O filho perfeito

By RobertaDragneel

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Dinesh Yamir é o filho de um grande empresário, por isso as expectativas sobre o seu futuro são altas. Então... More

Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Especial [+18]
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 27 (Parte I)
Capítulo 27 (Parte II)
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35 (Parte I)
Capítulo 35 (Parte II)
Bônus: "A Carta"
Capítulo 36
Capítulo 37
Capítulo 38 (Parte I)
Capítulo 38 (Parte II)
Capítulo 39
Capítulo 40
Epílogo
Agradecimentos

Capítulo 26

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By RobertaDragneel

*Atenção: Esse capítulo contém gatilhos como suicídio!


"Me encontre lá no fundo
Onde ninguém sabe
Alguém ajude
Eu estou perdendo meu coração." - Hallelujah, Kim Feel


Dinesh encarava a tela do computador com um olhar vazio enquanto Masaichi dizia como deveriam se comportar na próxima reunião. O Yamir só conseguia pensar em como havia agido como um monstro na noite passada, destruindo a vida de uma garota inocente. 

Eu só estrago tudo, pensava.

O homem massageava as têmporas, soltando um longo suspiro.

— Olha, Dinesh, eu sei que a minha voz não é a melhor do mundo mas faça um pouco de esforço para prestar atenção no que eu digo.

— Eu sou um monstro...

— Está bêbado logo pela manhã?

— Eu gostaria de estar bêbado todos os dias até ter uma overdose.

Nesse momento, a expressão de Masaichi muda para total preocupação e ele se aproxima do amigo.

— O que aconteceu, Dinesh?

— Eu... Eu fiz algo horrível...

— Oh céus, você engravidou alguém! Eu sabia que sair metendo em qualquer buraco daria nisso!

— Claro que não, Masaichi! — ele abaixava o olhar. — O que fiz é o pior dos pecados... Eu machuquei uma pessoa inocente...

Masaichi engolia seco, sentindo um calafrio percorrer por seu corpo ao encarar a expressão do rapaz à sua frente.

— Eu estou ficando preocupado. Você cometeu algum crime...? O que você fez?

— Infelizmente, não posso dizer...

O vice diretor abria a boca para fazer alguma pergunta mas batidas na porta o interrompem. Então, Miyuki entrava na sala com um largo sorriso e fazia uma reverência cumprimentando ambos.

— O seu irmão está aqui, senhor Yamir.

Dinesh sentia reviravoltas no estômago, saindo do escritório sem dizer uma palavra sequer e evitando olhar nos olhos da sua secretária.

— O que deu nele?

— O Dinesh anda meio estranho desde que chegou aqui. — comenta Masaichi. — Vamos respeitar o seu espaço e o esperar desabafar com a gente.

— É. Deve ser o melhor a se fazer...

Kiran aparecia na empresa usando o uniforme do colégio, cumprimentando os funcionários presentes com um largo sorriso. O rapaz possuía uma áurea agradável que atraía as pessoas ao seu redor, principalmente por causa da sua ingenuidade a qual muitos achavam fofo. Algumas pessoas que o viam no corredor paravam de andar apenas para apreciar a beleza dele. O seu longo cabelo tocando os ombros, olhos dourados e sorriso contagiante chamavam a atenção por onde passava. Dinesh o observou sendo bem aceito por todos enquanto tinha em mente os olhares de reprovação em sua direção. Quando o homem chegava na empresa, o sorriso dos funcionários ao seu redor sumiam de forma automática e ele podia sentir como a sua presença os incomodava.

Por mais que tentasse afastar esse desconforto, a verdade sempre sussurrava em seu ouvido palavras cruéis sobre a sua evidente rejeição.

Quando ninguém os observava, Kiran pegava o homem pela gola da camisa e o jogava para dentro do pequeno depósito de produtos de limpeza. Dinesh batia as costas contra a prateleira e encarava, incrédulo, o irmão mais novo.

