O ritual foi basicamente o mesmo. Depois de tomar apenas metade da dose diária de wolfsbane, Tonks voltou a aproximar a cama de casal da janela e eu amarrei o braço direito de papai no pé do roupeiro. Por último abrimos a janela e ficamos esperando a lua surgir no céu.
Dessa vez, a curiosidade em saber o que iria acontecer quase superava o medo de papai se transformar em lobisomem. Acompanhamos com apreensão o caminho feito pela luz da lua e para nosso alívio, mas uma vez nada aconteceu.
Ficamos sem palavras, mas provavelmente estávamos os três pensando a mesma coisa. Ou pelo menos foi essa impressão que eu tive quando papai se pronunciou.
— Por mais maravilhoso que possa parecer, não acho que eu esteja curado.
— Estou fazendo força para não acreditar nisso, pai. Mas é tão incrível ver a lua cheia ser inofensiva para você — comentei enquanto soltava seu braço.
— Sim, é verdade — um sorriso sincero iluminou seu rosto.
— Acho que esse momento precisa de uma foto! Com a lua ao fundo!
Saí correndo do quarto de casal e fui até o meu onde esperava encontrar minha câmera. Mas não estava em lugar nenhum, assim como minha mochila que eu levara no dia anterior para a casa da vovó... E deixara lá. Voltei para avisar que precisaria buscar o aparelho e encontrei papai e Tonks se beijando. Fiz um barulho com a garganta para chamar a atenção.
— Deixei minhas coisas na casa da vovó — disse quando os dois olharam para mim. — Estou indo lá e provavelmente vou ficar para ajudar com o Teddy.
— Se não quiser não precisa, Lana. Mamãe consegue cuidar dele sozinha.
— Sim, Dora. Mas ainda me sinto culpada por ter atrapalhado a rotina da família.
— Eu gostei de ter saído da rotina — comentou papai com a ironia de um Maroto.
Tonks e eu apenas rimos. Despedi dos dois e saí de casa atravessando o vale em direção à casa da vovó.
Eu achei que todas as noites seriam como aquela, mas as coisas foram um pouco diferentes na que se seguiu. O ritual foi idêntico. Papai amarrado, a janela aberta e a luz da lua entrando no quarto. Como ele já estava um pouco melhor por estar ingerindo uma quantidade menor de wolfsbane, não foi preciso que Tonks aproximasse a cama da janela.
Ele mesmo ficou de pé recebendo a luz da lua sobre o corpo. Como eu estava com minha câmera, aproveitei para filmar tudo. Mostraria para mamãe depois.
Assim que percebemos que havia se passado tempo suficiente e papai não se transformaria em lobisomem, o desamarrei.
— Agora a foto que eu queria ter tirado ontem! — mudei o modo da câmera para fotografia. — Vem, Tonks!
Minha madrasta se aproximou ficando do lado do marido passando um dos braços em volta da sua cintura.
— Mas eu vou sair de pijama na foto? Ah, não!
Tonks e eu caímos na gargalhada quando papai pegou a varinha para trocar suas roupas por outras.
— É só um registro nosso, pai... — eu tentava respirar enquanto ria.
— Um registro que merece ocupar a estante.
Acho que ainda não tinha parado para pensar o quanto aquilo significava para papai. Já era a terceira noite de lua cheia e ele ainda não tinha perdido a forma humana. Mesmo sem estar livre da licantropia, significava muito para ele.
— Pronto! — disse ele vestindo uma camisa e uma calça social.
Nós nos posicionamos em frente à janela com a lua aparecendo ao fundo. Com minha varinha fiz a câmera flutuar para aumentar a amplitude da fotografia e deixei a máquina disparar cinco vezes só para garantir. Depois tirei mais algumas da Tonks com o papai e pedi para ela registrar ele e eu.
— Bom, agora vou indo ajudar a vovó — disse colocando a câmera no bolso de trás da calça jeans.
— Hoje não, — papai me puxou para perto dele. — Essa noite você vai ficar com a gente.
