Quinze

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Eu estava passando por uma multidão. Todos me olhavam preocupados. Temerosos. Satisfeitos. Eu não via sorriso em suas faces, mas nem podia mesmo que houvesse algum. Virar meu rosto em sua direção seria um ato de rebaixamento da minha parte, então eu sempre permanecia com a cabeça inclinada. Mas mesmo que eu quisesse demonstrar todo o meu poder, não era isso em que eles reparavam, e sim em meus erros.

Eles sabiam. Todos eles sabiam sobre minha fraqueza.

Eu falhei.

Fiquei olhando diretamente para frente, meus olhos lagrimejavam, mas lagrimas não saiam dos meus olhos. Estava os observando as três sobras negras que estavam paradas logo após aquela multidão. Não dava para ver seus rostos, menos ainda os seus olhos. Eram como espirilos agourentos em que eu já ouvira muitas histórias. Estavam me esperando... Eu viraria como eles. Um ser sem alma.

Eu não podia.

Eu não queria.

Mesmo que eu não quisesse continuar andando, minhas pernas me guiavam como se tivessem vontade própria, para o caos que dominaria a minha vida.

Poder eu ouvi um breve sussurro em meus ouvidos. Glória uma voz me atormentava. Poder, Poder, poder, poder, poder.... Ele nunca parava. Esse murmúrio era próximo demais, incrivelmente perto. Estava entranhado em desespero, querendo a todo custo colocar minhas mãos sobrem meus ouvidos e me esgueirar até o chão, até o momento em que eu não escutasse mais esse tortuoso sibilo melodioso. Meu corpo parecia não me responder, ele não obedecia a um mínimo ato, e me empurrava cada vez mais para a escuridão.

Embora eu tentasse me encolher, mesmo que meus passos fossem brevemente hesitantes, eu não conseguia parar. Não até estar diante deles. Até estar na frente dele.

Olhos azuis. Grandes olhos azuis frios me encaravam. Mas como podia? Se há poucos segundos tortuosos atrás eu mal conseguia enxergar algo que não fosse sombras? Mesmo agora sua face parecia cheia de escuridão, quando seus dedos me envolviam e me puxavam para si. Minha voz sumiu, quando tudo o que eu mais queria era gritar em nosso pequeno contato nada acalorado. Não tinha forças, mas as lágrimas quentes desciam pelo meu rosto agora, ignorando as ordens de não o fazerem. E mesmo que eu não quisesse, eu não podia ignorar a intensidade do olhar, do príncipe sombrio sobre mim. Virei-me aos poucos para encarar os nobres que estavam nos observando, e meu coração quase parou de bater, eles não tinham rostos, vestiam ouro e diamante. E se desfaziam à medida que meus olhos passavam por cada um.

Estavam mortos, mortos, mortos.

Acordei com um grito, puxando todas as cobertas enquanto me sentava, como se elas fossem me proteger de qualquer coisa que estivesse por vir. Estava suada e minha respiração completamente irregular, enquanto meu corpo tremia e parecia ter espasmos. Segurei meu rosto, olhei para os meus braços e depois para minhas mãos. Para então dar um tapa em minha própria face em um minuto de pouca sanidade. Era apenas um sonho, só um pesadelo terrivelmente ruim. Apenas mais um dos muitos que eu tive desde que cheguei aqui.

Eu precisava ir embora. Não aguentava mais essa tortura psicológica. Demorou muito para me acalmar, ainda mais do que nos dias normais. Mas eu sabia o motivo: Hoje seria o dia da oficialização do meu noivado com Elian diante dos olhos dos nobres mais importantes do continente. E um sonho como esse deveria representar o maior medo, que era o de errar. Se cada passo meu já era uma representação de perigo para mim, imagino se algo acontecesse durante um evento tão importante para a realeza de Monteblack? Eu não conseguia nem me dar ao trabalho de imaginar, era torturante demais pensar em todas as possibilidades que seriam sucessíveis de acontecer. Era masoquismo demais.

Nem os primeiros raios de sol haviam aparecido. Sinal que eu teria ainda um tempo para acalmar meus tremores. Então me deitei novamente, porém toda a vez que fechava os olhos para tentar dormir novamente, aquelas imagens contaminavam a minha memória.

Reino ObscuroWhere stories live. Discover now