Um castelo de presente

بواسطة CeciAmaral

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Mariella não esperava herdar um castelo medieval italiano da noite para o dia. Ela estava ocupada demais tent... المزيد

apresentação
personagens
um
dois
três
cinco
seis
sete
oito
nove
dez
onze
doze
treze
quatorze
quinze
dezesseis
dezessete (final)

quatro

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بواسطة CeciAmaral


A visita ao vizinho que Mari planejava para o dia seguinte à sua chegada só foi acontecer quase uma semana depois.

Ela logo descobriu que cuidar de um castelo dá trabalho, mas que cuidar de uma criança que está super empolgada por morar em um castelo dá mais trabalho ainda.

Quando não estava na escola, Alonso parecia decidido a explorar cada canto da propriedade sozinho. Até o momento, ele quase tinha quebrado o pescoço ao escorregar de escadarias três vezes, se perdido nos subsolos que antigamente serviam como depósito de vinhos e alimentos duas e arriscado fraturar algum membro ao se empoleirar em esculturas de pedra cinco. E contando.

Mariella passava parte dos dias tentando transformar o castelo em uma casa limpa e decente e a outra metade correndo para cima e para baixo atrás do seu irmão como se estivesse em um desenho animado, tentando impedir que ele se matasse e ela ficasse de vez sozinha no mundo. Isso sem contar toda a burocracia envolvendo as reformas que - ela esperava - logo começariam, além das mil e outras coisas que precisava se preocupar para tornar a vida deles ali segura e minimamente confortável.

- Assim que as reformas acabarem, quero abrir parte do castelo ao público. Transformar em museu - ela disse em uma tarde enquanto preparava um bolo com Vitória na cozinha. Alonso, graças ao Senhor Jesus, estava na escola. - O Sr. Cipolla disse que é isso que a maioria dos herdeiros de propriedades históricas privadas acabam fazendo. Transformam os lugares em museus, pousadas, esse tipo de coisa. E também alugam as áreas externas para cerimônias de casamento e sessões de fotos.

- Legal! E deve dar uma grana boa.

- Mais ou menos. Eu teria que aprender a administrar o dinheiro, porque precisaria contratar funcionários, investir em infraestrutura, redes sociais e todo esse tipo de coisa. Não sei se levo jeito para isso.

Vitória sorriu e esfregou a bochecha, deixando uma mancha de farinha para trás.

- De escritora à empresária. Gostei.

- Talvez eu possa ser os dois.

Vitória passou um braço ao redor dos ombros da amiga.

- Você pode ser o que quiser.

Mari deu um beijo na bochecha dela.

- Eu te amo, sabia?

- Tô careca de saber.

Elas riram e Vitória foi tirar o primeiro bolo do forno. Tinham feito dois, um para que os três comessem mais tarde na sobremesa e outro para Mari levar até o seu vizinho misterioso.

- Tem certeza que é uma boa ideia bater na porta daquele mausoléu? - Vitória perguntou enquanto desenformava o bolo com cuidado.

- Se ele não quer ser educado, eu vou ser. - Mari cruzou os braços e se recostou na bancada de granito. - Ele já deve saber que o castelo tá ocupado. Não é possível que não tenha ouvido falar na cidade ou pelo menos visto às luzes à noite!

- Ele não parece ser do tipo que vai muito à cidade. Eu andei perguntando por aí enquanto fazia compras, mas ninguém fala muito sobre ele. É esquisito. Ele é esquisito. - Vitória colocou o bolo em um prato e escolheu um pano de bolinhas para cobri-lo. - Você ainda vê ele à noite pela janela?

- Todos os dias. Pelo menos os dias em que eu lembro que também sou escritora e que preciso entregar um manuscrito. Aí fico com um olho na tela e o outro na janela do meu quarto. - Mari suspirou, exasperada. - Por que ele só sai à noite? A gente nunca viu o cara durante o dia! É muito estranho.

Vitória fez uma careta.

- Vê se toma cuidado, Mariella. Eu sei que se você não for lá, não vai ter sossego nunca. Então entrega o bolo, dá uma boa olhada nele e volta depressa.

- Relaxa. Não é como se ele fosse um ser das trevas ou algo assim, né?

