Conto 3 - O fim? - Laury Alves

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O fim?

Laury Alves

  

Amar alguém deveria ser difícil, certo? Mas na verdade é fácil. Eu diria fácil de mais. Acho que uma força superior deveria desejar o nosso bem e tornar difícil de acontecer uma das coisas que mais lhe machucará no futuro: se apaixonar. Não posso dizer que me apaixonei muitas vezes, mas ao ler o bilhete que se encontrava em minhas mãos, senti que foram vezes suficientes.

Eu não te amo.

Desculpe.

Desculpe. Aquilo ficou girando e girando na minha cabeça inúmeras vezes. Ele estava pedindo desculpa por não me amar? Será que ele não entendia que aquele não era realmente o problema? Ele não deveria pedir desculpas por não me amar, mas sim por ter me deixado acreditar que amava, me deixado cair em seus braços como se eles fossem minha casa para sempre, como se ele fosse tudo o que eu precisava para viver.

Porque era isso que ele era.

Mas agora não era mais. Nunca mais seria.

Suspirei observando minha cena decadente, jogada no chão, os sapatos do que deveria ser uma noite divertida abandonados como lixo. Na verdade abandonados como o meu coração. Roupa de festa, maquiagem borrada e um esmalte que se desfazia como minha vida naquele momento. Pensei nas várias pessoas que já ouvi dizer que se matariam por amor. Ou pela falta dele. Elas alegavam que o vazio era grande de mais. Insuportável.

Era quase isso que eu sentia. Sentia o vazio, a mágoa, mas também sentia a raiva de ter sido usada. A raiva de não ter significado nada. Porque na verdade eu não significava, não é mesmo? Ele havia passado a noite comigo e não se dado ao trabalho de dizer alguma coisa, nenhuma vez, nem quando me disse adeus como se fosse me ver no outro dia, nem quando me beijava e me entregava aquele envelope estúpido com suas desculpas mais estúpidas ainda.

Tirar minha própria vida.

Pensei sobre isso e não demorou muito para me ver gargalhando. Talvez todas as pessoas que já fizeram isso pensaram que iriam fazer as outras sentirem remorso. Mas como alguém que vê você como nada sente a sua morte? Para mim alguém se matar por alguém, só faz aquele alguém se sentir mais importante do que realmente é. Mais importante do que um dia foi.

Eu não faria isso. Definitivamente não.

Um dia aprendi que só há uma coisa mais poderosa que remorso: ciúme. Mas o ciúme não ganhava apenas nisso, mas no fato de você poder ver os efeitos dele. Sorri maliciosa enquanto picava o recado a minha frente em pedaços incontáveis. Meu coração poderia estar tão rasgado quanto aquele papel, mas eu não deixaria um canalha saber disso. Na verdade, eu teria o prazer de fazê-lo pensar que estava perfeitamente inteiro, vermelho e reluzente. Batendo como se tivesse coisa melhor para fazer do que lamentar.

Levantei, joguei o salto no fundo do armário, tirei a maquiagem e o vestido, enquanto procurava por uma acetona e algodão. Outra coisa que não contavam sobre o amor era que ele lhe fazia fazer coisas de que realmente não gostava. Eu odiava ser uma “dama”, usar vestidos, salto e todas aquelas coisas que “mulheres elegantes” deveriam usar. Mas ele gostava. E durante todo o tempo que estive com ele, o amor me fez gostar também. E para quê? Para no final eu ganhar um bilhetinho de “desculpa, mas não te amo”.

A raiva fez com que eu quase arrancasse minha unha juntamente com o esmalte, mas ela conseguiu sobreviver e voltou a ser a minha velha e normal unha enquanto eu me vestia de forma confortável. Short e camiseta. Alguma vez já existiu combinação melhor que essa? Eu sinceramente duvidava. Olhei para toda a tralha que eu estava usando antes e desejei jogar tudo fora, da mesma forma que desejei jogar fora todo o sentimento que um dia havia preenchido meu coração.

Eu, Você e o Natal - Contos inesquecíveisOnde as histórias ganham vida. Descobre agora