── Calado. Apenas me leve para a casa. ── Louis estremeceu, ouvindo a voz rouca de Harry, pela falta de uso contínuo.
Louis o fitou, fixamente, piscando fraco, sem entender absolutamente nada. Seus olhos mal fechavam, de tão rápido que eles piscavam; e, bom, seus cílios iam de encontro com aquela água que ele odiava com todas as suas forças, a água que expressavam os sentimentos os quais ele tinha receio de demonstrar. A água que escorria por sua bochecha de uma forma imprescindível, que nem mesmo precisava fazer força para se livrar delas. Ele tinha as mãos baixas, como se estivessem jogadas. Sentiu a pele de sua bochecha arder, como sua garganta ── pois ele segurava o choro. Ele jamais esperava aquilo.
Segundos antes, pensava no quão importante Harry era para si. Segundos antes, demonstrava todos seus sentimentos apenas com o olhar. Segundos antes, ele estava feliz por ver seu garoto acordar. Passou horas acordado, quase sem piscar, chorando, desejando que ele estivesse bem, sejá lá onde. Havia dado banho naquele garoto, o cuidado com amor, lhe dito coisas boas, mentido para vê-lo bem, se importado com si, o carregado no colo até o carro e o levado para o hospital. Para então, vê-lo acordar e não receber palavra alguma; ou talvez, todas elas de uma vez só, acertando sua feição assustada e triste. Por quê?
── Como "calado"? Você me acerta de repente e espera que eu fique calado? ── Louis o olhou incrédulo, não o reconhecendo. Louis observou o garoto se levantar, após calçar seus tênis que estavam ao seu lado na cama. Harry ficou em pé ao seu lado e o fitou, pressionando levemente os lábios, bufando disfarçadamente.
── Tudo bem. Eu pego um ônibus. ── Falou, o olhou de cima a baixo. Louis sentia que aquele olhar demonstrava nojo.
── Pelo amor de Deus, me explica. ── Louis agarrou seu pulso, assim que o viu virar-se e ameaçar a sair. Harry o fitou no fundo dos olhos e então, respirou fundo, controlando-se.
── Eu lembro.
•••
Harry respirou fundo, observando o sol fraco e as folhas caídas no chão da calçada. Apoiou a bochecha na palma da mão e o cotovelo em uma parte qualquer da porta do carro, apenas para continuar observando o caminho. Não queria falar nada. Não era preciso falar mais nada. Louis apenas disse que iriam conversar quando chegassem em casa e então, saíram do leito. Louis pagou pelo exame e foram embora.
Harry sentia-se destruído por dentro, Louis não estava diferente. Louis por ter mentido, Harry por ter ouvido a mentira. Louis sabia que Harry iria lembrar, afinal, não fazia tanto tempo assim. Ele apenas não sabia ao certo como lidaria com aquilo. Jogaria todas as suas cartas na mesa, jogaria com o que tinha e sabia que tinha tudo para ganhar, ele só não sabia como.
Louis estacionou o carro e o desligou. Tudo em um completo silêncio, isso o incomodava. Parecia que alguém tinha falecido, este era o clima ali. Talvez alguém de fato tenha morrido, mas não no sentido literal.
Harry saiu do carro, ainda sem falar nada, ou até mesmo olhar para Louis. Fechou a porta com força, mesmo sabendo que isso deixava Louis irritado. Passou pela frente do veículo e foi em direção à entrada da residência, batendo os pés no chão o máximo que conseguia ── foi a única maneira que conseguiu encontrar para demonstrar que estava com raiva. Louis rapidamente deixou o veículo e o seguiu, apertando o botão para trancar as portas e ligar o alarme. Olhava preocupado na direção que Harry ia, desesperado pelo fato do garoto nem se quer olhar em sua cara. Ele tinha feito algo tão horrível assim? Não entender os sentimentos de Harry fazia ele ser pior ainda?
