TRÊS

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     Eu e meu pai ficamos um bom tempo ali, até que as pancadas violentas na porta  começaram. Meu pai olhou incrédulo para a pequena iluminação laranja que se formava na soleira da porta. Ele se levantou, levou a mão a boca, indicando que eu ficasse em silêncio e gesticulou para que eu fosse para o meu quarto. A porta se abriu em um grande estrondo. Corri para debaixo da cama e me escondi. Então ouvi pela primeira vez o som forte e alto de uma arma. Escutei passos apressados correrem pela casa, depois vi os sapatos das pessoas indo em direção ao quarto dos meus pais. Ouvi um homem gritar um palavrão, seguido de: Ela realmente estava doente!

     Humanos, foi outra palavra que me marcou. Minha mãe não morreu pelo flagelo. Sim, ela ficou doente. Mas quem realmente matou ela naquela noite, foram os humanos.

. . .

     Eu e Gus estávamos do lado de fora da cabana. Já se passaram quatro estações, pensei enquanto olhava para o sol se pondo, criando uma atmosfera alaranjada. Gus estava com a cabeça baixa, seus olhos azuis fitavam a grama, seu corpo inclinado e suas orelhas de cervo curvadas. Quando Richard se foi, o garotinho quase perdeu a alegria de viver. Uma vez eu o ouvi chorando baixinho na cama até dormir. A responsabilidade de cuidar do Gus se tornou minha, e o peso que ela carregava me fez não conseguir dormir direito. Minhas visitas na cerca também diminuíram. Comecei a ir um dia sim, um dia não, sempre na esperança de encontrar Dylan novamente. Um dia deixei de ir por completo.

— Você quer me ajudar hoje? — Me virei para Gus e forcei um tom alegre.

— Não sei Maya. — Ele continuou olhando para baixo.

— Ah, vamos! — Fiz um olhar de coitadinha. — Prometo que vai ser legal, Bambi. Sabe do que precisamos hoje?

— Do que? — Gus levantou sua cabeça e me olhou curioso.

— Fazer uma faxina na casa! — Pisquei. — Seu nariz é muito sensível, você não vai aguentar o tanto de poeira que tem lá dentro.

— Eu consigo sim. — Ele cruzou os braços e fez biquinho.

— O Sr.Gus poderia me trazer um espanador? — Fiz um sotaque inglês escandalosamente horrível. Esfreguei um bigode imaginário e Gus riu.

— Sim, Srta.Maya. — Ele imitou o meu sotaque e correu para dentro da cabana.   Quando voltou, parou de frente a porta enquanto segurava um espanador de pena.

— Muito obrigada, Sr.Gus! — Me curve e me dirigi para onde ele estava. — Agora precisamos tirar as forças do mal das prateleiras e do chão.

— E o que são essas forças do mal? — Gus abriu bem seus olhos e estendeu suas orelhas.

— Elas vão entrar no seu nariz e... — Pensei. Me aproximei dele e comecei a fazer cosquinhas. — Elas vão te encher de cosquinhas Bambi! — Fiz uma risada maligna.

— Oh não! — Gus riu e então colocou a mão no coração. — Eu não deixarei isso acontecer! — Ele correu para dentro de casa, apontando o espanador para mim como se fosse uma espada.

— É o que veremos! — Fiz outra risada maligna e então corri atrás dele.

. . .

     Passamos um bom tempo limpando a poeira deixada por quatro longas estações. Mas ainda faltava um cômodo que não havia sido aberto: O quarto de Richard. Olhei para o garoto e o mesmo me fitou.

Sweet Tooth: FLAGELO (Em Revisão)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora