ARREBOL • JiKook

By K_M_R_Leda

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[HIATUS] >> Escrevendo em formato original Ano 2020, Jimin Park é fã irretratável de Arrebol, uma banda de r... More

◦ PRÓLOGO: Bilhete ◦
1 ◦ Sou um cara morto
2 ◦ A 5º Chama
3 ◦ Eu, penetra
4 ◦ Karaokês e Guitarras
5 ◦ Angela's Disco
7 ◦ Quebra-Cabeças

6 ◦ Halloween de 84

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By K_M_R_Leda

DOCES OU TRAVESSURAS?🎃🦋

Hoje teremos os dois, mas principalmente travessuras. Fiz este capítulo com a força dos deuses para conseguir entregá-lo nesta data específica, porque ela é importante para o Jimin de Arrebol, e vocês já vão descobrir o motivo. 

Não teremos tristeza no capítulo de hoje (no máximo um momento ali de depressão, como de praxe nos meus capítulos kkkkk). Peguem seus doces, liguem a playlist da fic, deixem um ⭐VOTO⭐(porque ele me incentiva muito) e BOA LEITURA!

#MariposaPunk

[ 6 ◦ Halloween de 84 ]

Era noite de 31 de outubro de 1984. Através da janela do apartamento que ganhei da gravadora, eu conseguia ver as ruas de Sant'Angela aglomeradas por pessoas fantasiadas, e lojas abertas enfeitadas com temática macabra. Não era muito diferente do cenário do futuro que eu conhecia, o clima de Dia das Bruxas pairava da mesma forma, com o mesmo vigor obscuro que todo mundo gostava. Só eu não me sentia no clima para festejar alguma coisa.

Já fazia algum tempo desde o ocorrido com o contrabaixo na premiação do Angela's Disco, mas aquela noite tinha deixado um gosto amargo dentro de mim que desde então vinha se mantendo preso em minha garganta.

Para resumir o que andava acontecendo, após eu ser oficialmente apresentado como novo membro ㅡ ou membro em período de teste ㅡ do Arrebol, passei a cumprir o mesmo cronograma da banda e, por conseguinte, a conviver com os integrantes dela em locais onde o nosso profissionalismo deveria prevalecer.

Por um lado, isso era bom, pois Jungkook e eu éramos mantidos separados por Namjoon para impedir o surgimento de qualquer discussão ou briga enquanto estivéssemos sob os olhares do público e da mídia. Sendo assim, fui poupado de ter que aturar algum comentário ou atitude sarcástica do vocalista que com certeza teria eliminado as últimas gotas de paciência que ainda existiam em mim. Mas eu confesso que gostaria de ter tido uma conversa franca com o moleque, ou pelo menos ter escutado algumas palavras de desculpa dele.

Mas quem eu estou tentando enganar?

Jungkook se desculpando comigo? Haha, quanta bobagem...

Pensando bem, ele teve sim a oportunidade de se retratar, e não o fez. Foi no dia em que seríamos entrevistados num programa de um canal de TV.

Estávamos no camarim escutando Cassandra Moura explicar quais as perguntas que seriam feitas para nós e como poderíamos respondê-las sem grandes receios, porque aparentemente aquele programa era confiável e prestigiado. Enquanto isso, a equipe de maquiagem e de estilistas faziam as últimas arrumações em nós, ajustando um cinto, um piercing ou um colar, e corrigindo uma mecha de cabelo fora do ângulo certo ou um lápis de olho borrado.

Quando acabou, dirigi-me até um palco móvel montado nos bastidores com os nossos instrumentos musicais, que estavam ali porque em algum momento da entrevista a banda seria convidada a tocar uma música. Já tínhamos testado tudo mais cedo numa breve passagem de som, mas eu queria ter certeza absoluta de que o meu baixo estava pronto para ser usado, então coloquei ele nos meus braços, conectei a um pedal e tirei alguns acordes.

Pouco tempo depois, notei a figura de Jungkook parado perto de mim, virado em minha direção com um olhar que eu não consegui interpretar.

Ele estava de casaco de couro preto ㅡ não o meu casaco do John Travolta, que, por sinal, ainda se encontrava sob a posse dele ㅡ, calças pretas apertadas e botas escuras. Basicamente as únicas coisas coloridas em seu corpo naquele momento eram os cabelos roxos, que tinham sido penteados para trás com boas camadas de gel, e os olhos verdes incisivos.

Jungkook parecia querer me falar alguma coisa, porque abriu a boca e depois fechou, e então abriu de novo, e fechou de novo. Repetiu isso umas três vezes antes de parar e franzir o cenho para mim.

Eu o encarei, esperando não sei o quê, e andei um passo na direção dele para impulsioná-lo a fazer o que tinha ido fazer ali.

Talvez lá dentro do meu cerne existisse uma parcela minha desejando fortemente que aquele garoto tivesse se aproximado para se desculpar. Então continuei fixando os meus olhos nele, em sua boca que se abria incerta, em sua respiração um pouco nervosa e em seu olhar hesitante.

Mas é claro que ele não fez nada disso. No final, Jungkook apenas cerrou os lábios num semblante de irritação, deu as costas para mim e saiu andando relaxado para longe.

Não voltamos a ficar tão próximos e a trocar olhares assim desde então, mesmo durante as demais atividades da banda que surgiram nos dias seguintes, como os ensaios fotográficos para a Stones Magazine, as entrevistas nas rádios de música e as reuniões com a gravadora Doors e produtores.

E foi de um jeito distante que continuei monitorando o garoto em suas saídas noturnas. Jungkook não ia mais a locais suspeitos falar com pessoas ainda mais suspeitas. Às vezes ele só visitava uma locadora de filmes ou discos, ou ia beber em algum bar mais reservado, sempre sozinho. Essa mudança de ares foi ótima para mim, porque não precisei intervir em nada e, por conseguinte, não voltei a fingir que éramos algo como amigos.

Tecnicamente, as coisas se encontravam estáveis e poderiam continuar assim. Eu deveria estar levemente satisfeito, então não sei bem a razão que me levou a preferir o isolamento do meu apartamento e uma maratona de filmes em fita VHS da trilogia Star Wars, a uma saída naquela noite para experimentar o Halloween dos anos 80.

Minha atitude também deve ter soado tão estranha vista de fora, que o meu guia espiritual ㅡ o qual havia ficado sumido por quase um mês inteiro ㅡ surgiu em sua forma masculina e se sentou no sofá de frente para a televisão onde passava uma cena de "O Império Contra-ataca".

ㅡ Que bela festa de aniversário, Garotão. Só você, um balde de pipoca e um filme esquisito sobre guerra espacial ㅡ disse ele, arqueando uma sobrancelha para mim, num semblante inquisitivo. ㅡ Hoje é seu aniversário mesmo, não é? 31 de outubro...

Eu dei de ombros e enchi minha boca com uma porção de pipoca. Depois de mastigar e engolir, falei com um tom brincalhão de indiferença:

ㅡ Já estou morto, porque eu comemoraria um aniversário?

ㅡ Nossa, quanta morbidez! ㅡ Jin riu e roubou umas pipocas para si. ㅡ Se bem que combina com o clima de Dia das Bruxas...

Ele passou um momento saboreando-as em silêncio, encarando a tela da TV com um olhar distante. Nestes entrementes, reparei em algo estranho nele, em sua calmaria anormal e na ausência de brilho ofuscante em suas roupas.

ㅡ Onde esteve todo esse tempo? ㅡ perguntei, curioso. ㅡ Passei por um perrengue sem sua ajuda, sabia?

Jin sorriu.

ㅡ Estive fazendo alguns trabalhos e andando por aí em diferentes épocas... ㅡ Ele deu de ombros, mas eu percebi que estava tentando não se aprofundar muito em sua resposta.

Acho que não conseguiu fazer isso, porque, depois de uns segundos, acrescentou:

ㅡ Eu queria ver se era mesmo verdade aquilo que me disse sobre pessoas iguais a mim existirem, então dei uma olhadinha no futuro. ㅡ Uma risada anasalada atravessou os seus lábios carnudos. ㅡ O que encontrei foi um achado interessante.

ㅡ O que encontrou?

ㅡ Uma resposta afirmativa para uma pergunta que fiz certa vez ㅡ respondeu, enigmático, e voltou a roubar uma porção das minhas pipocas.

Perguntei-me naquele instante se algum dia eu iria descobrir alguma coisa concreta sobre a mariposa fantasma sentada ao meu lado.

ㅡ Agora chega de falar sobre mim. ㅡ Jin bateu as mãos, chamando a minha atenção. ㅡ Diga-me a verdade. Porque está entocado em casa na noite do seu aniversário?

ㅡ Eu só não estou muito na vibe de comemoração... Prefiro ficar vendo Luke Skywalker lutando contra o Darth Vader. ㅡ Apontei para o televisor, no qual passava uma cena de batalha.

