Era uma tarde quente demais quando o carro saiu. Era uma noite muito fria quando Dulce descobriu que sua vida iria mudar de cabeça para baixo.
Com o luto não vem apenas a tristeza, vem a raiva, vem a negação, vem a dor profunda. O silêncio, o silên...
— E a perdi. — Mateus me encarou, os olhos arregalados.
— A perdeu? Como assim a perdeu, Guilherme?!
— Ela está louca, saiu correndo e sumiu no meio das pessoas, fui atrás mas não a achei de maneira nenhuma. Dulce parece ter sido abduzida pelo chão.
Mateus abaixou a cabeça, as mãos segurando o cabelo claro em desespero. Apoiei minha mão em seu ombro e apertei.
— Vamos achar ela, fica calmo.
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•°Dulce Maria°•
Uma vez, quando eu ainda era uma criança, vi meus pais brigarem.
Era tarde da noite, eu já estava dormindo, quando acordei com o barulho de algo pesado caindo no chão.
Vidro se quebrando em pedacinhos. E depois vieram os gritos.
Acontece, que minha mãe abominava a existência de bebidas alcoólicas, e que meu pai era um viciado em álcool do pior tipo.
Eu me levantei da cama enquanto ainda escutava os gritos, as brigas. Andei até a ponta da escada, abraçada com meu urso de pelúcia.
Meus pais estavam brigando na cozinha, minha mãe segurava o pano de prato apertado contra a mão esquerda. O pano de prato, que antes era branco, agora estava encharcado de vermelho.
Eu me lembro de chamar minha mãe e meu pai, ela se virou, me encarando como se estivesse arrependida de algo terrível. Meu pai continuava gritando, lutando uma luta sozinho.
Minha mãe veio até mim, quando ela se ajoelhou, me abraçou, suas mãos faziam carinho em minha costas, eu percebi que estava chorando quando minha visão ficou embassada.
Meu pai disse algo, parado de onde estava no batente da porta, o braço direito estava encharcado de sangue.
Me lembro de gritar, me lembro da minha mãe tampando meus olhos e gritando alguma coisa, meu pai respondeu, estressado. Então ela simplesmente disse:
— Vá embora.
E ele foi, a porta bateu com tanta força no batente que eu senti meus pés tremerem.
Desde então, eu sempre ficava com medo de meu pai, tinha medo das garrafas de bebida, e não gostava nem de chegar perto. Era algo parecido com um monstro para mim.