- Você bem queria que fosse. - Vitória olhou para a amiga e sorriu. - Você acha que eu não conheço essa sua cabeça? Toda essa história só tá te deixando ainda mais inspirada para escrever o livro.

Mari arquejou.

- Isso é um absurdo! Eu simplesmente quero ser uma boa vizinha gentil.

- Conta outra. - Vitória colocou o prato nas mãos dela. - Anda, vai logo.

- Você vai ficar bem aqui sozinha?

- É claro que sim. Vou desenformar o outro bolo e sair por aí pra fotografar. Sério, Mari, esse lugar é lindo demais! Meu Instagram tá bombando com as novas fotos. Pensei em conhecer as outras cidades da região um dia desses.

- Isso aí - Mari disse, empolgada pela amiga. - Você tá aqui pra isso mesmo. Vai explorar!

Vitória sorriu toda radiante e desejou sorte com o vizinho.

Se munindo de coragem e muito carisma, Mari deixou o castelo e seguiu pela grama rasteira e as elevações suaves dos campos daquela região até a casa enorme perto dali.

Quando a sombra da mansão se agigantou sobre ela, Mari precisou respirar fundo e esperar um pouco antes de subir as escadas de pedra que levavam a uma varanda grande e portas duplas requintadas. Ela viu seu reflexo distorcido na maçaneta dourada reluzente. Seus próprios olhos castanhos a encaravam com apreensão, a pele com certeza mais pálida que o normal.

De uma vez, Mari tocou o interfone ao lado das portas.

Ela esperou. Um momento atrás do outro.

Se balançou para frente e para trás, batucou as unhas que precisavam urgentemente ser feitas na base do prato e brincou com a série de brincos e piercings dourados que tinha nas orelhas.

Um segundo se arrastando até o outro.

Mari estava presente a tocar o interfone de novo quando o som inconfundível de passos a fez ficar parada no lugar. As portas foram destrancadas com um click e, ao contrário do que ela esperava, uma senhora baixinha, magra e com um coque tão apertado que dava dor de cabeça só de olhar, a atendeu com as sobrancelhas franzidas.

- Posso ajudar?

Mari engoliu em seco e abriu um sorriso amplo.

- Oi! Eu sou a Mariella, sua nova vizinha. Eu moro no Castelo Cavalieri, bem pertinho daqui. - Como uma idiota, ela apontou para a mais que visível construção no topo da colina. - Nós somos os vizinhos mais próximos, então quis vir me apresentar. Eu fiz um bolo de chocolate.

E Mari o estendeu para a senhora mais rápido do que se estivesse segurando uma batata quente.

A mulher olhou para o prato coberto como se ela tivesse oferecido larvas. O olho esquerdo de Mari começou a pular e seu sorriso foi se desfazendo aos poucos.

- Você é muito gentil, mas o dono da casa não come bolo de chocolate.

- Ah, então a senhora...

- Eu trabalho aqui.

Mari assentia devagar e repetidamente como aqueles cachorros com a cabeça móvel que algumas pessoas colocavam no painel do carro.

- Ele não gosta de bolo? - ela perguntou baixinho.

- Ele não come bolo.

- Ah.

Aquele "ah" foi o mais murcho da história dos "ah's".

- A senhora pode ficar com ele então - Mari ofereceu, implorando a Deus que, por favor, alguém só tirasse aquele prato dela e acabasse com todo aquele constrangimento.

A mulher hesitou, mas, por dó ou qualquer outra coisa, aceitou com um sorrisinho rígido.

- Obrigada.

Ela continuou ali parada na porta, não parecendo nem um pouco inclinada a convidar Mari para entrar. Os olhos da moça vasculharam o interior da casa atrás da senhora.

- Talvez eu possa preparar outra coisa que ele goste - ela tentou. - E então nós poderíamos nos conhecer.

- É muito gentil da sua parte, mas o Sr. Moretti é muito ocupado.

- É mesmo?

- Temo que sim.

Então o que o Sr. Moretti em questão estava fazendo no topo das escadas naquele exato momento, ouvindo toda a conversa com a maior calma do mundo, já que era assim tão ocupado?

A mulher notou o olhar de Mari por sobre o seu ombro e fechou mais a porta. Mari, que tinha visto só a parte inferior do corpo dele nas escadas daquela casa escura, o perdeu totalmente de vista.

- Obrigada pelo bolo - a senhora disse.

