Cruel: uma volta no tempo (sp...

By TheBiancaRibeiro

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Publicado originalmente em 2017, "Cruel: uma volta no tempo" é um spin-off do grande sucesso do Wattpad, "Cru... More

Parte 1
Parte 2
Parte 3
Parte 4
Parte 5
Parte 6
Parte 7
Parte 8
Parte 9
Parte 10
Parte 12 - FINAL

Parte 11

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By TheBiancaRibeiro


Nunca, nem em meus maiores e mais loucos devaneios, eu imaginei que ganharia uma casa de presente. Também nunca pensei que me casaria com o Capitão da Guarda Real ou que o amaria tanto. Tudo o que eu sempre quis foi viver uma vida boa e tranquila, vendendo minhas flores e cuidado de meu jardim. Só que hoje tenho muito mais do que isso.

O Capitão passa os braços ao redor de minha cintura e me abraça por trás, descansando o queixo em minha clavícula. Sinto seu coração bater e o calor de sua pele e, juntos, vemos outro pôr-do-sol no jardim de nossa pequena casa no meio do bosque. Os últimos dias têm sido os melhores da minha vida, porque finalmente me sinto plenamente feliz com ele ao meu lado. Todas as preocupações e problemas parecem não conseguir nos alcançar aqui, como se estivéssemos em um mundo particular que pertence somente a nós dois.

- Está vendo aquelas montanhas? - Capitão sussurra contra minha pele, apontando com uma das mãos para montanhas distantes no horizonte, quase completamente cobertas pela névoa.

- Sim - eu digo.

- Existe uma lenda que diz que é lá que as almas daqueles que amamos vão descansar e que eles sempre cuidam de nós de lá, à distância. Eles nunca deixam de nos amar. Nunca nos abandonam.

- Mesmo? - olho para as montanhas com mais interesse. - Mas é tão longe...

- Esse é um detalhe muito importante - ele assente, fazendo com que algumas mechas de seu cabelo negro caiam sobre os olhos azuis. - Um amor que ultrapassa qualquer distância e até mesmo o passar do tempo é tão...

Inclino a cabeça para olhar para ele.

- Você acredita em um amor assim? - pergunto.

Ele sorri e desvia o olhar para o horizonte.

- Minha avó costumava me contar essa história. Acho que tem um significado bonito.

Beijo seu pescoço.

- Isso quer dizer que seu amor por mim é eterno? - brinco, dando risada.

- O meu? - ele me vira e fica de frente para mim, rindo também. - E quanto ao seu? Que garantia tenho de que sua alma vai cuidar de mim pela eternidade?

- Você não tem - cutuco seu abdômen.

Capitão DeVil morde o lábio e me toma nos braços, me jogando por cima de um de seus ombros. Ele me faz cócegas e nós rimos até ficarmos sem fôlego enquanto voltamos para dentro da casa. Acho que estamos tão apaixonados que qualquer coisa é motivo para rir descontroladamente desse jeito.

E passamos nossos primeiros dias de casados assim, na companhia exclusiva um do outro como se fôssemos as únicas pessoas na Terra.

Até um mensageiro chegar certa tarde.

Estou terminando de arrumar as flores no vaso da varanda da frente quando ouço o som de cascos de cavalo se aproximando. Vejo, entre as árvores, um homem de preto se aproximar carregando um bornal azul. Ele me vê e pergunta se sou a esposa do Capitão DeVil. Quando digo que sim, ele me entrega um envelope e pede que eu dê ao meu marido. Então vai embora sem dizer mais nada.

Entrego ao Capitão durante o jantar e o vejo ficar consternado ao ler o conteúdo da carta. Não são boas notícias, mas ele ignora. Amassa a carta e joga fora.

- Querem que eu volte - é tudo o que ele me diz.