— Irônico que eu sou o violento da família...

— Cala a boca, Dinesh! Eu vim aqui reivindicar a minha posição como diretor.

— Hein?

— Isso mesmo que ouviu. Eu não posso permitir que um monstro como você continue na presidência.

— Não, não... Isso não pode acontecer...

Dinesh sentia o desespero o consumir por dentro pois o seu primeiro sacrifício na vida foi para proteger o Kiran e, atualmente, todo o esforço seria em vão.

— Você é um monstro, um lixo como pessoa. A empresa do baldi não merece alguém assim.

— E o seu sonho de ser professor de história?

— Eu posso conciliar.

— Você é muito idiota, Kiran. Acha mesmo que sua vida continuará normal depois de entrar para a empresa? Não! Você estará no inferno!

— E o que eu deveria fazer? Ficar de braços cruzados diante do crime que cometeu?

O homem passava a mão pelo longo cabelo solto, suspirando pesadamente antes de fitar os olhos dourados do seu irmão.

— Um dia, a Sakura virá atrás de mim e tudo estará terminado.

— O que quer dizer com isso, Dinesh?

— Eu sou um monstro como aqueles miseráveis, por isso mereço morrer. Primeiramente, quero que ataque os alvos mais fracos como o Dylan e o Ryan até avançar para os mais fortes. Assim, eu terei tempo de preparar um plano para atingi-los diretamente. No final, ela virá atrás de mim...

— Se descobrir que somos irmãos, isso será impossível.

As próximas palavras saíram rasgando da garganta do Dinesh, sangrando mais ainda o seu coração.

— Desconsidere-me como o seu irmão... Nós já estamos afastados, então ela nunca suspeitará.

— Você não teme à morte?

O Yamir solta uma risada sarcástica.

— Por que? Ela é a minha salvação.

Kiran encarava o irmão, incrédulo. No fundo, ele não queria vê-lo morrer mas também se via incapaz de perdoá-lo por ter machucado aquela garota. O jovem criou um inexplicável afeto por Sakura quando a viu no pátio, admirando as cerejeiras. Então, encontrava-se dividido entre impedir a morte do irmão ou apoiá-la.

— Eu não sei o que fazer.

— Apenas ajude-a a matar aqueles homens. Caso, um dia, ela chegue até mim eu peço para que não a impeça. Eu sou o causador de todo esse sofrimento, no final das contas.

— Por mais que eu te odeie, Dinesh, não apoio a sua morte. Você sabe que eu nunca aprovaria uma ideia tão extremista assim, mas... — ele abria a porta, olhando-o por cima dos ombros com uma expressão de puro rancor. — ... você nos decepcionou demais, então eu deixo essa última decisão em suas mãos.

Dinesh apoiou as costas na prateleira olhando para cima, sentindo as lágrimas rolarem por seu rosto.

Ele só queria voltar no tempo e consertar todos os seus erros, começando com o seu nascimento.

Ao final do expediente, chamou a sua secretária para comparecer em seu escritório enquanto arrumava alguns papéis. Miyuki aparecia com um largo sorriso, aproximando-se do Yamir e o abraçando por trás, aproveitando que o homem estava de costas. Dinesh continua imóvel olhando para baixo, respirando fundo antes de se virar em sua direção.

— Você anda meio triste, Dinesh. Eu estou preocupada...

— Eu preciso ser sincero com você. — comenta acariciando o rosto da jovem. — Você é a única pessoa que não consigo mentir, Miyuki.

Ela o encarou receosa, já sentindo um aperto no peito.

— Diga-me.

— Temos que ir para lados opostos, porque esse tem que ser o fim. O nosso fim.

— Por que...?

— Porque eu sempre estive tentando destruir os meus inimigos mas, ontem, eu percebi que o meu maior é inimigo não são aqueles empresários.

— Então, quem é?

— Eu mesmo.

Ela piscava os olhos confusa.

— Eu não estou entendendo.