- Eu...

- Tenha um bom dia.

E então bateu a porta na cara dela.

O queixo de Mari despencou e ela ficou ali parada por alguns segundos, chocada demais para sequer piscar. Isso acabou mesmo de acontecer?

Ela deu às costas à mansão e saiu pisando duro, puta como não ficava desde o dia que Alonso derramou tinta no vestido favorito dela sem querer.

- Eu devia ter colocado laxante naquela droga de bolo - ela murmurou para si mesma como uma maluca, só para se lembrar que o Sr. Antipático, por algum motivo, não comia bolo de chocolate e então seu plano não adiantaria de nada.

Mari ainda estava amaldiçoando o homem que nem conhecia quando algo perto da mansão a fez parar.

Ela se aproximou devagar do animal caído na grama. Era um coelho selvagem cinza-escuro. Estava inteiro e parecia ter sido morto recentemente a julgar pelo estado de decomposição. Não havia nem uma só gota de sangue na grama.

Mariella se levantou e seu olhar varreu a região. Logo ali, havia outro coelho morto, no mesmo estado que o anterior. Ela seguiu a trilha de animais e também encontrou três esquilos que tinham partido daquela para uma melhor.

Um arrepio sinistro subiu pela espinha de Mari e ela se levantou depressa, não querendo ficar ali nem mais um segundo.

Logo, se viu correndo pelo campo até se refugiar dentro das paredes grossas e impenetráveis do castelo.

Mariella estava no hospital de novo. Naquele mesmo corredor lotado demais, esperando a notícia que ela não queria, mas sabia que ia chegar.

Os minutos se arrastavam. Ela queria ir pra casa, mas não sem a mãe. Estava tão assustada. Ela tentava parecer forte na maior parte do tempo, principalmente pelo irmão, mas a verdade é que quando ninguém estava olhando, Mari ficava paralisada de tanto terror.

Ela colocava a mesma palavra no Google de segundo em segundo, esperando que logo alguma notícia boa chegasse, que a vez da mãe estava chegando.

Mas as vacinas para a idade dela ainda não tinham sido disponibilizadas. O Brasil estava atrasado. Pessoas continuavam morrendo todos os dias.

- Mariella?

Ela se levantou da cadeira e viu o doutor que estava monitorando a mãe pela última semana. Ela o reconhecia pelos olhos verdes vívidos. Nunca tinha visto seu rosto sem aquela máscara. Mari também quase não via o seu ultimamente.

O doutor se aproximou, mas ainda mantendo uma distância considerável. Ele parecia querer tocar seu ombro, ou se sentar junto dela, mas mesmo com todas aquelas camadas de plástico os separando, as pessoas pareciam ter desaprendido a segurar umas às outras.

- Mariella, eu sinto muito. Infelizmente, ela não resistiu.

E o mundo foi desabando. Como um castelo de cartas que com um único sopro vai ao chão.

Ela só tinha vinte anos. Vinte anos e estava órfã. Vinte anos e teria que brigar na justiça pela guarda do irmão.

Mariella chorou, mas o som ficou entalado na garganta. Ela gritou, mas nada foi ouvido. Quando abriu os olhos, dois anos depois e a milhares de quilômetros de onde a mãe tinha dado o último suspiro, a fronha do travesseiro estava úmida de lágrimas.

Ela afastou as cobertas e se levantou. Havia se deitado às seis e meia depois de garantir que o irmão tinha tomado banho e jantado. Ela não planejava dormir, mas estava tão cansada.

Mari tinha apagado por duas horas, o suficiente para viver aquele mesmo pesadelo de novo e de novo até acordar. Quando desceu as escadas da torre, ouviu o som de risos de Vitória e Alonso. Ela passou pela sala que ficava mais no fim do corredor e viu os dois comendo pipoca e assistindo desenhos animados na TV, que era uma das únicas coisas verdadeiramente modernas daquele lugar.

Ela sorriu e decidiu não perturbá-los.

Mari estava com dificuldade para respirar. A sombra do sonho ainda estava sobre ela, a impedindo de pensar com clareza.

Eu tô dando o meu melhor, mamãe, ela pensou, como sempre fazia. Me perdoa se às vezes eu erro com ele. Me perdoa.