Nossa rotina de recém-casados segue normalmente durante mais alguns dias, até que o mensageiro retorna com outra carta e novamente meu marido fica incomodado. Tenho quase certeza de que seus pais estão pressionando para que volte ao seu posto de Capitão da Guarda Real. Minha sogra me pareceu gananciosa o suficiente para exigir isso dele - e ainda deu aquela desculpa de que era para a proteção do filho.

- Você devia escrever para eles - digo, quando a terceira carta chega após mais alguns dias.

O Capitão suspira, encostado em um dos pilares do hall de entrada da casa, onde estamos.

- Achei que pudesse adiar isso se simplesmente os ignorasse.

Mordo o lábio. Ele está irritado.

- É natural que eles queiram que você volte. São seus pais.

- Meus pais não estão por trás disso, Rose - ele sacode a cabeça negativamente. - É o rei.

Isso me pega de surpresa.

- O rei? - franzo a testa.

- Ele quer que eu retorne ao meu posto na Guarda Real.

Fico sem reação. Capitão DeVil me prometeu que cuidaria de mim com toda dedicação durante nossos primeiros anos de casamento e para isso deixou a Guarda Real por tempo indeterminado. Mas se o rei está pedindo que ele retorne, não há absolutamente nada que possamos fazer. A palavra do rei é lei, desobediência é um crime punível com pena de morte. Ele deve retornar.

Aproximo-me e seguro seu rosto com uma das mãos. Olho fundo em seus olhos.

- Eu amo você - confesso. É a primeira vez que digo em voz alta.

Seus olhos se arregalam levemente e sua mão acaricia meu rosto.

- E eu amo você.

- Vamos voltar - digo suavemente. - Se o rei exige sua presença, você deve ir. E eu irei com você.

Sua testa alva se enche de vincos.

- Mas, Rose... o palácio... tudo o que você mais queria era deixar o palácio e nunca mais colocar os pés lá. Se eu voltar, nós...

- Eu sei - cubro seus lábios com meu dedo. - Ainda assim, eu irei com você.

Ele me puxa pela nuca e me aninha em seus braços, num abraço que me tira o fôlego. Aqui é o meu lugar favorito no mundo.

- Partimos em dois dias.


***


Espreguiço-me nos lençóis e noto que a cama parece grande demais. Sento-me, procurando pelo Capitão no quarto, mas não o encontro. Assim que me coloco de pé, sinto outra vez aquela dor forte no peito, como se uma lâmina perfurasse meu coração. A dor se intensifica até que eu perca o fôlego e caio de joelhos sobre o tapete do quarto.

Não é a primeira vez que algo assim acontece, percebo. Desde que fui levada ao palácio há um ano, tenho sofrido de uma série de problemas para respirar e dores no peito que se intensificam cada vez mais. Pensei que era um problema emocional, até agora.

- Rose - Capitão DeVil adentra o quarto usando apenas a calça de couro e as botas. Noto que há um cordão negro ao redor de seu pescoço que faz contraste com seu peito alvo.

- Eu... - estremeço no chão, tentando me agarrar a algo para me levantar.

O Capitão corre ao meu encontro e me toma nos braços, levando-me de volta para a cama.

- Você está suando - ele toca minha testa e afasta os fios de cabelo que nela grudam. - Está com dor? O que foi?

Puxo o ar pelas narinas ruidosamente e com dificuldade, segurando uma de suas mãos com força contra meu peito que ainda dói.

- Rose... - a voz dele soa desesperada.

A dor começa a passar e eu me acalmo aos poucos.

- Estou... estou bem - digo, após tomar fôlego.

- Não, não está - Capitão diz com rispidez, segurando meu rosto. - Você está doente, não é? Há quanto tempo isso vem acontecendo?

Sacudo a cabeça e sinto tontura.

- Não sei...

- Pare de tentar esconder as coisas de mim - ele rosna e seus olhos faíscam. Está irritado.

Aninho-me contra seu peito nu e sinto seu cheiro. Ele me acalma.