Parou em frente ao garoto que permaneceu de braços cruzados em frente à porta trancada da casa, pois não tinha a chave. Louis o olhou, mas Harry nem se quer o olhou de relance. O mais velho suspirou derrotado e usou suas chaves. Ele não tinha mais o que fazer, mas ele necessitava mais do que ninguém de explicações. Não era possível que Harry não tenha entendido suas intenções ao falar tudo aquilo; não era possível. Louis sentia seu corpo inteiro amolecer apenas por se sentir um obstáculo na vida de Harry. Céus, como se tornou difícil viver naquele momento.
Louis observou o garoto andar vagarosamente, em passos longos e desengonçados, para uma direção aleatória, como se estivesse se distraindo para o aguardar. Harry olhava em volta, inflando as bochechas e então, soltando o ar violentamente.
Louis fechou a porta atrás de si e jogou as chaves sobre o sofá, torcendo mentalmente para que tenha acertado lá de fato. Pôs as mãos em sua cintura e esperou. Harry continuou de costas para si, sem dizer absolumente nada, apenas olhando em volta, como se fosse um turista naquela casa.
── O que deu em você? ── Louis questionou, já meio sem paciência. Sentia-se egoísta por não ouvir o lado de Harry primeiro, para poder tirar suas conclusões, mas não queria aceitar assim tão fácil o fato de ter apanhado de graça. Observou Harry se virar e o olhar, franzindo o cenho.
── O que deu em mim?! ── Harry colocou a mão sobre o próprio peito, soltando uma risada nasal e desacreditado. Negou, olhando para um lugar aleatório, mas logo o fitou mais uma vez. ── Louis, o que deu em você? Por que tinha que dizer todas aquelas coisas? Na minha frente, Louis!
── Eu menti, Harry. Menti para salvar nossas próprias vidas. ── Louis disse, engolindo em seco logo depois, vendo Harry rir de uma maneira debochada.
── Desde quando você se tornou tão covarde assim, uh? Droga, Louis, eu não acredito que de fato seja mentira. Você queria proteger seu próprio relacionamento, não é? Onde está aquele homem que eu conheci há tempos atrás? ── Harry entrelaçou os próprios dedos, os pressionando, apenas para descontar algo em alguma coisa.
── Covarde?! Harry! Covarde?! ── Louis aumentou o tom, não acreditando no que ouviu. Ele até poderia ser, mas não ali. ── Quer que eu destrua o seu relacionamento com sua mãe? Como você acha que ela estaria se descobrisse que o próprio namorado a traiu com o próprio filho? Ou melhor, como você acha que ela reagiria se descobrisse que o próprio filho a traiu com seu namorado, uh? ── Louis falou, se aproximando vagarosamente, cuspindo as palavras contra o garoto.
── Você não pensa em nós? ── Harry o olhou, incrédulo, sentindo os olhos cercados por barreiras de lágrimas. Louis paralisou, ignorando todos aqueles pensamentos que se fizeram presentes naquele momento.
── Se não pensasse, eu não teria feito o que fiz. ── Ele suspirou, derrotado, abaixando a cabeça. ── A gente não pode... simplesmente ignorar tudo o que aconteceu? ── Passou a mão pelos cabelos castanhos e fitou o garoto, esperançoso.
── Lógico que não, Louis. Eu fui drogado, quase estuprado e ainda ouvi você dizer todas aquelas coisas. Como você acha que eu me sinto? ── Seu tom aumentou mais uma vez. Era como se ele visse tudo que Louis fazia, um desaforo de sua parte.
── Eu entendo, mas- ── Puxou o ar, enchendo seus pulmões. ── Harry, temos um segredo enorme. Pense em nós e pense na sua mãe por um instante. ── Disse calmo, mas ele estava prestes a explodir.
