Meninas de Seda

بواسطة JuliannaRioderguz

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"Apenas dois corações unidos pelo mesmo laço, serão capazes de com a maldição acabar." Natalie Dolman vê su... المزيد

Prólogo
1. Desastre na formatura
2. Um corpo no banheiro
3. 'Betina, cara de Botina'
3. 'Betina, cara de botina' - Parte 2
4. Uma noite no cemitério
5. A chegada em Âmbar - parte 1
5. A chegada em Âmbar - parte 2
6. Magicien de Sorcellerie
7. Cae-Drum
8. O Pântano de Aine
9. O Covil da Dama
10. Natal em São Paulo
12. O que vem após a morte
13. Uma briga e um jogo
14. As Veux
15. Elas descobrem
16. Aquele sonho
17. O Baile
18. Outro assassinato acontece
19. Um convite para a morte
20. Ela não é tão ruim
21. Outra mensagem é deixada
22. Ele me encontra - parte 1
22. Ele me encontra - parte 2
22. Ele me encontra - parte 3
23. E então, ela desapareceu...
24. A Cachoeira de Aldeam
25. A ajuda da Mascarada
26. O crepitar do fogo
27. "Meninas de Seda"
28. A verdade descoberta
29. O golpe final
30. Espectro de Victoria
31. A última Dolman
Epílogo
Sobre Meninas de Porcelana

11. Nem toda brincadeira acaba bem

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بواسطة JuliannaRioderguz

24 de dezembro, domingo.

A festa de Catarina estava digna de uma verdadeira Almeida. A decoração por dentro estava magnífica. Vindo de Catarina e Kátia, as maiores madames que já conheci, não poderia esperar por menos. Vários filetes felpudos de decoração de teto pendiam de canto a canto. Bolas de cristal pequenas e pintadas em cores alegres. Um Papai Noel de pano e algodão estava posto em uma das cadeiras, aparentando uma tenebrosa imagem de homem real.

Sua árvore de Natal era toda branca, e decorada por inteiro com uma coleção de enfeites natalinos. Os pais delas estavam sentados no sofá, apreciando suas bebidas vermelhas e geladas, enquanto se aproveitavam de leves petiscos.

- Natalie! - A senhora Almeida me abraçou, como sempre, receptiva. - Você está uma bela moça.

E após me cumprimentar, foi falar com Octavius e Anna, meus falsos avós.

A música agitada no fundo, alguns mais animadinhos, no meio faziam uma pista de dança, e se jogavam como se não tivesse ninguém vendo. Bem, tecnicamente, eu era a única que estava sentada observando os outros, que deveria ser primos distantes de ambas, ou amigos da faculdade.

Catarina fazia Publicidade e Propaganda. E Kátia seguia em Engenharia de Produção. Eram bem populares, como você pode imaginar.

- Você não vai dançar?! - Kátia surgiu esticando para mim seu sorriso mais falso, com a voz mais fingida possível, como se desse a mínima se eu estava me divertindo ou não.

- Talvez mais tarde. - respondi, dando de ombros, mas sorrindo de volta para não ser rude.

- Ah, venha! - ela me puxou pelo braço direito, e me fez levantar, me arrastando para onde os outros estavam.

- Natalie, querida! - Catarina gritou para mim, parando de se esfregar em seu namorado, João, e formando uma roda em minha volta.

- Vamos festejar! - ela levantou um brinde, e todos seguiram seu movimento. - Um brinde! À vida! Enquanto podemos. - e deu uma piscadela para Kátia, e todos riram.

***

A festa estava bem agitada, mas vou poupar o seu tempo, e ir para a parte dela que realmente interessava: quando estava chegando ao fim.

Algumas pessoas mais velhas já haviam saído quando passara da meia noite.

Dei um jeito de convencer minha amiga de que Octavius e Anna deveriam ficar para dormir em algum quarto da casa. Seria suspeito eles ficarem acordados até tarde sendo meus avós, e não poderiam simplesmente nos deixar ali, desamparados para o caso de algum infortúnio vir a acontecer.

- Opa! Agora vamos pra surpresa da noite. - anunciou Cat, assim que ficamos apenas eu, ela, Kátia, seus namorados e Marcos na sala.

- Já ouvi esse papo antes. - disse eu, lançando um olhar irritado na direção de Marcos, ainda o culpando por não ter me defendido aquela noite na Delegacia. Bunda mole! Isso é o que ele era.

- Dessa vez, é diferente. - ela atraiu minha atenção para si, e continuou. - Eu e Kátia, como boas anfitriãs, preparamos uma brincadeira pra vocês.