- Eu sei que você está doente - diz, com voz suave. - Sei desde a sua primeira noite no palácio quando você teve problemas para respirar. Eu... eu já vi o que acontece a quem apresenta esses sintomas e... - ele cerra os punhos e sinto seu corpo ficar tenso contra o meu. - Sempre tive tanto cuidado com você... isso é... isso é tão injusto!

Nada do que ele diz me surpreende. Acho que, no fundo, eu já sabia que estava doente todo esse tempo e nunca quis admitir para mim mesma. Sempre achei que era apenas uma reação exagerada a tudo o que passei recentemente.

Ergo o rosto e olho para ele.

- Minha mãe tinha os mesmos problemas - murmuro baixo, o rosto bem perto do dele. Estendo a mão e acaricio a linha de sua mandíbula.

- E por que não me disse que seu estado era tão grave, Rose? - seus olhos azuis fitam os meus com intensidade. - Por que não... por que não me disse que você está morrendo?

- Porque não estou.

Eu sorrio e beijo seus lábios sem pressa. Seus braços me envolvem e ele corresponde a minhas carícias com urgência. Estremeço com seu toque. Pela primeira vez, sinto um sentimento de medo pairar em nosso meio. Sinto o medo dele e sinto o meu. O medo de um ficar sem o outro.

Nós nos vestimos e terminamos de arrumar as coisas para partir. Hoje retornaremos para o último lugar ao qual eu gostaria de voltar: o palácio - e não há como evitar isso, pois são ordens do próprio rei. O Capitão e eu cavalgamos de volta à torre de seus pais e eu observo, ao olhar para trás, nossa casa desaparecer como um sonho distante. Será que teremos a oportunidade de voltar para lá? Será que viveremos esses dias de felicidade outra vez?

Nossa chegada à torre é celebrada com um banquete e muito vinho. Eu até me pego sorrindo com sinceridade vez ou outra, apesar de estar aqui contra a minha vontade. Capitão DeVil permanece ao meu lado o tempo todo para me apoiar e sou grata por isso. Sinto tontura durante o banquete e muita falta de ar durante as danças e ele está sempre lá para me segurar. Cada toque seu, cada olhar em minha direção, é como um impulso de que preciso para continuar.

Mas a festividade chega ao fim. Por minha culpa. Um simples desmaio não devia ser motivo de grande comoção e sei que, se eu ainda fosse aquela simples vendedora de flores, ninguém se importaria muito. Mas agora eu sou a esposa do Capitão da Guarda Real e nora dos anfitriões. Eu estrago toda a festa ao ficar completamente sem ar e desmaiar no meio de minha família e seus convidados.

Quando acordo, estou no quarto do Capitão e uma criada está limpando o suor de meu rosto com toalhas molhadas. Vejo poucos raios de sol entrarem pela janela quase completamente coberta pelas cortinas de veludo.

- O que eu... - começo a perguntar, mas perco a força. Fecho os olhos. Até mantê-los abertos parece além da minha capacidade.

- A senhorita está fraca - diz a criada, gentil. - Estava esperando que acordasse para alimentá-la.

Sinto o cheiro delicioso de mingau e forço meus olhos a se abrirem. Preciso comer.

- Aqui - a criada aproxima a colher prateada de minha boca e eu abro.

Esperava me sentir totalmente revigorada ao comer o mingau, mas tudo o que consigo é me sentar na cama. Minhas pernas estão tão moles que mal consigo dobrá-las e meus braços parecem flácidos e inúteis.

Recebo uma breve visita de minha sogra.

- Você nos deu um susto, menina - ela comenta, evitando olhar diretamente para mim.

- Vou ficar bem - asseguro a ela. Porque sei que vou. Preciso ficar. - Onde... onde está meu marido?

Ela suspira.

- Aquele teimoso decidiu por conta própria trazer o curandeiro real para cuidar de você. Já eve estar retornando.

Suspiro. Que alvoroço.