Ela deixou o castelo sem nem notar o que estava fazendo. Pegou um casaco grosso que tinha jogado numa mesinha do saguão de entrada e o vestiu sobre o pijama de moletom.

A noite estava fria, mas de um jeito bom. O ar puro era tudo que Mari precisava. Ela se afastou do castelo devagar e sem medo. De alguma forma, sabia que nada de mal poderia acontecer em um lugar tão pacífico. Se sentiu como a heroína de alguma novela gótica vitoriana, tomada por pensamentos sombrios e levada a explorar a natureza na calada da noite.

O pensamento a fez sorrir.

Mesmo quando estava no fundo do poço e apesar de tudo pelo que já tinha passado, Mari ainda conseguia romantizar a vida de vez em quando.

Sem perceber, ela acabou se afastando demais, descendo a trilha até chegar perto de Montefiori, com suas luzinhas charmosas e vida pacata. Mari já estava dando meia volta quando o vento soprou e pingos de chuva começaram a cair.

Merda.

Ela nem tinha notado os relâmpagos. O barulho dos trovões parecia distante demais para ela se preocupar.

Bem, ela devia ter se preocupado.

Mariella se apressou de volta para casa, tropeçando na barra do pijama e no terreno acidentado. A chuva estava engrossando, chicoteando seu rosto e ombros sem piedade.

Foi quando ela viu as ruínas do moinho abandonado a poucos metros dali. Já tinha reparado nele nas idas e vindas até Montefiori, e apesar de achá-lo sinistro - e consequentemente charmoso - nunca tinha se aproximado.

E foi então que a chuva desabou de vez.

Mari correu até o moinho, decidida a esperar o pior da tempestade passar para voltar pra casa. Os trovões caiam sobre a terra com estrondos e a água gelada fazia com que seu corpo doesse ao mínimo movimento.

Ela alcançou o moinho e se refugiou nas suas entranhas de pedra, tentando achar um pedaço do teto que estava inteiro e a podia abrigar da chuva. Mari não tinha certeza se era a ideia mais genial do mundo se esconder em uma construção visivelmente caindo aos pedaços durante uma tempestade, mas, pensando bem, aquela não seria a primeira das decisões estúpidas que ela tinha tomado ao longo do dia.

Mari se abraçou tremendo de frio, o cabelo acobreado grudado na testa e pescoço. Não havia nada de romântico naquela cena. Ela só sentia bem burra mesmo.

E foi naquele momento que Mari viu duas sombras se movimentarem nos fundos do moinho. Ela congelou, o coração quase saindo pela garganta. Por muito pouco não se humilhou ainda mais fazendo xixi nas calças.

- Quem tá aí?

Uma das sombras latiu, enquanto a outra sussurrou algo baixinho.

Mari se abaixou e tateou o chão desesperadamente, encontrando um pedaço de madeira velha que levantou sobre a cabeça.

- Eu tô armada! Não se aproxime.

- Eu não acho que precisamos apelar para a violência - uma voz masculina disse.

A sombra mais alta deu um passo na direção dela. Mari segurou o pedaço de madeira com mais força, mas bem na hora que ia descer o cacete na cabeça do desconhecido, seus olhos se adaptaram o suficiente à escuridão para distinguir os traços do rapaz diante dela.

Ele ergueu as mãos vazias em rendição e sorriu.

- Oi. Mariella, né? Desculpa. Não era assim que eu planejava conhecer a minha nova vizinha.

______________________♥️__________________

Oii, gente!! Como vocês estão?

Como de costume, temos capítulo novo no domingo <3 espero muito que tenham gostado desse! E desculpa pelo suspense no final, juro que a espera vai valer a pena. Vocês estão prestes a conhecer o Nico!

Esses dias estava brincando com IAs geradoras de imagem e salvei algumas fotos da Mari que a ferramenta gerou. Eu achei super legal e também fiz as do Nico, mas vou divulgar só no próximo capítulo kkkkk

Aqui, para quem quer uma ajudinha pra imaginar a Mari:

Eu sinceramente não sei porque colocaram ela de olhos azuis quando eu expliquei que eram castanhos, mas tudo bem kkkkk O cabelo dela também não é tão ruivo. Adicionem muitos brincos dourados nas orelhas e vocês têm a Mari completa!

Vejo vocês na semana que vem com o melhor capítulo do livro! Um beijo,

Ceci.

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