— Eu machuquei pessoas usando a desculpa de que era para proteger quem eu amo, mas não passo de um grande filho da puta. Minha vida inteira foi manipular, machucar e destruir. Por tanto tempo, menti para mim mesmo dizendo que meus motivos eram nobres mas eu sempre tive a opção de seguir o caminho do bem. Contudo, quando estava em uma situação de pressão, escolhia o caminho errado e isso me fez perceber que o problema sou eu. Essa é a minha essência, Miyuki.

— Claro que não, Dinesh! Você não é uma pessoa ruim, senão não teria sido o meu salvador desde aquele dia. — dizia segurando o rosto dele com ambas as mãos. — Você só precisou se adaptar a esse mundo cruel.

— Não... Eu não quero encontrar desculpas. Não importa o quanto eu tente fugir, os meus erros sempre chegarão primeiro para estragar a minha vida.

Em passos lentos, ele se afastava da jovem apoiando-se na mesa. O olhar vazio do homem fez Miyuki permanecer imóvel, sentindo um calafrio percorrer todo o seu corpo.

— Eu estou no fundo do poço, Miyuki. Tudo que eu queria era uma corda para sair desse inferno, mas só recebi uma pá para me colocar cada vez mais fundo. — ele dizia apoiando a mão sobre o peito. — Esse coração só tem rancor.

— Não, eu tenho certeza que também há amor já que nós...

— Eu não te amo e você sabe disso. Eu tentei encontrar um pouco de sentimento em nossa relação, mas apenas queria provar para mim mesmo que ainda era humano.

As lágrimas nos olhos de Miyuki embaçavam a visão do seu chefe, tentando secá-las desajeitadamente.

— Chega de tentar destruir os meus inimigos, agora eu preciso pagar pelos meus pecados. Perdão, Miyuki...

Ela dava alguns passos em direção ao rapaz, envolvendo os braços entorno da sua cintura e afundando o rosto em seu peito. As batidas do coração dele a acalmam, independente do momento em que se encontravam.

— Eu não me importo... Eu sinto que há bondade em você e nada me fará mudar de ideia...

— Você acha? Eu irei te provar o contrário.

Então, ele abaixava a cabeça sussurrando no ouvido da secretária tudo o que havia acontecido naquela noite, sem omitir nenhum detalhe. Além de falar sobre o fato de estar drogado, ressaltou o plano de se vingar dos empresários responsáveis por tal crime.

Instantaneamente, Miyuki apoiou as mãos no peito do rapaz e se afastou o encarando assustada. Dinesh abria um sorriso triste sabendo que essa reação era mais do que justificável diante de tudo o que aconteceu.

— N-Não pode ser... Você realmente fez isso, Dinesh?

— Na verdade, eu não sei. Como não lembro de nada, não posso ter certeza mas se for levar em conta a minha essência ruim... Eu não duvido...

— Eu não acredito... — ela murmura cobrindo a boca com a palma da mão. — Isso é cruel...

— Eu sei, por isso peço para que não insista na nossa relação.

— Nem precisa pedir. Eu já perdoei muitos erros que você cometeu, Dinesh, mas esse... É imperdoável.

— Sim...

Dinesh virava a cabeça para o lado, observando o belo pôr do Sol surgindo dentre os enormes prédios. Então, lembrou que passaria a vida inteiro sozinho, admirando essa paisagem sem ninguém ao seu lado pois a felicidade tornou-se uma meta impossível para alguém tão horrível quanto ele.

— Se você for inocente e, um dia, conseguir provar... Eu estarei aqui te esperando.

Nesse momento, ele a encarava incrédulo com os olhos arregalados.

— Você me esperará?

— Eu não posso garantir nada. — dizia secando as lágrimas. — Sobre continuar na empresa, eu creio que será impossível para mim depois de saber disso...

