Trinta e Um

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A noite cai e mesmo com quase um quilo de M&M's no estômago não melhoro em nada meu humor. Gostaria de ser igual a essas garotas que quando ficam nervosas não conseguem colocar nada para dentro, mas meu caso é o inverso. Desconto tudo na comida e, claro, engordo.

Mamãe está batendo na porta pela terceira vez hoje. Desde que chegou do trabalho e meu irmão linguarudo contou tudo o que eu tinha dito pra ele sobre minha história com o Bernardo (omiti as partes românticas porque não sou boba nem nada), ela tem tentado me fazer sair da cama. Sem sucesso, obviamente.

-Está acordada? – mamãe abre a porta pela metade me olhando por cima da luminária em meu criado mudo.

Estou deitada de bruços, mas logo enfio o rosto no travesseiro para que ela não note o quanto está inchado de lágrimas e respondo apenas com um "sim" abafado.

Mesmo sabendo que não é bem vinda mamãe se senta ao meu lado na cama e dá uns tapinhas em minha bunda.

-Ei. Vem. Vamos jantar um pouco. Fiz a sobremesa que você adora: torta de banana.

-Você não sabe fazer nem mousse de chocolate de caixinha.- rebato ainda sem olhar pra ela.

-Verdade, você me pegou. Mas foi comprada com amor e parece muito gostosa.

Graças ao tanto de chocolate no estômago consigo recusar sua oferta.

Mamãe fica calada por um tempo até que sinto que ela coloca algo perto de mim na cama.

-Ainda não entendi o porque da garrafa, mas acho que você deveria ler.

Na mesma hora me lembro da mensagem que Bernardo havia trazido dentro da sacola. Por causa da discussão ele com certeza se esqueceu de buscar.

Me sento cheia de curiosidade e tiro a mensagem da garrafa.

Mamãe me encara com expectativa, porém tudo que eu menos quero agora é uma plateia. Ela percebe quando abro os braços e sai suspirando como se eu fosse a filha mais chata do mundo.

Não ligo porque meus olhos já estão percorrendo as primeiras linhas da carta.



Mensagem IX

Para Cléo D"Ângelo

Sei que você já ouviu sobre o dia em que me machuquei, mas eu gostaria de contar com mais detalhes. Soa como um desabafo e eu sei que posso confiar em você.

Nós havíamos viajado pra Inglaterra depois de vencermos as regionais brasileiras da Copa Manchester. O jogo final ia ser no estádio do próprio Manchester United contra um time da Alemanha. Os caras eram bons, mas todo mundo tinha dito que nossa campanha no campeonato tinha sido melhor. A gente estava embalado. Todo mundo parecia confiante na vitória.

Menos eu. Mas meu problema era muito mais que insegurança ou dificuldade de lidar com a pressão. Eu vinha sentindo dores no joelho direito desde o ano passado (retrasado no caso). No começo eram fracas, foi só durante a Copa Manchester que elas pioraram. Eu sabia que devia avisar ao nosso técnico Ricardo ou ao pessoal do departamento médico. O que freou a decisão foi o medo de ficar de fora da final.

Havia sonhado tanto com aquilo. Imaginado as portas que um campeonato daquele iriam me abrir... Eu estava em alta. Eu era o cara. A promessa. O garoto de confiança do treinador. Não podia ficar no banco, não podia ser poupado. Tanto pela minha futura carreira quanto pelo meu time. Havia chegado a hora de mostrar pra todo mundo que eu não era mais criança.

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