- Já passou da meia-noite e estamos em número par. Coincidência? - João soltou um riso de um jeito forçosamente divertido, embora ainda soando arrogante aos meus ouvidos. Os irmãos Lancastre não estavam em muita estima comigo.

Os meninos deram risos maliciosos, e nós reviramos os olhos.

- Essa brincadeira eu reservo pra mais tarde. - Cat deu uma piscadela, entrando na brincadeira, como sempre. Ela era a pessoa mais alto astral que eu conhecia.

- A brincadeira que queremos fazer - Kátia tomou a frente, vendo que aquele papo entre os dois namorados poderia render. - É uma caça ao tesouro.

- Sim. - Cat disse, retomando o foco. - Nós escondemos pela casa alguns presentes, e vocês terão algumas pistas para encontra-los.

- As pistas estão na árvore. Cada uma delas levarão vocês a cômodos diferentes, então não vale pedirem ajuda uns aos outros. E o que ficar por último, ganha outra surpresa.

Consultei meu relógio. Já eram 2h43min. Eu não estava no melhor ânimo pra participar de uma brincadeira dessas, que sabe-se lá quanto tempo levaria pra acabar.

- Eu posso dormir e terminar isso depois? - perguntei, bocejando levemente pra expressar meu cansaço.

- Para de ser preguiçosa, Nat. Temos disposição de sobra pra isso. - Marcos falou, me cutucando no braço.

- Você tem, né? - disse eu, massageando o braço ainda sensível pelo ataque. - Ai!

- Nat, agora que reparei nesse vermelhão no seu braço. O que aconteceu? - Cat exclamou atônita, só naquele momento se dando conta de que algo estava errado comigo.

- Ah, umas pessoas me atacaram esses dias, enquanto estive fora. Mas já estou bem. Não foi nada demais - ela fez cara de quem queria maiores detalhes, mas eu não estava com pique para explicar.

Ela me deu aquela olhada de "mais tarde a gente conversa." Me levantei e fui até a árvore pegar o envelope com meu nome escrito, seguida por Marcos.

- Apesar do ataque, você está ótima! - sussurrou ele, ao meu ouvido.

- Eu sempre tô. - dei de ombros, lendo as pistas. Amassei o papel em meus dedos, e o guardei em meu bolso.

Puxei a Catarina de canto, e sussurrei em seu ouvido.

- Você tem me evitado a noite toda e mal olhou para mim desde que cheguei. Mas não irá fugir. Nós precisamos conversar sobre o que aconteceu na noite em que Betina foi assassinada, e não sairei daqui enquanto não souber.

Catarina entreabriu os lábios, como se ponderasse por um instante me dizer de uma só vez o que havia acontecido, afinal.

Mas sua expressão fechou.

Seu olhar tornou-se perturbado de tão arregalado que ficou. Sua feição contraída, ela engoliu em seco, mas não falou nada. As cordas vocais que possuía tinham sumido naquele instante. Ainda muda, ela deu as costas a mim, juntando-se a seu namorado.

Conheço Catarina minha vida toda. E mesmo já tendo visto ela com diversas expressões, nunca vi aquele olhar. O olhar, que mostrava que ela estava perturbada. De uma maneira, que em toda a minha vida, nunca pensei que veria aquela expressão.

Não em Catarina!

***

Iniciamos a busca pelos presentes. Passei no quarto em que Octavius e Anna estavam. Eles conversavam, mas me encararam alarmados quando entrei.

- Ah, é você! - Anna levou as mãos ao peito, aliviada.

- O que tem a nos contar, Natalie? - perguntou Octavius, antes que eu fechasse a porta atrás de mim.

- Como sabe que tenho algo a contar?! - instiguei, sentando na poltrona do quarto.

- Não teria passado aqui por outro motivo. - respondeu ele como se aquela fosse a coisa mais óbvia do mundo, e pegou um cigarro no bolso da calça.

- Não sabia que você fuma! - exclamei surpresa. - Pensando bem, vocês dois são mistérios para mim. - cerrei ambos com os olhos - Mas já está tarde. Deveriam dormir um pouco.

- E o que você, mocinha, está fazendo acordada ainda? - Anna perguntou, tirando o cigarro de Octavius. - Na minha frente, não.

- Mandona. - ele mostrou a língua pra ela, e me diverti com a cena dos dois, juntos como um verdadeiro casal.

- Somos tão jovens e ainda é cedo. - respondi, massageando uma ferida do braço. - A Cat preparou uma caça ao tesouro, algo assim.

- Não está um pouco tarde pra isso? - Anna estava desconfiada.

