3. Doloroso

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Alexa Trovasky, 6 anos de idade
Goiânia, Goias | 1966

 O sol quente queima a minha pele. A poeira da estrada de terra incomoda meu olhinho. Eu não consigo mais andar. Tudo dói. Estamos andando há horas. Mamãe esta com um cesto na cabeça. Ela está assobiando. É uma música feliz. Ela sempre assobia assim. Mamãe sempre esta feliz e usando seus vestidos floridos. Minha mamãe é linda. Ela grita muito comigo e me chama de atraso, mas, eu acho que isso é uma palavra boa. Eu não conheço muitas palavras, só conheço as palavras que a minha mamãe me fala e ela me ama

 Meus pés estão estranhos. Está doendo muito e tem uma coisa vermelha saindo deles. Paro. Sento-me no meio da estrada de terra. Entre meus dedos está vermelho. É pegajoso. Trago meu pé para pertinho. Passo a mão na sola para tirar as pedras e poeira. Faço uma careta. Dói

— Mamãe — chamo por ela. Olho para frente. Mamãe esta longe. Ela olhou quando eu a chamei, mas, ela continua andando — Mamãe, meu pé — esta vindo um carro. Mamãe finalmente para. O carro para ao lado dela e um homem sai

 Ela larga a cesta e pula em seus braços. Quem é esse moço? Ele é fino. As roupas dele são bonitas. São tão diferentes do vestido rasgado e velho que eu estou usando. Me levanto. Tenho que ir até à mamãe, ela não me ouviu quando eu a chamei

 Ela se afasta dele e saltitando pega sua cesta, a coloca no carro e em seguida entra. Esse moço vai nos ajudar? Um sorriso se desenha em meu rosto só de me imaginar entrando nesse carro bonito. Ele vai me deixar entrar no carro assim toda suja? Ele parece gostar muito da mamãe, ele vai gostar de mim também eu sou tudo o que ela tem

 Ando até o carro. O homem faz uma careta para mim e olha para a minha mamãe que faz uma careta para ele. O homem vem até mim. Com força ele me tira do chão e me leva até a sua camionete. Me joga na carroceria e entra no carro. Meu bracinho dói, dói muito

 Faço um bico para conter a minha vontade de chorar. Eu não posso chorar. Minha mamãe não gosta de barulho. Ela disse que mulheres não choram. Eu não posso chorar porque mulheres não choram!

 Nós estamos indo muito rápido. Mas, eu acho que essa deve ser a velocidade dos carros mesmo. Carros são legais, eles nos levam para lugares distantes e cheio de magia. Eu ainda não vi nenhum lugar cheio de magia, mas eu acho que deve ser para lá que os carros vão

— Hora do banho queridinha! — o moço diz entre risos assim que para o carro. Estamos em cima de uma ponte de madeira. Consigo escutar a água corrente passando em baixo de nós

 O moço sai do carro e dá a volta. Ele pega meus cabelos e os puxa me tirando do carro. Dói, mas, eu tento não chorar. Me puxando pelos cabelos ele me arrasta até a beirada da ponte. Com violência ele me joga. Sinto um frio na barriga. Meu corpinho afunda na água gelada. Agitando meus braços eu consigo sair do fundo. Ainda agitando meus braços eu tento sair daqui. Lagrimas salgadas descem pelo meu rosto. Eu chego na parte mais rasa. Corro. Corro muito. Ele só estava brincando. Como a mamãe. Só estava brincando. Só isso

 Tossindo muito eu subo o morro até a estrada que fica um pouco antes da ponte. Meus pés estão doendo mais que antes. Daqui eu vou poder ver o carro e voltar para mamãe. Volto para a estrada. Ando em direção a ponte. Não consigo ver o carro. Mamãe não foi embora sem mim, ela não me abandonaria

 Escuto ao se aproximar. É um carro. Não é igual, mas, é um carro. Os carros vão para o mesmo lugar mágico. Ele passa por mim. Eu corro atrás dele. Corro e corro. Ele finalmente para. Eu corro mais ainda com um sorriso enorme no rosto. Eu vou ficar com a minha mamãe

— Meu Deus Sérgio! — uma mulher diz e logo após uma mulher sai do carro. Ela tem cabelos da cor do sol. Ela corre para mim e me pega no colo. Não. Para onde ele esta me levando? Eu tenho que encontrar a minha mamãe. Eu quero a minha mamãe.

Recanto Hichello | Roma, Itália
15 de março de 1995 • 04:52

— Mamãe — sussurro abrindo meus olhos. Levanto-me de uma vez da cama. Ela não pode ir sem mim. Não pode. No completo escuro. Corro. Corro o máximo que posso — Não pode me deixar — digo com uma voz tremula — MAMÃE! — grito enquanto corro mais ainda. Tropeço em meus pés e caio desprezada ao chão. Choro feito uma criança. O mais alto que consigo — Por quê? POR QUE VOCÊ ME ODIAVA? POR QUÊ? MAMÃE — digo entre choro

— Alexa! — escuto a voz de Michael. O que estava escuro agora se clareia. Estou no hall de entrada da casa de Daniel. Sobre o chão. Michael corre para mim e me abraça — Foi só um pesadelo, já acabou Alexa — ele diz com sua voz tremula. Sinto as lagrimas dele cair sobre a minha pele. Daniel vem até nós e nos abraça. Michael esta aos prantos junto comigo. Por que a minha mãe me deixou? Por que mamãe?

Obsidia | Michael JacksonDove le storie prendono vita. Scoprilo ora