ㅡ Nananinanão. Fale a verdade! Ou você prefere que eu invada essa sua cabeça vermelha para descobrir o que se passa aí dentro? ㅡ Ele puxou uma mecha do meu cabelo.

ㅡ Ai! ㅡ resmunguei. ㅡ Ah... Sei lá! Só ando meio incomodado.

ㅡ Incomodado com o quê? Com a missão? Com alguém específico? Talvez com Jungkook? Eu vi o que aconteceu, inclusive. O caso do baixo com defeito foi sacanagem, aliás.

ㅡ Como viu? Você estava lá sem eu saber?

No. Eu vi pelos monitores do RH celestial. Transmissão direta e sem fio, alta tecnologia divina. ㅡ Ele encarou as unhas da mão. ㅡ Afinal, é por causa da situação com o baixo que você ainda está chateado?

ㅡ Mais ou menos... ㅡ Respirei fundo. ㅡ Depois daquele golpe baixo durante a premiação... Eu passei a me perguntar se Jungkook é só um moleque egoísta que gosta de ser famoso e que não se importa com ninguém de verdade.

ㅡ Hmmm, acha que isso vai interferir na sua missão?

ㅡ Não, só estou dizendo que é... uma merda ele ser assim. ㅡ Comi mais algumas pipocas e fiz uma careta quando senti o caroço de uma delas entre os meus dentes. ㅡ Além disso, também tem o fato de que ele agora está cem por cento certo sobre eu ser um infiltrado da Doors para acabar com a carreira dele. Ter o meu caráter questionado desse jeito me deixa irritado, entende?

ㅡ Hmmm.

ㅡ Não que eu ligue totalmente para o que ele acha de mim.

ㅡ Hm.

ㅡ É como se o meu progresso tivesse ido pelo ralo. E eu nem fui o errado da situação! Até hoje nunca recebi um pedido de desculpas dele.

ㅡ Hmm.

ㅡ Por que só está murmurando "Hmmm" pra mim? ㅡ Fechei a cara para Jin.

ㅡ Porque você parece precisar mais de um ouvinte do que de um comentarista. ㅡ Jin roubou meu balde de pipoca e começou a devorá-lo. ㅡ Mas agora eu vou opinar... Não deveria gastar suas preciosas horas na forma humana com um filme infantil de super-heróis....

ㅡ É Jedi e Sith. Não tem super-herói nenhum. E o poder deles é a Força, que é um lance filosófico ondeㅡ

ㅡ Certo! Certo! Enfim, não desperdice as horas com um filme. De qualquer maneira, é o seu aniversário, Garotão. Pense só, hoje é Dia das Bruxas, você é um meio-vivo... o conceito super combina.

ㅡ Isso era para ser um incentivo? ㅡ Minha cara se fechou numa careta.

ㅡ Pode ser. Você se sentiu incentivado?

Fiquei calado e voltei os meus olhos para o filme. A minha animação ainda estava alguns níveis abaixo de zero. Era provável que dali a alguns minutos eu fosse para a minha cama dormir.

ㅡ Tudo bem! ㅡ O meu guia espiritual se levantou de repente do sofá, levando as pipocas consigo. ㅡ Aqueles que vão chegar agora provavelmente terão mais poder de influência para tirar essa sua bunda do sofá do que eu.

ㅡ "Aqueles" quem? ㅡ Franzi o cenho.

Como num passe de mágica, escutei batidas na porta da frente.

ㅡ Até depois, Garotão. E feliz quase-aniversário! ㅡ disse Jin, um segundo antes de desaparecer no ar junto com o meu balde de pipoca.

Assim que fiquei sozinho de novo, encarei a porta e andei até ela um pouco hesitante.

Eu morava num apartamento localizado num condomínio fechado. Não era tão elegante quanto as moradias de Namjoon e de Jungkook, mas ainda assim tinha porteiro, interfone e outras burocracias do tipo, então como alguém poderia ter ido até a minha porta sem eu ser avisado previamente? A curiosidade ㅡ e minha falta de precaução resultante do fato de eu não ser mais um humano normal ㅡ falou mais alto e me fez girar a maçaneta.

Levei um susto quando me deparei com duas máscaras do Jason de Sexta-Feira 13.

ㅡ FELIZ ANIVERSÁRIO! ㅡ Eram as vozes de Hoseok e Taehyung.

O mascarado que supus que fosse Hoseok jogou confetes em cima de mim e ficou repetindo "Feliz, feliz, feliz, feliz aniversário". O outro se concentrou em equilibrar um bolo decorado com caveiras, sangue falso e uma vela acesa no formato de osso, enquanto adentrava o meu apartamento.

ㅡ Pegamos você de surpresa? ㅡ perguntou Taehyung, após deixar o bolo em cima da mesa da sala de estar e erguer a máscara, revelando o seu rosto sorridente.

ㅡ Si-sim... ㅡ Dei tapinhas na minha cabeça para limpar os confetes. Um sorriso tímido começou a se abrir no meu rosto. ㅡ Pensei que estivessem na gravadora. Ontem Namjoon falou que hoje teriam algo a tratar lá.

ㅡ Só ele e o Yoongi precisaram ir ㅡ explicou Hoseok enquanto ia até a minha geladeira para colocar lá dentro algumas garrafas de cerveja e de refrigerante que havia trazido numa sacola por baixo da fantasia de Jason.

ㅡ Oh... E como vocês passaram pelo porteiro? ㅡ perguntei, aproximando-me da mesa para admirar o bolo.

ㅡ Ele conhece a gente. Morávamos aqui no início, por isso ele sabe que não somos assassinos de verdade, hohoho! ㅡ Taehyung colocou a máscara de volta e fingiu que iria me estrangular.

ㅡ Ah, haha. ㅡ O meu sorriso cresceu.

ㅡ Qual é, cara? Por que não avisou a gente sobre o seu aniversário ser hoje? ㅡ reclamou Hoseok depois de envolver o meu pescoço com o seu braço, fingindo um mata-leão em mim. Seu punho também pressionou a minha cabeça, bagunçando os meus cabelos.

ㅡ Tecnicamente a culpa não é do Jimin, porque todos nós vimos a ficha dele durante a competição, e lá tinha a data do aniversário. ㅡ O baixista o cutucou e depois se virou para mim. ㅡ A gente descobriu que era hoje porque eu estava dando uma olhada na nossa papelada da viagem.

ㅡ Viagem? ㅡ Olhei de um para o outro, um pouco confuso.

ㅡ Sim, para a gravação do videoclipe do próximo single da banda.

ㅡ Ah, sim... ㅡ murmurei, achando-me ridículo por ter esquecido daquilo por um momento.

Tínhamos tratado sobre esse assunto na última reunião com a gravadora. Era algo importante e incrível, mas a minha cabeça naquele dia estava um pouco dispersa e talvez o culpado fosse Jungkook sentado na cadeira de frente para mim, encarando-me o tempo inteiro como se tivesse algo no meu rosto.

Aliás, onde o vocalista estaria naquele momento? Hoseok e Taehyung não citaram o nome dele nenhuma vez... Bem, tanto faz. Como Jin havia dito, aquela era a minha noite e ela não deveria ser desperdiçada, então eu iria pensar só em coisas legais.

ㅡ Vamos viajar... ㅡ Um pico de adrenalina se acendeu no meu peito de súbito, e se misturou a uma profusão de alegria e receio.

Alegria porque eu amava coisas como viajar em grupo, e porque ter uma experiência do tipo com o Arrebol para gravar um clipe de um single era como a realização de um sonho fodidamente foda.

E receio porque, durante viagens assim, todo mundo costuma ficar junto o tempo inteiro. Em algum momento eu precisaria me isolar para que ninguém visse o meu outro lado.

ㅡ O local das gravações já foi decidido? ㅡ eu quis saber.

ㅡ Não, mas ouvi o Yoongi comentando algo sobre cânions. Vamos ter certeza na reunião da próxima semana ㅡ disse Hoseok, dedando o meu bolo com sutileza para roubar um pouco do glacê vermelho.

Logo sua mão ganhou um tapão de Taehyung.

ㅡ Espera o Jimin apagar a vela, antes de sair molestando o bolo.

ㅡ Foi mal. Foi mal.

Diante da cena, eu soltei uma risada alta.

ㅡ Obrigado, pessoal. Obrigado pelo bolo e por terem vindo aqui ㅡ falei, sinceramente grato. A falta de ânimo de antes tinha sumido completamente.

A dupla começou a cantar "Parabéns pra você" e, quando acabou, eu me inclinei para assoprar a vela. Hoseok e Taehyung aplaudiram com uma gritaria exagerada e engraçada, e os dois voltaram a jogar confetes em cima de mim. Depois disso, cortamos o bolo, abrimos as garrafas de cerveja e de refri, fizemos uma nova leva de pipocas e nos sentamos ao redor da televisão para vermos Luke Skywalker salvando o universo das mãos do Império Sith.