— Não se preocupe, eu pensei que se sentiria assim. Por isso, já pedi para te transferirem para o setor de distribuição, onde fica a antiga boate que trabalhava. Nós não precisaremos nos encontrar, não mais.

— Sério? Você pensou em tudo mesmo! — exclama surpresa. — Então, isso é um adeus...?

— Eu creio que sim.

Miyuki o encarou com pesar no olhar, tentando afastar a dor em seu coração. Dinesh também a fitava no fundo dos seus olhos, apreciando a beleza de suas íris escuras pela última vez. Ele queria pegá-la em seus braços e cumprir o seu pedido de casamento, mas sabia que não tinha o direito de amá-la depois do pecado cometido. Por isso, a sua melhor decisão foi afastar a mulher antes do calor aconchegante em seu peito se tornar algo mais intenso, como o amor. Naquele instante, tudo ao redor parou enquanto o casal se encarava usando a linguagem do olhar para expressar o misto de sentimentos em seus corações.

A luz alaranjada do pôr do Sol iluminava a cena, dando um aspecto mais vívido ao escritório cinza. Por um momento, todo aquele ambiente parecia ter vida como se fizesse parte de um pequeno mundo onde o casal se encontrava. Contudo, a alegria desse mundo sumiu quando Miyuki deu as costas caminhando em direção à porta.

Ela caminhou de cabeça erguida sabendo que o seu amor foi sincero, por mais que não tenha sido correspondido. Dinesh admirou a silhueta da mulher, sentindo o último pedaço do seu coração ser esmagado junto com suas esperanças de ser uma boa pessoa.

— Cuide-se, senhor Yamir. Eu espero que encontre a redenção por seus pecados.

— E eu espero que encontre a felicidade, senhorita Sato.

Quando Miyuki saía do escritório fechando a porta, Dinesh permitiu que uma lágrima escorresse do canto do seu olho.

Ele chegou a amá-la em algum momento? Ou apenas mentiu para si mesmo esse sentimento, como havia dito?

No fundo, nada mais disso importava pois ele abriu mão da sua última chance de amar e ser amado. Mais uma vez.

(...)

Os oito meses que se seguiram foram destinados ao crescimento da empresa e, principalmente, ao seu plano de destruir seus adversários. Dinesh mandava informações pessoais, extremamente detalhadas, sobre a vida dos quatro empresários. A jovem vítima daquele crime, Sakura Mitsuru, recebeu a ajuda do Kiran, em sua vingança, que fingia pesquisar essas informações quando, na verdade, o seu irmão mais velho era o responsável.

Porém, Dinesh não esperava que Kiran fosse se apegar tanto à Sakura ao ponto de se apaixonar.

A primeira vítima foi na primavera. Dylan Hall morto envenenado. Dinesh usou esse estilo de morte como uma ironia por Dylan ter problemas com o alcoolismo. A segunda vítima, Ryan Mitchell, morreu no banheiro por conta de um gás venenoso liberado no local.

Mesmo que os causadores da tanta dor em sua vida estejam morrendo, Dinesh não se sentia feliz. Ele continuava com um vazio inexplicável em seu peito, o qual alimentava todo tipo de pensamento negativo. O Kiran também carregava o fardo de estar enganando a garota que ama mas, em contrapartida, compartilhava momentos únicos ao seu lado, ajudando-a a superar lentamente o trauma. Ele tinha o objetivo de salvar o coração da pobre Sakura e, apesar de não admitir, fazê-la desistir da vingança antes de chegar no seu irmão.

Como o esperado, Kiran conseguia trazer alegria para as pessoas ao seu redor enquanto Dinesh só as levava ao sofrimento.

— Precisa se concentrar em seu trabalho, senhor Yamir. — comenta a sua nova secretária, Aiko. — E em manter as boas aparências também.

— Isso mesmo. Você está sendo alvo de críticas negativas nas colunas de fofocas. — dizia Youko jogando as revistas sobre a mesa. — Eles dizem que você é o novo monstro, vulgo Godzilla, do século. A sua empresa está esmagando as demais descaradamente.