- Descanse - diz senhora Agatha. - Descanse e saia logo dessa cama.

Sinto uma pequena pontada de ternura em sua voz e ela sai antes que eu possa dizer alguma coisa.

Meu Capitão retorna e imediatamente vem me ver, trazendo o curandeiro real consigo.

- Como você está? - Capitão DeVil acaricia meu rosto, preocupado. - Dói em algum lugar?

Sacudo a cabeça e esforço-me para sorrir para ele. Vê-lo já me faz sentir melhor.

Sou examinada e, no momento em que o curandeiro vai dizer o que há de errado comigo, o Capitão é chamado com urgência pelo pai.

- Agora não é um bom momento - ele diz ao criado que trouxe a mensagem.

- Ele disse que é de extrema importância, senhor. É sobre o invasor.

O Capitão arregala os olhos, parecendo surpreso. Aperto sua mão.

- Vá - sussurro. - Nós conversamos quando você voltar.

Ele trinca os dentes e olha para mim, indeciso.

- Mas... eu...

Solto sua mão.

- Vá.

Capitão DeVil suspira e se inclina para beijar minha testa.

- Eu volto já. - E deixa o quarto rapidamente.

Sinto que os céus estão conspirando ao meu favor, pois era exatamente o que eu queria.

- Diga-me, senhor - sussurro para o curandeiro. - Qual a minha situação?

O homem, já em idade avançada, suspira ruidosamente e olha para mim com muita compaixão.

- Sua situação é extremamente delicada, senhorita. Extremamente.

Meus dedos tremem.

- Por favor, diga.

- A senhorita não tem muito mais tempo de vida - ele baixa os olhos para os próprios pés. - Cinco, talvez dez anos mais. Eu daria uma data mais exata se não fosse... se não fosse...

Mordo o lábio.

- Se não fosse...? - pressiono.

Ele me encara com preocupação.

- Se não fosse pela criança em seu ventre.

Arquejo. Paralisada, encaro o teto do quarto e toco a região de meu umbigo, sentindo minhas mãos tremerem mais do que nunca. Uma lágrima escorre por minha bochecha e pinga em minha camisola. Céus, estou tão feliz e tão apavorada! Há uma criança minha e do Capitão dentro de mim, um bebê, o fruto de nosso amor. Eu não ligo se eu morrer, mas farei o impossível para que essa criança nasça saudável. Ela precisa nascer. Ela precisa viver.

- Não posso nem imaginar como o Capitão vai reagir... - murmura o curandeiro.

- Por favor, não diga nada a ele! - imploro.

O curandeiro me encara.

- Tem certeza, senhorita?

Assinto com veemência. Meu coração está acelerado.

- Eu mesma contarei, no momento certo.

- Como a senhorita quiser. Eu trouxe um remédio para mantê-la mais calma, está bem aqui...

Bebo o remédio e, contra a minha vontade, adormeço.

Tenho um longo e lindo sonho, no qual o Capitão e eu cavalgamos através de uma clareira belíssima em um dia tão ensolarado que só pode existir nos sonhos mesmo. Nós estamos felizes. Não há doença. Não há medo. Só amor, no mais puro sentido da palavra. E há nossa criança. Nós nos refugiamos em nossa casa escondida pelas árvores para nunca mais sairmos dali. Eu choro em meu sonho, pois nunca pensei que poderia ser tão feliz ao lado de outra pessoa. Choro porque nunca pensei que seria capaz de amar alguém como amo nosso bebê. Nunca pensei que confiaria minha vida e meu coração a alguém - e agora ambos já não me pertencem mais. São dos dois.

Acordo ao ouvir um estrondo alto e forte, seguido por gritos.

Sento-me, assustada, na cama e me dou conta de que estou usando apenas a longa camisola branca. Ouço o som de vidro sendo quebrado e mais gente grita com tanta agonia que me assusta ainda mais. Consigo me levantar e chego até a porta. Abro apenas uma fresta para tentar ver o que está acontecendo. Tudo o que vejo, porém, é o corredor escuro e silencioso.

