1º Capítulo: A corrupção da Alma

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Era uma manhã como outra qualquer. Os animais já vagavam preguiçosamente pelo terreno, aguardando pelos primeiros cuidados do senhor das terras.

Albert era um homem modesto, de coração nobre, pacato de ações e mente abarrotada de ideais. Vivia com a família – esposa e cinco filhos – em uma pequena casa de alvenaria com algumas paredes erguidas e reforçadas com barro, as quais protegiam muito bem os três quartos da casa.

A vida que levava agora era uma dádiva, um presente do destino para compensar o passado negro e turbulento. A pouco mais de uma década, ele e a esposa fugiram das terras do rei em busca de um futuro melhor. E ali estava ele em suas próprias terras, cuidando de seus animais, vendo sua mulher preparar o desjejum e os seus filhos correrem por um mundo sem cercas e sem violência.

Margareth era uma mulher doce e delicada, tão pequena que o marido tinha a impressão de que, se fosse possível, a quebraria ao meio toda vez que fosse abraça-la. Mas, todos ali sabiam que, apesar das aparências, possuía uma força e uma resistência incríveis!

Ela era uma sobrevivente e não se vangloriava disso. Sempre tentava empurrar o passado para o canto mais inóspito de sua mente, na esperança de um dia se apagar totalmente. Entretanto, toda vez em que olhava nos olhos de sua filha mais velha, sentia um gosto amargo na boca e uma escuridão consumir-lhe a alma.

Margareth a amava, assim como amava a toda sua família. Contudo, os olhos inocentes e verdes da menina a arrastavam para outro olhar esverdeado e cruel... Um olhar que ainda assombrava os seus sonhos.

Ela e o marido fugiram do Reino de Larkwrym na calada da noite, com Albert carregando um pouco mais de 20 moedas de ouro – merecidamente roubadas de seu dono original – e ela carregando na barriga a meiga Flora.

Enquanto o pai ordenhava as vacas, a mãe arrumava a mesa para o café da manhã e os irmãos brincavam com as cabras, Flora tentava correr para o mais longe possível da casa e mais perto de onde se podia ver a mudança da vegetação; um território de transição entre dois distintos cenários, entre a planície dourada e a mata densa.

Ela buscava naquele descampado o local que a permitiria ver algumas árvores altas, plantas exóticas e animais estranhos e belos que, por algum motivo, sempre saiam apenas de manhã e jamais perambulavam pelo campo. Seu pai dizia que se fizessem o contrário, poderiam se tornar o jantar de seus predadores, mas Flora nunca viu tais caçadores... Nem mesmo quando Albert acordava pela manhã reclamando da ausência de algum animal da criação ou quando a mãe prendia a todos dentro de casa até o pai terminar de enterrar alguma carcaça.

Flora parou de correr e se curvou para recuperar o fôlego. Aproveitou para se espreguiçar e olhar ao redor. Estava envolta por uma vegetação enfadonha e amarelada que batia na altura de sua cintura. Atrás de si estava a sua casa, rodeada de animais domésticos e de um pouco de grama extremamente verde, além de alguns pés de fruta, bem como pequenas plantações de verduras e legumes – graças aos cuidados de Albert com o solo. Também havia algumas flores brancas, rosas e lilás, as quais, de acordo com sua Margareth, eram pequenas Flores do Campo.

A sua frente podia ver, ainda um pouco distante, a tal transição entre planície e mata. A sua direita era o horizonte amplo, aberto e lindo, o qual se tornara uma de suas vistas prediletas ao final do dia, pois, graças à vegetação baixa e à ausência de construções, era possível assistir a um belíssimo pôr do sol, cheio das mais vivas cores e raios esplendorosos!

E a sua esquerda, ao longe, podia-se ver o telhado e a fumaça que saia da chaminé de um de seus pouquíssimos vizinhos, os Shieldlife. Aliás, eles eram os únicos mais próximos e ainda visíveis, já que os demais estavam distante o bastante para não serem vistos.

Sem NomeWhere stories live. Discover now