Aquala e o Castelo da Provínc...

Oleh BernardoDeSouzaCruz

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Extraterrestres. Será que eles realmente existem? De onde vêm? Será que são do jeito que os humanos imaginam... Lebih Banyak

PRÓLOGO - VIZINHOS EXTRATERRESTRES
CAPÍTULO 2 - O DICIONÁRIO DE BOLSO
CAPÍTULO 3 - CATORZE ANOS MEDÍOCRES
CAPÍTULO 4 - ESCOLA DAMATIO
CAPÍTULO 5 - UM INSETO EM ALAN
CAPÍTULO 6 - O ATAQUE AOS ALUNOS
CAPÍTULO 7 - DEBAIXO DO SEU NARIZ
CAPÍTULO 8 - TUDO DE MÃO BEIJADA
CAPÍTULO 9 - OS EXTRATERRESTRES DE ESTIMAÇÃO
CAPÍTULO 10 - AS AVES CINTILANTES
CAPÍTULO 11 - O CENTRO OSÍRIS
CAPÍTULO 12 - A CIDADE DO CASTELO
CAPÍTULO 13 - A CORRIDA
CAPÍTULO 14 - O LAGO DOS DESEJOS
CAPÍTULO 15 - MALDITOS MONSTROS!
CAPÍTULO 16 - SOB O DOMÍNIO DOS THONZES
CAPÍTULO 17 - A SOBREVIVENTE
CAPÍTULO 18 - OS ESCARAVELHOS
CAPÍTULO 19 - UMA ESTRANHA VISITA
CAPÍTULO 20 - DOIS HOMENS DE MEON
CAPÍTULO 21 - AS ABDUÇÕES
+ Um recado aos leitores
Capítulo 22 - O gancho necessário.

CAPÍTULO 1 - A CADEIRA DOURADA

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Oleh BernardoDeSouzaCruz

Bem longe dos Flintch e muito mais longe de Aquala, num lugar fora da Terra, havia uma muralha que cercava um forte. O lugar era bem escuro e, por toda a parte, o ar formava cristais roxos. O chão era de terra marrom e parecia estar em brasa. Três homens estavam parados em frente ao gigantesco portão, usavam vestes compridas que chegavam até aos calcanhares e tinham seus rostos completamente cobertos por capuzes. O homem do meio era conhecido como Sangrento por causa da cor vermelha da sua vestimenta. Os outros dois, que eram chamados Grisalho e Bobalhão, vestiam cinza.

Sangrento deu alguns passos adiante enquanto os outros ficaram imóveis e o observando. Ele tocou o alto muro que cercava o forte de um jeito apressado, como se quisesse encontrar algo escondido. Com uma luva também vermelha, ele apalpou os cantos mal construídos de cada tijolo. Ele tirou um e viu que atrás havia um escaravelho que cabia perfeitamente em sua palma, mas o inseto estava morto e amassado. Aquilo fez Sangrento levar um susto, então ele soltou um som parecido com o de um berrante, fazendo uma luz do outro lado da muralha se acender.

Os três homens ficaram rodeados de poeira e, então, transformaram-se em milhões de grãos vermelhos e cinzas que voaram sobre o forte. Lá de cima, dava para ver que, na verdade, era uma cidadela vazia. Havia casas em ruínas, pontes caídas e barulhos como zumbidos por todos os cantos. A visão de Sangrento, transformado em poeira vermelha, o fez levar um escondido sorriso ao seu rosto. Ele e seus capangas voavam em direção a uma velha casinha de madeira de onde resplandecia a única luz naquela cidadela, o resto estava na penumbra. Jatos de fogo saíam do chão de terra, como vulcões que podiam queimar qualquer descuidado que não olhasse por onde passava. Os grãos pairaram em frente à porta de madeira da casa e transformaram-se novamente nos mesmos homens de antes. Movimentaram rapidamente suas mãos para que as labaredas que saíam das rachaduras do solo se apagassem.

Sangrento não ousou esperar e bateu na porta, estava ansioso demais para perder mais tempo. Ele, assim como os outros dois, foi chamado para fazer um serviço que pretendia fazer há anos, porém, só desta vez seu Mestre resolveu agir. E eles foram para a casa dele, para o lar daquele que desejava a morte do resto da família Flintch.

