Vinte e Sete

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Violet olhava pela janela embaçada pelas gotas de chuva que caíam mansamente lá fora. O clima condizia com o seu estado de espírito. Tudo dentro dela estava opaco e melancólico como a fraca garoa que descia do céu. Seus olhos estavam carregados de um pesar característico, e sob eles, olheiras deixavam-na com uma aparência cansada. Ela também estava magra, até um pouco pálida pela falta de alimentação correta nas últimas semanas.

Tudo o que ela queria era ficar trancafiada em seu quarto, encolhida na cama, se balançando para frente e para trás, sua mente rondando bem longe dali. Ela não estava conseguindo lidar bem com o turbilhão de sentimentos infelizes dentro de si. Sentia-se miserável.

De certa forma, ela era a culpada por tudo que acontecera. A morte de Nerissa. A ameaça que pairava sobre suas mães. A maldição não quebrada. E agora, o fato de seu melhor amigo não ter recuperado a consciência desde aquela maldita noite e estar em estado vegetativo sobre uma cama de hospital. Violet bem que tentara reverter ao menos essa última situação. Descansara durante dias, como Norah sempre aconselhava depois de um esforço grande com magia. Depois, voltara a concentrar todas as suas forças em Bryce, tentando, em vão, curá-lo. Mas não deu resultado. Falhara. Falhara mais uma vez.

Voltou seus olhos a Bryce, adormecido. Pálido, ele estava cheio de tubos que garantiam que continuasse sobrevivendo. Ela não suportava vê-lo daquele jeito. Bryce, que sempre fora tão alegre e cheio de vida, agora padecia na inconsciência. Ela não sabia nada sobre espíritos, mas sabia que Bryce não tinha ido. Ele continuava ali dentro, em algum lugar, lutando por sobrevivência. Sentiu isso quando tentou curá-lo. Bryce não desistira. E ela também não desistiria, ou o deixaria desistir. Se era a única maneira de ajudá-lo, ao menos nisso ela não falharia.

Dierdre Montgomery tinha destruído sua vida. Violet não acreditava que o feitiço que jogara contra o demônio duraria muito tempo. Sabia que ela retornaria, e mais cuidadosa, pois agora sabia exatamente do que Violet era capaz. Ela não estava livre da ameaça que pairava sobre si e sobre aqueles que amava.

Sentiu a presença antes mesmo que ela abrisse a porta suavemente e adentrasse o quarto. Depois da explosão de seus poderes naquela noite, Violet teve sua magia completamente desperta e mais forte do que nunca. Conseguia realizar pequenos feitiços que antes demorava dias tentando. E estava mais sensitiva, o que era uma habilidade importantíssima a aprender a controlar.

— Você é a avó de Bryce — Violet disse, roucamente.

Tinha permanecido calada todos aqueles dias, recusando-se a falar com todos. E quando falava, esforçava-se para demonstrar que não tinha interesse em conversas triviais. Limitava-se apenas ao necessário, e logo retornava a sua reclusão.

— Eu sou — Norah concordou, aproximando-se de Bryce.

— Por que não me contou? — Violet questionou, não como uma acusação, mas sim como uma simples pergunta.

Não era sua intenção discutir com Norah. Não é como se essa fosse uma informação vital.

— Bryce e eu não temos um bom relacionamento — Norah respondeu com sinceridade e um traço de tristeza.

Violet conhecia bem a história. Quando Emily, a irmãzinha de Bryce havia morrido, Norah não fizera caso. Dissera que aquele era o destino de Emily, e que ela não morreu em vão. A família, é claro, repudiou as crenças de Norah e a baniu do convívio com eles. Por isso, Bryce raramente mencionava a avó. Assim como seus pais, ele odiava a idosa por ter dito o que disse. Nunca conseguira superar a morte da irmã. Agora Violet sabia qual era a sensação. Apesar de não ter tido muitos vínculos com Nerissa, havia perdido-a cedo demais. Como Bryce havia perdido Emily.

Supplicium [Completo]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora