24. A Cachoeira de Aldeam

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Ainda era meu aniversário quando a noite anunciava. Octavius havia deixado em minha cama a surpresa de que falara. Era uma carta de Marcos, e uma camiseta nova do AC/DC. Fazia tempo que não via ele, ou João Célio, e queria saber como estavam reagindo à falta que Catarina fazia. Marcos sempre gostou muito da cunhada.

Por um momento, me peguei pensando em como teria sido se meu destino já não estivesse traçado, e se eu pudesse ter tido a oportunidade de uma vida normal. Talvez eu e ele estaríamos juntos...

Sendo assim, ainda bem que sou uma fée!

Abri a carta, e li apenas um trecho:

Minha querida, Natalie!

Há tempos venho te procurando, desde aquele dia em que nos beijamos na porta do Hospital, não consigo tirar você dos meus pensamentos. Sinto saudade dos seus lindos olhos castanhos, e da forma como seu olhar consegue sempre prender minha atenção totalmente para si. Sinto falta desse seu cabelo cor de fogo a roçar minha pele...

Espero que caso consiga ler isso, ainda reste alguma lembrança carinhosa sobre mim. Queria que estivesse aqui. João não tem vivido, apenas fica trancado em seu quarto. Ele se culpa pela morte dela, Natalie.

Acha que deveria ter lutado mais. Que poderia evitar que lhe roubassem sua Cat.

Feliz aniversário, Nat. Ou Natinha, lembra? Como te chamei uma vez, logo após você derrubar suco de uva na minha camiseta branca.

Precisamos de você aqui. Mande notícias.

Dobrei a carta, guardando-a dentro do criado-mudo. Peguei uma caneta e uma folha em branco, e escrevi sua resposta. Não estava a fim de nada muito meloso, não fazia meu tipo. Mas também não poderia dar uma resposta fria.

Agradeci todo o carinho dele comigo, dizendo que também sentia falta, enfatizando a parte em que Catarina era a que mais ocupava meus pensamentos.

Disse à ele que iria vingar a morte de Catarina, e caso sobrevivesse, iria visitá-lo algum dia. Coloquei a carta em um envelope branco comum, e borrifei um pouco do meu perfume. Força do hábito.

Entreguei a carta à Anna.

Ela já estava à par de meu plano para salvar as meninas, e iria comigo. Ela e Octavius, já que eram meus protetores. Amanda havia falado que eles não poderiam entrar, mas não custava tentar.

- Vá descansar. Tem que estar bem pra amanhã. - Anna anunciou, assim que lhe entreguei minha carta.

- Como assim amanhã? Temos que começar a agir e logo. - disse eu, revoltada.

- Você não será muito útil se estiver cansada, Natalie. - Anna replicou, guardando algumas amostras de sangue dos alunos que participavam do Canestro. - E tente entender uma coisa, se nossa teoria estiver certa, eles não poderão atacar Nicole até que você e Naomi estejam juntas, entendeu?

- E se a teoria de vocês estiver errada? - rebati, e percebi que ela ficara sem resposta alguma. - E se quando chegarmos lá for tarde demais?

- Desculpe-me, querida. Mas você terá que entender dessa vez. - ela foi dura em cada palavra dita.

- E eu sou obrigada a ficar me angustiando até amanhã? - rebati, mas parei ao sentir minhas mãos arderem. As marcas que haviam aparecido estavam se transformando em cicatrizes. A pele de meus braços começou a embranquecer, e minhas veias ficaram saltadas.

Anna arregalou os olhos para mim. Em meus pulsos, algumas linhas apareceram, mas não consegui ler. Estavam em outra língua.

- O que está acontecendo comigo, Anna? - perguntei, com uma dor latente a me invadir por inteiro. - O que está acontecendo?

- Acho que você pode ter razão. - seus olhos apresentavam um assombro que nunca tinha visto naquele olhar. Ela gritou para sua Enfermeira assistente, e disse - Chame Octavius César. Rápido.

Ele tem César no nome?

