Prólogo [1]

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O som das risadas dos adultos e a troca de olhares satisfeitos entre si, denotavam que tudo estava como eles gostariam que estivesse. Teresa, Rodolfo e Nicole estiveram ali na Fazenda do Riacho Doce, por apenas um final de semana. Haviam ido visitar os parentes que há algum tempo não viam, e foi uma rápida estadia para apresentar sua filha recém-adotada. Nicole chegou à família dos Netto Andrade e Macedo Aguiar, com muito carinho e amor. E as crianças entenderam-se tão bem, que a despedida foi dolorosa para Bernardo e Rosa, embora não fosse tão perceptível aos olhos dos adultos.
Algum tempo depois, a família reuniu-se novamente. Bernardo já tinha seis anos, Rosa, nove, e Nicole quatro. A reação do garotinho ao rever a priminha — que para ele era como a primeira vez já que não se recordava muito dela — não foi diferente da anterior. Ao deparar-se com a pequena garotinha de franjinha e tranças, corpinho franzino e sorriso doce dentro de um vestidinho verde cheio de babados, Bernardo não conseguiu evitar: queria brincar com Nicole e mostrar todas as maravilhas da fazenda para ela. Rosa, já não se importava tanto com a atenção da priminha, mas queria estar junto com os dois nas brincadeiras. E nem poderia escapar daquilo, afinal, era a mais velha e, portanto, responsável por eles.

Bernardo era protetor demais com a criança mais nova. E Rosa achava aquilo engraçado. Os dois andavam de mãos dadas aonde quer que fossem pela fazenda, com a mais velha sempre atrás os observando. Brincaram com as galinhas, com os patinhos, com os cãezinhos. Colheram frutas, mexeram na horta com tia Laura e tia Teresa. Comiam juntos na panelinha de Bernardo, pois ele queria que Nicole sempre almoçasse com ele e o menino desde novinho, não comia em pratos. Brincaram de balançar na rede aos finais da tarde, andaram de barco com os adultos na outra manhã, nadaram de rio à tardinha com os pais, e beberam leite ao pé da vaquinha.

Nicole seguia Bernardo para todo o lado, como se ele fosse o desbravador aventureiro de suas brincadeiras. Ele nunca tirava o olhar cuidadoso da menina, e queria que a prima morasse na fazenda com eles, assim poderiam brincar por muito tempo. Mas, novamente, quando chegou à vez da despedida, a tristeza o assolou. Um dia antes de Nicole e seus pais voltarem a São Paulo, tia Laura contou ao filho que eles iriam embora, e Bernardo, claro, fez pirraça. Era pirracento dos mais insuportáveis desde criança! E só desemburrou a face, quando o seu pai apareceu ao seu quarto em tom autoritário, mas também acolhedor:

— Bernardo! Vamos parar de má-criação! Eu vou contar até três para você descer e se comportar!

O menino olhou com medo para o pai, e calçou os chinelos ainda emburrado. Então Fabiano sorriu por baixo do bigode, e quando o filho se aproximou, colocou a mão na cabeça dele bagunçando os cabelos do garoto, de forma cuidadosa:

— Você não quer que a Nicole vá embora triste, por você não brincar com ela no último dia, não é?

O menino não olhou para o pai, e apenas se limitou a dizer:

— Eu não quero que ela vai embora nunca, papai.

Fabiano sorriu novamente. Entendia o que estava acontecendo e até achava engraçado. E foi ele quem fez os outros adultos perceberem o óbvio: aquele era o primeiro amor platônico de Bernardo.

— Quem sabe quando adultos eles não se casem? — Laura falou à sala, onde todos observavam com admiração as duas crianças.

— Mamãe, eles são primos! — Rosa advertiu enojada.

— É verdade, Cora! — Rodolfo exclamou como o pai de menina, zeloso e ciumento que já era.

Mas, no fundo, aquela era a vontade de Laura Coralina. Ela achava que não haveria história mais romântica do que um amor de infância que se torna real. Talvez, fosse apenas uma maneira de lidar com a frustração de sua própria vida. Amava Fabiano, era verdade! Ele tornou-se o homem com o qual ela formou família. E como ele era apaixonado por ela e ela por ele! Mas, nas profundezas de seu coração, as memórias infantis de Laura não a deixavam esquecer-se de uma pequena pergunta: E se, ela houvesse se casado com o seu primeiro amor?

Depois daquela vez, Bernardo, Nicole e Rosa nunca mais se viram de forma direta ou se falaram. Laura e seu irmão Rodolfo trocavam cartas, telefonemas e muitas promessas de reencontros, que infelizmente não aconteceram. A vida encarregou-se de ocupá-los demais com a rotina familiar e a expansão do trabalho na fazenda, já que eram apenas Laura Coralina, Fabiano e um ou outro ajudante quando necessário. Logo, as crianças eram maiores e também ajudavam, mas nunca queriam sair do rancho para visitar o tio em São Paulo. A educação dos filhos também lhes prendia. Sair de seu lar campestre para passear era na maior parte do tempo, impossível para Cora — apelido de Laura — e Fabiano.



>> continua... 

No Coração da FazendaWhere stories live. Discover now