Dossiê Introdutório - Dados Histórico-Analíticos - Europa, 2025 à 2099.

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Desde então, a maioria das grandes cidades não se encontra mais em ruínas, porém estrutural e socialmente precárias devido à série anterior de eventos ocorridos no passado. Os cidadãos lutam até hoje para sobreviver em meio ao lixo e ao esgoto que se acumulam nas ruas, lutam contra um clima hostil que assola grande parte do globo e lutam contra seus maiores inimigos: eles mesmos.

As cidades que não haviam sido completamente devastadas, ou que ruíram, tiveram todos os seus serviços de saneamento básico, principalmente os subterrâneos, destruídos. Não se é mais possível escoar os detritos por vias normais ou abastecer bairros inteiros com água potável. O esgoto agora é despejado através de encanamentos externos, instalados nos prédios e descendo até pouco abaixo das calçadas. Sendo em seguida liberado por canos e dutos, por entre os meios-fios, os detritos então correm livres pelas ruas. Ao centro dessas vias localiza-se uma vala com cerca de dois metros de profundidade e cinquenta centímetros de largura, no qual o esgoto escoa para fora da cidade. Não mais existe nenhum tipo de sistema pluvial que possa escoar as águas das constantes chuvas, sendo consequentemente despejada com o esgoto, em algum rio próximo ou no mar. Assim, somadas as águas das chuvas frequentes, as valas de escoamento encontram-se sempre cheias ou trasbordantes.

A água potável é comumente coletada das chuvas torrenciais, de todas as formas possíveis que a sociedade pôde conceber. Quem pode pagar por esse serviço o recebe através de canos que se espalham pelas cidades, por meio de torres suspensas entre os prédios. Quando não se é possível pagar pelo sistema de distribuição de água potável, a mesma é transportada por caminhões para as comunidades desamparadas, mas raramente é suficiente para atender a demanda. Os abalos sísmicos mais sutis que ocorreram em 2025 haviam, ao menos, provocado rachaduras e fissuras por onde a água e o frio invadiam as residências precárias. Muitas vezes, essa é a única forma acessível e rápida pela qual a sociedade mais carente pode obter a água de que necessita, ao custo do frio castigador.

O lixo agora é abandonado pela sociedade, nas ruas, em qualquer beco ou por entre o esgoto. Desde então existe um precário serviço de recolhimento de lixo, ou de limpeza urbana, e as autoridades apenas contratam um serviço particular de coleta quando o lixo toma as ruas e impede a passagem de algum indivíduo econômica e politicamente bem posicionado entre a sociedade, que possui voz ativa o suficiente para fazer alguma reclamação. Normalmente a população conta com que a correnteza das valas de esgoto possa levar seu lixo para algum outro lugar, que não seja o seu bairro. Ainda assim, é bastante comum encontrar montanhas de sacos de lixo à frente de prédios residenciais e comerciais, becos, estacionamentos e escadarias. Na maioria das vezes, essas montanhas de lixo não desaparecem, pois servem de abrigo para alguns moradores de rua.

Redes elétricas, telefônicas e as redes de dados transformaram-se em um emaranhado impossível de se discernir, ao nível do solo, sem o equipamento adequado. A grande globalização das telecomunicações, que ocorreu no início do século XXI - principalmente devido ao desenvolvimento desenfreado da internet e ao barateamento de aparelhos, equipamentos e serviços -, fez com que várias comunidades ou indivíduos se tornassem completamente dependentes de seu espaço de expressão. Nenhum outro recurso básico, visando a qualquer qualidade de vida, havia sido priorizado antes do reestabelecimento das tecnologias de comunicação.

Ainda existem na atual sociedade muitos problemas com todos os tipos de entorpecentes, mas o vício da comunicação se tornou algo pior que muitas drogas químicas. A dependência tecnológica transformou-se no ópio do povo, devido ao fácil acesso aos sistemas de telecomunicações atuais e os módicos preços dos aparelhos comercializados. É interessante lembrar que todas essas tecnologias são desenvolvidas e distribuídas por empresas japonesas, que incentivam a imersão tecnológica para se esquecer da tragédia que é a vida. É muito fácil encontrar, morando em meio às montanhas de lixo, muitos moradores de rua acessando incessantemente as várias redes sociais digitais. Permitimos que tudo isso ocorresse para fazer-nos esquecer de nosso atual e maior castigo, o clima.

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