UPRISING

By martafz

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Num futuro não muito distante, uma nova estirpe viral ameaça exterminar a espécie humana da Terra. O estado m... More

Uprising
0. Prólogo
1. América
2. É bom ter-vos de volta
3. HCC K42
4. Virgem outra vez
5. Achas que ela respira?
6. Kim
7. Sobrevivência
8. Quem és tu?
9. Voltar para casa
10. Lasanha vegetariana
11. Porque raio te injetas?
12. Dói-me a barriga
13. Porrada de um velho gordo
14. Gémea?
15. Não me podes proteger disto
16. Despe-te
17. Dói-me só a cabeça
18. Invictus
19. Impotência
20. Eu não quero que chores
21. Não queria que te doesse
22. Eu não sei mentir
23. Vamos embora
24. Não saltes!
25. Com a Kim seria esquisito
26. A melhor pessoa que eu conheço
28. Eu prefiro dormir no carro
29. Deixa-me ficar contigo
30. Eu estou a sangrar!
31. Pedi-lhe tanto para não me tocar
32. Ela estava a gostar!
33. Memórias
34. Faz-me esquecer, por favor
35. Temos que sair daqui!
36. Eu prometi, lembras-te?
37. O que é que eu fui fazer?
38. Aidan Nolan
39. Irmã
40. Canadá
41. Só por uma noite
42. Diz-me se vai doer
43. Quero-te
44. És tão giro
45. Afinal que merda és tu?
46. Vocês vão todos morrer
47. Tu... gostas dela?
48. Nós somos a tua família
49. Conspiração
50. Defectus
51. Não deixes de gostar de mim
52. Eu estou bem
53. Eu cumpro as promessas que faço
54. Não quero ser uma necessidade para ti
55. Plano B
56. Gráim thú
57. Vai correr tudo bem
58. Duvida quando te parecer óbvio
59. Berra, deficiente
60. Por um bem maior
61. Nem sempre os heróis têm um final feliz
62. Homo invictus
A Up ganhou um Watty!
63. Humana
64. Eles já não aguentam mais
65. David Brody
66. Amanhã será mais fácil
67. Onde tu estiveres
68. Casa
Notas finais

27. Parece que viste um morto

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By martafz

Dia 80

Há quase um mês que passavam os longos dias em casa, na companhia uns dos outros, como se de umas férias merecidas se tratassem. Poderiam aproveitar se não temessem pelas próprias vidas, se não tivessem que ponderar sobre cada ação que faziam, se resignados e não revoltados com a longa espera incerta, com as saudades de casa. Falar com a família por telefone não era suficiente e nada lhes dizia que conseguiriam manter comunicações durante muito mais tempo. Estava na hora de regressar.

 O medo constante de que as pessoas que amavam, do outro lado do oceano, pudessem morrer a qualquer instante, vítimas de uma doença quase ridícula, obrigava-os a moverem-se. Cada dia era uma tortura por pensar naquela realidade e esperar pelo fim não era uma opção.

Jake continuava reticente em sair da Califórnia. Não sabia o que esperar assim que chegassem à fronteira e não sabia o que fazer se não houvesse solução. Continuava a achar o irmão louco por aventurar-se de maneira tão impulsiva, mas ele sempre fora assim e era impossível demovê-lo. David não se achava louco ou precipitado. Ele não era mais do que ninguém, não havia nada que o pudesse salvar de algo que escapava ao controle de qualquer ser humano. Assim, só lhe restava agir por si mesmo, utilizando os meios que ainda dispunha. Face à ameaça que enfrentavam todos os dias, com a qual aprenderam a conviver, fazerem-se à estrada e partir à procura de uma solução para voltarem a casa não era nada.

– Isso assim não vai caber – disse Rachel numa espécie de grunhido. – És teimoso, Aidan! Já te disse que tens que meter a grande de lado senão o resto não cabe aí. És lento? – embirrou novamente, esbracejando. A calma já se fora há alguns minutos, desde que concordara em ajudar o irmão na impossível tarefa de arrumar a bagagem. Desorganizado e teimoso como era, Rachel não conseguia parar de resmungar com a disposição das malas na bagageira. O loiro suspirava de frustração, farto de ouvir as lamúrias da rapariga, e sabia que ela não se calaria enquanto não lhe fizesse a vontade. Organizou as malas novamente como ela pedira.

– Contente? – O sorriso cínico não chegou para irritá-la.

– Muito. Vá, só faltam estas – anunciou, pegando nas duas pequenas malas cujo conteúdo era mais frágil.

Aidan limpou o suor da testa e suspirou fundo, antes de barafustar. Apesar do Sol ter nascido há poucas horas, o calor já era insuportável dentro da garagem.

– De quem é isso tudo?! E porque é que tenho que ser eu a arrumar esta tralha toda enquanto tu olhas para mim? Não era mais fácil levar o essencial?

– Tu não sabes o que é essencial nesta altura... – murmurou Rachel sem pensar no que dizia. Talvez mais tarde percebesse o significado daquela frase. A prioridade era sair da cidade. As memórias, arrependimentos e incertezas ficariam para refletir mais tarde.

