Parte 3

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     Dama Agatha aplica pó branco em meu rosto e depois uma tinta rosada em meus lábios, o que faz com que eles fiquem um pouco grudentos. Ela ajeita minha longa trança dourada e a enfeita com pequenas presilhas de flores azuis que parecem gotas de gelo. Em seguida, praticamente me enfia dentro de um vestido de tafetá lilás, cuja saia é volumosa e as mangas chegam aos meus punhos.

     - Pronto - murmura. - Está bonita.

     Encaro o pequeno espelho redondo preso na parede do dormitório da Dama Agatha e suspiro. O que eu queria mesmo era ficar esquisita para que o príncipe desistisse de me manter aqui, mas estou bonita.

     - Não está um pouco exagerado? - pergunto a Dama.

     Ela franze a testa.

     - Não. Está ótimo. 

     - Eu... - minha voz treme. - Eu realmente tenho que ir?

     Dama Agatha apoia as mãos nos quadris.

     - É uma ordem real, menina - diz suavemente. - Estamos todas sujeitas às vontades da família real e não cumpri-las pode resultar em morte. Achei que já tivesse compreendido isso.

     Desesperada, seguro a mão dela com força.

     - Por... por favor, ajude-me - suplico. - Eu não posso ficar aqui, eu não sirvo para essa vida. Por favor, ajude-me a sair daqui...

     Dama Agatha afasta minha mão com um tapa. Olho para seu rosto e vejo uma expressão irritada, como se minhas palavras a tivessem ofendido de uma maneira bastante séria.

     - Pare de dizer tolices - ela rosna. - Não há para onde fugir. Esqueça da sua vida de antes e concentre-se em agradar seu príncipe. Essa é a sua realidade agora e você deve encará-la com coragem. - Seus olhos praticamente perfuram os meus. - Ou morrer.

     Engulo em seco. Eu não aceito isso. Deve haver alguma maneira de desfazer toda essa confusão e deixar esse lugar. Sinto saudades imensas de casa e da minha vida e este foi só meu primeiro dia no palácio. Como esperam que eu viva aqui até morrer?

     - Vamos - Dama Agatha me arrasta com ela novamente, na direção do hall de entrada. Eu faço muita força para não chorar, pois sei que isso só me causará mais problemas.

     O Capitão DeVil permanece no mesmo lugar onde o deixamos e vejo que está encarando esculturas decorativas de cães, dispostas numa estante de madeira. Dama Agatha pigarreia alto para chamar a atenção dele e ele fixa seus olhos frios em nossa direção - mas especificamente em mim. Não há mudança alguma em seu semblante. Envergonhada, admito a mim mesma que queria que ele notasse que estou bonita e retirasse o que disse antes.

     - Siga-me - é tudo o que ele diz. Sua voz soa cortante e ríspida.

     Dama Agatha solta minha mão e me dá um leve empurrão nas costas, para que eu vá atrás do Capitão. Cruzo as mãos diante do corpo e respiro fundo. Sigo o homem vestido todo de preto para fora da Casa das Damas, sentindo meu coração bater tão forte que acho que vai estourar. Não há como evitar isso, não é mesmo? É como a Dama Agatha disse: obedecer ou morrer. Veremos quanto tempo vou durar aqui dentro.

     Sinto o frescor da noite assim que piso no gramado diante da Casa das Damas e paro para olhar o céu. Está realmente estrelado hoje, digno de ser registrado em uma tela. Minhas mãos formigam, ansiando por papel e tinta para que eu possa desenhar e, por um segundo, eu me esqueço de onde estou. Um puxão em meu braço direito me lembra e eu vejo o Capitão bem perto de mim, encarando-me com irritação.

Cruel: uma volta no tempo (spin-off)Where stories live. Discover now