Fecho a porta e decido me esconder em um canto do quarto. Se meus instintos não estiverem errados, a torre está sendo atacada. E isso é aterrorizante. A preocupação começa a crescer dentro de mim quando penso no Capitão e se ele está ferido. Ele não pode estar. Ele precisa voltar para mim em segurança para que eu possa lhe contar sobre minha gravidez. Eu preciso dizer a ele que vou ficar mais forte e mais saudável para o bem de nosso bebê.

Mas o tempo passa e não tenho nem sequer um sinal de que ele está bem. Ouço o tinir de espadas, os sons de luta e gritos de agonia, mas nada de meu Capitão.

Então, quando estou prestes a ser imprudente e deixar o quarto, a porta se abre. Encolho-me em meu esconderijo ao lado do guarda-roupa e prendo a respiração.

- Rose? - ele chama por mim desesperadamente.

Eu começo a chorar enquanto corro para ele e seus braços me tomam num abraço apertado.

- Pensei que você nunca viria - soluço.

Ele beija meus cabelos.

- Assim você me ofende.

- O que está acontecendo? - afasto-me para olhar para ele.

- Homens do rei, aquele... aquele maldito - a expressão em seu rosto é assustadora. - Ele ordenou que invadissem e matassem a todos nós.

Arregalo os olhos.

O gentil e cortês rei Theo? Não é possível.

- Precisamos sair daqui - o Capitão segura minha mão com força. - Os cavalos já estão prontos na saída dos fundos do estábulo. Vamos!

- Espere - eu hesito. Preciso dizer a ele. Preciso contar.

- Não temos tempo! - ele me toma nos braços e corre para fora do quarto.

Alguns homens surgem em nosso caminho para o estábulo e o Capitão me coloca no chão para derrubá-los - e o faz com muita facilidade. Nós corremos escadaria abaixo e eu sinto minha respiração ficar instável, mas obrigo-me a continuar correndo. A torre está desolada. Cortinas rasgadas, sangue respigado nas paredes, lustres caídos no chão. E corpos. Gente morta que eu vi perambular ontem pelos corredores e salões. Começo a chorar enquanto corro. Isso é horrível!

Subitamente, enquanto corremos através do enorme salão onde estávamos dançando ontem, uma figura vestida de preto e capuz surge e empurra o Capitão ao chão brutalmente. Eu também caio e sinto meu joelho e cotovelos doerem devido ao impacto. Rapidamente me coloco de pé e busco meu marido com os olhos.

Ele e o homem de preto e capuz estão se encarando, imóveis. O forasteiro não parece em nada com os homens do rei. Está vestido como um daqueles assassinos de aluguel dos quais ouvi histórias no mercado. Há uma espada e várias adagas presas a seu cinto. Há algo semelhante a uma besta pendurada em suas costas, mas eu não vejo flechas para carregá-la. Meu Capitão está armado apenas com sua espada.

- Então você está vivo - Capitão DeVil diz ao homem de preto.

Ele baixa o capuz e seu rosto é tão coberto por cicatrizes que mal consigo olhar.

- Fez um péssimo trabalho ao tentar me matar, Capitão - cospe o homem.

- De fato - replica o Capitão. Então desembainha sua espada. - Não falharei dessa vez.

O homem de preto também saca sua espada e uma luta nada elegante e nada nobre se inicia entre os dois. Cada golpe que o Capitão recebe me aflige e eu me apoio em uma das paredes do salão para me manter de pé. Quando ele vencer, preciso estar pronta para continuar a correr - porque ele vai vencer.