Ela segurava meus dois braços com força, enquanto passava o olhar pelo armário de remédios, como se um mapa mental estivesse sendo explorado dentro dela, buscando algum remédio que pudesse usar para aliviar a dor.

Eu me sentia quebrando por dentro.

- O que está acontecendo comigo? - rebati, agarrando com força seu braço, e cravando nele minhas unhas.

- Ele está abrindo o diário. - Anna respondeu, e vi que Octavius estava chegando. Bastou que desse uma olhada em mim, para entender.

- Como? - perguntei, cuspindo sangue com baba. Meus olhos começaram a revirar, e meu corpo ficou mole por um instante.

- Ele está usando Naomi. - Anna disse, e agilmente inseriu uma agulha em minha veia. - Você ficará bem em alguns minutos, mas tinha razão. Temos que ir para lá o quanto antes. Octavius assentiu, e fez surgir uma mala com alguns suprimentos que iríamos precisar.

Anna injetou um soro em meu pulso. Instantaneamente, a dor suavizou.

- Vamos agora! - Octavius disse, se agarrando à mim.

- Espere! - exclamei. - Mas e Mariane? E tenho que me despedir de alguns amigos, caso eu não volte. Principalmente de Ellen. E Bernardo – engoli em seco. Fazia tempo que não o via.

- Você não irá morrer, Natalie. Estaremos lá para garantir isso. - Octavius tentou me acalmar, passando a mão por meu ombro. - Você ficará bem e logo Naomi estará aqui com você. Vamos acabar com isso!

E terminando a frase, nos tele transportamos para a entrada da Cachoeira de Aldeam.

- Como vamos saber o lugar onde está a entrada? - perguntei, analisando ao redor.

- De onde você caiu? - Anna perguntou, jogando uma mochila nas costas.

- Da catarata mais alta. – apontei para cima. – Por quê?

- Eu acredito que quando a leoa te jogou dali, a intenção era fazer com que você caísse direto na entrada. - Anna mal terminou de responder, e já estávamos no topo da Cachoeira.

- Como sabe de tudo isso? - perguntei, não conseguindo evitar desconfiança.

- Eu faço muito mais do que ficar na Enfermaria curando suas feridas! – ela retrucou.

- Tenha cuidado, Natalie! - Octavius disse. - Se algo começar a dar errado estarei aqui para te proteger.

Ele sussurrou para mim. Respirei fundo e, sem nem pensar duas vezes, dei um salto. Já havia feito aquilo antes, e o fato de estar sob a pressão de salvar uma grande amiga e minha irmã, me faziam mergulhar sem medo.

Caí na água. Meu corpo afundou. Minha visão ficava muito melhor embaixo da água. Nadei alguns metros, e encontrei um orifício bem no fundo da cachoeira.

A entrada! Exclamei mentalmente, e nadei até ela. A sua extremidade era apertada. Meu corpo foi sugado orifício abaixo, como uma pia suga a água após ser desentupida. Meu corpo girou em redemoinho, uma ânsia de vômito me tomava.

Minha visão começou a ficar embaçada pela quantidade de água que estava à minha frente e quando pensei que fosse afogar, meu corpo foi expelido para fora do tubo.

Dei de cara no chão, ralando os braços.

Fiquei alguns minutos encostada à parede, esperando meus protetores aparecerem. Será que Amanda estava certa e eu teria que enfrentar aquilo sozinha? Estremeci. Um baque chamou minha atenção. Havia caído em um pequeno túnel, então qualquer som revibrava fazendo eco. Virei imediatamente a cabeça para ver do que se tratada. Alguns galhos de árvores começaram a crescer na superfície das paredes, e se mexiam compulsivamente, prestes a esmagar qualquer coisa que estivesse em sua frente.

E para o meu azar, não havia mais ninguém ali.

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Nota da autora: Oii, gente. Desculpe a demora a postar. Os últimos dias foram corridos, mas a novidade é boa: MEU LIVRO NÃO FOI SUICÍDIO SERÁ PUBLICADO!!! Finalmente esse sonho se tornará real.

Conto com o apoio de vocês! ♥♥

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