— Mas e a vovó...
— Mamãe conseguiu lidar comigo, o Teddy é bem mais tranquilo — Tonks esticou o braço. — Temos uma surpresinha.
Segurei a mão dela e saímos pelo corredor com papai vindo logo atrás. Não podia imaginar que tipo de surpresa me esperava. Tonks soltou minha mão quando chegamos à cozinha e foi em direção a um dos armários de onde tirou uma garrafa de hidromel e três taças. Ela as encheu e entregou uma para mim e outra para papai.
— A dedicação e o cuidado que você tem comigo são presentes que eu jamais imaginei ganhar na vida. Não importa qual será o resultado desse experimento. Muito obrigado por ter ao menos tentado.
— Oh, pai... — meus olhos começaram a ficar embaçados com as lágrimas.
— À sua saúde — papai levantou a taça.
— À família Lupin — ergui minha taça e fui acompanhada por Tonks.
Os dois viraram o conteúdo em um só gole, eu esvaziei o recipiente devagar.
— Ainda com trauma daquele dia, Aluadinha?
— Acho que nunca vou esquecer o dia seguinte.
O show das Esquisitonas, minha primeira vez com bebida e o mal que passei no dia seguinte ainda estavam bem vivos na minha memória.
— Não precisa se preocupar, o antídoto está comigo hoje.
Ri da observação de Tonks lembrando a lição que tive de papai sobre exagerar na bebida com ele escondendo a poção que curava todos os sintomas da ressaca.
— Talvez eu deva aprender a beber sem exagerar...
Dessa vez foi papai quem encheu minha taça e depois a de Tonks.
— Vai por mim, mesmo sem exagero você vai querer essa poção amanhã.
Sorri para ela e notei que papai não tinha servido uma segunda rodada para ele.
— Já parou, papai?
— Não tenho certeza se isso afeta o efeito da wolfsbane. Nunca fiz nada além de me esconder e dormir durante a lua cheia... Bom... Salvo aquela vez em Hogwarts...
— Passado, Remus. Não vai acontecer de novo.
Nos acomodamos nas poltronas da sala e deixamos a garrafa de hidromel sobre a mesinha de centro.
— E você não machucou ninguém. Quer dizer, o Sirius atacou você para defender os outros e o Bicuço causou mais estrago em você do que você nele.
— Por isso não quis voltar a lecionar na escola. Já pensaram se Sirius não estivesse lá?
— Nem quero pensar — minha taça ficou vazia e eu a enchi novamente. Hidromel era suave e doce. Muito bom ao paladar. Nem parecia alcoólico. — E você também deveria deixar de sofrer por coisas que poderiam ter acontecido, mas não aconteceram.
— Você tem razão, mas não é tão fácil quanto eu gostaria que fosse.
— Mantenha seu olhar para o futuro. Tenha o passado apenas como algo que te trouxe até aqui. Fez ser quem você é. Nada mais. O passado não pode comandar sua vida. O que você decide fazer a partir de agora é que conta.
— Olha você me dando conselhos de novo — papai sorriu.
— Vai dizer que eu já te dei conselho ruim? — pisquei o olho para Tonks.
Acabei rindo do tanto que eu me sentia convencida ao aconselhar papai. Ele e Tonks riram também, não sei se pelo mesmo motivo. Foi uma noite muito agradável. Passamos horas conversando até eu e minha madrasta esvaziarmos a garrafa de Hidromel.
Papai realmente havia parado na primeira taça com receio de afetar de alguma forma a eficácia da wolfsbane. Poderíamos ter feito àquela reunião em qualquer noite, mas o fato de ter acontecido durante a lua cheia deixou tudo um pouquinho mais especial. Foi como se a licantropia não fizesse mais parte das nossas vidas.
***
Que saudade desse dia! Ainda bem que tenho as fotos para provar que não foi umsonho. Mas ainda tem muita lua cheia para frente. Espero que vocês continuemacompanhando nossa saga.