Tornar-se Janeiro (em pausa)

By bexxxm

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Recomeços sempre foram complicados para mim. Geralmente eles são consequências de dois possíveis cenários: al... More

Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32

Capítulo 25

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By bexxxm

   Entre as poucas roupas que separei para guardar em uma mala, eu traçava um plano, mesmo que com os olhos cheios e a acidez das minhas lágrimas queimando a pele do meu rosto. De todos os recomeços, aquele seria o fim mais difícil.

   Auto sabotagem ou não, o momento havia chegado. Primeiro, o amor que fizemos por toda aquela casa cheia de histórias para contar.
Histórias que nunca fui parte e eu também nunca entenderia. Histórias por trás de um par de olhos verdes que tinham o poder de passar medo ou muita paixão e posso afirmar, com convicção, que eu senti os dois lados dessa moeda.

   Segundo, um nome de mês andante que vaga por uma cidade que desconhece qualquer passado que eu possa revelar. As luzes do bar, o vestido vermelho, o sexo na varanda. A necessidade das peles juntas e do pertencer que ela tanto procurou. Um lar, ela parecia finalmente ter. Mas não, a escuridão do jogo foi maior naquele instante e talvez sempre fosse.

   Desde o começo, ela estava vivendo os movimentos de cada jogador sem nem mesmo saber e estava mergulhando sem checar se no fundo haveriam pedras. Haviam. Haviam tantas que, no quase final, Janeiro percebeu que algumas daquelas pedras eram frutos que ela mesma plantou. Por que, de forma involuntária, ela havia colocado uma por uma em cima de todas que já existiam com a família Madraga.

   Auto sabotagem ou não, a escolha foi feita e não foi por falta de avisos internos. Era melhor nem ter o conhecido? Talvez. Mas eu sabia mesmo assim que morreria sem poder repetir o seu nome diversas vezes, mesmo que sozinha, mesmo que baixinho, mesmo que longe dele.

   Então, sim, ela havia encontrado uma espécie de lar que funcionaria de um jeito torto bonito, mas não, ela não conseguia nem dizer o que sentia.

   A verdade além dos fatores: Janeiro sou eu e Janeiro fui eu. Ambas tortas e feias, não merecedoras de ninguém. Sozinhas porque sim e solitárias por opção. Talvez realmente não houvesse outro cenário além desse, então o que restava era agradecer por aqueles que mostraram a possibilidade do contrário. Agradecer pelo sonho em que ela viveu por alguns meses.

Obrigada pelo lar, Oliver.

   Também desejava pedir desculpas, claro que sim. Mas Oliver não me escutaria, não naquele instante. O que doía mais nem era saber que eu estraguei tudo, porque eventualmente eu faria, mas o que doía mais era saber que Oliver havia encontrado, de alguma forma, um lar em mim. Um lar no nosso sempre. Por isso, insisti em substituir minhas desculpas por um perdão e decidi que sairia daquela cidade o quanto antes, colocando tudo aquilo no meu esquecimento.

   O melhor de todos os meus esquecimentos.

Pedi um táxi e como uma covarde sai pelas portas do fundo. No caminho, recordei um dos meus poucos diálogos com a dona Ruth.

   "Ninguém que vive aqui realmente pertence, querida" ela disse sobre a casa. Talvez ela estivesse correta.

   Talvez Oliver e eu fôssemos um sempre fadado a chegar ao seu final. Eu não pertencia na parede laranja tanto quanto ele não pertencia a essa cidade. Porque, mesmo que depois de tanto tempo, ele ainda merecia ser feliz. E que felicidade existiria com alguém como eu?

   Outra coisa: que felicidade poderia existir em um relacionamento em que alguém se entrega mais? Alguém que mesmo tão forte e tão duro consigo mesmo e com os outros, pode ser doce e gentil. Alguém que merecia ser feliz com uma pessoa normal, uma pessoa que ele poderia realmente se abrir e receber o mesmo tratamento.

   Oliver merecia uma reciprocidade que eu não sei se conseguiria oferecer. Foi difícil concluir isso. Mas já era tarde demais, não era?

Era tarde para afastá-lo quando tudo que eu queria era um toque seu. Era tarde também para pedir que ele me tratasse com a raiva de antes. Não a que descobri quando ele me confrontou sobre o episódio do hospital psiquiátrico, mas a raiva silenciosa e sem ameaças. A raiva que gritava de dor e ao invés de ferir, apenas pedia distância. Uma distância que acabou comigo.

Eu preferia mil vezes que o Oliver fosse rude comigo, que ele pedisse para eu não fazer perguntas e apenas acompanhá-lo em uma festa chique. Eu colocaria um vestido e seria sua companhia, Oliver. Eu seria tudo que você precisasse por uma noite e depois seria descartada. No fim, isso era vantagem para nós dois.

   Éramos dois fodidos, eu sei disso. Mas talvez eu não merecesse algo tão bonito quanto tudo que passamos juntos. Aquilo não era meu.