Dinesh encarava as ofensas escritas pelos jornalistas, mas estava tão morto por dentro que sua única reação foi reunir todas as forças para suspirar. Ao notar o seu estado, Youko, a chefe do setor de publicidade, virava-se para a secretária.

— Poderia nos deixar à sós?

— Claro! Com licença.

Aiko fazia uma reverência antes de sair. Em seguida, Youko aproximava-se do Yamir em sua cadeira e sentava-se na mesa, cruzando os braços.

— Você anda distante, Dinesh. Eu e o Masaichi mal te conhecemos mais. Nós somos amigos e precisamos saber o que está acontecendo contigo para poder te ajudar.

— Eu... Eu estou bem.

— Não ouse me dizer que está bem quando o seu olhar diz o contrário.

— Quem sabe.

— Você nunca se importou com críticas e, provavelmente, estaria redigindo alguma nota pública que terminaria em um palavrão. — comenta a última parte rindo fraco. — Mas há meses eu só te vejo trancado nesse escritório, os funcionários falam sobre esse tipo de atitude o que contribuiu com a imagem negativa da empresa.

— Eu deixei de me importar com o que falam ou pensam de mim.

— Mas sobre o legado do seu pai, deixou de se importar também?

Nesse momento, Dinesh erguia o olhar em sua direção e ficava de pé cortando a distância entre ambos.

— Eu estou vazio por dentro, nada mais importa.

— O que aconteceu, Dinesh? Eu posso sentir como a ferida em seu coração é profunda, por isso não pode guardá-la só para si.

— O problema são os meus pensamentos quando eu estou sozinho. As minhas paranoias sussurram em meu ouvido como eu estrago tudo o que toco, afasto as pessoas e causo sofrimento por onde passo. — dizia abaixando o olhar. — Eu nem lembro da última vez em que sorri de verdade... Em que me senti genuinamente feliz, sabe? Eu morrerei sozinho, sem ninguém para estar lá em meu enterro e dizer que eu fui uma boa pessoa. Sabe por que? Porque eu não fui.

Youko o encarava surpresa e afetada pelas palavras pesadas do seu chefe. Então, ela o puxava para um abraço fazendo com que repousasse a cabeça do rapaz em seu ombro. A mulher usava o seu lado maternal para acolhê-lo em seus braços e, pelo visto, o plano deu certo pois Dinesh pareceu menos tenso.

— Eu imagino como é angustiante estar sozinho e eu não estou falando de uma solidão física. — comenta acariciando as costas do homem. — Você precisa encontrar à si mesmo, porque passou muito tempo se moldando para agradar às outras pessoas que esqueceu da sua própria essência, mas isso não significa que está vazio. Você só precisa de um tempo para se recuperar.

— Tudo bem....

Dinesh não acreditava em suas palavras, mas optou por ficar em silêncio e concordar com Youko. Após se afastar, abriu um falso sorriso para disfarçar a dor angustiante em seu peito.

— Cuide-se, Dinesh. — ela dizia dando leves tapas em seu ombro. — Ah, sim. A Miyuki está no meu setor agora mesmo. Ela veio à mando do chefe da distribuidora entregar algumas fotos.

Os olhos do Yamir enchem-se de brilho por uma fração de segundos, mas logo volta a expressão vazia.

— Entendo... Bom para ela.

Seu teimoso, Youko pensava antes de sair do escritório.

Dinesh controlou a sua vontade de vê-la à todo custo e se contentou em observar, da enorme janela do último andar, a silhueta da mulher correndo pela calçada com uma pasta branca em mãos. O longo cabelo de Miyuki estava solto e as mechas bagunçadas, aos olhos do Yamir, a tornavam mais bela. Ele esticou a mão em sua direção mas voltou à realidade quando seus dedos se chocaram contra o vidro.

No final, ele se encontrava preso em uma caixa enquanto ela estava livre para ser feliz.