Um senhor abriu a porta, olhava bem para cima já que a grande corcunda levava seu tronco para baixo. Tinha pouco cabelo preto na cabeça, alguns buracos sem fios, como se fossem arrancados. Ele resmungou:

– Já estava na hora – o velho mostrou o caminho casa adentro com a mão estendida. Sangrento, seguido de Grisalho e Bobalhão, entrou calado com aquele clima inóspito e rude. Apenas quem falava era aquele senhor. – O Mestre está à sua espera. Não se intimidem com o que aconteceu lá fora, já passou e agora está tudo calmo novamente. Ainda têm alguns por aí, mas os que restaram são inúteis ao Mestre, por isso ele chamou vocês, Ele quer o seu exército.

Pouco eles andaram por um corredor de madeira e apertado, o velho mostrou o caminho que os levou até uma sala pequena e quadrada onde a luz era escassa, tendo apenas um novelo flutuante que brilhava bem forte em vermelho. Após poucos passos e rangidos da madeira, aqueles três homens ouviram um pigarro que parecia vir de todos os cantos e, então, viram as costas de uma cadeira dourada que contrastava com o ambiente morto e antigo onde estavam. O dono daquela cadeira, o mesmo que sentava nela, então disse:

– Sabem muito bem o que quero de vocês – falou com a voz grossa e melancólica bastante rouca. – Espero que tenham feito tudo de maneira correta, afinal eu quero todo o meu exército, precisarei dele.

Enquanto a conversa se desenvolvia naquela sala, o velho fazia movimentos para que o fio do novelo luminoso atravessasse a janela e chegasse ao céu negro, levando o brilho vermelho, forte e intenso. O fio flutuou para longe, como se tecesse o ar e os grãos roxos que apareciam e desapareciam repentinamente em todos os cantos daquele lugar. A luz vermelha iluminou bem o céu, mostrava bem todas as casas destruídas e o rio seco. Algumas pessoas escondiam-se atrás das cortinas de suas janelas, eram covardes que fugiam do tal Mestre. Ele poderia facilmente conseguir quem quisesse para seu exército, porém havia uma breve preguiça em ter gente tão medíocre e ter que ensiná-la a matar. Ele queria qualidade de fábrica.

– Em instantes todas aquelas criaturas estarão aqui – falou Sangrento sob o capuz vermelho. Ele tremia. Seu medo não era menor do que o medo de errar a fala.

– Muito bem. Estão se mostrando eficientes desta vez.

– Mestre, o que exatamente iremos fazer na Terra? Quero dizer, é perigoso?

– Somente será perigoso se os Flintch estiverem atentos. Nossa única forma de atacar desta vez é a luta – a mão saía detrás da cadeira dourada e acariciava os detalhes em ouro. Sangrento, Grisalho e Bobalhão não conseguiam ver o dono daquele trono, somente ouvir sua voz cansada.

O clarão vermelho incendiava o céu acima da casa, então Grisalho ouviu algo, um som que entrou em seus ouvidos que eram simples buracos, sem orelhas. Tirou o capuz e mostrou o rosto coberto por ataduras. Um par de antenas marrons também apareceu, lembravam duas minhocas grandes e compridas que permaneceram em pé. Grisalho ouviu, de longe, ruídos que os outros não ouviram e contou que já estavam chegando.

Do céu escuro à parte vermelha com o fio flutuante do novelo, apareciam centenas de javalis com asas escuras e finas. Tinham ferocidade estampada em seus focinhos. Havia criaturas montadas neles, com a pele coberta por fungos e veias, o cérebro era avantajado para trás da cabeça, parecendo ser uma espécie de coroa de pedra. Tinham três dedos em cada mão e seguravam bem as rédeas. Possuíam patas de dinossauro, garras grandes e ossudas que batiam nas celas. Essas criaturas montadas nos javalis eram chamadas de corsarius, tinham ódio no olhar negro e seus narizes eram inversos aos dos humanos: em vez de ter as narinas para baixo, eles tinham exatamente três narinas e eram voltadas para cima.

O velho corcunda entreabriu a porta. Curioso, tinha sempre cara de perdido e logo foi empurrado pelos homens encapuzados como gentalha. Eles olharam o céu infestado de javalis, e então Sangrento correu de volta para a saleta quadrada onde estava o Mestre com a cadeira dourada.

– Mestre, está tudo pronto. Eles chegaram.

