Capítulo 2 - Zander

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— Vocês sabem como eu amo Maria da Fé, não sabem? Não tenho nenhuma vontade de voltar a viver na capital, nessa loucura de carros, buzinas, assaltos

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— Vocês sabem como eu amo Maria da Fé, não sabem? Não tenho nenhuma vontade de voltar a viver na capital, nessa loucura de carros, buzinas, assaltos... Não, não! — argumenta tia Suria, balançando as mãos na altura do rosto.

— Não é assim também, Suria. Eu tenho uma vida bem sossegada.

— Sossegada? Você já teve dois carros roubados e vive com crises de bronquite por conta dessa poluição. Não venha me dizer que isso é sossego, Santiago!

— Acho Maria da Fé linda, mas não conseguiria ficar na cidade por mais de um mês, parece não ter nada para fazer lá, Suria — rebate minha mãe, entregando-me uma tigela com purê.

Tia Suria ergue as sobrancelhas, chocada com o comentário de sua irmã.

— Tem tanta coisa para fazer que eu passaria um dia inteiro listando. Os campos de oliveiras estão mais lindos, são tantas plantações que logo todo mundo vai saber quem é Maria da Fé neste país.

Eles dão uma pausa na conversa para mastigar, mas logo voltam a falar:

— Hum! Esse picadinho de carne está divino, Tamara. Lembra o da mamãe.

— Lembra mesmo — gaba-se ela, orgulhosa de sua comida ser comparada à da minha avó, que era a chef da família.

— Se nossos pais ainda estivessem vivos iriam amar viver em Maria da Fé. — Tia Suria volta a enaltecer a cidade que escolheu depois que ficou viúva.

— Você nunca foi tão efusiva ao falar de lá, Suria. Está pensando em se candidatar a prefeita? — Meu pai questiona, rindo com a boca aberta e cheia de comida.

— Ora essa, veja esse homem que continua sem modos à mesa.

— Tenho que concordar com Suria, Santiago — reclama minha mãe, dando um tapa na mão dele.

Não tenho entusiasmo para interagir, então paro de prestar a atenção nas trivialidades que dizem e foco somente no meu prato até ouvir meu nome.

— E você, Zander?

— O que tem eu? — pergunto, sem ter ideia do que me foi perguntado.

— Você viveu em vários lugares quando estava no exército, não tem vontade de visitar outros tantos?

Baixo o olhar pensando no que dizer. Um, sim, é o que ela espera, e então dará uma aula sobre sair e visitar lugares, mas se eu disser não é provável que faça a mesma coisa.

— Não — respondo simplesmente.

Volto a comer, mas noto os três se entreolharem em silêncio, como se eu tivesse dito algo absurdo ou ofensivo. Repouso os talheres ao lado do prato, viro-me para minha tia.

— Mesmo se eu tivesse vontade, não haveria muitos lugares para eu ir agora que eu... que eu...

Minha mãe pigarreia e se levanta dizendo:

— Vou pegar a sobremesa. Fiz uma mousse de abacate que vocês vão adorar.

Eu sei que não sou uma boa companhia, sei que ficar ao meu lado é tão sufocante para eles quanto é para mim. Por isso, fico nos fundos me exercitando ou no quarto lendo. Assim, eles podem manter sua rotina sem ter de lidar diretamente comigo por muitas horas do dia.

Regresso ao quarto quando se levantam da mesa. Escolho um livro, pronto para me perder na leitura e esquecer da vida algumas horas.

Depois de algum tempo ouço uma batida à porta. Tia Suria coloca a cabeça no vão e pergunta se pode entrar. Ela é pequena, menor que minha mãe, os cabelos tingidos num tom de loiro escuro é a mesma cor de seus fios naturais. Caso não fosse pelas rugas que os anos lhe trouxeram, sua aparência seria a mesma desde que eu era um menino.

— Posso me sentar? — pergunta ela, apontado para minha cama.

— Claro, tia. — Ela se senta e analisa o quarto que ainda ostenta a decoração adolescente de antes de eu ir para a escola militar.

— Você ainda é fã dessa banda? — Aponta para um poster do Green Day preso na parede desde que eu tinha dezessete anos.

— Ainda. — Alguns segundos se passam sem que ela diga mais nada, apenas olha ao redor. — Aconteceu alguma coisa? — questiono.

Tia Suria respira fundo.

— Querido, eu quero te propor um trabalho.

Ela se vira para mim, segurando uma mão na outra na altura do peito.

— Trabalho?

— Em Maria da Fé, no projeto de ampliação da fazenda Villa Oliva.

De primeiro momento, acho que ela está brincando e sorrio de canto, mas o semblante sério mostra que diz a verdade.

— Eu...

— Você é engenheiro civil. Martim e Pilar precisam de alguém para projetar e acompanhar a construção de um novo armazém, eles vão aumentar a produção e...

— Tia... — começo a dizer, interrompendo-a. Como ela pode pensar que nesta condição eu possa ir à cidade que mora trabalhar em qualquer coisa que seja.

— Sei que você quer negar, que você quer me dizer um sonoro não. Como aquele que me disse há pouco no jantar. — Ela hesita um segundo. — Posso demorar para vir, mas sei o que está acontecendo, querido, você só vive entre essas paredes.

Ela tem razão, é exatamente isso o que acontece, passo meus dias enlouquecendo dentro desta casa. Mas, não porque quero e sim porque fui obrigado quando minha perna foi arrancada do meu corpo.

— Não preciso disso, tia. — Ela entende a seriedade no meu tom. A última coisa que quero agora é mais alguém lamentando a minha vida.

— Não vim só por isso, eu queria ver vocês, pessoalmente. — Ela sorri e ajeita seu casaquinho de lã.

— Agradeço que se preocupe comigo, mas eu não preciso de...

— Sou eu quem preciso, Zander. — Ela segura minhas mãos. — Havia um engenheiro que fazia esses projetos na cidade, mas vários produtores tiveram problemas com ele. Pilar me perguntou se eu conhecia alguém na capital e eu lembrei de você. Você estudou tantos anos, sei de sua competência...

— Isso não é...

— Um plano para tirar você de casa? É claro que não! Acabei de dizer à sua mãe sobre esse trabalho e ela não gostou. — Ela revira os olhos para expor que não dá bola para minha mãe. — Mas, você teria que morar em Maria da Fé por um tempo.

— Eu não dirijo e...

— Eu dirijo — responde, apressada. — Além do mais, a cidade tem vários motoristas que passam o dia levando as pessoas de uma fazenda para outra.

Baixo a cabeça ponderandosua proposta. Talvez seja uma maneira de eu desempenhar a profissão que aprendidentro da armada, talvez seja uma forma de eu ter alguma perspectiva nessa vidanula e vazia que levo. Talvez seja o destino acenando para mim outra vez

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Sem DestinoWhere stories live. Discover now