Nesse meio tempo, as luzes do filme começaram a ficar estranhamente engraçadas. Após uma breve análise do sabor da massa do bolo ㅡ que até então estava ocultada pelos aromas intensos da cobertura e do recheio ㅡ, concluímos que um certo guitarrista havia adulterado o chocolate com o que eu chamaria de "especiarias verdes".

Acabamos entrando numa guerra de comida contra Hoseok, com todo mundo se encolhendo de rir e vendo o teto girar feito um carrossel.

Acho que em algum momento Taehyung subiu no sofá com uma vassoura em mãos e tentou recriar uma luta Jedi com o abajur da sala. Lembro também de ter visto Hoseok chorando porque estava com saudades de Yoongi, sendo que ele tinha visto o empresário poucos momentos antes de visitar o meu apartamento. Enquanto isso, eu me concentrei para não surtar e acabar me transformando sem querer numa mariposa na frente daqueles caras ㅡ se bem que, se isso tivesse acontecido, acho que nenhum dos dois iria estranhar, porque estavam muito alucinados.

Em determinado momento, o telefone da mesinha da sala começou a tocar. O som dele me deixou em transe por alguns segundos. Fiquei encarando o fio enrolado e o brilho que piscava no aparelho, e me perguntei como um negócio tão antiquado conseguia fazer tanto barulho.

Na segunda vez que tocou, eu despertei um pouco e me movi para atender a chamada. A sensação fria do telefone contra o meu ouvido me deixou disperso até o momento em que a voz de Namjoon soou insistente do outro lado da linha.

Tem alguém aí?? ㅡ O líder do Arrebol parecia nervoso.

ㅡ Hm, oooi! Tem eu aqui. ㅡ Tentei impedir minha voz de sair arrastada demais, mas acho que não mudou muita coisa.

Jimin? O que aconteceu? Você está bêbado?

ㅡ Hmmm, um pouquinho.

Ou está chapado?

ㅡ Hm, hehe.

Entendi. ㅡ Escutei uma risada. ㅡ Feliz aniversário, cara.

ㅡ Valeu.

Taehyung e Hoseok tinham dito que iam passar na sua casa. Eles estão aí? Posso falar com eles?

ㅡ Eles estão aqui, mas... Hm... ㅡ Olhei para Taehyung e vi que ele agora abraçava o abajur enquanto murmurava alguma coisa sobre a Força dos Jedi. Hoseok já tinha se entregado ao sono em cima do sofá e roncava. ㅡ Acho que eles não são capazes de ter uma conversa normal no momento.

Sei, ah... ㅡ Namjoon suspirou pesadamente. ㅡ Você sabe me dizer se o Jungkook passou aí? Ou se ele entrou em contato com um dos rapazes?

A menção do nome do vocalista fez um lado do meu cérebro despertar.

ㅡ Jungkook não veio aqui, e ninguém falou dele. Aconteceu alguma coisa? ㅡ Pressionei o telefone contra o meu ouvido.

ㅡ Não aconteceu... Quer dizer, eu não sei. Ah, esqueça o que eu falei. Continue aproveitando a sua festa, cara.

ㅡ Namjoon... ㅡ A chamada já tinha sido encerrada quando terminei de dizer o nome dele.

Depois disso, passei longos minutos encarando o telefone e escutando o BIP abafado.

Com a mente torpe, devolvi o aparelho à base de apoio, girei o meu corpo uns 180 graus e caminhei de forma mecânica até a porta ligada à varanda, onde Taehyung estava encostado, sentado no chão e abraçado ao abajur.

Quando me sentei ao lado dele, encarei o piso de porcelanato marrom e fiquei repassando as palavras de Namjoon em minha mente num ciclo sem fim de voltas e voltas.

Jungkook estava sumido? Se não estivesse, Namjoon não teria ligado para cá. Foi por isso que ele não veio? Ele entrou em problemas de novo? Ele desapareceu? Algum paparazzi vai encontrá-lo antes de nós... Se a Doors souber disso, ele será prejudicado... Hm... Eu não deveria ter comido aquele bolo.

ㅡ Taehyung... ㅡ chamei baixinho, um pouco grogue. ㅡ Você sabe onde o Jungkook está?

ㅡ Hmmmmm. ㅡ O baixista contraiu os olhos. Suas pupilas dilatadas estavam em outra dimensão. ㅡ Não sei não.

ㅡ Namjoon está procurando por ele.

ㅡ Eu também procurei por ele hoje... antes de vir para cá. Ele não estava no apartamento dele. ㅡ De repente, balançou os ombros. ㅡ Bem, era normal nessa época.

ㅡ Por quê?

ㅡ Estamos livres da agenda de shows e acabamos as entrevistas... Jungkook costumava ir para casa nesse tempo.

ㅡ Para qual casa?

ㅡ Da família dele, eu acho. Ele tem essa tia... Aquela mulher esquisita que encarava a gente como se fôssemos um bando de drogados. ㅡ Passou um instante, e então Taehyung desatou a rir. ㅡ Se bem que, neste momento, nós somos exatamente isso.

Uma gargalhada saiu de mim sem que eu pudesse controlá-la.

ㅡ E-então o Jungkook está com a família... Mas por que o Namjoon ligou para cá perguntando sobre ele?

Taehyung não respondeu. A mente dele devia estar em algum lugar fora do alcance.

Sua cabeça de repente pendeu para o lado e se encostou no meu ombro. Senti um arrepio com aquela proximidade, e com a respiração quente dele próxima ao meu pescoço. As sensações do meu corpo estavam muito afloradas naquele momento, o que não me ajudava em nada.

ㅡ Sinto falta da Mercedes... ㅡ Escutei ele murmurar.

ㅡ Mercedes? O seu carro? ㅡ Meus pensamentos vagaram até o carro que provavelmente devia estar estacionado ao lado do meu condomínio.

Minha resposta fez Taehyung abrir um sorriso misterioso .

ㅡ É. Mercedes, o meu carro. ㅡ Seus ombros chacoalharam com uma risada. ㅡ Mercedes é um nome muito bonito para um carro, não é?

ㅡ É... eu acho.

Ele passou a rir com mais intensidade, e então bagunçou os meus cabelos num gesto amigável que me deixou um pouco tocado demais.

ㅡ Você é muito fofo, Jimin, sabia? Fofo, bonitinho e genial... Se fosse uma menina, eu iria gostar de você de um ooooutro jeito ㅡ disse, arrastando as palavras.

Eu tinha certeza de que o meu rosto, naquele momento, era a epítome da cor vermelha. Ainda bem que Taehyung estava chapado demais para pensar profundamente sobre o que a minha reação corporal às palavras dele significava.

ㅡ Só se eu fosse uma menina? ㅡ sussurrei, escondendo o rosto.

Não obtive resposta. Pensei que talvez tivesse falado baixo demais, então olhei de soslaio, buscando o olhar dele para ter certeza da minha hipótese. Encontrei um rapaz adormecido apertando o meu abajur como se fosse um bebê.

Exalei um suspiro de derrota.

ㅡ Pare de pensar em coisas ridículas, Jimin... ㅡ murmurei para mim mesmo.

Agora o meu apartamento se encontrava mergulhado num silêncio profundo, já que os filmes haviam acabado e os meus dois visitantes dormiam.

Olhei para o meu pulso onde jazia o temporizador e vi que ainda me restava umas três horas na forma humana.

Minha mente dispersa voltou a ser atravessada pelas palavras preocupadas de Namjoon, e o suposto sumiço de Jungkook de repente martelou em meu cérebro.

ㅡ Esse garoto me paga... ㅡ falei, levantando-me do chão.

Onde ele poderia estar? Talvez num dos bares que andou visitando nos últimos tempos. É... O movimento no centro da cidade provavelmente o ajudou a desaparecer das vistas do líder do Arrebol. Eu poderia passar as próximas horas procurando por Jungkook e, quando o encontrasse, iria usar algum orelhão para entrar em contato com Namjoon.

Com essa ideia em mente, dirigi-me à varanda pronto para me transformar e alcançar voo. No entanto, assim que saí do interior do apartamento e senti uma brisa fria envolvendo o meu corpo, algo me veio de repente, uma memória trazida por um surto de um cérebro ébrio.

A memória me fez travar e olhar para trás na direção de um calendário pendurado na parede da sala. Encarar as datas expostas por números numa fonte chamativa reorganizou a minha mente e provocou uma epifania em mim.

Imediatamente reordenei a minha rota, porque agora eu sabia onde Jungkook estava, e a minha ida até ele tinha que ser a mais rápida possível.

Logo em seguida, saltei da varanda e fui pego pelos ventos noturnos que me ajudariam a chegar aos subúrbios de Sant'Angela.

🎤🦋🎤

Eu o encontrei uma rua depois do ancestral de um estabelecimento que cheguei a frequentar entre 2015 e 2017. O local estava deserto, exceto por alguns pedestres que passavam por ali discretamente com o desejo de não serem vistos por ninguém.

Jungkook jazia no chão, encolhido e encostado num hidrante, segurando frouxamente uma garrafa de vodka e dormindo como se aquele fosse o lugar mais confortável do mundo. Ele se escondia por baixo de calças e casaco preto, a falta de boa luminosidade naquele ponto favorecia para que ninguém o reconhecesse. Mas eu reconheci assim que o vi.

Pousei no colo dele e encarei seu semblante bêbado. Suas bochechas estavam vermelhas, seus lábios, entreabertos. Havia um rubor ao redor de seus olhos, e umidez grudando seus cílios. Ele tinha chorado? Nunca o vi chorar, parecia estranho pensar em Jungkook se deixando levar por um estado tão grande de vulnerabilidade. Não combinava com a imagem que eu tinha dele na minha mente.

De repente, o garoto se remexeu e abriu os olhos um pouco, piscando torpe. Suas íris verdes se fixaram em mim, provavelmente atraídas pelas minhas asas vermelhas. Pensei que fosse se assustar, então me preparei para voar, mas Jungkook só moveu um dedo até mim e acariciou-me com cuidado, como se ainda restasse alguma sobriedade em sua cabeça bêbada.

Talvez ainda não tivesse bebido tanto. Olhando bem agora, a garrafa de vodka estava praticamente cheia.

Internamente, suspirei de alívio. No fim das contas, eu tinha evitado o pior.

Acontece que, momentos antes, quando olhei para o calendário no meu apartamento, a data 2 de Novembro chamou a minha atenção e fez a minha memória trabalhar.

2 de Novembro de 1984, eu lembro bem... Havia uma manchete chamativa num jornal velho que fora impresso nesse dia, e que, durante a minha adolescência, encontrei estampando uma folha inteira de um livro biográfico sobre o Arrebol. Pode parecer estranho eu me lembrar disso, principalmente porque um livro assim tem muitas páginas, muitas imagens e muitas informações, mas como eu poderia me esquecer da data que marcou a cena musical de Sant'Angela e do resto do país? Nesse dia, o garotinho rebelde amado e odiado por todos havia sido encontrado desacordado num beco daquelas redondezas, depois de ter sofrido um coma alcoólico.

Dali a dois dias isso iria acontecer.

Quero dizer, não iria mais. Não comigo ali.

Jungkook parou de me acariciar e voltou a fechar os olhos. Imaginei que ele fosse dormir para valer dessa vez.

Aproveitei a deixa para me transformar de volta num humano. Depois que o fiz, fiquei parado diante dele, agachado, observando-o atentamente.

ㅡ Por que fica fazendo isso com o seu corpo? ㅡ murmurei, um pouco melancólico.

Por mais que ele tivesse sido um canalha comigo, aquilo ainda me deixava desconfortável. Às vezes, parecia que Jungkook não tinha intenção de ter algum zelo por si mesmo, e isso me fazia voltar ao meu passado, ao período em que quase me matei.

Passei a analisá-lo, rolando os olhos pelas suas tatuagens à mostra, pelos cabelos roxos bagunçados e pelo rosto sereno que, naquele momento, transmitia um ar mais jovial. Ele era muito bonito, muito mesmo, mas, no dia a dia, essa beleza se apagava de alguma forma.

Soltei um suspiro.

ㅡ Tenho que avisar o Namjoon que te encontrei ㅡ sussurrei.

Em seguida, olhei ao redor em busca de algum orelhão ou cabine de telefone. Não encontrei nenhum. Concluí que precisava sair dali para ir em busca de um, mas não gostei da ideia de deixar Jungkook sozinho de novo. Se ele não acordasse, eu teria que arrastá-lo comigo...

Acabou não sendo necessário, porque, nesse momento, um trio de drag queens passou rindo alto pelo beco, indo em direção a um pub localizado nas proximidades. O barulho fez Jungkook despertar assustado.

Assim que ele me viu, arregalou os olhos, soltou um grito mudo e arremessou a garrafa de vodka na minha direção.

Eu desviei no último segundo.

A garrafa acertou a parede do outro lado. O impacto quebrou a tampa e fez o álcool se derramar inteiro no chão.

Achei isso ótimo.

ㅡ Ah, é você? ㅡ A voz de Jungkook saiu um pouco grogue. Ele deu de ombros, se virou para o outro lado e agiu como se estivesse se preparando para dormir outra vez.

ㅡ Não, não. Você não vai dormir aqui de novo.ㅡ Puxei o pé dele, desequilibrando-o e fazendo-o cair de cara no chão.

Jungkook soltou um arquejo abafado, e então ficou quieto, indicando que iria dormir daquele jeito mesmo.

Eu me levantei com raiva ㅡ com o cérebro chapado dando algumas voltas ㅡ e dei um chute em suas pernas.

ㅡ Acorda. Vou te levar para casa ㅡ falei, irritado.

ㅡ Eu posso ir para casa sozinho...

Apertei minhas têmporas.

ㅡ Tenho que ligar para o Namjoon, porque ele está atrás de você. Preciso que venha comigo, Jungkook. Não posso te deixar aqui desse jeito.

Jungkook manteve-se calado e não se mexeu.

Soltei um suspiro audível.

Com vontade de desistir e jogar tudo para o alto, olhei para cima, pedi paciência para qualquer entidade divina que estivesse me vendo naquele momento, e me sentei naquele chão imundo ao lado do vocalista.

ㅡ Sinceramente, depois do que você fez comigo, eu deveria só te largar aqui e ir sozinho ㅡ murmurei, apoiando a minha testa num joelho dobrado.

Passou-se um segundo.

Jungkook se arrastou até ficar sentado a poucos centímetros de mim. O cheiro de álcool o cobria, junto com perfume cítrico. Senti um leve alívio por não captar nenhum odor fumacento de cigarro ali no meio.

Olhei para ele pelo canto do olho. O garoto me encarava com um semblante ébrio, distante e enigmático.

ㅡ É só ir. Ninguém vai te impedir ㅡ balbuciou com um sorriso bêbado.

ㅡ Eu não vou sem você, nem que seja preciso te colocar nas minhas costas.

Ele balançou a cabeça e pendeu um pouco para o lado.

ㅡ Por que ainda age assim? Não faz sentido nenhum... Eu fiz uma canalhice contigo naquele dia... ㅡ Suas palavras saíram arrastadas, nasais e um pouco emboladas. Eu quase conseguia ver seu cérebro lutando para formar frases inteiras e inteligíveis.

ㅡ Pelo menos reconhece que foi canalhice ㅡ resmunguei.

Jungkook riu de um jeito amargo.

ㅡ Não era pra ter sido... daquele jeito. ㅡ Ele passou a língua nos lábios, sua boca devia estar seca pelo álcool.

ㅡ E como era pra ser? O baixo deveria explodir em mim ou algo do tipo? ㅡ questionei, e também lambi meus lábios. Aquele bolo adulterado tinha secado a minha boca completamente.

O vocalista negou com a cabeça num gesto incisivo. O movimento o fez cair para frente, em total desequilíbrio. Precisei me aproximar e segurá-lo pelo peito. Senti o calor do corpo dele através do tecido da camisa que ele vestia por baixo do casaco, e a respiração pesada pressionando os meus dedos.

ㅡ Eu pensei que o Tae iria verificar o seu baixo antes de você subir na... na bosta do palco. Pensei que tinha dado tempo para trocar aquele troço... ㅡ disse baixinho. Seus olhos desfocados encaravam o chão. ㅡ Era para ter sido só uma zoação... Um aviso ridículo para você não trair a gente com a Doors.

ㅡ Seu aviso me custou um constrangimento a nível nacional. ㅡ Abri um sorriso amarelo. ㅡ Não foi nada profissional da sua parte.

ㅡ É... ㅡ Ele expirou o ar dos pulmões. ㅡ Às vezes eu tenho esses surtos de amador, meu cérebro... puff... uma zona completa. Entendo porque eles me odeiam tanto. ㅡ Riu baixinho, um pouco engasgado.

Franzi o cenho e levantei sua cabeça devagar para encará-lo. Lá estava, despontando de seus olhos, uma melancolia estranha. Eu já tinha visto ela antes, mas agora parecia mais miserável, como se o álcool tivesse aberto uma brecha para deixar as coisas mais aparentes.

ㅡ Naquele dia da entrevista no programa de TV ㅡ ele começou a dizer, seus olhos fixos em mim ㅡ, eu te vi testando o seu contrabaixo antes de... entrarmos no ao vivo. Naquela hora eu queria ter dito alguma coisa. Hmmm, eu queria ter dito... ㅡ Suas pálpebras se fecharam e se abriram, vagarosas, ébrias e trêmulas. Então ele completou sua fala: ㅡ Sinto muito, Jimin Park.

