O barro cola na sola do meu tênis da Adidas preto. A terra esta um pouco molhada por conta de uma chuva passageira que veio pela madrugada, me obrigando a ficar um bom tempo vidrado na janela do meu quarto enquanto o fogo da lareira me aquecia. As árvores balançam conforme o vento bate, algumas gotas geladas caem na minha pele nua.
O vento esta um pouco estável pela manhã de Serafins City. O tempo esta limpo e sol brilha mais que nunca no céu, embora o frio intenso do inverno venha se estendendo.
Me sinto nostálgico com as lembranças dessa floresta. A cada passo que dou lembro de uma situação que passei com Lauren nesse lugar a alguns anos atrás. Meu peito carrega uma sensação estúpida, como se pudesse vê-la a qualquer momento.
Quando chego perto da margem do rio Syfis, recosto meu corpo no tronco de uma árvore e permaneço ali apenas sentindo a brisa. De alguma forma aquele lugar me traz uma paz inexplicável.
Olho na direção da maldita ponte, que nesse momento passa alguns carros e sinto um aperto no coração. Passo a mão pelo meu cabelo desajeitando mais e volto a olhar na mesma direção. As malditas lembranças da primeira vez que vim aqui com Lauren surge na minha cabeça, tínhamos uns seis ou sete anos na época. Fugimos da escola com a boneca enorme que Eva tinha e jogamos no rio. Lembro que meus pais quase me mataram e tivemos uma conversa nada agradável com os pais de Eva e Lauren.
Desde então Fray e Christopher criaram mais ódio por mim.
Um barulho de galhos sendo quebrados faz meus devaneios sumirem. Olho ao redor a procura do som e encontro um casal de costas para mim olhando a água, suas roupas são simples e os dois estão de chapéu, devem ser de alguma fazenda por perto. Sem fazer barulho giro meus calcanhares e vou em bora, não estou afim que alguém me veja.
Ao entrar na rua de casa, vejo o Camaro azul de Neal estacionado na calçada. Estaciono meu carro na garagem e desço rápido entrando pela porta dos fundos. Neal espera na sala de estar como imaginado, ele tem seu celular na mão e nem percebe minha presença quando sento do seu lado no sofá.
- Concentrado? - ele da um pulo ao meu lado ao ouvir minha voz.
- Que susto! - ele põe a mão no peito rindo - To pesquisando se é normal irmãos gêmeos terem a voz parecida. As duas tem o mesmo tom de voz se for reparar, mas a da Camila é doce e calma - explica.
- Um dos motivos pra eu não ter dado conta da semelhança antes...
- No seu lugar, eu nunca iria perceber também. Ainda mais por Camila ser tão natural e já Lau artificial - tenta me confortar.
Cruzo uma perna.
- Ah. Mabel tava aqui até agora - ele comenta enquanto mexe no celular - Cê tinha que ver ela me perguntando se eu encontrei a pessoa pelo qual eu morreria e de qual faculdade eu me inscrevi.
- Pois é cara, ela me fez a mesma pergunta. Nem me lembrava mais dessa frase idiota de "por quem eu morreria" - coço a cabeça desviando o olhar, forçando uma risada alta - Mabel devia organizar aquelas terapias pra casais, sabe?
- Duvido se teria algum casal nessa merda de terra que aguentaria ficar separado se ela fosse mesmo - ele concorda rindo.
Me junto a sua risada.
- Camila é uma Velay e só agora me dei conta disso - comento voltando para o assunto ao qual trouxe meu amigo aqui.
- Agora tudo faz sentindo- ele concorda me olhando - a irmã da Lauren sempre esteve na sua frente e você nem se deu conta.
Suspiro.
- Como foi o primeiro dia de aula dela? - pergunto curioso mudando de assunto novamente, estou começando a ter muitos arrependimentos e eu sei como isso acaba se acumular.
- Ela foi bem conveniente, cara. As pessoas na hora que viram acharam que ela era uma assombração - conta - E sua suspeita tá certa, Victor chegou com ela!
Passo a mão pelo rosto frustrado.
- Eu vou acabar com ele - aviso irritado, imaginando minha mão acertando seu rosto.
- E eu te ajudo, cara - olho para Neal franzindo a testa, como o loiro tivesse dito algo errado - Quero dizer... você não pode fazer isso. Ele é seu primo!
Rimos juntos. Faz tempo que não tínhamos momentos como esse.
- Ainda a possibilidade dele ter entendido que você só estava com ela pela semelhança - Neal me lembra.
Tem de fato, e um lado meu quer isso, assim quando essa droga de mal entendido acabasse voltaríamos a ser grandes amigos. Todas as suas palavras com segundo sentindo já estavam praticamente desvendada na minha cabeça e agora sei porque ele falava tanta merda sem sentindo. Desde o primeiro segundo que Victor me viu junto com Camila, achou que eu estava com ela por causa da semelhança.
- Mesmo que for isso, ele não vai fugir do olho roxo - brinco.
Neal ri.
- Não mesmo, cara - concorda - Acho que você tava certo... Camila tem muito cara de virgem - Neal segura o riso.
- Eu disse.
- Duvido que Victor não vai tentar fazer de tudo pra tirar a dela, ele já tirou da irmã mesmo.
Concordo com a cabeça incomodado com a ideia.
- Ela passou o recreio com ele? - pergunto.
Ele assente.
- Acredita que eles passaram na nossa mesa! - diz incrédulo batendo as duas mãos nas cochas como se fosse contar o assunto do século - Foi medonho, Cooger! Não conseguia encarar ela direito nos olhos.
- Você é um grande medroso de merda, Neal - zombo.
- É porque não foi você que viu uma garota idêntica a uma pessoa morta, no corredor vazio andando na sua direção.
- É, acho que no seu lugar eu também correria.
Neal chacoalha a cabeça rindo.
- Eva perguntou pra ela, se você voltaria também - sorri maliciosamente - Elas nem imaginam a surpresa que vão ter.
Ficamos encarando um tempo o tapete da sala até que Neal se pronunciar como se tivesse lembrando de algo:
- Josh! - ele diz com os olhos vidrados ainda no tapete. Sinto a expressão do meus rosto se fechar ao escutar tal nome - Camila se sentou atrás dele na aula de inglês e é claro que aquele merda se aproveitou da situação.
Franzo a testa.
- Ele tocou nela? Eu juro que vou matar aquele...
- Só pediu um lápis emprestado - relaxo ao ouvir aquilo. Neal analisa meu rosto antes de continuar como se procurasse algo - mas tenho certeza que ele vai aproveitar essa situação. Você sabe pra se vingar.
- Eu acabo com ele antes - asseguro entre os dentes.
É um fato, Josh não tem chances de bater de frente comigo. Todos sabem disso e comigo de volta, é bom ele se preparar.
- Você acha que Lau tenha tido algo com ele? - Neal me encara pensativo.
- Não. Claro que não - chacoalho a cabeça negativamente, indignado que a verdade possa ser ao contrário.
- Tem certeza?
Suspiro. Penso duas vezes antes de responder.
- Não - respondo encarando a parede fixamente e é verdade não da nem pra saber se Lauren teve algum lance com o coelhinho da páscoa.