Todos não viram apenas aqueles monstros sitiando o céu rubro como também um gigantesco disco todo feito de madeira que tinha o tamanho de um estádio de futebol. Ele girava devagar, mas se deslocava rápido o suficiente para que os corsarius que ainda sobrevoassem fossem brutalmente atingidos e saíssem rodopiando montados em seus javalis.

Quando o disco pairou no ar, surgiram velas como as de uma barcaça, pareciam cortinas vermelhas e rasgadas com um símbolo no topo, algo como um triângulo preto e uma ave de cor vinho no centro.

O misterioso homem da cadeira dourada se desintegrou em areia roxa, saindo do trono. Passou por debaixo das pernas do velho na porta e flutuou como uma nuvem roxa até o disco que o aguardava no céu vermelho. Sangrento, Grisalho e Bobalhão fizeram o mesmo, transformaram-se em grãos e o seguiram. Eles deveriam repetir tudo o que aquele homem mandava, todavia tinham medo de que algo os ocorresse se algum erro fosse cometido. Havia um plano e eles já o tinham em mente. O velho corcunda acenou gentilmente para o deslumbrante disco que pairou entre o fio vermelho brilhante no céu. Jamais teve o mínimo de atenção, pois, para aqueles homens, ele não se passava de um servente, realmente um verme que deveria ser esmagado imediatamente.

A nuvem de areia pairou sobre o piso do disco voador marrom ao lado de uma balaustrada, deu forma às mesmas pessoas vestidas de antes. Era incrível a facilidade que tinham em se transformar em areia, poderia ser perigoso eles voltarem a ser quem eram e perderem alguma parte do corpo na transformação.

Alguns dos corsarius montados em seus javalis deram uma parada ao lado da casa e a adentraram, quebraram portas e paredes, e o piso de madeira afundou. Pareciam ser criaturas que não tinham controle sobre o que faziam, mas as aparências enganavam, eram muito sábios e ardilosos. O velho desapareceu no mesmo instante em que a casa foi ao chão.

O disco deu partida e alcançou altura. A maioria dos corsarius o seguia, estavam lá para um propósito e já podiam sentir o cheiro da matança. Canhões revelaram-se ao redor do disco, fazendo as grandes explosões começarem a sua volta. Dava-se sinal de partida para os que ainda permaneciam com as mãos nas rédeas de suas montarias.

Aos poucos, os animais alcançavam um voo mais alto, enquanto o extraordinário disco ganhava velocidade. Uma bandeira preta na balaustrada era esbofeteada pelo vento.

– Não acham isso um espetáculo? – ouviu-se de todos os lados a voz do homem da cadeira dourada com um tom aparentemente satisfatório. Sangrento olhou para trás e suspirou ao lado de Grisalho e Bobalhão. Ele via o céu coberto por feiura, uma mistura de corsarius e javalis com asas grandes, secas e destruídas. Todos eles seguiam com empenho o gigante disco de madeira.

Grisalho tinha suas antenas marrons levantadas por um instante, mas, num outro, elas ficaram penduradas como cordas que saíam de sua cabeça totalmente coberta de ataduras. Por um simples comando do Mestre, todos continuaram a viagem dormindo. Os javalis continuavam a bater suas asas, só que de olhos fechados, assim como os corsarius e os outros. Seu Mestre, que preferia ficar às escuras, queria poupar seu exército de esperar até sua chegada.

O tempo passou com imensa rapidez e Ele podia sentir uma presença medíocre que já havia sentido antes. Demorou para conseguir enxergar uma bola azul cheia de pontinhos brancos a sua frente.

Na Terra, uma garotinha na janela do quarto gritava.

– Papai! Papai!

– O quê houve? Sua mãe já está dormindo, não grita desta forma!

– Olha, papai – ela apontou para o céu – eu não disse que eles existiam?

O homem olhou além da cortina fria, com o ar da noite em seu rosto, e pôde ver o disco voador que tinha um brilho vermelho a sua volta passar por cima de sua janela. Um dos corsarius, que já estava acordado, atirou uma lança e o homem caiu morto ao lado da filha sobre o ursinho de pelúcia.

Não muito longe dali, um casal saía de um restaurante. Entraram dentro de um carro rindo, eram Sandra e Robert.

– Querida, não tinha acreditado que a garrafa inteira de vinho havia sumido. Você lembra quando eu belisquei sua perna embaixo da mesa? Eu achava que era você quem tinha escondido a garrafa! – o homem ria com a mulher, já sentado no banco do carro e o ligando, escorregando as mãos no volante.