Levei alguns segundos para processar o que ele estava me dizendo.

Jungkook tinha me pedido desculpas. Desculpas sinceras, bêbadas e que claramente estavam presas na garganta dele há dias.

Achei isso engraçado. Tudo estava engraçado demais dentro da minha cabeça e do meu peito, porque nada fazia sentido. Acabei soltando uma risada.

ㅡ Para chegar ao ponto de me pedir desculpas, significa então que você está muito bêbado mesmo ㅡ murmurei depois de parar de rir.

Ele caiu para o lado novamente, e dessa vez parecia que iria se entregar totalmente ao sono.

ㅡ Ah, não. Não! Pode acordar! ㅡ Eu o chacoalhei com força. ㅡ Anda! Precisamos achar uma cabine telefônica.

ㅡ Hmmm...

Com um pouco de tontura, levantei-me e comecei a puxá-lo. Seu corpo pesado, junto ao meu atual estado de desequilíbrio, quase me derrubou. Precisei me concentrar para colocar o braço dele ao redor do meu pescoço e impulsioná-lo para cima de um jeito que ficasse em pé.

Consegui na segunda tentativa.

ㅡ Certo. Pelo menos tenta caminhar ㅡ pedi, ajeitando-o contra o meu corpo.

No fim, saímos andando pelo beco tropeçando em nossos próprios calcanhares. Atravessamos uma rua estreita cheia de bares e pubs até chegarmos a uma maior na qual avistei uma cabine. Chegando lá, agradeci ao ver uma lista telefônica numa superfície de apoio. Nela continha o número de algumas empresas da cidade, e entre elas estava o da Doors.

Com minha mão livre, enfiei algumas moedas no aparelho de telefone e apertei o conjunto numérico. Após alguns bips, uma funcionária me atendeu.

Expliquei a situação e me identifiquei, então ela me passou para um superior, que me transferiu para outra pessoa, até chegar em alguém que finalmente me deixou falar com Namjoon. Eu entendia que a burocracia era necessária para proteger os artistas de assediadores, mas, poxa... Que saudades de um celular com a possibilidade de mandar uma mensagem direta...

Jimin? ㅡ A voz de Namjoon soou do outro lado da ligação.

ㅡ Oi, então... Eu achei o seu menino perdido. Ele estava, haha, bebendo com a sombra dele. Hm, na verdade é o Peter Pan que tem uma sombra esquisita. Esqueça o que eu falei. Eu sou o Peter Pan, e achei o seu menino perdido ㅡ falei. Meu cérebro já estava indo pelos ares.

Você está tentando me dizer que encontrou o Jungkook?

ㅡ É... Isso aí. ㅡ Olhei para o vocalista. Ele tentava se apoiar no vidro da cabine enquanto pressionava a testa contra a porta e se curvava inteiro.

Ah! ㅡ Deu para sentir o alívio de Namjoon. ㅡ Obrigado, Jimin. Nossa... Olha, daqui a pouco eu vou dar uma passada na casa dos meus pais. Você pode trazê-lo? Vou mandar um motorista para buscar vocês.

ㅡ Casa dos seus pais? ㅡ Arqueei as sobrancelhas.

Eu nunca tinha visto os pais do Namjoon, eles eram bastante reservados quanto a aparições públicas. Seria emocionante conhecer o casal que adotou e cuidou do líder do Arrebol.

Estava prestes a dizer sim para a pergunta de Namjoon, quando Jungkook de repente se virou com a face pálida e tentou tirar o telefone de mim.

ㅡ Não... ㅡ murmurou, como se não quisesse ser escutado pelo colega baterista.

Coloquei uma mão sobre o receptor de áudio do telefone.

ㅡ O que foi?

ㅡ Ele quer... ich... que eu vá para a casa do casal Bass. ㅡ Seu corpo se encolheu. ㅡ Não posso ir.

ㅡ Por que não?

ㅡ Não dá... Não posso deixar o senhor e a senhora Bass me verem neste estado. ㅡ Suas bochechas ficaram rubras, e sua cabeça, cabisbaixa.

Ele estava constrangido com a ideia de aparecer bêbado na frente dos pais do Namjoon?!

Pisquei, perplexo.

Jungkook alcoolizado era um evento totalmente novo.

ㅡ Hmm... ㅡ Pensei no que faria.

Levar Jungkook para casa e deixá-lo lá sozinho nesse estado não me parecia uma boa ideia. Inclusive, eu acreditava que era por causa desse mesmo motivo que Namjoon havia me pedido para levar o vocalista até ele.

Com uma olhada no meu pulso, vi que ainda tinha duas horas e meia na forma humana. Uma ideia me atravessou.

Tirei a mão do telefone e falei para o outro lado da linha:

ㅡ Podemos ir mais tarde, Namjoon? Estou resolvendo umas coisas com ele...

Claro... Aconteceu algo?

ㅡ Não ㅡ respondi só isso porque o meu lado do cérebro que inventava boas desculpas tinha se apagado.

Hm, então, quando quiserem que eu envie o motorista, é só ligar para o número da casa dos Bass. O Jungkook sabe qual é.

Okay, beleeeeza. ㅡ Nesse momento, eu excluí totalmente da minha cabeça o fato de que havia o risco de Jungkook simplesmente apagar e nós dois ficarmos sem número de telefone e sem motorista.

De qualquer forma, a ligação foi encerrada em seguida. Saímos da cabine e paramos no meio da rua movimentada. Havia muitas pessoas fantasiadas andando de um lado a outro, e música reverberava por todos os cantos, o que estava deixando a minha cabeça ainda mais tonta.

ㅡ Vamos tentar ficar um pouco sóbrios. Precisamos de, hm, água, comida, doces... ㅡ falei, fazendo uma busca visual atrás de algum estabelecimento que não estivesse lotado de pessoas.

ㅡ Quero dormir ㅡ Jungkook murmurou contra o meu ombro. Seu hálito quente me pegou de surpresa e fez o meu corpo se arrepiar.

ㅡ H-hm ㅡ pigarreei. ㅡ Dormir também iria servir, mas não dá pra dormir na calçada.

ㅡ Você é chato.

ㅡ Você também, e ingrato. Eu deveria ter me livrado da sua bunda alcoólatra, te mandando para o Namjoon.

ㅡ Não...

ㅡ Então cala a boca e vem comigo.

Nos arrastamos pela rua, dando continuidade à minha busca por um local menos movimentado, mas quanto mais avançávamos pelo centro de Sant'Angela, mais gente surgia.

Em determinado momento eu me toquei do perigo que era estar daquele jeito, porque de repente algumas pessoas paralisaram e começaram a nos encarar, e então a nos seguir.

Aos poucos, escutei murmúrios ao nosso redor de fãs do Arrebol que tinham reconhecido os nossos rostos. Em breve, aquele lugar iria ficar tumultuado. Precisávamos nos esconder de algum jeito antes que tudo explodisse.

Segurei firmemente na cintura de Jungkook e, sem mais nem menos, corri com ele até uma lojinha que tinha fantasias de Halloween na vitrine. Comprei duas máscaras de caveira e cobri as nossas cabeças com elas.

ㅡ Pronto. Agora você pode se jogar por aí e até dormir na calçada, que ninguém vai te reconhecer ㅡ falei enquanto encaixava a máscara no rosto de Jungkook.

ㅡ Não consigo enxergar direito com isso ㅡ ele balbuciou. Sua voz saiu abafada.

De novo, tive uma crise de riso, e, o mais estranho, achei a reação dele fofa. Eu precisava urgente de uma dose de sobriedade.

ㅡ Água. Temos que beber muita água e encher o estômago de comida. Continua andando. ㅡ Saí empurrando o vocalista rua afora.

Infelizmente, durante o percurso, a movimentação tumultuada ao meu redor e a sensação um pouco sufocante da máscara na minha cabeça começaram a me deixar meio fora de órbita. O meu cérebro queria girar.

ㅡ Ah, que droga, literalmente... ㅡ Encostei-me na parede de outra loja. Como diabos eu iria conseguir guiar Jungkook até um restaurante? Minha mente precisava voltar aos eixos.

ㅡ Você... Você está bem? ㅡ Jungkook parou na minha frente, um pouco bambo. Acho que estava me encarando por trás da máscara.

ㅡ Mais ou menos... Hoseok me deu um bolo de ervas. ㅡ Soltei uma risadinha sacana.

Ele inclinou a cabeça. Em seguida, se virou e esticou o pescoço, como se buscasse algo. Por fim, com alguma dificuldade, segurou meu pulso e saiu me puxando, caminhando em linha torta pela calçada.

Nem me atentei a questionar sua atitude, pois de repente a minha cabeça só conseguia pensar na mão dele ao redor do meu pulso, e no fato de que ela estava descendo a ponto de seus dedos se enroscarem nos meus. No estado em que eu me encontrava, a sensação de toques físicos era multiplicada, então nossas mãos se entrelaçando parecia muito, mas muito estranho dentro da minha mente.