– Isso vai cair tudo quando abrirmos a mala e não vou ser eu a apanhar – rabujou Aidan ao ver a irmã dispor as malas de forma pouco segura. Resignado, empurrou a bagagem, tentando comprimi-la ao máximo para que conseguissem fechar a porta e acabassem com aquela discussão ridícula. Já não sabia dizer há quanto tempo estava a arrumar malas, mas a tarefa demonstrara-se deveras frustrante.

– Se tu me partes alguma coisa do que tenho nesse saco, viro filha única num instante!

– Porra, juro que não percebo as mulheres – guinchou o rapaz, farto das lamúrias dela. – Faz tu então. Enfia lá isso melhor, Madame – ironizou, cruzando os braços. – Qual é a parte do não há mais espaço que não apanhaste?!

Os Brody abriram a porta da garagem e estacaram ao assistir à discussão dos dois irmãos. Pareciam tão concentrados que nem repararam nos pequenos sacos que David trazia na mão e no computador portátil que Jake segurava. Faltava apenas rever o que faltava e podiam ir embora. Se a discussão parasse...

– Vocês ainda estão nisso?

– A culpa é da minha irmã!

– A culpa é do meu irmão!

Rachel e Aidan berraram em simultâneo, parando finalmente de se atacarem verbalmente. Jake e David franziram o cenho, abismados com a reação dos dois irmãos, tão diferentes e tão iguais. Tal como eles mesmos, pensaram. Com um olhar cúmplice, pousaram as malas no chão e explodiram numa gargalhada trocista.

– Tão queridos! – comentou David, divertido com a expressão chateada da namorada e do amigo. – Será que os podemos adotar? – perguntou a Jake, fazendo-o entrar na brincadeira.

– Até vêm sincronizados e com mau feitio...

– Gozem mais. Gozem tudo – reclamou Aidan, desistindo de arrumar fosse o que fosse. – Já está arrumado, não é?

– Aidan, meu amor, não te excites tanto. São só umas malas – troçou Jake, sem se conter.  

– Qual é o drama? Ainda faltam estas coisas – informou David ao ver a bagageira sem espaço.

Aidan e Rachel fuzilaram-no com o olhar e reviraram os olhos, murmurando lamúrias frustradas. O loiro fechou a porta da bagageira com força e entrou em casa.

– O que é que eu disse? – perguntou David, sem conseguir conter o riso até Rachel afastar-se.   Hey! – Puxou-a pelo braço, antes que pudesse escapar. – Espera lá, tu também ficaste amuada? E sobrou para mim? – Olhou para Jake, como se ele pudesse responder àquela questão por ela. Fitou-a finalmente, abraçando-a e beijando-a no pescoço, sabendo que a desarmaria em segundos. Quase infantilmente, e por entre beijos repenicados na namorada, afirmou:

– Para a próxima meto tudo lá dentro sozinho.

Rachel fitou-o severamente, obrigando-o a parar com as carícias e, sem aviso, abriu o sorriso e riu sonoramente. Fixou os lábios dele e provocou:

– Promessas, amor. – Beijou-os sem paixão ou calor. – Só promessas. – Ergueu o sobrolho, em desafio, e entrou em casa. Jake riu quando a viu sair. A expressão confusa do irmão era demasiado boa.

– Escapou-me alguma coisa? – O mais novo tentou manter a expressão baralhada, embora sorrisse contagiado pela alegria do irmão. Queria ter a certeza de que não havia conteúdo sexual algum no que Rachel dissera. Não faziam amor desde que ela adoecera, e não fora por iniciativa ou falta de desejo dela, e a sua afirmação fizera-o pensar em algo que não malas.

– Não quero ter nada a ver com isso, meu irmão. Mas se a conversa não era sobre malas, para a próxima não deixes que se note que ela anda insatisfeita – zombou Jake, divertido. – Assim dás-me o dobro do trabalho para manter a honra da família.

David fez a careta mais infantil que Jake já vira e esmurrou-o sem força, apenas para o provocar.

Apesar de tudo, havia alguma normalidade. Ainda conseguiam brincar e serem eles mesmos, o que tornava tudo ligeiramente mais fácil. Ainda assim, não era o suficiente.

***

Depois de delineado o caminho a tomar para chegar à fronteira, de concordarem que cada um iria conduzir por um determinado espaço de tempo, para que a viagem se tornasse mais curta, restava encher o depósitos do veículo. Era a vez de David conduzir. Procurara por uma bomba de gasolina disponível durante mais tempo do que o esperado e apenas nos arredores da cidade fora possível encontrar o que pretendiam.

David prontificou-se a fazer o pagamento do combustível enquanto o irmão atestava o depósito.

