Arrependa-se

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PARTE 2

O coro celestial trovava a canção final na abside com a maestria de um idôneo.

A missa havia acabado, os fiéis retiravam-se da capela com o costumeiro cumprimento da paz. Como de praxe o sacristão e seus auxiliares fecharam as janelas e portas, organizaram-se para a partida.

Todos haviam ido, exceto um. No fim dos bancos estava ele, diário em mãos e vestido de preto. Pelo silêncio que fazia da nave central, ouviu-se um riso baixo, mesclado com o suspiro incontido do Padre.

Taehyung, ao lado do ambão coberto por tecido verde, segurou firme a sua estola de mesma cor. Olhou para cima, para as inúmeras imagens celestiais, clamou a Deus por um pouco mais de paciência.

— O que engendras desta vez, Gregori? — perguntou, descendo do altar.

No entanto, ao contrário do que esperava, Taehyung seguiu pelo transepto, indo em direção às salas traseiras da igreja. Gregori o perseguiu, fazendo-lhe o favor de apagar as lamparinas restantes do salão. Encostou-se ao umbral da porta, assistindo o clérigo retirar a alva e estola, guardando-a, assim ficando com sua batina permanente. O patuá propendia em seu pescoço, na frente o crucifixo prateado, atrás um pequeno retângulo com a imagem do santo padroeiro da capela.

— Vim furtar um pouco de tua atenção.

O Padre saiu da sala sendo seguido de perto, travaram frente ao confessionário, lugar onde se viram pela derradeira vez.

Fazia um mês inteiro que Gregori havia estado ali, trinta dias de orações impetuosas em que Taehyung fragmentou-se entre clamar misericórdia para afastá-lo de si e pedir momentos de mais visitas inoportunas.

— Esta es a tua maneira querençosa de dizer-me que sentiu saudades?

— Garanto-te que meus modos para demonstrar tal sentimento são mais concupiscentes, Padre.

— Gregori, não me pilherie na casa do Senhor — repreendeu-o — Achei que tivesse posto um ponto final nisso.

— O único ponto final que porei será quando teus lábios proferirem a verdade de quem é.

Eles se enfrentaram, silenciosos, minuciosos. Taehyung observou cada partícula aparente de Gregori, exatamente tudo que lhe foi exposto era magnífico. Embora comportasse alguns arranhões, a imundice da devoção dele para consigo lhe deixava estonteante.

Tinha que confessar, Gregori não lhe dava ódio, mas egolatria.

Já Hoseok, perspicaz em anular a barreira de formalidades, contemplava as feições delicadas e marcantes de Taehyung. Não se incomodava quando todos o chamava de Gregori, seu sobrenome, mas quando o Padre fazia, sobrepondo uma longinquidade entre eles, sentia arrefecimento.

— Eu já disse — o clérigo falou cansado — Eu sou Padre, estou aqui pelo Senhor, para o Senhor. Casei-me com ele e a igreja e morrerei assim.

— O celibato é uma presa para os fogos devoradores e de poucas ideias e, apesar de eu ter muitas ideias, ímpias — ressaltou — o seu Celibato foi estabelecido por insegurança. A vida de celibato sacerdotal foi uma atração para ti, porque assim poderia camuflar teu verdadeiro eu — acusou, elevando o índex até tocar o peito de Taehyung.

— Este é o meu verdadeiro eu! — exaltou-se, o tom de voz subindo dois oitavos, descaradamente mentindo, pior, perante o Senhor.

— Você gosta de homens! — denotou.

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