Fiquei tão concentrado nisso que não reparei quando Jungkook me puxou para dentro de um restaurante oriental pequeno e com pouco movimento. Nós nos sentamos numa mesa vaga dos fundos, atrás de um biombo, e tiramos nossas máscaras quando concluímos que ninguém ali conseguia ver os nossos rostos.

Jungkook imediatamente deitou a cabeça na mesa, mas permaneceu acordado e me olhando.

ㅡ Seus olhos... ㅡ ele murmurou.

ㅡ O que tem eles?

ㅡ As pupilas... estão dilatadas. É engraçado.

Eu voltei a rir e falei.

ㅡ É engraçado?

ㅡ É... ㅡ Ele suspirou.

Sua mão então viajou para dentro do casaco e tirou algo de um bolso interno. Em seguida, me entregou um tipo de lenço no qual havia algo rabiscado.

ㅡ É um autógrafo do Michael Jackson. Eu consegui pra você... Hoje é seu aniversário, não é? 31 de outubro... era o que estava escrito na ficha da competição. ㅡ Ele fungou. Seu rosto estava muito vermelho, imaginei que fosse o álcool tomando de conta de sua corrente sanguínea.

Encarei o lenço um pouco embasbacado. Lá estava a assinatura de Michael, e, logo abaixo, as palavras "Para Jimin Park" escritas por ele.

Uma emoção subiu para a minha garganta subitamente. A hipersensibilidade que me cobria disparou, e eu não pude controlar o que veio a seguir: Uma torrente de lágrimas. Não era só por conta do autógrafo, na verdade, eu acho que era mais por causa do ato de ter recebido aquele presente. E o fato de Jungkook ter se lembrado do meu aniversário também tinha me deixado bastante chocado.

Apressei-me para ocultar o meu rosto, colocando a cara no cardápio que havia sobre a mesa. Aquela vergonha eu não iria passar na frente do Jungkook.

ㅡ Tem yakisoba e rolinhos de primavera.

ㅡ Hm... ㅡ Jungkook agora estava com a cara enfiada na mesa.

ㅡ Você gosta?

ㅡ Hmm... ㅡ Uma afirmação abafada.

ㅡ Beleza.

Chamei a garçonete e fiz o pedido. Dois yakisobas, um pratão de rolinhos de primavera e uma garrafa enorme com água. A garrafa foi entregue primeiro, porque estávamos precisando desesperadamente de uma limpeza interna. Bebemos metade dela em poucos minutos, o que desencadeou numa redução progressiva do carrossel em minha mente, e num olhar mais acordado no rosto de Jungkook.

Depois disso, um silêncio pairou entre nós enquanto aguardávamos a refeição.

Apoiei um braço na mesa e encostei a cabeça nele. Meus olhos encararam o lenço e então rolaram até Jungkook, que ainda permanecia deitado na mesa, mas com olhos despertos virados em minha direção.

A vermelhidão úmida que antes havia neles agora estava suave. Eu tinha muitos questionamentos...

ㅡ Por que você estava bebendo? ㅡ murmurei.

Jungkook desviou o olhar.

ㅡ Só para beber... como todo mundo faz.

ㅡ Você estava chorando. Eu vi seu rosto inchado.

O corpo dele enrijeceu.

ㅡ Você também estava chorando. Ficou tão emocionado por causa do presente? ㅡ Riu, grogue.

Ele claramente estava tentando desviar do assunto, mas eu tinha o direito de saber sobre a vida pessoal dele?

Ignorei esse pensamento.

ㅡ O que aconteceu, Jungkook? ㅡ Insisti, porque sentia que precisava, e porque era a única forma de conseguir acessá-lo.

Jungkook voltou a me encarar, mas agora com um olhar mais analítico, como se estivesse verificando se eu era confiável. Se valia a pena dizer alguma coisa.

Em seu estado sóbrio, ele provavelmente só iria me ignorar e fazer algum comentário sarcástico, então não foi isso o que aconteceu naquele momento.

ㅡ Minha mente estava caótica ㅡ balbuciou. ㅡ Hm, quando não estou cantando, ela fica assim... Assim, meio pesada e barulhenta, porque eu fico repassando algumas coisas que fiz. ㅡ Seus lábios tremeram levemente. ㅡ Então eu fumo, e bebo... mas eu não queria fumar desta vez. Eu não quero... deixar de cantar por causa do fumo. Minha voz é tudo o que tenho. Cantar é só o que sei fazer...

Ele se ajeitou no assento, ficando com as costas eretas, depois deu uma risadinha seca e encarou o copo com água em sua frente por longos segundos, antes de beber todo o conteúdo dele.

Enquanto isso, eu tentava processar o que tinha acabado de escutar.

Pela primeira vez, Jungkook havia me dito algo verdadeiramente cru sobre ele, e eu pude ficar de frente a um lado seu que não pensei que existia. É como se estivéssemos nos conhecendo pela primeira vez. Não havia ali o cara rude, ignorante e egoísta. Havia só um garoto com conflitos, sentado ao meu lado com cara de paisagem, como se não tivesse se dado conta do peso de suas palavras e da sinceridade delas.

A bebida acabou sendo milagrosa. Naquele instante, eu agradeci pelo efeito dela.

ㅡ Ah... Vou mijar. ㅡ Ele se levantou todo torto e se arrastou para circular a nossa mesa.

Num ato impulsivo, segurei sua mão.

ㅡ Não fuja ㅡ falei, olhando nos olhos dele. ㅡ Você ainda tem que comer.

Ele encarou nossas mãos juntas, antes de responder:

ㅡ Não vou fugir ㅡ assegurou.

Eu o soltei, e ele saiu cambaleando até a porta do banheiro do restaurante.

Quando retornou, nossa comida já estava sendo entregue. Devoramos o yakisoba e os rolinhos de primavera em dois tempos, e mais uns biscoitinhos chineses que ganhamos de cortesia. Eu conseguia sentir o meu estômago explodindo enquanto líamos as mensagens que vieram dentro dos biscoitos.

ㅡ O que apareceu no seu bilhete? ㅡ Jungkook perguntou.

ㅡ Bem... "O amor está mais próximo do que você imagina". ㅡ Soltei uma risada.

Eu definitivamente não estava numa situação propícia para o amor. Ainda que o meu peito vibrasse um pouco toda vez que Taehyung se aproximava de mim, o meu estado atual e a minha missão tornavam impossível qualquer possibilidade de romance, então aquela mensagem era apenas ridícula.

ㅡ E o seu, como é? ㅡ perguntei a Jungkook, e inclinei o rosto para ler o bilhete dele por cima do ombro.

ㅡ "O nosso primeiro e último amor é o amor-próprio". ㅡ Ele uniu as sobrancelhas e amassou o papel dentro do punho, mas não o jogou fora. ㅡ Sem graça.

ㅡ Eu achei filosófico e bonitinho.

ㅡ Hm. ㅡ Ele balançou os ombros e guardou o bilhete no bolso da calça.

Depois disso, dividimos a conta e voltamos a andar pelas ruas do centro, disfarçados com as nossas máscaras. Jungkook tinha parado de tropeçar em seus calcanhares, e eu me sentia mais sóbrio. De vez em quando esbarrávamos um no outro, tentando recuperar o equilíbrio, mas logo voltávamos ao normal para seguir adiante.

ㅡ Acha que já consegue ir para a casa dos pais do Namjoon? ㅡ perguntei.

ㅡ Sim... tudo bem. ㅡ Ele se encolheu. Parecia estar inseguro.

ㅡ Então... vamos procurar por outra cabine telefônica. Você se lembra do número da casa deles, não é?

ㅡ ... Lembro.

ㅡ Ótimo.

Mais adiante, avistei uma cabine, mas ela estava ocupada e tinha uma pequena fila se formando na porta dela. Novamente senti saudade dos celulares.

ㅡ O jeito é esperar ㅡ falei, encostando-me numa parede.

Jungkook colocou as mãos no casaco e virou o rosto na direção de um estabelecimento localizado ali perto que vibrava. Ele era um tipo de lanchonete com pista de patinação. Estava lotado e dele saía muita música. Parecia interessante.

ㅡ Ainda é seu aniversário. Não deveria estar aproveitando um pouco mais esta noite? ㅡ questionou o vocalista, apontando um polegar para o local.

A proposta dele me surpreendeu.

ㅡ Hm, talvez.

Olhei discretamente para o meu pulso. Ainda me restava uma hora e vinte minutos na forma humana, então eu tinha algum tempo para me divertir um pouco naquele lugar...

ㅡ Seria legal, mas vou ter que ir embora cedo ㅡ falei.

ㅡ Por quê?

ㅡ É-é... assuntos pessoais e complicados.

