Capítulo 4 - Brian May

373 49 39
                                    

Acho que nunca fui uma pessoa que acreditasse muito em destino.

Pra mim tudo acontecia porquê tinha que acontecer e só. Mas desde aquele acidente, comecei a repensar algumas coisas.

Em uma cidade tão grande como Londres, eu tinha que ser acertado logo pelo carro de Roger Taylor?

A minha surpresa foi bem maior que o espanto, é verdade, mas pela primeira vez eu podia ser e mostrar a ele o novo Brian, e não aquele de antes.
Por ironia do tal destino, Freddie estava comigo nesse dia. Ele não acreditaria se eu chegasse e dissesse que meu carro foi atingido pelo do loiro, riria sem sombra de dúvidas.

O que intrigou nós dois é que o rapaz nem ao menos nos reconheceu. Talvez ele estivesse apenas fingindo, mas não ganharia nada com isso, certo? Ou apenas não lembrava, afinal já haviam se passado longos anos.

Freddie o analisou em silêncio até o último segundo, procurando vestígios de uma mentira ardilosa, mas não encontrou. Sendo uma pessoa sensata e inteligente, observador, ele sabia pegar as coisas no ar, muito bem, obrigado!

Nós nos conhecemos desde que eu saí de casa para me aventurar e bater as asas em liberdade, coincidentemente isso aconteceu na mesma época em que ele teve a mesma ideia louca que eu.

Até hoje estamos aqui, um cuida do outro de uma maneira única, e ele foi e continua sendo o irmão que eu não tive.

- Eu consigo ver o Nemo nadando nesse seu café de tanto que você demorou beber, amado. - Freddie chega na cozinha como um furacão, abrindo as portinhas dos armários que ficavam em cima da pia e me tirando de meus devaneios. -, você viu onde guardei o meu chá?

- Acho que acabou. - faço uma careta pelo barulho de uma xícara cair de cima da pia, enquanto o outro rapaz pragueja baixinho - Freddie, você não acha estranho... tudo isso?

Ele se vira para mim, os olhos semicerrados, como algum milagre trazia um pequeno sachê de chá entre os dedos, talvez o último que possivelmente ele mesmo escondeu em algum canto.

- Eu sabia que você não ia aguentar e tocaria nesse assunto.

- Não é como se eu não fosse aguentar, eu apenas estou sem entender realmente.

- Não entendeu qual parte, Brian? - fala enquanto enche uma xícara nova com água bem quente e mergulha o sachê. -, ele ter batido no seu carro ou ele saber pedir desculpas? OU talvez o fato dele não se lembrar dessa sua cara de neném?

Fecho a expressão, acho que eu me lembraria se encontrasse na rua com uma pessoa a quem fiz muito mal.

Mas por quê diabos eu queria que ele lembrasse de mim? Pra que continuasse a me maltratar? Acho que eu possuía um lado masoquista desconhecido.

- Não entendi porque você quis tanto que a gente levasse ele ao hospital e muito menos porque chamou ele pra almoçar conosco naquele dia.

Freddie solta uma risadinha e dá de ombros bebendo seu chá em grandes goles.

- Darling, eu queria ter mais tempo para analisá-lo, é claro, além do mais o novo comportamento dele também está me intrigando. E quanto ao hospital, por Deus, Brian! O homem estava sangrando, poderia ter uma hemorragia e morrer, sei lá.

Reviro os olhos.

- Você é tão exagerado, já te disseram isso?

- Eu sou o exagero em pessoa! - ele dá uma piscadela e se levanta levando junto a minha xícara de café ainda pela metade, eu não tomaria mesmo, e se pôs a lavar. - Mas falando sério, Bri... você não tá nem um pouquinho curioso para desvendar esse mistério? Vai, em nome dos nossos velhos tempos.

Freddie faz uma carinha de cachorro pidão.

