18 | FOGO TROCADO

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"Eu ando no limite
Minha velocidade vai no vermelho
Eu sempre gostei de brincar com fogo
Louvados sejam o rei e a rainha do tumulto"
Play with fireSam Tinnesz

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RAFE

  O olhar de Barry Lopez é indecifrável. Ele se recosta no sofá da varanda, processando o que expliquei.

  Nunca senti tanta dor em minha vida. Cada pedaço do meu corpo implora por analgésico. Impossível controlar toda a tensão. O dia anterior persiste confuso em minha mente, mas contei tudo o que me lembrava sobre Lisa.

  Quase tudo.

  — Eu só quero paz. — Suspiro.

  — Saiu por aí atirando em policial e quer paz? — Solta um riso ácido, indignado.

  — Não era a intenção! — Rebato. — Eu não sabia como agir.

  — Você prometeu não arrumar encrenca, porra! — Barry dá um chute raivoso na mesa minúscula, derrubando a bagunça que ficou após a festa.

  Alguns detalhes do que rolou na noite anterior, quando assumi a festa, ficaram de fora. Max Hudson amenizou o máximo possível, talvez esperasse que eu ou Mandy contasse o resto — o que não aconteceu. Não tem porque mencionar a quase overdose ou a baderna que estava antes dele chegar.

  Minha memória está quebrada, mas a breve lembrança fica em loop.

  A vergonha inflama dentro de minhas veias. Não sei se conseguirei olhar para Mandy omitindo o que fiz. Posso lidar com o julgamento de Hudson, de Barry ou de minha família, mas não suportaria o dela. Eu não aguentaria que, no fim das contas, ela estava certa sobre sua dúvida em mim.

  — Vou resolver isso. — As palavras tremem quando penso alto.

  — Você sempre diz que tem tudo sobre controle, Rafe! — Meu amigo fica em pé, andando de um lado para o outro. — E o pior é que eu sempre dou meu voto de confiança! — Encara o teto, toda raiva está exposta.

  Nuvens negras pairam acima de mim. Torço para que um raio me atinja de uma vez.

  — Vou contar à polícia. — Me levanto segurando o ombro dele, recebendo um tapa no mesmo instante.

  Barry puxa a gola da minha camisa abruptamente, me olhando nos olhos à procura da minha sanidade. Espero pelo seu soco, mas ele me solta e gargalha desacreditado.

  — Você simplesmente entregaria Ward também? — Sua voz causa arrepios. — Entraria na delegacia, se sentaria como uma criança que aprontou na escola e confessaria tudo? — Minha pressão cai aos poucos. — Não é tão básico assim. Ainda não entendeu como funciona o sistema de Outer Banks. Não tem como você apenas se culpar sem levar outras pessoas junto. Mesmo que da maneira errada, tentou defender sua família seja lá do que for. — Cada pontuação dele me eletrocuta. — Eu faria o mesmo por minha irmã porque sei o que ela faria por mim.

  Talvez meu pai não me defenderia de algo que não envolva ele. É egoísta. Tudo é estritamente pensado em como irá afetá-lo. Sempre foi um narcisista. Quando criança eu o via como um ser maior que todos. Eu queria aprender seus truques, queria me vestir igual, almejava ter sua relevância algum dia porque as pessoas o cumprimentavam onde quer que passasse, me reconheciam rapidamente por ser filho de Ward Cameron. Ninguém nunca questionou como é por trás das câmeras.

  Siga o roteiro.

  Modifique o roteiro.

  Por anos quero ter uma conversa eficiente, sem o ego dele falando mais alto e nunca ocorreu. Tudo do jeito dele. Parece que quando tento me afastar de ser sua cópia, acabo agindo igual, e isso me faz me odiar cada vez mais.

REDENÇÃO [rafe cameron]Where stories live. Discover now