- Eu sei. - dei de ombros, e me levantei para encará-los. - Posso pedir uma coisa? - esperei uns segundos, e ao vê-los assentindo com a cabeça, continuei. - Fiquem de olho em todos nessa casa. Façam isso por mim, e sem que eles percebam.

- Por quê? Você viu algo suspeito? - Octavius ficou atônito, tirando outro cigarro de seu maço.

- Não. Mas é aí que tá o problema. - eu disse, com um leve sorriso de canto. - Eu nunca percebo nada quando é pra acontecer!

Eles pareceram convencidos por meus argumentos, mas afinal, eles eram meus protetores, certo? E protetores serviam para isso. Manter-me protegida, faça chuva ou faça sol.

- Ok, nós tomaremos conta. - Anna resmungou - Agora volte, antes que eles sintam sua falta.

Assenti agradecida, e voltei para baixo.

As pistas ainda não faziam sentido algum.

***

25 de dezembro, madrugada de segunda-feira

Todas elas eram ridículas, e envolviam charadas que crianças de cinco anos conseguiriam entender. Mas pelo menos a intenção das meninas foi boa, apesar da criatividade ter passado longe.

Cada um foi para um lado da casa, enquanto Kátia e Catarina ficariam sentadas no sofá, esperando.

Elas haviam colado em várias paredes números ou alguma palavra. Minha primeira pista fazia referência a comidas. Fui direto para a cozinha, procurando por algum palavra que fizesse menção à isso.

Demorei até entender que encontraria o que precisava dentro da geladeira. Ali, havia uma folha com espaços para eu completar a frase. Tão infantil, que chegava a me surpreender por ter sido criado pelas duas. Deve ter um dedinho do João nisso!

Algumas palavras estavam escritas no verso:

Parabéns, Dolman! Você conseguiu chegar aqui! As próximas pistas que desvendar, te levarão para um cartão que contém algumas letras. Essas letras, na ordem em que for encontrando, deverão ser escritas nos espaços dessa folha. A mensagem te levará para o seu presente. Boa sorte!

Aquela não era a letra da Catarina. Deveria ser da Kátia. Estava fácil demais pra ser só aquilo. Posso não ser nenhuma vidente, mas previa muita dor de cabeça em minha madrugada.

Olhei para a lista de pistas, vendo qual era a próxima. Resolver a raiz quadrada de 9.

Tudo bem que eu não era tão boa em matemática, mas ela não precisava apelar colocando algo tão fácil. Olhei cada canto da cozinha, procurando pelo cartão de número 3. Encontrei dentro do forno.

As letras eram POO.

Eu não tinha nenhuma caneta por perto, então teria que dar conta de guardar os cartões na ordem, para formular a frase em minha mente depois.

Abri o papel amassado, lendo o próximo tópico.

"Item 3: Muito bem, Dolman! Você conseguiu chegar aqui. Essa tarefa, é bem mais árdua e horripilante. No coração da dona, encontrará o que tanto procura. Mas seja rápida! Ele se fechará, assim que der a última batida."

Hesitei por um instante, analisando a intensidade daquelas palavras.

"No coração da dona." Uma súbita ideia me veio à mente, e subi apressadamente as escadas, formulando uma hipótese do que deveria ser.

Quando João Célio e Catarina completaram um ano de namoro, ele fez uma surpresa especial para ela. Lembro-me do quão radiante ela ficou, e que minhas palavras exatas para ela, foram:

"- Parabéns! Você é uma guerreira!"

Mas, voltando à surpresa, ele criou um holograma que foi reproduzido no prédio inteiro onde ele mora, fazendo uma grandiosa declaração, e a surpreendeu com uma caixa de joias em estilo antigo, de madeira rústica, com o diferencial de ter seu formato em coração.

"Meu coração, para sempre contigo."

Era o bilhete que havia dentro.

Empurrei a porta do quarto, ainda com o pensamento de que aquele seria o coração da dona.

Dando uma análise rápida no ambiente, encontrei exatamente a mesma decoração do quarto que ela tinha na casa de seus pais, com a diferença de ser muito maior do que o antigo.

Cama de casal com cabeceira almofadada, um criado-mudo em cada lado da cama. Não havia um guarda-roupa propriamente dito, mas havia duas portas de madeira detalhadas e pintadas em branco, onde, provavelmente, estava o closet da madame.

Do outro lado, uma escrivaninha com seu notebook, os livros da faculdade e...

- Claro! - exclamei, esboçando um sorriso quando vi uma caixa de madeira rústica logo abaixo de um de seus livros de Marketing.

Menos mal! Pelo menos as duas colaboraram com a minha vida. Tirei o livro, colocando-o sob o notebook fechado, e puxei a caixa de joias.