Antigamente ele gostava de solucionar o que ele chamava de "mistérios" e me arrastava junto, não era nada demais, particularmente eu preferia dizer que ele era a perfeita definição de mexeriqueiro, mas ele dizia que era um ótimo investigador e detetive, e sempre conseguia descobrir o que queria.

- Certo Sherlock, vamos ver. Mas não acho que seja uma boa idéia de qualquer forma.

- Você não acha nada, Watson.

Solto uma risada, ele não tinha jeito mesmo.

- Então, você não vai se arrumar? Temos que estar no pub às 22h - ele olha as horas no relógio, eram 20h30.

- Por que você quer tanto que vejamos essa tal banda?

- Eu meio que sou amigo virtual do vocalista, ele é legal e pediu para eu ir ver o show. - Dá de ombros e eu aperto os olhos na direção dele. - Só amigos, Brian.

- Tá, que seja. Eu vou tomar um banho e você liga pro Deaky, vamos passar lá às 21h30.

- Então se apresse querido, todos nós sabemos que você demora uma vida para se arrumar.

- Acho que se confundiu, meu nome não é Freddie Bulsara. - falo já saindo da cozinha e me direcionando ao banheiro social.

- É Mercury, Brian!!! - ele esbraveja e tenta me atirar uma colher, mas não acerta.

Depois de um bom banho, procuro por uma roupa em que eu me sentisse confortável. Decido por um jeans escuro, uma camisa branca com as mangas dobradas até os cotovelos e botões abertos até o peito.

Meus cachos curiosamente estão bem definidos mas com grande volume, e consigo sentir o cheiro do shampoo emanando dele. Borrifo um pouco de perfume e pego chaves, celular e carteira antes de sair do quarto.

A porta do quarto de Freddie ainda está fechada e consigo ouvi-lo cantarolar alguma música da Whitney Houston, mas não se demora e logo já estavamos indo em direção ao meu carro.

Freddie usava uma calça de lavagem clara, regata branca e uma jaqueta jeans, era possível sentir seu perfume até se estivesse do outro lado da rua, mas não era enjoativo, pelo contrário, ele tinha as melhores fragrâncias.

Em 10 minutos Deaky estava conosco no carro, usava camisa e calça de cor azul e um tênis branco.

O caminho até o pub fora animado, Freddie cantava alto junto com os cantores da sua playlist do Spotify, eu e John ríamos e vez ou outra cantávamos junto com ele.

O ambiente estava terrivelmente cheio quando chegamos, mas de alguma maneira conseguimos uma pequena mesinha na lateral do palco. Eu não beberia pois estava dirigindo, então tomava calmamente um suco enquanto meus amigos bebiam alegremente dois copos enormes com cerveja.

Entre risadas e conversas as luzes do local diminuem e as coloridas do palco se acendem, era possível ver as silhuetas dos membros através da cortina vermelha que ainda encobria a banda.

Uma máquina de fumaça fazia o seu trabalho, e vejo quando uma moça sobe no segundo degrau, o microfone em mãos, os lábios carnudos pintados de vermelho-sangue.

- O momento tão esperado chegou, espero que estejam preparados para essa noite de rock!!! - as pessoas gritam e batem palmas eufóricas. -, senhoras e senhores: KING!

Assim que anuncia o nome da banda e desce os degraus, a cortina sobe revelando quatro rapazes.

As garotas ao redor do palco gritavam ensadecidas e quase não posso acreditar no que meus olhos vêem quando ouço baquetas se chocarem marcando o tempo para começarem a tocar a música de abertura.

- Só pode ser brincadeira! - falo mais alto e viro para Freddie que possui a expressão tão chocada quanto a minha.

Quando o som estridente da guitarra chama minha atenção de volta ao palco posso ter a certeza de que eu não estava alucinando e nem sob efeito de drogas.

Atrás da bateria preta, com os cabelos loiros rebeldes, castigando os pratos de ataque e condução, estava ele.

Roger Taylor.

FIRST | maylorWhere stories live. Discover now