Ela cochichou
No ouvido dele
O quanto ele era importante
E depois o beijou na bochecha, vendo-o
Fazer aquele sorriso
Que só ele sabia fazer
Quando estava envergonhado
Ou quando não sabia o que fazer.
Ele a abraçou por trás
Inesperadamente
Enquanto os dois esperavam para pagar
Um produto
Na fila do caixa do mercado
E repousou a cabeça em seu ombro
Sentindo aquele perfume
Que era tão dela.
Ela timidamente estendeu a mão
Quando estavam sentados lado a lado
Dentro do metrô,
E seus dedos ficaram entrelaçados
Fazendo carinho uns nos outros
Enquanto as estações passavam
Por janela a janela.
Ele trouxe café
Mesmo sem ela ter pedido.
Aquele café fraquinho que ele odiava
Mas que ela amava tomar quentinho
Enquanto o frio batia à porta
Todas as noites
E eles dormiam juntinhos.
Ela também no frio
O cobriu com outra coberta
No meio da noite
Enquanto apenas uma
Não aplacava
O frio que ele sentia.
Bem, ela nunca entendeu o porquê
Dele sentir tanto frio.
Ele ficou a observando falar:
A boca meio rosada e carnuda,
Olhos expressivos,
Nariz fino
E rosto com traços suaves.
As palavras eram melodias, mesmo
Que ele não estivesse entendendo nada.
A voz dela era maravilhosa.
Mas ela brigou com ele quando perguntou
Se estava prestando atenção,
E constatou que passou vários minutos
Falando sozinha.
Ela notou que ele franziu o cenho
E respirou fundo
Quando o amigo dela não parava de olhá-la
De forma diferente
Na festa que haviam ido juntos.
Viu que estava com ciúmes
E sorriu, porque ele não era de demonstrar
Essas coisas.
Então pediu para que fossem embora
Porque queria ficar apenas com ele
Na casa deles.
Ele pediu desculpas
Porque sabia que tinha agido errado
Ao alterar a voz para falar com ela
Daquela maneira.
Ele sabia que a culpa não tinha sido dela
Do seu dia ter sido uma porcaria.
E então, no final da noite
Não a levou flores, mas sim
Livros,
Que era o que ela mais gostava de fazer: ler.
E ela sorriu aquele sorriso
Que acendia
Algo nele
Mas que não sabia explicar.
Ela também pediu desculpas
Por ter sido grosseira certa vez
Quando eles não concordaram
Em um assunto.
Ele era cabeça dura, mas ela também era.
Porém, ele não tinha sido grosseiro.
Ela sim.
E então, à noite, tentou fazer uma boa comida
E um jantar romântico.
E no final, eles riram dessa falha tentativa
(só da comida ser boa, porque a noite foi
Realmente
Romântica)
Ele ofereceu seus ouvidos
Para escutá-la
Enquanto ela, irritada, falava das coisas
Que haviam acontecido no trabalho.
Segundo ela, cada absurdo pior que o outro.
Mas que para ele, só via a necessidade de abraça-la
Enquanto esperava que a raiva
Se dissipasse.
Ela perguntou
Como tinha sido o dia dele
E se interessou pelas coisas
Que ele estava dizendo.
De vez em sempre ele ficava rindo
Porque que ela sempre o fazia rir.
E assim iam indo.
Ele riu sozinho
No trabalho
Se lembrando de como era difícil
Acordá-la
Pela manhã.
E depois, com um sorriso bobo,
Se lembrou de maneira fofa que ela
Se espreguiçava.
E o arrepio na espinha o tomou
Quando ele lembrou da voz rouca dela
Lhe desejando um bom dia.
Mas logo voltou a rir, lembrando do cabelo
Bagunçado que só, mas
Que ela fazia questão de cuidar
Com todo o amor e carinho,
Assim como cuidava dele.
Ela lhe disse para levar um guarda-chuva
E ele não o fez.
Ela brigou assim que o viu todo encharcado
Chegar em casa.
O mandou a trocar de roupa porque pegaria
Um resfriado.
Ele sorriu: ela só queria seu bem.
Ele acariciou sua bochecha
Enquanto eles, deitados frente a frente,
Apreciavam simplesmente
A presença
Um do outro.
Ela fechou os olhos, parecia gostar.
E ele sentiu algo dentro dele
Crescer.
Percebeu o quanto a amava.
O quanto precisava daquele sorriso
Satisfeito
Que ela fazia
Naquele exato momento.
Ela o observava de longe
Enquanto ele escrevia algo.
Ele usava óculos.
E ela pensou o quanto ele ficava
Ainda mais bonito assim.
Pensou que sorte a dela
De ter o encontrado.
Mas quando ele perguntou qual era
O problema
Com toda aquela preocupação,
Ela ruborizou,
E balançando a cabeça,
Voltou a ler.
Ele estendeu a mão
Para segurar a dela
Enquanto ela andava divinamente
Com um salto igualmente divino.
Ele se aproximou, e com um sorriso
Disse que ela estava
Toda maravilhosa.
Sua princesa.
E a observou morder os lábios
Com os olhos sorrindo para ele
Da forma mais sapeca
Que ele já tinha visto.
Ela chorava
Porque tinha perdido
Um ente querido.
E ele, sem saber exatamente o que fazer,
Apenas a abraçou,
Querendo que toda a dor que estivesse sentindo
Se transferisse
Para si,
Só para ela não sofrer tanto.
Ele chorava
Escondido
Na madrugada
Aflito
Porque havia sido demitido.
Suas olheiras embaixo dos olhos haviam
Crescido,
E ela, sem saber exatamente o que fazer,
Apenas o abraçou,
E disse que tudo iria ficar bem,
Que era para ter fé.
E deixou ser sobrecarregada com tudo
Para que ele se aliviasse.
Ela sorria novamente
Dizendo que
Tudo iria ficar bem
Enquanto eles passavam mais um mês
Comendo só arroz e feijão
(Às vezes nem isso).
Ele parecia acreditar
Mas ela não confiava muito nisso.
Só queria vê-lo bem.
Ele enviou uma mensagem
Pedindo desculpas
Por não ter ligado mais cedo.
Perguntou como estava do resfriado
Que ela havia pegado
E lhe indicou uns remédios
E repouso
Mesmo sabendo que ela provavelmente
Não cumpriria.
Então riu sozinho.
As pessoas viam e...
Não era uma relação muito melosa?
Ouvi dizer outro dia que eles brigaram.
Ouvi dizer que ele fora demitido.
Ela não era muito estressada com ele?
Ele não era muito feio para ela?
Ela chegou tarde do trabalho hoje... será que...?
Ele estava chorando essa semana.
Ela estava...
Ele fez...
Ela
Ele
Eles
Viviam só eles
Com as coisas deles
Sem se preocupar com aqueles
Que não queriam
O bem deles,
E assim continuaram vivendo
A relação que agora havia mais de meses
E meses.
Estavam juntos e gritavam
Para todos
O quanto se amavam
De tempos em tempos
Todas as vezes.