(...)

Ao chegar tarde em casa, caminhava diretamente para o seu escritório onde tirava o terno. Então, virou o corpo em direção ao grande espelho ao lado da estante com livros. Naquele momento, Dinesh não reconheceu a pessoa diante de seus olhos pois somente via um monstro o qual destruía todos ao seu redor. O seu maior medo voltava à tona: ser uma pessoa ruim.

Ele recuava alguns passos engolindo seco, subindo as mãos até as longas mechas do couro cabelo e começando as puxar os fios com força. O seu olhar expressava total desespero e medo.

Medo de si mesmo.

As suas costas se chocaram contra a outra estante e, lentamente, caiu sentado no chão controlando um grito de desespero. O corpo do homem tremia incansavelmente, seus olhos estavam repletos de lágrimas e um bolo se formava em sua garganta, impedindo-o de falar. Dinesh só podia soluçar igual a uma criança indefesa após se perder dos seus pais. Contudo, no caso dele, havia perdido a sua essência.

Então, ele pegava a arma presa em sua cintura – a qual sempre carregava consigo depois de ser odiado por tantas pessoas – e a apontou para a própria cabeça. Dinesh não via motivos para continuar lutando uma batalha perdida, onde nenhum prêmio o faria recuperar tudo o que havia desistido. O homem soluçava alto sentindo a mão trêmula falhar ao se aproximar do gatilho mas estava determinado a dar um fim no seu sofrimento.

Ele fechou os olhos com força, forçando o cano da arma contra a sua cabeça enquanto as lágrimas escorriam por seu rosto. Em um último suspiro, apoiou o dedo sobre o gatilho o pressionando lentamente.

No exato momento em que tiraria a própria vida, batidas na porta o fizeram abrir os olhos repentinamente.

Bhaya... Bhaya...

Dinesh reconheceu a voz de Maya e permaneceu imóvel com a arma apontada para a cabeça, por longos segundos. Então, ficou de pé caminhando em direção à mesa do escritório e guardando o revólver na segunda gaveta.

Está aí, bhaya?

Eu já vou!

Ele abria a porta do escritório, forçando um sorriso após secar as lágrimas rapidamente.

— O que houve, Maya?

— Eu não consigo dormir... — resmunga coçando o olho enquanto segurava firme o seu ursinho favorito, Cuddy, com o braço livre. — Pode me ajudar?

— Claro, minha pequena.

Maya sorria mais calma, caminhando de volta para o quarto e Dinesh a seguiu, sem antes olhar por cima dos ombros a mesa do escritório.

Eu farei isso quando a colocar para dormir, pensava.

A pequena acomodava-se em sua cama, puxando a coberta até a altura do queixo enquanto esperava ansiosamente pelo seu irmão. Dinesh sentava-se ao seu lado, passando a mão pelos longos cabelos negros dela.

— Conta uma história para mim, bhaya.

— Eu não sei nenhuma, mas posso falar sobre os princípios da Administração. Eu tenho certeza que você dormirá em menos de um minutos. Bem, pelo menos, foi o que aconteceu comigo quando estava na faculdade.

Ela ria baixinho e sorria boba.

Bhaya...

— Sim?

— Você nos odeia?

Dinesh franze o cenho confuso.

— Claro que não. Por que pensa isso?

— Porque você vive ocupado como se nos evitasse, então pensei que não gostava da gente...

O Yamir a encarava surpreso, vendo como a sua ausência causava uma lacuna na família. Ele sempre pensou que todos estavam bem desde que ficasse afastado, mas havia percebido como o efeito foi reverso. Então, sentiu os olhos marejados e mordeu o interior das bochechas para controlar as lágrimas.

— Eu não os odeio. Pelo contrário, você são tudo o que eu tenho.

Os olhos de Maya se enchem de brilho, sentindo-se feliz ao ouvir essa resposta do seu irmão.

— S-Sério?!