O tinir das espadas faz com que eu me encolha e a luta não parece ter fim. Eles conversam entre si enquanto se golpeiam, mas não entendo suas palavras. A raiva nos rostos de ambos me faz acreditar que esse confronto é mais pessoal do que pensei e minha aflição é triplicada. Os dois se atracam, rolam no chão, trocam chutes, socos e cortam um ao outro com suas respectivas lâminas. A certo ponto parecem cansados, e é nesse momento que o Capitão dá um golpe certeiro que desarma seu oponente e então o perfura com sua espada no abdômen. O homem de preto urra de forma animalesca e se dobra sobre o Capitão. Sangue escuro verte da região onde ele foi atingido e ensopa o piso do salão.

O Capitão o joga para o lado e se levanta, ofegante. Mas o homem de preto ainda não está morto. Ele pressiona a própria ferida com as duas mãos e tosse, cuspindo sangue. Então dá um sorriso macabro e olha na minha direção.

- E-essa é sua esposa...?

- Morra - rosna Capitão DeVil, dando um chute nas costas do homem.

Eu quase começo a chorar outra vez quando ele se vira para mim e começa a caminhar em minha direção, mancando. Há algo de errado com sua perna, mas ele parece bem. Está suado e sujo de sangue, mas eu o abraço apertado e ele me gira, prendendo-me contra seu peito.

- Eu sabia que você venceria - digo, abraçando-o com força.

Ele me afasta e acaricia meu rosto.

- Vamos desaparecer daqui de uma vez por todas.

Capitão DeVil segura minha mão e, de repente, seus olhos se arregalam. Ele grita, olhando para algo atrás de mim, e me segura pelos ombros, lançando-me ao chão. Caio novamente contra o piso do salão e olho de volta para ele a tempo de ver uma flecha negra perfurar seu corpo e logo em seguida outra. Seus olhos, arregalados, não deixam os meus e a expressão em seu rosto é de puro choque. Ele cai de joelhos no chão e eu o agarro, impedindo que tombe. Sangue rubro começa a empapar sua camisa mais rápido do que meus olhos podem acompanhar e sai de sua boca quando ele tosse, respingando em minha camisola branca.

Ele ergue uma mão e segura uma das flechas cravadas em seu peito. Então ele a puxa com força e grita de dor.

- Não! - eu grito ainda mais alto. - Não! Não faça isso! Vai piorar tudo!

Ele me ignora e retira a outra flecha, contorcendo-se. E desaba em meu colo.

Eu estou chorando tanto que sacudo a nós dois.

- Não! Não! - eu o abraço com todas as minhas forças, tentando, de alguma forma, segurar a vida em seu corpo para que ela não o deixe. - Você não vai me deixar! Por favor, não! Não!

Seus olhos azuis encontram os meus, mas eu mal os vejo por causa das lágrimas que inundam os meus olhos.

Isso não está acontecendo. É mentira. Não está acontecendo.

- Eu amo você! - grito, sentindo minha garganta arder e meu peito doer mais do que nunca. - Não me deixe! Não me deixe! Por favor, não!

Sua mão lentamente encontra o caminho para meu rosto.

- Tão linda... - ele balbucia. - Desde... o primeiro... momento...

Seguro seu rosto com as duas mãos e beijo seus lábios.

- Amo... você... - ele suspira.

E eu assisto a vida deixar seu corpo lentamente, como o pôr-do-sol. Seus olhos não vão mais brilhar e não olharão de volta para mim. Suas mãos não vão mais me acariciar e nem vão tocar meu rosto. Seus lábios não beijarão os meus. Nunca mais.

Olho para trás e vejo a besta na mão do homem de preto, que agora também está estirado no chão, morto. Aos poucos compreendo que ele atirou para me matar. Essas flechas teriam me perfurado e estraçalhado se meu Capitão não tivesse entrado na frente. Ele me salvou. Ele salvou nossa criança. Eu o abraço e coloco toda a minha dor para fora em forma de gritos e choro. Dói como se as flechas tivessem atingido meu próprio corpo e tivessem incendiado minha carne. Dói como a dor mais inexprimível que alguém pode sentir.

O amor de minha vida está morto.




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