Abri-a, e me deparei com ela quase vazia, se não fosse pela presença de um cartão, onde estava escrito por cima "Você chegou ao coração!".

Desdobrei-o, e li as letras EINS.

Coloquei o cartão por baixo dos outros, retirando novamente as pistas do bolso. Só faltavam duas. A próxima me indicava a ir para o lugar mais nojento onde eu poderia encontrar uma pista.

Banheiro?! Talvez. Corri pela suíte do quarto de Cat, mas não encontrei nada ali. Deveria ter um mapa da casa também! Tudo bem que eu nunca estive ali antes, pois elas haviam se mudado depois que conheci o outro lado da minha vida, mas não deixar nenhum mapa dos banheiros era sacanagem. Isso mesmo. "OS". Duas adolescentes metidas à adultas, que mantinham uma casa enorme em São Paulo.

Encontrei um banheiro. Abri o armarinho, e vi um cartão, em que apenas estava escrito "DEA". Só poderia ser minha pista. Não tinha importância. Se não fosse, o pior que aconteceria seria eu estar atrapalhando a brincadeira alheia. A última pista, apenas dizia.

"O ponto de início pode ser a chave para se encontrar o fim. Encontre a sequência numérica correta."

A sala, claro! Onde as duas malucas estariam me esperando, para me verem trabalhando o cérebro encontrando uma sequência que fosse correta. Desci as escadas correndo, com um sorriso no rosto.

Meus pés faziam eco ao entrarem em atrito com o chão.

- Kátia? Catarina? - perguntei, chegando à sala. Elas não estavam lá. Ninguém estava. Sentei no sofá, e parei para respirar um pouco. A casa estava quieta. Quieta até demais.

Vários bilhetinhos estavam colados na televisão, com sequências numéricas em cima, e provavelmente as letras restantes por baixo. Analisei-as, e todas me pareciam verdadeiras. Não havia entendido o que seria essa sequência correta, sendo que poderia ser qualquer uma.

- Já sei! - exclamei, o som saindo mais alto do que eu imaginara. Coloquei tudo o que havia encontrado até então na mesinha de centro, e recolhi todas as pistas da TV. Iria testá-las, até encontrar a correta.

Abri a primeira. Estava vazia. A segunda também. A terceira. A quarta. Que estranho!

Abri a quinta. Três letras estavam escritas. ALV.

Peguei a folha para completar a frase.

_ _ RÃ_.

M _ N_ _

_ E

S_D_

S_ _V_

Com calma, abri novamente a primeira pista e completei com as primeiras letras encontradas.

PORÃO.

M _ N_ _ _ _

_ E

S_D_

S_ _V_

Abri o próximo envelope. Não sabia que naquela casa tinha um porão, até porque, isso é muito norte americano pro meu gosto, e sou uma verdadeira medrosa pra essas coisas. Olhei as próximas letras da pista.

PORÃO.

M E NIN AS _ E

S_D_

S_ _V_

O terceiro envelope tinha as letras DEA

PORÃO.

M E NIN AS

D E

SEDA

S_ _V_

Meu coração gelou quando formulei essas palavras. Mas talvez não mais quanto quando eu terminei a última palavra.

PORÃO.

M E NINAS D E

SEDA SALVE.

Salve as Meninas de Seda. Porão.

***

Saí correndo sem nem olhar para trás, e subi diretamente para o quarto em que meus protetores estavam. A porta estava trancada. Gritei e a esmurrei, puxando freneticamente a maçaneta.

- ABRAM! ABRAM! EU PRECISO DE VOCÊS!

Ninguém lá dentro se manifestou. Fiquei quieta, para que pudesse ouvir algum som, e escutei um choro leve.

- Vocês estão aí? - perguntei agora brava.

- Natalie! - a voz de Anna parecia seca. - Ele veio. Está aqui.

- Cadê Octavius?! - instiguei confusa.

- Foi buscar reforços. - ela tomou fôlego, e continuou. - Eu tentei proteger vocês... Mas...

- Mas?!?

- Ele me prendeu aqui. Foi tudo uma armadilha, Natalie. - Anna parecia sufocada em sua própria fala. - Eles sabiam quem somos nós. Sabiam de tudo.

- Quem sabia? - perguntei impaciente pelo outro lado da porta.

- Os amigos que você viu hoje... Não eram seus amigos de verdade. Eles tomaram a mesma forma. E esconderam os verdadeiros no porão. - ela tossiu, e pareceu ofegante.

Comecei a gritar pela casa, descendo desesperada o lance de escadas em direção à sala novamente. Onde quer que eles estejam mais cedo ou mais tarde alguém teria que ouvir.