   Eu estava ocupando o espaço de alguma garota espanhola que ele conhecia da faculdade. Algum amor de verão ou infância. Eu ocupava algo que ele não podia ter, pois teve que abandonar tudo para ser alguém que nunca chegaria perto de quem ele me mostrou ser. Em sua performance, ele às vezes saía do personagem e apagava seu cigarro, somente para deitar na nossa cama e deixar nosso cheiro nos lençóis.

Quando eu deixei tudo isso acontecer? Quando eu desisti de me monitorar e me entreguei a situação? Quando eu comecei a amá-lo?

A perda parecia revelar mais do que qualquer memória que eu tenha de nós dois e dos meus sentimentos.

   Pagando o taxista, eu fazia também uma reza, sempre sem muita fé, pedindo que algum ser divino do universo o fizesse me esquecer. Volte a sua performance, Oliver. Eu não aguentaria encarar os seus olhos verdadeiros sabendo que causei dor após ser a primeira pessoa que você confiou depois de tanto tempo no limbo. Preferia olhar o homem misterioso que conheci e sentir medo. Eu preferia que as cortinas se fechassem e eu pudesse ir pra casa. Uma casa que não existe, mas eu fingiria que sim.

   Eu fingiria ter para onde ir somente para que ele não cedesse e me amasse de novo, de um jeito que eu não merecia ser amada.

   Então, ali eu estava, onde tudo começou: o Bar 21. Entretanto, dessa vez era diferente. Naquela noite, eu não seria a Janeiro garçonete, a amiga da Mandy ou até mesmo a Janeiro gerente que cuidava das coisas para o seu patrão.

   Naquela noite, eu seria uma cliente.

* *

   Sentei em um banco do balcão e pedi por algo forte. Whisky me recordaria dele, champagne dos seus negócios, então tequila poderia ser a solução.

   A Mandy aproximou-se e começou a conversar comigo, eu implorava por silêncio, mas ao mesmo tempo sabia que eu devia muitas explicações para ela. Tentei contar da melhor forma possível, não sobre tudo, claro.

Contei para ela que eu estava investigando o dono daquele lugar e por isso tentei obter informações do seu tio, o Jorge Amaral, um homem que enlouqueceu e foi parar no hospício. Revelei que usei o nome da irmã de Oliver, expliquei que eu havia descoberto que a Helena Madraga vivia na Espanha e não voltaria tão cedo.

   Depois de contar essas mentiras, consegui fazer com que a Mandy ficasse mais calma. Ela parecia acreditar em tudo que eu falava e por uns segundos me senti mal. Após um outro shot de tequila, esse sentimento ruim passou.

Então era assim que as pessoas se sentiam quando bebiam álcool? Faz sentido.

   Ah, Mandy, se você soubesse o que realmente aconteceu. Se você soubesse que eu estava completamente apaixonada por aquele homem que tanto falo mal. Se você soubesse o quão gentil ele poderia ser, pelo menos comigo. Se você soubesse o quanto ele provocava gemidos nos meus lábios, gemidos que eu teria vergonha de proferir na presença de alguém, mas não com ele, não na nossa cama ou no nosso tapete branco, não na nossa varanda.

   Ah, Mandy, se você soubesse que eu estraguei tudo.

   Eventualmente ela retornou sua atenção para os fregueses e me deixou ali com as bebidas alcoólicas que eu não precisava comprar, pois trabalhava naquele bar. Vantagem ou não, aquilo foi o que me manteve quase sã na primeira noite sem o Oliver.

Quase sã. Não durei muito e pouco me lembro dos instantes seguintes.

   Lembro apenas da Mandy passando a mão em meus cabelos e oferencendo água. Lembro também das lágrimas que percorriam o meu rosto e da humilhação que passei sentada no banheiro e vomitando em meio a embriaguez. Só não lembro das mãos do Oliver, porque daquela vez elas não estavam ali, nunca mais estariam.

   Ele não entrelaçaria seus dedos nos meus até passar, ou seja, aquilo não passaria.

   Acordei em um sofá que não era preto e encarei uma parede que não era laranja. Minha cabeça latejava de uma forma antes desconhecida e meu corpo me punia por todo álcool que ingeri depois de tanto tempo evitando aquilo. Então estava concluído, eu havia me tornado as pessoas que mais me machucaram a minha vida toda.

Eu era oficialmente meu pior inimigo.

Levantei e encontrei, na mesa de centro da sala desconhecida, um bilhete e uma caixa de remédios que pareciam estar estrategicamente posicionados para quando eu acordasse.

   Era um apartamento, um possível sexto andar. Eu estava no centro da cidade, provavelmente perto da pensão da dona Leila. A sala era branca demais e pouco decorada. Não haviam retratos e muito menos dicas sobre quem vivia ali.

   Investiguei e explorei o ambiente, mas também percebi que meu corpo implorava para não se mover nunca mais. Havia apenas um quarto e a sua porta estava trancada. A da saída? Também.

   De repente, escutei o som de alguém abrindo a porta e colocando alguma coisa na cozinha.

   "Janeiro?" - a voz disse e caminhou até me encontrar perto da janela, onde eu estava minutos antes investigando a região ao redor do prédio.

   Quando reconheci o rosto por trás do tom grave daquela voz, travei.

   "Como você está se sentindo?" - Alexandre disse e expôs um dos seus sorrisos sarcásticos.

* *

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