𝕻𝖗𝖔𝖑𝖔𝖌𝖔

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"Dizem que quando uma pessoa morre, ela vira uma estrela, para sempre poder observar e zelar por quem ela deixou. Como pode algo tão belo e fascinante ser feito de tanta tristeza e dor? Creio que a única resposta possível é que o céu anoitecido serve para nos lembrar que até na mais profunda tristeza pode haver beleza"


Lucy Vaughan

Meus dedos das mãos estão gelados como gotas de chuva. Meu estômago estremece e minha pele se arrepia como se estivesse recebendo o toque ardente de certas mãos. Meu coração pulsa mais rápido na tentativa de aquecer meu corpo, que se encontra estirado e desprotegido, e isso já é o suficiente para minha consciência retomar inteiramente o controle de tudo. Abro lentamente meus olhos sujos e pesados pelas cinzas da destruição recém feita, sem acreditar que estou conseguindo fazer tal ação.

Estou viva!

Mas até quando? Antes que eu tenha tempo para raciocinar e enxergar com clareza o lugar ao meu redor, sinto a consequência de estar viva pulsando no meu braço direito, que deve ter sido pulverizado durante a luta e agora se resume a um mero antebraço ensanguentado. Isso responde a minha pergunta. Não devo ter mais que 20 minutos de vida.

Levanto minha cabeça machucada com dificuldade e olho em volta com atenção, na rasa esperança de encontrar alguém. No entanto, logo essa pequena brasa de ilusão se apaga quando me deparo com o estado da paisagem. O que antes era um paraíso da flora agora se resume à fogo e vestígios de guerra. As majestosas árvores que formavam uma pequena floresta, se tornaram troncos baixos o suficiente para serem feitos de banquinhos. As flores sumiram e a grama em que estou deitada ainda está um pouco quente. A cratera, visivelmente profunda e gigantesca é como um martelo de culpa batendo na minha mente.

Viro meu rosto para o lado esquerdo e me espanto levemente antes de sentir uma calmaria estranha tomar conta de mim e eu repousar meu olhar cansado sob o corpo caído e tão machucado quanto o meu ao meu lado.

— Ei, acorda. — Ele se mantém imóvel. — Ivan? — Seu peito não mexe. Reúno as poucas forças que me restam e uno nossos dedos. Sua mão gelada.

Muito gelada.

Parabéns Lucy, conseguiu fazer o que ninguém conseguia, mas todos queriam. Com a morte dele o seu reino está a salvo e o seu povo irá adorá-la como nunca se foi feito. Mas era isso que você queria?

   — Não... Eu nunca quis isso. — Meu sussurro é fraco e minha voz está falha. Seguro fortemente em sua mão enquanto meus olhos começam a arder intensamente, anunciando a chegada das minhas lágrimas que foram aposentadas há três anos e já estão transbordando. — Perdão... — Forço meus dentes uns contra os outros para suprir o barulho e parte da dor, mas isso só funciona com o barulho.

Estou rasgada. Devastada como nunca estive. Eu estava tão corrompida e cega que matei alguém que tinha todo o meu coração em algo que era para ter me matado de imediato; um poder que era para fazer de mim apenas pó. Perdi tudo que eu mais amava e logo morrerei sabendo que tudo o que causei foi desgraça.

O sangue em minhas mãos nunca saiu e nunca sairá.

Só espero que ele tenha ido para um lugar melhor que eu. Espero que tenha ido para a companhia das estrelas.

Irmãos da RosaOnde histórias criam vida. Descubra agora