▕ B l a i r ▕
Sinto-me mais concretizada, uma vez que visto o meu quente e macio roupão. A casa aqui, no andar de cima, estava um sossego, nem sequer dando para distinguir este dia de um comum. A minha avó e o meu avô paternos estavam cá em casa, assim como a minha tia de manias e fala esquisita. Raio da mulher que teve de aceitar o convite do meu pai, eu resmungo em pensamentos devido a já estar farta de a ouvir desde que cá chegara.
Quando era criança, o Natal era festejado com muita mais alegria, com uma alma viva de esperança. Recordo-me de ter todos os olhares dos meus familiares colocados em mim na altura do desembrulhar dos papéis coloridos e de bonitos laços de embrulho. A minha família vivia esta época com grande animação mas isto apenas até à separação dos meus pais. Depois disso, fora obrigada a optar com quem queria passar este feriado colocando-me numa posição muito pouco favorável, logo aos meus sete anos de idade; eu tinha que escolher entre o meu pai e a minha mãe.
Atualmente, os meus dezanove anos não me permitem que eu veja este dia como algo divertido e feliz não me trazendo, por isso, nada além de um grande peso e de uma grande desanimação.
Desço as escadas com alguma cautela, para quase não cair como aconteceu há pouco, e abro a porta da cozinha tendo, logo de seguida, a visão da minha família que convivia de forma entusiasmada. O meu pai sorri-me abertamente e não sou capaz de passar o gesto em falso, tendo de lhe retribuir. Era visível o contentamento que ele tinha em puder observar a sua família toda reunida, visto que já não estava com eles há muito tempo.
"Não precisamos de ficar aqui na cozinha para sempre, quer dizer, onde já se viu passar o Natal neste espaço." O meu pai comenta divertido, gesticulando com as mãos como suporte do seu bom humor. "Vá, vamos para a sala."
O meu pai ajuda o meu avô a levantar-se, visto que a idade a dificultava em certos movimentos, e encaminhamo-nos todos para a sala. Após me acomodar no sofá individual, ligo a televisão para procurar um canal que estivesse a passar um bom filme. Desligo logo do que se passava atrás de mim, mal a minha tia começa a comentar a sala de estar, colocando defeito e criticas em tudo o que era mobília. Decerto que o meu pai deve estar incomodado com a sua irmã e muito provavelmente ainda não disse nada por respeito aos meus avós.
Enfim, não se escolhe a família, infelizmente,
Debaixo da árvore enfeitada consigo reparar na prenda que Zayn me mandara por correio. Ele, ainda quando estávamos na universidade, perguntara-me onde é que eu iria passar o dia festivo e, logo após isso, perguntara-me a morada desta casa. Claro que o fizera de forma tão natural que eu nunca desconfiara que fosse para me mandar a prenda de Natal tanto que, se eu tivesse desconfiado, ter-lhe-ia logo perguntado a morada de sua casa. Como não o fizera, na altura, terei que aguardar até estar com ele para lhe dar a minha surpresa.
Quisera dar-lhe algo além de um perfume, por isso, fora a um fotógrafo longe da universidade para que ele imprimisse algumas das nossas fotografias mais estúpidas que tinha guardadas no meu telemóvel. Aproveitara o facto de lá estar e pedira ao senhor para imprimir também para mim, visto que era algo que tinha já em mente fazer há muito tempo. Hoje ainda quase não tivera a oportunidade de falar com ele pois, segundo o que me dissera, a sua família é muito grande tendo de, por isso, ajudar a sua mãe a organizar a casa para receberem as visitas. Não obstante, queria que ele tivesse um tempinho para responder à mensagem de Feliz Natal que lhe mandara.
- Oh, querida, como foi este primeiro tempo na universidade? - A minha avó paterna pergunta, deixando consequentemente a minha tia com o olhar penetrado em nós, pronta a se intrometer.
- Foi bom. Conheci muitas pessoas, dei-me bem com todos, no geral, e consegui passar a Biologia.
- Só a uma disciplina? - O previsto acontecesse, dando voz à pessoa irritante e maneirenta que já me começava a por os cabelos em pé. - Devias tirar muito melhor, quer dizer, é a universidade da tua mãe.
- Adelaide, estás a ser indelicada para com a Blair. A universidade não é algo fácil e esse negativismo todo só lhe irá trazer demónios para o próximo período. - A minha avó defende-me, repreendendo a sua filha que rondava a casa dos cinquenta anos. - A Blair é inteligente e tenho a certeza que irá conseguir passar às novas disciplinas que se avizinham.
- Obrigada, avó. - Eu agradeço, sorrindo triunfante para a insuportável e resmungona crítica.
O meu pai força um sorriso, posto o ambiente que se colocara seguidamente, na divisão, mas acaba por retomar a conversa que estava a ter com o meu avô sobre um jogo qualquer de futebol que passara há dias na televisão. O meu telemóvel vibra, fazendo o meu olhar ansioso o fixar seguidamente. Todos os meus amigos, incluindo Samantha, Louis, Elaine e Niall, já me haviam respondido à mensagem de Feliz Natal, por isso, as opções recaiam para apenas uma pessoa e, como sempre, a minha intuição estava certa.
"Feliz Natal, Blair. Espero que este dia esteja a ser bom.
Tenho andado muito atarefado com os preparativos e com a minha família, já tendo mesmo feito de babysister para as minhas primas mais novas. Contudo, é uma alegria o ambiente que aqui se instalou e já tinha muitas saudades de estar reunido com todas estas pessoas que eu tanto adoro. Desculpa a dificuldade em escrever-te algo querido mas ambos sabemos que eu não sou muito bom com palavras.