– Eu não tinha entendido absolutamente nada! – ela gargalhava enquanto tentava falar – Minha mãe estava olhando para o meu pai com uma feição muito estranha, eu percebi isso, mas, para adivinhar que todo o vinho tinha encharcado o prato deles e eles nem tinham percebido, foi um sacrifício.

– Só me lembro de ter olhado para sua mãe e vê-la quase bater a testa na mesa – falou o Sr. Flintch num tom harmônico enquanto dirigia.

– Eles não estão acostumados a beber, só um pouco de vinho uma vez ou outra. Hoje eles quase ficaram de porre. Foi muito divertido! – falou Sandra e olhou para o banco de trás. Thomas estava sentado numa cadeirinha de segurança toda branca com gotas azuis estampadas no acolchoado. Brincava com o encaixe do cinto. O bebê ria graciosamente para a mãe como se ele entendesse a conversa, ele se esbaldava.

Sandra voltou-se para Robert e continuou a falar:

- Temos que contar todas essas histórias para o Tom quando ele crescer.

– Ele vai ser uma pessoa incrível, tanto quanto a mãe – o Sr. Flintch virou uma esquina, concentrado tanto no caminho quanto na conversa – Imagine o dia em que todos nós iremos para Aquala.

– Ainda falta muito tempo, querido. Temos, no máximo, quinze anos para levá-lo.

– Já sinto saudades de lá, sabia? Muito melhor que viver aqui na Terra. Um lugar cheio de encanto.

Um segundo depois, Sandra jurou ter ouvido Thomas falar "mama". Era muita emoção pensar que seu filho quase a chamou por mamãe, mas em controvérsia o pai, antes focado na estrada, teve sua atenção voltada para o bebê.

– Querida, eu ouvi o que ele falou! – disse Robert – ele falou papa.

– É claro que não disse, com certeza foi mama, eu estava mais perto, não posso ter escutado errado.

Uma discussão dentro do carro foi lançada, ou melhor, um debate. Seus corações estavam totalmente expostos naquele momento, o primeiro som compreensível de Thomas foi ouvido com quase perfeição. Mal eles podiam imaginar que o menino não havia falado nada, não se passava apenas de um ruído na garganta, entretanto a discussão não foi para um se sobressair diante do outro, mas sim para continuarem a se envolver no novo capítulo da história de suas vidas. A felicidade estava completa.

Robert estacionou o carro no posto de gasolina mais próximo, assim como outros dois carros nas redondezas. Esforçaram-se para segurar Thomas no colo, tentando tirar mais palavras do bebê enquanto o frentista enchia o tanque. A lojinha do posto estava um pouco movimentada e as luzes piscavam com o que parecia ser mau contato.

Robert e Sandra, ao brincarem com o filho, sentiram as poltronas vibrarem. O homem saltou do carro e fitou a escuridão da outra estrada que diferenciava o caminho de onde veio para onde ia. Nada se via à frente. As poucas pessoas que estavam por ali desapareceram, o que o fez pensar que algo estranho estava por acontecer. O leve, contudo constante, tremor o fez ter essa conclusão.

– Volte já para cá! Está tarde demais, vamos embora – Sandra, com Thomas nos braços e dentro do carro, tentava convencer o marido.

Ele continuou parado e viu o corpo do frentista caído no chão ao lado da roda traseira, com um tipo de lança atravessada em seu peito. O Sr. Flintch teve um calafrio.

– Fique dentro do carro – Robert andou em linha reta, em direção à escuridão.

Uma forte luz vermelha foi acesa na estrada, fazendo-o tampar o olhos. Com dificuldade, ele pôde ver um majestoso disco de madeira nobre e escura com velas e uma flâmula na ponta. O asfalto sob aquilo estava literalmente arrebentado, com rachaduras prolongadas. Aquilo era impossível. Várias caraminholas passavam por sua cabeça e, para ele, aquele monumento estava cada segundo mais óbvio.

Repentinamente, canhões ejetaram-se e permaneceram à vista nas laterais do grande disco. Seguiu-se uma série de explosões que levou Robert ao chão, encolhido e cobrindo os ouvidos. Sandra berrava desesperadamente pelo nome do marido, achava que acontecia alguma coisa com ele, contudo percebeu que isso fazia Thomas chorar em seus braços.

