Quem?

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Quando a libertação torna-se um objetivo,
não há ninguém que possa impedir de fazê-la possível.

Por mais que os caminhos sejam alterados, mesmo havendo a insistência do destino em instigar a lembrança do passado, sempre haverá um futuro inteiro pela frente.



Glasgow não é tradicionalmente uma cidade de muitas cores. Com a chegada do inverno, é possível perceber os toques mais profundos da escuridão, onde umidade e chuva costumam fazer com que a paisagem e a vivência sejam alteradas. O frio por si só não é o suficiente. É preciso mais. O clima agressivo da nova estação, que impede que os habitantes saiam de casa frequentemente, é certeiro nas consequências da falta da luz dos dias de sol alto. A neve branca, que cobre as ruas e os campos verdes, impossibilita os grandes deslocamentos, sendo necessário precaver-se com muita antecedência. E é nessa movimentada cidade que mora um dos homens mais influentes e bem sucedidos de todo o Reino Unido.

Com barba e bigode sempre muito bem aparados, Francis Alexander Lancaster Bauffremont-Courtenay ainda teima em carregar uma espada como parte do traje. Apesar da imponência — na qual ele próprio compreende —, gosta de se autodefinir como uma pessoa de poucas, mas úteis palavras, expressadas sobretudo à filha e à família, aos funcionários, aos poucos amigos e às reuniões de trabalho.

Parte do Parlamento Escocês, Francis faz-se presente como um dos representantes do país na Câmara dos Comuns, a Câmara Baixa do Parlamento do Reino Unido, responsável pelos direitos das pessoas comuns. Muito distante e crítico da Câmara dos Lordes, que também é parte do Parlamento e é representada pelos grupos mais abastados da sociedade, e que inclui a realeza, ele possui a árdua tarefa de manter-se firme aos princípios que carrega consigo.

Muito servil e solitário, reside em uma grande mansão junto da filha Rosalie Frances, de nove anos e meio. A menina, também muito sozinha, assim como o pai, vive acamada em função da incurável tristeza já tratada por diversos médicos. A permanência do desânimo, que insiste em dar as caras quase diariamente, resulta em uma menina mais e mais debilitada emocionalmente.

Sem alegria de viver, ela pouco aproveita o lado externo da casa, os amigos são limitados em três e está resignada a estudar a maior parte do tempo, pois é apenas o que se dispõe a fazer com certa felicidade. Após perder a mãe de forma abrupta, aos cinco anos de idade, tanto ela como o pai precisaram encontrar uma forma de se reinventar e viver sem a presença de Marie, uma das mais famosas escultoras da Escócia e o maior amor da vida deles.

Para isso, planejam um calendário, onde presentes os dias das visitas esporádicas aos avós paternos da menina, a única família ainda viva. Os eventuais passeios, programados para as férias da criança ou para alguns dias do escasso verão, permitem que Rosalie tenha mais fôlego com a vida tão difícil e já considerada, de certa forma, como uma subsistência.

A melhor amiga da criança, segundo a própria, é a égua puro sangue inglês na cor castanho queimado e nomeada como Annis. O presente, dado pelo avô no aniversário de sete anos, foi um dos melhores da raça. Escolhido com a ajuda de Francis, foi entregue para Rosalie como uma surpresa, na intenção de fazer com que a menina levantasse da cama. A ideia, um tanto duvidosa, surtiu efeito positivo por algum tempo. Mesmo com a presença de tantos apesares, a pequena jovem triste, mas bastante falante, ama o animal e, nos poucos momentos de diversão que possui, ama cavalgar na companhia do pai pelos campos verdes da cidade.

— Rosalie, seu professor estará aqui em trinta minutos. Por favor, esteja pronta. — Avisou ele da ponta do corredor dos quartos, enquanto a menina ainda tentava finalizar o cabelo com um grosso laço de fita. Esperava ser ouvido, mas preferiu ir até mais perto, porque ela provavelmente estava atrapalhada com algo, tal qual sempre se encontrava.

LiberdadeWhere stories live. Discover now