Capítulo 17

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Correndo em plena chuva, Laura tentaria a todo custo convencer Theo de que desistisse de tudo e fossem logo embora. No começo ela entendia todas as razões dele, a final de contas ela estava praticamente exigindo dele que abandonasse tudo o que havia construído, assim de uma hora para outra.

Mas por outro lado ela entendia o que Leon tanto implicava. Theo estava muito instável, um vampiro que recém passou pela mudança e completamente confuso. Em algum momento ele poderia se tornar algum tipo de ameaça. Além claro de todos os mistérios que o circundavam.

Resumindo, ela sentia que ter ido até aquela igreja tinha sido uma péssima ideia.

Perto o suficiente dele, Laura segurou um dos seus ombros e o incitou levemente contra si para que ele se levantasse e voltasse para o carro. Ali ele estava muito desprotegido, e na atual situação eles não poderiam se dar ao luxo de arriscar tanto.

- Vamos para o carro. - Laura insistiu - Isso tudo não vai dar certo, pelo menos não agora... - ela precisava soar sensata.

Mas ele a ignorou. Ele olhava fixamente para baixo, estranhamente vidrado na água que empoçava os seus joelhos. Ele parecia sussurrar, o seu lábio superior repuxando de tanto estresse.

- Theo? - ela insistiu.

- "Acabou..." - ela conseguiu ouvir de Theo. Mas, para o seu espanto, o tom e o timbre pareciam muito diferentes, um som mais profundo do habitual - "Aceite o seu destino... Termine esse sofrimento..."

- Eu me lembro de você... - a voz de Theo então voltou, mas dessa vez afetada e exausta – Eu me lembro... - as frases saiam incoerentes – No espelho, era você. Nos sonhos... Quem é você?!? - ele esmurrou a poça de água, fazendo o aglomerado se desfazer por um instante – Diga, seu filho da puta!

E um sinal de alerta brotou dentro da mente de Laura.

"Ele está conversando consigo mesmo?" - a constatação a fez se horrorizar.

Nunca em todos esses anos vivendo em meio ao sobrenatural Laura viu algo parecido acontecer. "Como ele poderia estar falando consigo mesmo? Não fazia o menor sentido" - pensou.

Parada e ajoelhada junto a Theo, Laura permanecia em silêncio e atenta, captando cada informação que podia do que estava ocorrendo. Ela queria saber com o que estava lidando.

- "Você sabe quem eu sou... Em momento algum isso foi um mistério..." - a voz voltou a sair de Theo, ainda mais enigmática - "Mas e você?" – a voz o instigou.

- Quem sou eu...? - Theo indagou com a respiração entrecortada, seus olhos vidrados fitando intrigados a imagem que impossivelmente conversava com ele – Eu não...

- "Pelos seus olhos eu vi pela primeira vez o mundo. Pela sua mente eu entendi como ele funcionava. Cada comportamento, cada palavra. Eu aprendi com você. Aprendi sobre você."

Ele não está conversando consigo... Definitivamente não... - ela constatou.

- "Nós fomos abandonados por nossos pais. Sem amor, sem carinho. Vivendo com pessoas que lidaram com esse fardo de nos cuidar" - o vermelho dos olhos da criatura parecia pulsar de êxtase.

- Mas... - Theo tentou argumentar.

- "Não adianta, Theo. Você mal consegue se enganar..." - a criatura o olhou sério - "Deixe de ser, apenas uma vez, um mero espectador de sua própria vida! Mostre quem realmente é!"

Todas as palavras expelidas pelo reflexo eram como tapas seguidos, um mais forte que o outro. Cada sentença o fazendo cair em si e ficando encurralado.

As Sombras da AlmaWhere stories live. Discover now