As cortinas vermelhas esvoaçavam com o vento e o homem levantou-se do asfalto, mostrando suprema autonomia, enfrentando aquela visão funérea em sua frente, entre um instante e outro olhando para se certificar de que sua família estava a salvo no carro. Sandra debruçava-se sobre o filho, tentando protegê-lo. Lágrimas desciam de seus olhos, ela já parecia entender o que ia acontecer.

Quando Robert decidiu voltar para o carro, várias lanças de aço saíram do disco e cortaram o ar em uma velocidade incrível em sua direção. Ele, em minuciosas frações de segundos, resolveu fazer com que, nas pontas de seus dedos, se abrissem pequenos buracos, deixando a anatomia da unha parcialmente desfigurada. Ele, com uma rápido movimento com as mãos, projetou uma força que saiu dos seus dedos e fez as lanças se desviarem.

Os aqualaestes eram beneficiados, já que podiam aprender cerca de milhares de poderes, porém os daqueles vindos de Aquala eram bem diferentes do poder que Robert sentia sair do gigantesco disco de madeira. Ele agradecia por ter um reflexo tão bom quanto aquele. A morte havia passado pela primeira vez diante dos seus olhos naquela noite.

Durante toda a sua vida, ele teve suprema preocupação em ser alguém completo, com uma bela casa, família reunida na mesa do almoço e crianças correndo pelo quintal. Nos seus olhos, dava para sentir o medo que tinha em perder o que menos lhe interessava naquele momento, a própria vida. Não que ele não tivesse amor próprio, pelo contrário, mas sua mulher dentro do carro, chorando com o seu filho ainda bebê, o levava a temer sua perda. Os olhos de Robert fitavam, sem expressão alguma, o silêncio nos arredores. Deu meia volta e correu apressado para o carro.

O asfalto rachava e, como uma onda, levou o homem ao chão. Ficou encharcado com a água da poça e seu terno pingava. Sandra batia no vidro do carro, levando forças ao marido para levantar.

Os corsarius pularam de dentro do disco para o asfalto. A luz vermelha ao seu redor era tão forte que não dava para ver de onde saíam, Robert somente tinha a certeza de que eram muitos, e a quantidade só aumentava. Ele, enquanto corria, olhava rapidamente para trás e movimentava as mãos como se jogasse maldição sobre aquelas criaturas. Seu poder aqualaeste não falhava e, nas cabeças dos corsarius, caía uma série de explosões azuis. Mais e mais daqueles bichos corriam na direção do Sr. Flintch como lobos famintos por carne. Suas patas de dinossauro os davam velocidade e o pano que vestiam não os deixavam pesados.

Robert parou de correr e virou, encarando a luz. Seus poderes saíram dos buracos milimétricos em seus dedos, e foi assim que ele fez as árvores ao redor da estrada serem arrancadas junto às raízes. Ele suava frio, pois sabia exatamente quem estava por trás daquilo, assim como lembrava que não era a primeira vez em que passava por aquela mesma situação. Robert, sem dó alguma, jogou nos corsarius as árvores que flutuavam.

Sandra, com Thomas no colo, se apressou para ajudar o marido. Ela tinha o mesmo princípio de família que ele tinha e correu como uma mulher forte. Robert sempre a deixou segura e ela, naquele momento, achou que devia fazer sua parte. O par de sapatos de salto alto foi deixado no carro.

O Sr. Flintch gritou para ela voltar, mas ela não obedecia. Com o filho no colo, ela também encarava a luz intensa do disco, pronta para usar os poderes aqualaestes com o braço livre. Infelizmente havia uma surpresa, um ruído emitido pelo Mestre dentro do disco fez a família Flintch levar as mãos aos ouvidos, já que sentiram, de repente, uma dor incalculável. Naquele instante, muitas lanças prateadas choveram da mesma direção da luz vermelha, tais com canivetes cortando o vento.

O corpo do frentista resolver levitar, assim como os doces e revistas da lojinha. Em seguida, os postes e as colunas que sustentavam o teto do posto de gasolina e os poucos carros estacionados também começaram a levitar como se fossem abduzidos.

Robert percebeu que, acima deles, havia uma outra luz vermelha tão forte quanto a luz do disco no asfalto. Aquela luz sobre suas cabeças tentava abduzi-los.

Em pé no asfalto e com o bebê no colo, Sandra apontou o braço para o céu e fez sair de seus dedos um poder invisível que virou escudo. As lanças batiam na defensiva e voavam para longe. Algumas que conseguiram atingi-la transformaram-se em gotas de água ao encostarem em seu corpo, deixando seu rosto e o de Thomas úmidos.