Ele deu de ombros.

ㅡ Só dez minutos. Provavelmente só vamos ficar olhando, já que tem muita gente ㅡ disse.

ㅡ É, verdade... ㅡ Virei para ele e comecei a rir.

ㅡ O que foi? Ainda está muito chapado?

ㅡ Não, eu estou melhor. É que você está sendo amigável. Amigável de verdade. Uma companhia agradável até. ㅡ Inclinei a cabeça e me aproximei dele até colocá-lo contra um poste de placa de trânsito. Por causa da máscara, eu não consegui ver o seu rosto, mas notei o enrijecimento de seu corpo. Sorri e falei: ㅡ Por acaso está armando outra armadilha para cima de mim, Jungkook?

Eu vi o pomo de Adão dele subir e descer.

ㅡ Não, eu só achei o lugar legal ㅡ sibilou. Em seguida, limpou a garganta. ㅡ Quer saber? Melhor ir embora...

ㅡ Hã-hã. Agora já era. ㅡ Segurei ele pelas costas de seu pescoço e, ignorando seus xingamentos, o arrastei até o outro lado da rua, onde estava a lanchonete.

O barulho alto da música nos envolveu assim que adentramos o estabelecimento, e as luzes neon brilhantes e em movimento pegaram os nossos sentidos ébrios de surpresa. O local realmente estava lotado, mas o espaço era grande, então rapidamente nos acomodamos próximo ao balcão e pedimos milkshakes de chocolate como se fôssemos dois adolescentes numa noitada family friendly.

Sob o ritmo de Maniac, de Michael Sembello, e com milkshakes em mãos, aproximamo-nos do parapeito que circundava a pista de patinação. Pelo teto, vários globos espelhados jaziam pendurados, refletindo os LEDs coloridos e as imagens de quem patinava logo embaixo.

Era tudo tão vibrante para mim que, de repente, paralisei e fiquei encarando o nada, dissociando. Só voltei para a órbita terrestre quando Jungkook pôs a mão no meu ombro.

ㅡ Você ainda está aí? ㅡ perguntou alto, para que sua voz não fosse abafada pela máscara e pela música.

ㅡ Estou. ㅡ Levantei um pouco da máscara para pôr o canudo na boca, e suguei o máximo de milkshake até congelar o meu cérebro. Talvez assim ele reiniciasse.

Acho que provocou um efeito diferente, porque, de uma hora para outra, desejei loucamente calçar patins e entrar naquele naquela pista.

ㅡ Quanto você calça? ㅡ perguntei a Jungkook.

ㅡ 40. Pra quê quer saber?

ㅡ Espera aqui.

Virei-me e corri de volta ao balcão. Lá, aluguei dois pares de patins e retornei para o lado de Jungkook com uma agitação maluca fervilhando em minhas veias.

ㅡ Calça aí ㅡ falei, entregando um dos pares ao vocalista.

ㅡ Não sei se é uma boa ideia...

ㅡ Claro que não é. Eu estou chapado e você, bêbado. O que pode resultar disso? ㅡ Gargalhei.

Jungkook pensou um pouco antes de tirar seus calçados e colocar os patins nos pés.

Entramos na pista assim que terminamos os nossos milkshakes, e já nos primeiros minutos caímos juntos de bunda no chão. Eu me contorci de rir.

ㅡ Você viajou completamente na maionese ㅡ ele disse, acariciando o traseiro machucado enquanto tentava se equilibrar em pé outra vez.

ㅡ Viajei na maionese? Puff, que gíria velha é essa? ㅡ Gargalhei ainda mais alto, antes de me lembrar de que estávamos na década de 80. ㅡ Ah, é. Eu viajei totalmente na maionese, no ketchup e na mostarda. Me ajuda a levantar. ㅡ Ergui a mão para Jungkook.

Ele balançou a cabeça e soltou uma risada, depois segurou minha mão e se preparou para me erguer.

Só que eu tinha um plano de vingança em mente. Imediatamente o puxei de volta e, com a ajuda do seu equilíbrio de bêbado, o fiz cair em cheio sobre mim.

ㅡ Mas que porra! ㅡ Ele deu de cara no meu peito. Doeu um pouco por causa da sua máscara, mas eu não liguei.

ㅡ Pagamento por ter me derrubado na piscina do Namjoon ㅡ expliquei, levantando um pouco da minha máscara para que Jungkook pudesse ver o meu sorriso e olhar maléficos.

Tive a impressão de que o corpo dele travou nessa hora.

Eu o tinha assustado? Hahaha, que engraçado!

Ficamos em pé e saímos patinando com alguma dificuldade, às vezes nos apoiando no parapeito do salão, às vezes em nós mesmos ㅡ o que acabou gerando duas outras quedas.

Em determinado momento, quando a música agitada que estava tocando chegou ao fim, a voz de um funcionário soou pelos alto falantes:

Agora uma dança para os casais! Viva o amor!

Depois disso, a melodia de Hopelessly Devoted to You, da atemporal Olivia Newton-John, reverberou alta, envolvendo-nos.

Através dos buracos nas máscaras, Jungkook e eu nos encaramos e então tivemos uma crise de riso.

ㅡ Isso só pode ser perseguição ㅡ falei, ofegante. ㅡ Grease está me perseguindo!

Jungkook continuou gargalhando. O riso melódico dele me fez lembrar de uma coisa.

ㅡ Você estava cantando essa música naquele dia... quando te visitei no seu condomínio. ㅡ Cutuquei o ombro dele.

ㅡ Correção, quando você invadiu o meu condomínio. ㅡ Ele usou o ombro para me empurrar e sair deslizando pelo salão, mas acabou dando errado porque seu corpo caiu para frente e tentou se apoiar em mim. No final, nós dois saímos deslizando como carros desgovernados numa avenida movimentada.

Quase atropelamos um casal de idosos.

ㅡ Haha, gosta de Hopelessly Devoted to You? ㅡ perguntei, segurando os ombros dele para que não caísse de cara no chão.

ㅡ Hmmm, é a música preferida da minha mãe. Acabou virando a minha também...

Fiquei intrigado com Jungkook citando a mãe. Seu jeito de agir, todo livre e irrefreável, sempre transmitiu a estranha ideia de que ele não tinha raízes em algum lugar.

Será que essa mulher tinha conhecimento das coisas que o filho fazia? Ela sabia que ele havia se alcoolizado naquela noite a ponto de dormir na rua? Ela se importava de alguma forma com ele...?

Comecei a me questionar sobre muitas coisas, minha mente viajou através de todos os tipos de hipóteses, e só não foi mais além por conta do jeito suave de Jungkook ao citá-la.

Talvez eles só não tivessem um contato muito grande atualmente...

ㅡ Sua coroa tem bom gosto para música ㅡ falei.

Jungkook balançou a cabeça, concordando, e ficou em silêncio. Em seguida, ele se afastou e saiu patinando pela pista.

Seu corpo foi coberto pelas luzes e seus cabelos roxos reluziram com o brilho delas enquanto eram arrastados pela aceleração do movimento. Suas pernas não se desequilibraram, por mais que tenham se mostrado hesitantes e sem uma direção certa. Jungkook parecia estar fugindo de mim de novo, por mais que só estivesse seguindo o fluxo do salão que logo voltaria para o local onde eu estava.

Senti a necessidade de segui-lo, então foi o que eu fiz.

Fiquei a poucos metros dele, mas sempre atrás, em seu encalço, insistindo.

Insistindo em quê?

Não sei direito. Eu me sentia confuso.

Havia essa estranha urgência em mim que desejava entender aquele garoto. Ela estava apitando com força depois de eu ter alcançado algumas camadas inéditas de Jungkook.

Eu era um pesquisador, e ele, o meu objeto de estudo.

Talvez eu só quisesse desvendar a mente e os instintos do criador da música que salvou a minha vida.

Talvez...

Hopelessly Devoted to You acabou e fomos imediatamente jogados para um clima completamente novo, com luzes mais escuras em tons alaranjados e avermelhados, e nuvens de fumaça que cobriram o salão.

Por fim, Thriller, de Michael Jackson, reverberou ao nosso redor, fazendo todo mundo vibrar.

Era o clima de Halloween tomando de conta.

Ah, é. Ainda estávamos no dia das bruxas, e ainda era o meu aniversário. Eu tinha que aproveitar, assim como Jungkook havia dito.

ㅡ Vamos dançar! ㅡ exclamei, puxando-o pelo casaco.

ㅡ Quê? Não mesmo. ㅡ Eu quase conseguia vê-lo lançando-me um olhar azedo por baixo da máscara.

ㅡ Todo mundo está dançando e nós estamos de máscara. Pra quê ter vergonha?

Ele ficou quieto. Estava reconsiderando?

