• Ariana •

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Não importava se o mundo estava caindo aos seus pés ou o clima de verão que tanto amava esquentava a cidade, o humor de Ariana não mudava.

Ela odiava as pessoas e não fazia questão nenhuma de demonstrar o contrário.

A garota do cabelo castanho avermelhado nunca entendeu por que o bando de meninas superficiais a seguia. Ela era popular, mas nunca se esforçou para isso. Talvez fosse seu rosto bonito e bem desenhado, com os lábios cheios e os olhos âmbar, ou talvez fosse o jeito de não se importar muito com as coisas e sempre ser sincera a respeito do tédio que sentia em relação às pessoas.

Ariana sabia muito bem a superficialidade daquelas relações. Ela sempre foi capaz de enxergar através das pessoas, como uma espécie de clarividência. Bastava olhar para uma pessoa e pronto, ela conseguia reconhecer suas intenções.

A primeira foi aos seis anos quando sua mãe voltou para cidade natal após o divórcio. Se mudaram para o centro da Belalís, em uma das ruas que cortavam a avenida principal. Seus novos vizinhos sorriam com simpatia (Menos os Solis. Esses sequer olhavam em suas direções), mas ela enxergava a maldade neles, a vontade de tornar a vida delas em um inferno. Na semana seguinte, boatos antigos sobre sua mãe foram revividos.

Ariana era a única aluna no colégio a ter um carro graças ao ano atrasado causado pela mudança de país quando sua mãe decidiu deixar o marido e a Irlanda. Era um fusca vermelho que antes tinha sido de Leona, sua mãe, e antes disso pertenceu a sua avó. Uma herança do clã Venturi, conhecida família em Belalís.

Ela tinha acabado de estacionar  o carro vermelho no estacionamento do colégio quando viu Alan Moreno se aproximar com sua bicicleta e parou perto dela.

Os cabelos castanhos bagunçados e o olhar cansado de sempre, junto a jaqueta de couro surrada chamava a atenção de Ariana. Ele era um clichê de badboy ambulante. Alan não usava cabelos curtos em penteados típicos de garotos com hormônios borbulhando, muito menos jogava no time de futebol do colégio. Ariana não podia deixar de achar isso interessante.

Os dois trocaram um breve olhar. Ele também não podia deixar de notar a garota popular da escola. Ariana tinha os cabelos brilhantes e lisos, se espalhando por suas costas e ombros. Um amontoado de fios despenteados cobrindo a cabeça. Alan tinha um interesse particular em como ela parecia alheia a tudo e ninguém parecia notar ou se importar. E Alan não podia deixar de se interessar por ela também. Porém ele sabia, como todos também sabiam, que Ariana gostava de meninas tanto quanto ele.

Sem um aceno sequer, ele seguiu para a escola com a mochila no ombro.

Ariana trancou o carro, se virou para a entrada do colégio e deu um passo para trás quando percebeu que as meninas que a perseguiam no colégio tinham notado sua chegada e caminhavam rapidamente em sua direção. Queria poder se esconder, mas era tarde demais.

— Nós decidimos o que vamos usar no Dia das Bruxas! — a mais alta gritou dando um salto na frente de Ariana. — Vamos de As Meninas Super Poderosas com um toque macabro!

Ariana semicerrou os olhos para a ideia nada original e a estranheza particular nela. As meninas estavam em três; Cristina, a que acabara de falar era de longe a mais irritante. Depois vinha Jenifer, a garota loira de cabelo curto e de voz anasalada. Por último, Bárbara, com o cabelo ruivo tingido e que tentava ao máximo ser como Ariana, porém sem muito sucesso. Pelas suas contas,  Ariana estava fora dos planos das garotas, o que para ela era um alívio.

— Pensamos que você pode ir de Senhorita Belo! — Jenifer disse efusiva.

— Aliás, já mandamos fazer sua fantasia — Bárbara acertou o ombro de Ariana e falou baixo como se contasse um segredo.

Ariana as encarou por mais um momento. Não se deu ao trabalho de falar que aquilo não ia acontecer e abriu caminho entre elas, caminhando até a entrada do colégio.

Desviou de Valquíria, que passou por ela como um furacão e a viu tropeçar em Mona, que parou por um momento e encarou Valquíria, a ignorando em seguida, continuando seu caminho a passos rápidos para dentro do colégio.

Ariana assistiu tentando desvendar o que se passava, mas sua clarividência não funcionava com meninas como elas. Nelas, Ariana não via nada.

Mas nem mesmo aquilo era interessante o suficiente para lhe tirar o tédio, e no instante seguinte, Ariana deu de ombros.

Já dentro do colégio, ela caminhou em direção a quadra coberta para se esconder pelo maior tempo que conseguisse para que não precisasse lidar com pessoas.

Quando finalmente achou um canto vazio, jogou sua bolsa no chão e se deitou na pequena arquibancada, tampando seus olhos com o antebraço e relaxando o corpo sobre a superfície nada confortável de concreto. Se desligou do mundo aos poucos, e voltou abrir os olhos quando ouviu o som abafado de vozes agitadas em algum lugar próximo.

Esperava que as vozes desaparecessem, mas elas apenas aumentaram. Levantou bruscamente, andou até a porta prestes a xingar as pessoas responsáveis por aquela baderna toda.

Ariana odiava as pessoas pelas coisas ruins que eram capazes. Odiava ainda mais as ver sendo as criaturas selvagens que eram debaixo das máscaras.

Quando seus olhos enxergaram a confusão que acontecia, Ariana não viu más intenções escondidas. Prendeu a respiração inconscientemente, fechou seus punhos e prosseguiu com seus passos fundos até o centro da confusão. O ar só saiu dos seus pulmões quando o primeiro chute atingiu em cheio o meio das pernas do garoto, ao mesmo tempo que o punho fechado de outra garota acertou o presunçoso rosto do mesmo rapaz, que visivelmente não esperava por aquilo e se desequilibrou caindo de joelhos no chão.

Era certo que todos comentariam mais tarde sobre como a garota mais popular de São Basco foi uma das responsáveis pela gloriosa surra que King finalmente havia levado, o tornando piada nos celulares de todo o colégio com vídeos ridículos daquela situação, e como Ariana Venturi estava indiscutivelmente ferrada por isso.

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