Ignorando todos os meus outros desejos que tenho contigo, gostaria que estivesses aqui neste dia tão especial e que abrisses a tua prenda ao meu lado. Estou ansioso que vejas o que te ofereci e gostaria que depois me contasses como fora a tua reação. Mal posso esperar para estar contigo novamente, tenho saudades.
Amo-te."
Him ♡ - Wed. 23h43
Sorrio após reler a mensagem. Fico mesmo satisfeita por saber que ele está a aproveitar o tempo com a sua família e por saber tudo está bem. Na verdade, gostava de o ver cuidar das primas pois, com o jeito e com a paciência que ele tem, tenho a certeza que deve ser um cenário lindíssimo.
A voz do meu pai traz-me de volta ao mundo real, deixando-me um pouco sem noção se quanto tempo estivera a sorrir para o meu aparelho tecnológico.
- Bem, sei que ainda faltam quinze minutos mas acho que já podemos abrir as prendas.
- Sempre a estragar a magia do Natal, pai.
A verdade é que a minha família nunca ligara muito à tradição de abrir as prendas após a meia-noite. Como sempre fora uma rapariga muito inquieta e muito curiosa, descobrira rapidamente que o Pai Natal não passava de uma mentira e, por causa disso, os meus pais começaram a abrir as prendas mais cedo, desculpando-se que, ou estavam cansados ou alguém da minha família estava cansado.
- Desculpa, filhota, mas o Natal já não é o que era e além disso o teu avô já deve estar cansado.
Reviro os olhos quando ele põe em prática a desculpa habitual mas assinto com a cabeça, não me importando que as prendas sejam agora abertas. Como sempre, e após o seu pedido, fora eu que tivera que distribuir as prendas por entre todos, deixando todas as minhas ( que já agora, eram a maio parte delas ) para o fim. O gorro de Pai Natal que o meu pai me obrigara a usar dava-me um ar tão engraçado que não conseguira não compartilhar com os meus amigos. Mandei, por isso, uma foto a mostrar as minhas figurinhas de idiota a Samantha, a Louis, a Elaine e a Zayn.
Os meus avós e o meu pai pareciam bastante satisfeitos com as prendas que desembrulhavam dos seus mais queridos, contrariamente à senhora de cabelos ruivos que apenas sorria, notando-se perfeitamente pela sua expressão facial que não era nada daquilo que ela desejava. Conhecendo a família da parte do meu pai como eu conheço, apenas tenho duas hipóteses para o facto de a minha tia ser da forma como é: ou ela bateu forte com a cabeça quando era mais nova ou veio a rebolar do monte, a minha avó teve pena e adotou-a.
- Blair, não vais abrir aquela? - O meu avô questiona, notando que apenas faltava uma prenda para abrir debaixo da árvore. Receosa com o que estivesse no seu interior, tendo em conta que o meu namorado não é muito certo da cabeça, neguei com a cabeça.
- Talvez mais tarde, avô.
Os papéis, rasgados ou amarrotados, são todos colocados num grande saco para que a sala não fique mais suja do que já está. Os laços dos embrulhos estão todos a um canto guardados, visto que todos os meus parentes conhecem o grande fascínio que eu tenho pelos mesmos. Levanto-me do sofá, com alguma dificuldade tendo em conta os presentes já abertos que me rodeiam, e pego na caixa que sobrava.
O meu pai franze a sobrancelha e ri-se para mim, provavelmente desconfiando que viria de um rapaz. Ele é inteligente e ambos sabemos que é muito difícil eu esconder-lhe algo. Todavia, não me impediu quando eu lhe pedira para ir para o meu quarto. Apenas fez um comentário.
- Espero que esse rapaz se tenha esmerado para te fazer sorrir.
- Acredita, pai, eu também espero isso.
Sorrio e abandono a divisão, subindo apressadamente até ao meu quarto. Desta vez não me importara se ia caindo ou não, querendo unicamente chegar rápido ao meu compartimento. A caixa era grande mas não era tão pesada quanto aparentava ser. O único problema da mesma é que dava mau jeito a andar por não me dar uma grande visão do chão.
Uma vez que me sento na minha cama, começo logo a desembrulhar a grande caixa, repleta de mistério. Não fazia a menor ideia do que é que se encontrava no seu interior mas, uma vez que abro a caixa deparo-me com mais duas caixas de tamanhos diferentes. Começo por abrir a de papel mais colorido, por me ter chamado mais a atenção, e arregalo o meu olhar ao ver um lindíssimo colar no seu interior.
Encantada com o objeto, resolvo logo colocá-lo. Era lindíssimo, não tenho palavras para o descrever.
Delibero abrir a segunda caixa, mas faço-o mais lentamente receosa com o que pudesse conter o seu interior. O papel de embrulho não era tão apelativo e, idiota como é o Zayn, coisa boa não deve vir de algo tão grande. E, após abrir, confirmo que, como sempre, eu estava certa.
Os meus lábios entreabrem-se ao ver a roupa que ele me comprara. Algo colegial associava-se aquela vestimenta e, a comentar pela saia, como garantir que toda a minha parte inferior ficará exposta caso a vista. A parte de cima também não era muito apropriada para sair à rua visto que, além de não me tapar a barriga, tenho quase a certeza que todo o meu peito ficará exposto ao vesti-la. Não obstante, isto não ficava por aqui.
No fundo da caixa havia um preservativo, juntamente com uma mensagem pouco ou nada decente tendo em conta a situação.
❝Mal posso esperar pela nossa próxima aula, Miss Blair. Com os melhores cumprimentos para a minha aluna preferida, do seu professor predileto.❞
Eu vou matá-lo.