Quando o ritmo da música ficou mais agitado e começou a se aproximar do refrão, o salão inteiro se entregou às coreografias do rei do pop, então não teve desculpa para Jungkook. Logo passamos a nos mexer em sincronia, um pouco desajeitados com os braços tortos e o equilíbrio por um triz. Mas foi divertido, e eu notei que ele também se divertiu.

Eu só queria que não estivéssemos usando máscaras para poder ver o rosto de Jungkook naquele momento.

Dançamos até as nossas mentes pedirem socorro. Fomos forçados pelos nossos corpos ébrios a sair do salão e dar uma pausa numa das mesas disponíveis.

O local que escolhemos acabou sendo um que era pouco iluminado e bastante ocultado pelo movimento da pista de patinação, então nos sentimos seguros para arrancar as máscaras.

Olhei para Jungkook e o encontrei vermelho e um pouco suado. Seu semblante estava leve, desperto e tinha uma leveza interessante de alguém que claramente se sentia bem.

Foi aí que os meus pensamentos viajaram de volta ao que ele havia falado momentos antes para mim sobre sua mente caótica. Aquilo latejou no meu cérebro, incomodando-me de um jeito muito irritante.

ㅡ O que está olhando? ㅡ questionou Jungkook. Seu semblante parecia hesitante.

Não tinha percebido que estava encarando ele tão intensamente.

Não desviei o olhar.

ㅡ Você está enganado ㅡ falei num tom sério.

ㅡ Sobre o quê?

ㅡ Aquele lance sobre cantar ser tudo o que você tem é a maior bobagem que eu já escutei. ㅡ Soltei uma risada seca e ergui o queixo. ㅡ Olhe ao seu redor. Os caras da banda nunca desistiram de você. Hoseok, Taehyung e principalmente Namjoon sempre estiveram lá, então como pode dizer que não tem mais nada a não ser sua voz?

Ele empalideceu.

ㅡ Olha aqui...

ㅡ E tem seus fãs ㅡ eu o interrompi, cruzando os braços. ㅡ Falo dos fãs de verdade. Mesmo que um dia a sua voz não exista mais, eles não vão esquecer, eu te asseguro. ㅡ falei com a certeza que me cabia. Eu não esqueci. ㅡ Se sua mente está caótica, enfie as minhas palavras nela. E, se quiser, eu mesmo enfio à força.

O corpo dele enrijeceu.

Acho que exagerei um pouco, então decidi respirar fundo e amenizar o clima que tinha se formado mudando de assunto.

Olhei para além da janela do estabelecimento até visualizar a cabine de telefone no outro lado da rua.

ㅡ Ei, lá esvaziou. ㅡ Apontei. ㅡ Já se sente sóbrio o bastante?

ㅡ ... Sim. Mas não precisamos ligar para a casa dos pais do Namjoon.

ㅡ Por quê?

ㅡ Acabei de me lembrar que deixei o meu carro estacionado em algum lugar por aqui.

Arqueei as sobrancelhas para ele e comecei a rir, balançando a cabeça.

De um jeito contido, Jungkook também acabou rindo.

ㅡ Qual de nós dois vai dirigir? ㅡ perguntou.

ㅡ Deixaria eu dirigir a sua Datsun rara que não é mais fabricada?

ㅡ Tanto faz. ㅡ Ele deu de ombros. Esse movimento já fazia parte de seus trejeitos.

ㅡ Hm, acho que é melhor decidirmos isso com algum teste de equilíbrio. Tipo ver quem anda em linha reta e se sustenta por mais tempo com um pé só.

ㅡ Igual aos testes que os policiais de trânsito fazem?

ㅡ É.

Seguimos a minha ideia e fizemos os dois testes. Jungkook foi o primeiro a ceder quando ficamos em um único pé, e seus passos saíram da linha reta traçada pelo rejunte do piso. No fim, ganhei a chave do carro.

ㅡ Ah, espera. Eu não lembro se tenho uma licença para dirigir ㅡ soltei sem pensar e puxei a minha carteira do bolso.

ㅡ Como assim não se lembra? ㅡ Ele me encarou como se eu fosse maluco.

Dei uma risadinha sem graça na tentativa de disfarçar a minha péssima escolha de palavras, enquanto remexia a carteira até finalmente encontrar a licença.

"Obrigado, guia espiritual!", exclamei em pensamentos e beijei o documento.

Nessa hora, o meu pulso entrou no meu campo de visão e os números levemente brilhantes piscaram para mim como se quisessem me dar um tapa por ser tão desleixado.

Só me restava trinta minutos na forma humana.

Cacete.

ㅡ Temos que ir embora AGORA. ㅡ Agachei-me desesperado para tirar os patins.

ㅡ An? O que houve?

Não o respondi, só agarrei os pés dele e arranquei seus patins logo depois que me livrei dos meus.

Assim que devolvemos os dois pares, saí puxando Jungkook porta afora.

ㅡ Onde está o seu carro!? ㅡ perguntei.

ㅡ Um pouco mais adiante, eu acho.

ㅡ Você ACHA?! Aaaaaaah! ㅡ Segurei firme o pulso dele e comecei a correr acelerado.

ㅡ Por que estamos correndo?!

ㅡ Não pergunta, só me avisa quando vir o carro!

Corremos até alcançarmos o fim daquele quarteirão, antes de Jungkook apontar para o seu Datsun preto e dourado estacionado em frente a um bar.

Joguei o meu corpo para dentro do carro, liguei o motor poderoso e coloquei o cinto, tudo num piscar de olhos. Assim que Jungkook se acomodou no banco de carona, eu pisei o pé no acelerador e saí em alta velocidade pelas ruas de Sant'Angela.

ㅡ Você quer matar a gente?! ㅡ exclamou o vocalista.

ㅡ Olha, na verdade, eu quero evitar! ㅡ gritei de volta. ㅡ Vai me dizendo o endereço. Você sabe o endereço, não é!? Diz que sim, pelo amor de Deus!

ㅡ Se-sei. ㅡ Jungkook afundou o cenho, encarando-me. ㅡ O que deu em você?

ㅡ FALA O ENDEREÇO!

Visivelmente chocado, ele começou a me instruir durante o caminho.

Para a minha sorte, o casarão dos Bass se localizava num bairro ali perto, então, quando chegamos lá, ainda me restavam 10 minutos na forma humana.

Saí do carro aos tropeços assim que o estacionei e desliguei o motor. Devolvi a chave para Jungkook e andei com ele até a porta da propriedade.

ㅡ Beleza. Te entreguei são e salvo. Agora eu vou vazar! ㅡ Acenei com uma mão e virei o corpo, pronto para sair correndo dali.

ㅡ Espera! ㅡ Jungkook segurou o meu braço de repente, impedindo-me de ir.

Quando voltei a encará-lo, ele me soltou rapidamente.

ㅡ Sobre você estar na banda, e o lance do baixo... Eu não pretendo mais fazer algo como aquilo. Nunca mais... ㅡ Seus lábios se moveram hesitantes.

O meu tempo estava acabando, mas eu queria escutar o que ele ainda tinha a dizer.

ㅡ Quero confiar em você. ㅡ Suas palavras me paralisaram por um segundo.

Logo em seguida, abri um sorriso. Eu tinha conseguido acessá-lo de alguma forma, finalmente.

ㅡ Certo. Vamos trabalhar juntos. ㅡ Dei um tapinha em seu ombro e comecei a me afastar, e então a correr.

No final daquela rua, virei o rosto para trás. Jungkook ainda estava parado na frente da casa dos Bass e me acompanhava com o olhar.

Assim que dobrei a esquina, sucumbi à transformação. Agora eu tinha asas e um corpo pequeno.

Levantei voo para verificar se Jungkook havia entrado no casarão, porque eu ainda temia que ele fugisse outra vez.

Para o meu alívio, Namjoon abriu a porta da propriedade e o puxou para dentro com um sorriso amigável.

Naquela noite eu fui para casa com a mente leve e uma sensação de que as coisas estavam começando a funcionar.

🎤🎤🦋🎤🎤

#MariposaPunk

Antes de ir embora, por favor, deixe o seu ⭐VOTO⭐! Obrigadaaa~

Pessoal, não vou fazer notas finais grandes desta vez porque eu estou correndo contra o tempo para postar este capítulo (o que me deixa muito triste, porque, até agora, ele foi o mais divertido de escrever). Espero que tenham dado algumas risadas. Por favor, não romantizem o uso de drogas e álcool. O que aconteceu na cena do aniversário ocorre bastante na vida real em festas entre amigos, mas é sempre bom levarmos isso a sério e tomarmos cuidado! Vou ficar no aguardo para saber as reações de vocês ao desenvolvimento dos Jikook ao longo deste capítulo. Será que conseguem perdoar o Jungkook agora? Suas teorias sobre ele estão se comprovando? Quero saber tudinhoooo.

Obrigada por terem lido, e desculpem a att surpresa, é que eu estava empolgada!

Até a próxima, mariposas punks💜

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