Capítulo 8 - O início

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Imóvel em uma maca, numa espécie de transe acarretada por minúsculas dores oculares, numa forte luz branca que piscava em seu globo ocular, laços negros em pescoços mostravam uma família desconhecida temendo algo... talvez nem tanto. O famoso e velho rosto derretido pairava olhando o chão tristemente com suas pupilas esbranquiçadas, sem dar a menor ideia para o corpo que apenas contemplava os relances da cena. Nenhuma figura materna ou amigável estava por perto para prestar ajuda, era o fim, o fim para o garoto que teve de aceitar o fogo nos olhos do jovem lobo ao morder sua jugular e sentir o quente explodir em suas veias e derreter seu tecido muscular, era o limite do menino que não conseguiu se quer ajudar a garota que gostava, era o fim para ele mesmo que não conseguiu nem ao menos entender o que aconteceu. Acabou, ele pensou, é isto e sem fôlego e força para pensar, mais dois membros da família pacata e mórbida se aproximaram dele para saborear sua carne, mas dessa vez retirando pedaços de pele, pedaços de seus membros, cacos de sua alma, como se já não bastasse toda a dor e a angústia de partir sorrateiramente sendo devorado por três irmãos não tão idênticos, gargalhadas, mais gargalhadas ao chão adentravam a sua audição que começava falhar gradualmente. O amaro senhor sorria, encarando ao chão, ele segurava com força as mãos de uma velha senhora de longos cabelos pretos e parecia pertencer a uma decomposição bastante arremetida. Já não há forças, você estar morto Rael, sua alma pertence ao mundo dos mortos, ao mundo que sua amiga se encontra, e bom, ela veio lhe receber, seu sorriso contagiador o convida para subir uma escada angelical e é lá de cima, dos degraus que ele sabe do porquê, a piada entendida, todos rindo e cuspindo pedaços de sua carne que não desciam à garganta, todos com tons de olhares diferentes, olhando macabramente de baixo para cima, os três jovens sombrios e sorridentes acenavam levemente sobre os corpos de Lílian e Caio e de mais dois familiares...

— Acabou, este é o fim, o fim da linha minha doce amiga, o limite de sonhos improvisados e de uma família que poderia se unir, é o fim da minha própria religião e de meus únicos amigos, irei vagar lentamente pelas lustrosas estrelas até amanhecer e me perder na claridade do céu, eu quero partir deixando algo nesse mundo, nem que seja uma cicatriz em alguém que mais amo. Me perdoem Alana, Lílian, Caio, Luke e mãe, talvez essa seja a carta que nunca escrevi, desculpem não mencionar mais do que já vivemos e do que deveríamos. Adeus.

Lágrimas, lágrimas e mais lágrimas derrubavam o sangue preso. Uma mão, duas mãos, faziam movimentos de costura, seguido de uma dor fina que costurava os pequenos buracos de sua narina.

— Tente respirar pela boca, garoto.

— Preciso de um pouco de gaze. Pela boca, respira pela boca, garoto!

— Rael, obedece à médica!

Toda essa aventura acabará em breve, te esperarei quando você ficar maior, será melhor que estar presente em uma cidade cheia de velhos e de histórias assombradas, uh!

— Vai ficar quase novinho em instantes. Assine o atestado de quatro dias para ele, a anestesia ficará fraca em breve, tente não fechar os olhos agora, mocinho.

Se cuida.

— Por que você está chorando? Tudo bem que a pancada foi forte, mas já está no lugar.

— Cristina! Ele perdeu uma amiga.

— A menina que morreu? Era amiga dele? Pobre menina! Nunca pensei que veria algum corpo tão mutilado na minha vida, que espécie de maníaco arranca o coração e leva? A polícia já olhou as câmeras?

— CHEGA!

— Desculpe, senhorita, Lílian. Mil perdões, não era minha intenção. Ana, é... abaixa as luzes, vamos, sente-se, não mexa no nariz, está me ouvindo?

Se cuida.

— Garoto?

— Sim, estou ouvindo, quero me levantar!

— Ok, pode se sentar. — Um total devaneio passou em seu cérebro, uma tontura quase o derrubou para sua antiga posição. Em meio à dificuldade de enxergar, ele mal conseguia dizer quem estava à sua volta. Suas pálpebras pesavam a cada dolorida batida, então, sem pensar muito, ele apenas fechou os olhos.

— Lílian, você está aí?

— Sim! Como se sente, Rael? — Perguntava preocupada o suficiente para não conseguir ficar sentada.

O Próximo Plenilúnio Onde as histórias ganham vida. Descobre agora