Robert puxou a mulher pelo pulso para que visse o que estava prestes a chegar; no céu voavam os javalis. O carro deles ainda flutuava com os doces e revistas da lojinha, porém eles usaram seus poderes para que o automóvel caísse no chão novamente para poderem ir embora.

O som de um berrante saiu da forte luz vermelha do disco voador na estrada. Os corsarius e os javalis pararam onde estavam. Os Flintch também pararam, aflitos e suados. Seus olhos fitavam tudo ao seu redor, principalmente de onde o som veio.

Da madeira nobre e escura do disco, uma fileira de areia vermelha escapou, flutuando e pairando sobre o asfalto, o que fez aparecer uma pessoa encapuzada de cor vermelha, Sangrento. Grisalho e Bobalhão apareceram ao seu lado, vindos dos grãos cinzas. Os três esticaram os braços e uma espada de lâminas douradas surgiu para preencher o vazio na mão de cada um. A voz do seu Mestre falava:

– Surpresos?

Sandra e Robert pararam e observaram os homens. Em seguida, caíram no chão com um impulso em sinal de rendição, parecia ser o ponto final para eles, pois não tinham controle de seus movimentos, eram controlados, sentiam o corpo e a mente pesados, suas pernas não aguentavam tamanha pressão, e então o Sr. Flitch pareceu reconhecer a voz rouca e falha.

– Tertius? – Robert berrou e não demonstrou medo algum.

– Já percebi que o instinto animal da família ainda funciona como o mesmo.

– Foi uma pena você ter vindo esta noite, não conseguirá nada de nós – falava Sandra, com cara de desprezo, ajoelhada e agarrada ao filho – Você já conseguiu o que queria, matou quase toda a nossa família.

O casal entreolhou-se e em seguida olhou para o rostinho gelado e redondo do filho, coberto por uma manta azulada. O bebê colocava a mão babada inteira na boca. Sandra chorou.

– Isso é um absurdo! – impôs Robert – O que está pensando em fazer? Acabar de vez com toda a minha família?

– Ora, meu rapaz, é pedir muito? Eu já lutei para destruir todos os Flintch e você acha que esse resto é muito? Quê ignorância!

– Não vai nos matar com tanta facilidade. Minha família sempre vai existir, nem mesmo pondo tudo nas costas de um herdeiro! – ele abraçou, ainda de joelhos, a mulher e o filho.

– Não quero dor, meu caro, só quero que vocês comecem a andar e que larguem o bebê.

Enfrentando os corsarius, Sangrento e seus capangas, o casal levantou e começou a andar com Thomas no colo.

– Larguem a criança!

Robert não sabia o que fazer, suava frio. Olhou para a mulher e viu seus olhos inchados, o rosto todo molhado de lágrimas.

– Não daremos um passo sequer – ele falou.

O Sr. Flintch sabia perfeitamente o que dizia, imaginava se blefar serviria para alguma coisa, mesmo tendo a certeza de que já poderiam estar mortos. O único problema era se, fazendo isso, as chances de Thomas sair de lá vivo decairiam.

– Sempre gostei de poder, você já deve saber disso – dizia Tertius, transformado na nuvem de areia roxa que saía do disco caído na estrada – O lado bom de tudo isso é que você e sua mulherzinha poderão sair vivos, terem quantos outros filhos quiserem, porém Thomas deve morrer.

– Tolo você em achar que nos juntaríamos a essa barbárie.

– Entende as consequências, meu caro?

– Não há consequências – falou Robert e encarou o monte de areia que ainda saía de dentro daquele monumento redondo. Era um olhar de ódio, mas, ao mesmo tempo, de medo.

A voz, então, mandou todos que estivessem lá matarem a família. Sandra e Robert arregalaram os olhos ao virem Sangrento começar a correr, e Grisalho e Bobalhão também correram com suas espadas em mãos. A única saída era se apressar para o carro, que parecia estar mais longe do que realmente estava. Os canhões estouraram, seus projéteis de luz vermelha eram lançados na direção dos Flintch, quebraram até o asfalto por onde passavam, jogando pedregulhos pelos ares. Logo a estrada toda foi tomada por uma linha de fumaça. Sandra e Robert, quando quase entraram no carro, fizeram os projéteis explodirem bem à frente, antes de encostá-los. Apontavam e os jogavam também para bem longe, como se as bolas de fogo batessem num escudo invisível e voassem para a escuridão entre as árvores.