- Porão, porão, porão! - levei as mãos à cabeça, tentando conter a respiração, mas estava praticamente impossível.

- CATARINAAAAA??? - gritei o mais alto que pude, tomando forças para não chorar. Meu braço voltara a doer, e toda a angústia pelo que poderia ter acontecido à minha amiga me tomou.

Saí apressada pela casa, procurando pela entrada do porão. Já era quase 4h da manhã, eu estava praticamente sozinha, perdida e com mais um problema nas costas.

Subi novamente a escada, na tentativa de encontrar alguma coisa no andar de cima, mas parei no meio do caminho. Os degraus pareciam ocos. Sapateei sobre eles, e realmente estavam.

Mas é claro!

Pestanejei, e desci novamente. A entrada para o porão deveria estar do lado da escada.

- Achei! - exclamei baixinho, não sabendo se me alegrava ou me entristecia por isso.

O corrimão estava sujo de sangue. Engoli em seco, e abri a porta lentamente. Não queria fazer barulho. Desci as escadas, e um cheiro forte inalou pelas minhas narinas.

Isso é... Sangue.

Concluí, sentindo minha respiração prender.

- Nat... alie! - uma voz feminina me chamou, parecendo vir de baixo. Do chão.

- Catarina? - sussurrei de volta, na esperança de que fosse ela.

- Kat... - ela respondeu o próprio nome, e tossiu, parecendo cuspir algo no piso imundo.

- Onde estão os outros? - perguntei, tentando localizá-la ali dentro, mas estava escuro demais.

- Eles foram... - ela parecia fazer muito esforço pra falar, mas eu entendia. Seja lá o que tivessem feito com ela, sentia o horror em cada palavra dada.

Comecei a andar para trás, apalpando o ar na tentativa de achar qualquer coisa, e levei um susto quando me encostei à parede e esbarrei no interruptor.

Kátia estava sozinha de um lado, com manchas de sangue pelo corpo. Na parede do lado oposto, havia uma frase em vermelho. Ela escorria pelo branco da tinta. Havia sido pintada de sangue. Algumas manchas dificultavam a leitura, mas dava pra entender perfeitamente o que estava escrito ali.

Salve as Meninas de Seda

Abaixo, o corpo de Catarina estava inerte, com uma tesoura na mão, e uma caixa de madeira na outra. Usava um vestido que parecia ter saído de outro século, preto e avolumado com várias camadas. Em seus olhos, uma máscara preta, que lhe cobria completamente os olhos.

- Não! - exclamei baixinho, pois já não tinha mais forças para gritar. Catarina, não!

Caí a seu lado, me deixando ser tomada pelas lágrimas que queimavam em meu rosto, descendo compulsivamente.

Abracei o corpo de minha amiga, medindo seu pulso. Mas a pulsação havia cessado. Uma mancha circular delineava o lado esquerdo do peito. Peguei trêmula como nunca estive em toda a minha vida, a caixa de madeira em sua mão.

Havia um bilhete nele.

Paralisei, suando frio.

"Parabéns! Você chegou ao coração da dona."

Estava friamente escrito.

Não! Recusei-me a acreditar na conclusão que minha mente havia chegado.

- Não! - minha voz estava embargada. - Não, Cat! Não! Você não merecia! - abri a caixa, engolindo em seco aquela coisa ruim que me subiu à garganta. Seu coração ainda batia, e desacelerava cada vez menos ritmado.

- Não! - minha voz quase ficou presa em minha garganta. Meu peito inchado não continha as lágrimas que desciam por meu rosto, e nem queria conter. Seu coração perdeu o ritmo. O envolvi em minhas mãos, segurando trêmula o coração de minha melhor amiga. Ele desacelerava o ritmo, e aos poucos, sua pulsação se perdeu entre meus dedos. Sentia o gosto salgado das lágrimas que passavam por meus lábios. Elas desciam cada vez mais compulsivamente.

- Não, Cat... - foi o último sussurro que dei, colocando a caixa novamente no chão. Senti meu mundo desmoronando naquele momento. Queria poder gritar até aliviar a dor de ver a minha amiga ali, seu corpo inerte, e seu coração parando de pulsar em meus dedos.

Aquilo era demais para mim. Tudo era demais para mim.

Um líquido corria por meu polegar. Meus olhos se voltaram para seu pulso, de onde havia tirado a caixa. A mesma marca do corpo de Betina...

Estava escrito meu nome, e logo abaixo de onde o sangue parava de escorrer, um lenço azul com as inscrições Meninas de Seda se anunciava.

Aquele pesadelo não teria fim...

A Mascarada também havia estado ali.

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