── Eu só queria que tudo fosse mais fácil. Por que você simplesmente não o acertou, uh? E quando o acertou, por que fez isso depois que ele já tinha dito tudo? ── Franziu o cenho, cruzando os braços.
── Se eu fizesse isso enquanto ele falava todas aquelas coisas, eu deixaria muito na cara. Nós deixaríamos muito na cara. Você não consegue ver, Harry? ── Louis falou, entre um suspiro.
── Ah, sim. Então você deduziu que seria melhor eu ouvir que eu sou um insignificante na sua vida, do que ouvir toda aquela chantagem que não leveria à lugar algum? É isso? ── Harry disse, um pouco alterado, rindo sarcástico logo depois. ── O que eu não consigo ver, Louis? O quê? ── Gritou a última parte, logo indo um pouco para trás, se encolhendo, sendo surpreendido pelo grito em resposta de Louis.
── Que eu te amo, Harry!
Harry paralisou da cabeça aos pés, após se encolher. Foi aí, que sua mente inteira vibrou e ele sentiu como se tivesse acabado de levar um tirou no peito, bem no meio, profundo como um poço. Ele soltou o ar que não havia percebido que tinha prendido, olhando para Louis, sentindo seu corpo inteiro sendo consumido pela culpa e pela decepção. Harry poderia dizer que já havia percebido os sentimentos do homem, mas a insegurança lhe dizia o tempo inteiro que eles não existiam; e ele acreditava.
── L-Louis... ── Saiu dentre seus lábios, como seu último suspiro. Seu corpo amoleceu e ele seguiu com os olhos a lágrima que deslizada pela bochecha vermelha e gélida do homem. Era como se ele observasse uma cachoeira de sentimentos. Louis rapidamente a enxugou, erguendo o queixo, tentando parecer forte ── prometeu mais uma vez a si mesmo que não choraria.
Harry deu um passo em frente, ficando próximo do homem. Fitou seus pés, com os olhos levemente arregalados, sentindo aquela pontada horrível em seu peito, como uma facada. Fitou o homem mais uma vez, correndo para seus braços. Louis permaneceu estático, olhando para frente, sentindo Harry envolver seu tronco com os braços.
Era como se Harry estivesse sumindo em meio ao seu peito, se afundando ali e procurando moradia para sempre. Louis percebeu de fato o que acontecia segundos depois, abaixando a cabeça e fitando o garoto que o apertava entre os braços longos. Louis desabou, relaxando os musculos e se sentindo fraco. Aquela era uma das poucas vezes em sua vida que havia chorado na frente de alguém, uma das poucas vezes que mostrou fraqueza. Bom, ele não chamaria isso de fraqueza; era corajoso demonstrar os sentimentos.
Lágrimas descontroladas preenchiam o rosto do homem mais velho ali, agarrando o garoto em seus braços. Era tudo tão fácil, mas eles não conseguiam ver facilidade em lugar nenhum. Seria tão simples terminar com Kate. Mas como seria destruir o coração dela contando sobre tudo? Como seria vê-la chorar por seu próprio erro? Como seria destruir o coração daquela mulher incrível, aquele coração que ela demorou tanto para reconstruir?
Harry suspirou aliviado, sentindo-se seguro, entre os apertos dos braços do homem em si, aquele que chorava descontroladamente. Harry apenas queria permanecer ali, com aquelas barreiras, acreditando que nada poderia lhe atingir novamente. Louis jamais permitiria que algo o atingisse.
── Eu amo você, Harry. ── Louis sussurrou, após uma tentativa falha de segurar o choro. Por fim, suas falas saíram entrecortadas, pela dificuldade de parar de chorar. Louis só sabia que chorava por amar.
Harry sorriu, sentindo-se no céu por ouvir aquelas palavras. Seu peito aqueceu e suas mãos suavam. Fechou os olhos e escondeu o rosto no peito do homem, rindo fracamente em seguida, pela mais pura felicidade que podia sentir.
── Eu também te amo, Louis.