Entrou na pequena loja de conveniência e deparou-se com um cenário já esperado. As prateleiras pareciam carecer de mercadoria, apenas as luzes de presença fluorescentes iluminavam o espaço, e um cheiro a mofo, um odor desagradável que David não conseguiu identificar contribuíam para o mau ambiente da divisão. A música country proveniente de um pequeno rádio sobre o balcão e a luz vinda de uma pequena saleta denunciavam uma outra presença e David bufou por perceber que teria de esperar.

Aproveitou para procurar tabaco, algo que o irmão e Aidan pediram, e esperou que alguém aparecesse do outro lado do balcão para o atender. Entretanto, desfolhou alguns jornais que embora desatualizados captaram o seu interesse. Tornara-se evidente que ninguém fornecia aquela loja há imenso tempo. Surpreendia-se por ainda haver gasolina nos depósitos ou mesmo por alguém manter um estabelecimento aberto sem condições.

Farto de esperar, tossiu propositadamente, anunciando-se, e esperou ouvir o som de um autoclismo, um gemido feminino, qualquer coisa que o fizesse crer que fora notado. Não podia esperar a noite toda. Pegou no tabaco e num jornal e não conseguiu resistir à tentação de levar um dos pacotes de gomas que pareciam tão solitários na grande prateleira. Dirigiu-se ao balcão, tentando encontrar a validade dos doces no pacote e antes de o conseguir fazer, tropeçou. Conseguiu impedir uma queda aparatosa ao agarrar-se ao balcão, por impulso. Não largou o que tinha nas mãos até reparar no que o fizera tropeçar.

Então, com um guincho assustado, recuou a uma velocidade que o fez cair e embater contra uma prateleira. Pontapeou o que pisara e cobriu a boca com as mãos trémulas ao dar-se conta do sucedido. Tentou desviar o olhar do que tinha em frente, mas não conseguia. Uns grandes olhos, raiados de sangue, baços e sem vida pareciam fitá-lo com intensidade. A boca entreaberta e coberta de sangue, as enormes bolhas, os hematomas na pele e o grande inchaço nos membros despidos confirmaram o que ele se recusava a pensar. Tropeçara num cadáver. Pisara-o e pontapeara-o em pânico.

A fraca luz incidia sobre ele, intensificando o olhar do homem, dando-lhe uma tonalidade quase psicadélica; a melodia melancólica country e o cheiro nauseabundo adensavam o ambiente. David sentiu-se invadido pelo pânico que todos os seus sentidos, exceto a visão, começaram a falhar.

Numa questão de segundos, levantou-se e nem se certificou se conseguia suster-se nas pernas torpes. Saiu da loja com uma pressa quase doentia, abrandando apenas quando chegou ao exterior e respirou ar puro. Tentou não olhar para trás e não cedeu ao impulso de correr para o carro. Com uma calma que estava longe de sentir, entrou no carro e descalçou-se antes de se agarrar ao volante como se fosse a sua tábua de salvação. Deixou os ténis lá fora, como gostaria de deixar toda a sua roupa, inclusive a memória do olhar intenso e sem vida.

Era a sua vez de conduzir e tinha que se concentrar. Limpou as mãos às calças diversas vezes, querendo apagar a sensação de nojo que se apoderara dele. Fechou os olhos e acalmou-se durante alguns segundos.

– Deu? – A voz do irmão tirou-o do tenebroso torpor. – David?

David piscou os olhos e fitou-o languidamente. – O quê?

Jake franziu os sobrolhos, estranhando a súbita reação do irmão. Era impossível não notar o pânico nos seus gestos, na sua expressão.

– O cartão funcionou?

– Compraste tabaco? – perguntou Aidan, aligeirando a tensão nos bancos da frente.

– David! – Jake insistiu, abanando-o. Algo não estava bem.

– Não – murmurou em resposta. – Não, quer dizer, deu, mas não havia tabaco – Rodou a chave e esperou que não fizessem mais perguntas. Não queria ter de falar, até se acalmar. Respirou fundo e acelerou, tentando não olhar pela vitrina da loja. – Vamos embora.

– Parece que viste um morto, puto – comentou Jake, abrindo um sorriso e ligando a rádio.

 David limitou-se a rir tremulamente ao ouvir a mesma música country.

– Estás bem? – insistiu Jake.

– Sim, porque não haveria de estar?

Mas Jake não ficou convencido. Os nós brancos dos dedos que apertavam o volante e a súbita expressão alarmada indicavam o contrário. David sabia-o, mas tudo o que queria era ir-se embora. Chegar ao Canadá o quanto antes, tentar arranjar uma solução para regressar a casa e não iria permitir que nada nem ninguém os fizesse mudar de ideias. Nem mesmo o que acabara de presenciar.

Foi só um susto, pensou. Não voltaria a acontecer.

Ou voltaria?

***

NOTA DE AUTORA

Este capítulo é a coisa mais banal de sempre, em que só quero mostrar que apesar de tudo, eles conseguem arranjar felicidade nas pequenas coisas, e que provavelmente esta viagem não vai ser tão fofinha como o querido David pensava ;) Porque ele não terá dito a ninguém o que viu dentro da loja de conveniência?

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