A voz de Tertius entrava na mente do casal com xingamentos em outras línguas, eram ditos com um tom bastante rude. Possesso era pouco para o que ele falava com um som ardente de suas amígdalas em brasa que queimavam os tímpanos do Sr. e da Sra. Flintch.

Ao tocarem na maçaneta quente do carro, mais um barulho da boca de artilharia ecoou. O projétil do canhão chegou ao carro e o jogou para longe. A fumaça espalhou-se rápido e Robert, por um momento, sentiu-se aliviado em estar vivo, só que com o rosto coberto por fuligem. Balançava as mãos como um maestro, fazendo os corsarius rodopiarem para bem longe enquanto arrumava tempo de fugir de lá. Ele sabia que, se continuasse, não iria aguentar. O que não entendeu foi o fato de seus ferimentos terem desaparecido, talvez fosse a fuligem escondendo o sangue, todavia não doía nada. Ele olhou para o chão perfurado de crateras e viu Sandra morta, seu corpo permanecia esticado e imundo.

– Amor... Sandra, meu amor, está me ouvindo? – ronquejou, apoiado sobre ela.

Perder a pessoa que mais amou na vida era a última coisa que ele pensou que fosse acontecer, estavam tão animados com o jantar de casamento dos sogros e com o aniversário de Thomas na semana que ia começar que tudo passou muito rápido, principalmente a felicidade. Robert não sabia ainda nem que o sentimento que eles sentiam um pelo outro nem que a morte podiam acabar. Ele não ficou iludido com possibilidade alguma em poder ver a esposa viva, ele foi frio como se já soubesse que isso fosse acontecer.

Agora ele era um enfurecido maestro desordenado, regia uma música sem partitura, melodia odiosa que mandava montes e mais montes de corsarius para além das árvores num impacto invisível tão forte que os desmembravam em pleno ar. Um maestro é um chefe de um grupo, aquele que dita as regras, tem que coordenar seus subordinados. Robert, naquela hora, era um mestre sem batuta, apenas comandava seus poderes com os dedos.

Thomas chorava perto do pneu que estava em chamas. O Sr. Flintch apressou-se e segurou o filho como se fosse um tesouro antes que o manto que o envolvia pegasse fogo. Naquele momento, Robert sentiu uma pontada na sua nuca que o fez ajoelhar-se com o bebê no colo. Fechou os olhos e não quis pensar em nada. Sangrento o rondou com uma espada dourada, agora encostada na sua garganta.

– Acabe com eles – a voz ecoou novamente. O silêncio foi quebrado logo depois, quando sons de trovões iluminaram o céu negro. Surgiram algumas aves enormes de penas azuis cintilantes e bico torto para baixo. Muitos dos javalis que ainda espreitavam o céu sentiram uma intensa energia vinda das luzes que as envolviam, obrigando-os a pousar no asfalto. As lágrimas de Robert então lavavam a fuligem em seu rosto quando uma mão lhe foi oferecida para montar numa daquelas aves.

Thomas ainda não entendia o que estava acontecendo, contudo ele não parava de chorar. Todos os Flintch eram bem calmos, e essa foi uma característica que parecia infectar bem forte o bebê, porém ele sentia toda aquela situação como nenhum outro adulto poderia sentir. Quando subiu na ave, seu pai olhou para seu rostinho e começou a niná-lo.

Uma mulher estava montada no animal que socorreu Robert e Thomas, a mesma que lhe puxou para cima. Era a cunhada de Sandra e se chamava Haydee.

– Como soube que precisávamos de ajuda? – perguntou o Sr. Flintch, obcecado em proteger o filho.

– Ela nos ligou quando estava no carro agachada – explicou a mulher, conduzindo a ave. Tinha cabelos castanhos, curtos e ondulados. Um nariz espesso e boca fina.

Eram três pássaros, um deles voou por cima do corpo de Sandra, que estava esticado no asfalto, e o pegou com as garras. Robert e sua irmã olhavam para trás, fitavam a Sra. Flintch, que permanecia de olhos fechados e o rosto sujo. Quando as aves não podiam mais ver o disco voador de tão longe que estavam, as luzes azuis de suas penas se apagaram. Na escuridão da noite, dificilmente iriam encontrá-los novamente.




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