— Sim. Eu amo a minha família. Eu amo todos vocês do fundo do meu coração.

Dinesh abaixava o corpo para envolver a sua irmã em um forte abraço, levando a mão até sua nuca e a puxando contra seu peito. Ele aproveitava para deixar as lágrimas escorrerem por seu rosto, segurando à todo custo o choro descontrolado o qual sabia que, cedo ou tarde, viria.

Ele acreditava que agir daquela forma seria o suficiente para provar o seu amor, mas não adiantava permanecer calado e não expressar claramente como se sentia.

— Agora você ficará mais tempo com a gente, não é? — pergunta a pequena, esperançosa. — Eu sinto sua falta.

Naquele momento, Dinesh havia desistido da ideia de tirar a própria vida pois encontrou um propósito para ela: estar lá por sua família.

— Sim... Eu prometo que estarei. — dizia a apertando mais forte. — Perdoe-me por ter se ausentado tanto... Eu prometo não desistir de vocês... Não desistir de tudo... Eu serei forte por vocês e por mim...

Maya escondia o rosto no peito do homem, também chorando silenciosamente. Ela tirava um peso do seu coração após se livrar da preocupação de ser odiada por seu irmão mais velho. E, tendo o pensamento de que tudo voltaria ao normal, a pequena adormeceu nos braços dele.

Em seguida, de forma delicada, Dinesh a acomodava em sua cama dando um beijo em sua testa e saindo do quarto. Então, tirava o celular do bolso discando o número de Masaichi que demorava alguns minutos para atender, falando com a voz sonolenta:

Alô, Dinesh. Sabe que horas são?

— Sim, aqui nós temos relógio. Masaichi, você acabou de ganhar um aumento.

Hã...? Aumento? Como assim? Por acaso, alguém bateu na sua cabeça?

O seu aumento será como diretor.

O QUE?!

O Yamir ouvir ao fundo um "cala a boca" do namorado de Masaichi, por causa do grito.

— É isso mesmo o que ouviu, diretor.

(...)

No outro dia, Kiran descia as escadas bocejando e encontrava Mahara na sala, sentada no sofá enquanto lia uma carta.

— Bom dia, mamadi.

— Kiran...

Mahara erguia o olhar em direção ao filho que percebeu as lágrimas em seus olhos dourados.

— O que houve, mamadi?!

O Dinesh foi embora.

— Como assim?

— Veja.

Kiran pegava a carta confuso e começava a ler, reconhecendo a caligrafia do seu irmão.

"Desculpe ter que sair dessa forma, sem ao menos dar uma despedida digna mas era preciso. Eu sou péssimo com despedidas e, por sinal, não ficarei tanto tempo fora. O Masaichi ficará na liderança da empresa durante a minha ausência. Eu estou indo para um templo budista no Brasil, onde o nosso tio se encontra. O motivo? Estou morto por dentro mas, por minha família, quero entrar em uma busca por uma faísca para me dar esperanças. Prometo voltar como uma pessoa melhor ou, caso falhe, não voltarei. Cuidem-se."

"Ps: Nada de confiscar minhas revistas pornô debaixo da cama. Amo vocês."

Mahara estava com uma expressão confusa mas, aos poucos, entendia o motivo do seu filho desejar sair de perto da empresa. Kiran sentava-se ao lado da mãe, irritado porque o seu irmão abandonou todos da família para buscar redenção por seus pecados. Ele não acreditava que Dinesh encontraria o perdão, principalmente depois do ato cruel que fez.

Do outro lado da cidade, Dinesh embarcava no primeiro vôo em direção ao Brasil. O homem apreciava a vista daquela altura, onde via as belas nuvens brancas e o céu azul comporem uma obra de arte natural. Ele deixava escapar um longo suspiro de tensão de seus lábios, apoiando a mão sobre o queixo enquanto estava focado na paisagem.

Será um novo começo ou o ponto final da minha jornada?

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