O INÍCIO (REVISADO)

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  Como nem tudo na vida é um conto de fadas, logo a minha vida não seria também. Nesse momento eu estava no meio da mudança, com caixas me apertando na traseira do carro do meu pai. Paramos em frente a nossa nova casa, em comparação com a antiga, caímos bastante.
 
   Pulei da traseira do carro arrumando a minha calça que estava toda torta e suja. Peguei a caixa do meu quarto enquanto meu pai arrumava as outras.
 
  —Da próxima vez limpa o carro. Fiquei toda suja. -Falei fazendo cara feia.
 
  —Larga de ser chata Ruby. Vem, vamos arrumar isso logo.
 
   Antes de entrar olhei em volta, foi quando me dei conta da quantidade de caras que me olhavam de cima em baixo. No mesmo momento um carro passou na rua, rebaixado, vermelho, parecia ser antigo.
 
   Dentro dele estavam dois caras, os dois lotados de tatuagens, um deles com um sorrisinho debochado no canto do rosto. Passaram sentando o mão na buzina. Ao chegar ao meu lado um deles deu um toque no braço do outro e a velocidade foi diminuindo.
 
  —Meu sonho é você em novinha. -Ele sorriu.
 
  —Nem nos seus sonhos você me teria. -Revirei meus olhos e dei as costas indo em direção a minha casa.
 
   De longe escutei um grito de alguém me chamando de gostosa, apenas dei um dedo do meio e entrei em casa. Quem aqueles idiotas pensam que são? Os donos do bairro pra chegar buzinando? Me poupe!
 
  —Filha, vou ter que te deixar cuidando de tudo. Vou precisar sair pra trabalhar.
 
   Meu pai apareceu na porta do meu quarto olhando pro telefone e saindo.
 
  —Tá, tchau né!
 
   Era 17:30 da tarde, eu não tinha absolutamente nada pra fazer. Resolvi colocar uma roupa e sair pra correr, eu tinha feito uma promessa ao meu pai de voltar para a dança. É complicado desde quando a minha mãe se foi, mas sinto que está na hora de deixar o passado para trás. Peguei minha toalha e fui para o banheiro, quando a água gelada se chocou contra o meu corpo era como se voltasse naquela noite.
 
  FLASHBACK:
 
  —Como assim você não vai? -Gritei surtando.
 
  —Filha, eu vou. Só vou chegar uns 15 minutos atrasada.
 
  —Não mãe, você tem que estar no horário. Por favor, é muito importante pra mim. -Falei chegando ainda mais perto dela.
 
  —Prometo tentar ok? -Ela me mandou um beijo.
 
  ...
 
 
   Eu estava tentando olhar pelas cortinas pra ver se ela já havia chegado, faltava 2 minutos para a apresentação e nada.
 
  —Ruby, vamos!
 
  —Espera mais 2 minutos? Ela deve estar chegando.
 
  —Não dá tempo. Você precisa subir nesse palco.
 
   Tive que me posicionar esperando que quando as cortinas se abrisse ela estaria lá. Mas não, ela não estava lá. Me esforcei pra dar o meu melhor, balé sempre foi o meu sonho e era a oportunidade para eu me destacar com vários jurados me olhando.
 
  No meio da dança um calafrio circulou o meu corpo, me fazendo perder o equilíbrio e tudo desabar. Naquele momento era como se flash passasse em frente ao meu rosto. Desci do palco com o coração apertado e corri para fora do ginásio vendo carros da polícia e meu pai escorado no carro com o rosto inchado. Por segundos eu quis não entender aquilo, mas eu entendi. Meu mundo desabou, por minha culpa ela se foi. Por minha culpa eu nunca mais a veria.
 
  ...
 
   Abri meus olhos com a sensação novamente. Sai do banho colocando uma calça moletom, um top de academia e uma blusa de frio por cima. Tranquei a minha casa e sai em disparada correndo em direção ao nada. Eu não sabia para onde estava indo, algumas lágrimas insistiam em cair no meu rosto mas eu enxugava e aumentava a minha velocidade. Até sentir meu corpo se chocando com o chão.
 
  —Ops! -Levantei meu olhar e uma garota dava risada.
 
  —Qual é o seu problema? -Me levantei ficando cara a cara com ela.
 
  —Não gosto que corram na minha calçada.
 
  —Ah que pena, se eu soubesse teria passado aqui mais vezes. E quem é você? A dona da porra da calçada? -Ouvi risadas e percebi os caras do carro sentados em frente a casa.
 
  —Se falar comigo desse jeito de novo eu vou te encher de porrada. -Não, você não vai.
 
  —Tô esperando pra ver então. -Me aproximei mais dela.
 
  —A branquela está se achando a gostosa. -Ela deu uma risadinha debochada.
 
  —Achando não amor, eu sou a porra da gostosa. -Falei olhando ela de cima em baixo.
 
  —Alguém realmente acha isso? -Ela deu risada.
 
  —Eles todos acham. -Mandei um beijinho pra ela e continuei correndo.
 
   Dei a volta no quarteirão fazendo questão de passar duas vezes na mesma calçada e sentir ela fuzilando as minhas costas. Até que na terceira volta o cara que falou comigo no carro me chamou.
 
  —Ei? -Virei meu olhar pra ele parando de correr e esticando o corpo.
 
  —Fala!
 
  —Vai ter uma festinha hoje, quer colar? -Virei o olhar pra mulher.
 
  —A festa vai ser sua? -Ela balançou a cabeça confirmando.
 
  —Ah, então claro. A gente se vê lá... -Falei dando risada e olhando ela.
 
   Ela se levantou e ia vim com tudo para cima de mim, como uma boa menina e nada medrosa continuei no mesmo lugar. Se ela pensa que me assusta e que eu vou abaixar a cabeça, ela tá bem enganada e não tem ideia de quem eu sou.
 
  —Katrina nem pensa. -Ela se afastou e foi para dentro da casa.
 
  —Onde e que horas? -Voltei o meu olhar para o cara.
 
  —Ela vai mesmo? É maluca! -Um dos caras deu risada.
 
  —Na rua de cima as 22:00, mas fica bom à 00:00.
 
  —Otro caliente. (OUTRA GOSTOSA)
 
  —Voy a estar allí. (VOU ESTAR LÁ)
 
   Escutei mais risadas e voltei a correr, desça vez em direção a minha casa. Já era quase 20:00, dava tempo de tirar um cochilo. Tomei um banho lavando meu cabelo para secar naturalmente e me deitei no sofá de casa com tudo arrumado. Escutei meu pai chegar e dizendo que sairia de novo.
 
  —Vou em uma festa hoje. -Ele parou na porta.
 
  —Onde e com quem? -Ele cruzou os braços.
 
  —Umas pessoas que eu conheci, na rua de cima. -Ele fez a cara de que não gostou nada disso.
 
  —Se cuida! Qualquer coisa me liga.
 
  Ele saiu me deixando sozinha outra vez. A maior novidade, ele sempre me deixa sozinha. A desculpa? Sempre é trabalho. Até parece que ele não vai pra porra do bar mais perto e se encher de vodka e tequila. O meu refúgio desde que minha mãe se foi? Acho que corrida ou dormir, isso afasta da minha mente. O do meu pai? Beber até perder o controle e jogar na minha cara as diversas vezes que eu fracassei. Inclusive me culpar pela morte dela, i que não é mentira. Mas ele não imagina a quantidade de coisas que eu sei que acontecia entre eles. Coloquei meu celular pra despertar e não demorei muito pra cair no sono.

Os donos da rua | OSCAR DIAZ Onde as histórias ganham vida. Descobre agora