⏳. Você é real, Ágape?

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Hoje é um daqueles dias que não tem data. Não tem data, nem nome da semana. Não tem data, nome da semana, minutos ou horas. Não tem data, nome da semana, minutos ou horas e nem sorrisos.

O hoje não é um dia mais.

As coisas mudam quando nós abrimos os olhos. Eu pude encarar meus lençóis várias vezes, mas eles não me aqueciam. Eu pude abraçá-lo durante a madrugada, mas ele não me esquentava mais. Eu pude ligar o aquecedor, mas eu estava tão gelada quanto a Antártica. Eu estava congelando aos poucos, e sabia o motivo.

O tempo passou rápido demais.

A sensação de estar sendo observada só aumenta e vem me matando aos poucos. Sinto que se fechar os olhos pra dormir de novo, alguém vai passar pela janela e vai acelerar o tempo. O tempo está indo muito rápido...

Quando me virei na cama, ainda senti os braços dele em minha cintura. Mas então vi um daqueles quadros presos na parede, e tudo rodou lentamente. Aquele baque de ver que tudo vai passar. Tudo passa. Tudo. Seja bom ou ruim, passa correndo. Às vezes escapa das nossas mãos mesmo que nós demos nossa vida pra cuidar de alguma coisa. Tudo escapa, tudo se vai. Tudo morre. Meu tempo morre, meus sentidos morrem, meu coração morre.

Passarinhos são tão bonitos. Eles voam para longe com uma liberdade tão linda de se ver. Eles podem voar para onde quiserem. Pousam um pouco em alguma árvore para descansar o pulmão, e depois continuam voando. Eu gosto de pássaros, mas sabia que hoje não teria nenhum para ver do lado de fora da janela. Eu gosto de liberdade. Mas estava tão presa, não só no abraço dele, mas tão presa no tempo que não podia correr.

Presa nos minutos inexistentes.

Namjoon falava que a lua ilumina nosso viver. Mas eu não gosto do sol, ele queima. E o sol faz a lua brilhar. Será que é por isso que corro das noites e dos dias? Corro pra não me queimar com o brilho do sol? E será que, na maior confusão e mesclagem, também corro das pessoas? Corro daquele brilho tóxico, corro do brilho que é iluminado por outro ser que não conheço?

Eu tento brilhar por mim mesma. Mas no fim, estou tão vazia que nem brilhar eu consigo. Tão oca que respirar dói. Tão confusa que não tenho mais voz pra gritar.

Meu par de tênis está jogado no meio do quarto. Porque diabos não o arrumei mais cedo? Me agonia. Coisas fora do lugar me agoniam. Me lembro então das horas, que nunca estão em seu devido lugar. Já se passaram cinco minutos desde que abri os olhos. Eu não queria contar, mas estou contando. Me matando lentamente. Morrendo para poder contar. Um, dois, três, morrendo. Matem-me suavemente, por favor.

Dez minutos voam tão rápido. Mas dez minutos é algo tão demorado, então porque passou tão rápido dessa vez? Numa tentativa absurda de fazer tudo parar de passar, minhas mãos agarraram as mãos dele na minha cintura. Senti a textura de sua palma suada, senti as veias nas costas de sua mão. Eu não via seu rosto, mas pude fechar os olhos e ao mesmo instante que segurava sua mão, também senti sua respiração em meu pescoço. E naquele segundo em que congelei, pedi em um sussurro de leve algo como "faça o tempo parar pra mim". Sim, Kim, faça parar. Não quero ver a dolorosa imagem do sol chegar e você partir.

Será que anos já se passaram desde que te vi pela primeira vez? Eu não sei contar o tempo muito bem. Dói a cabeça, dói. Então prefiro pensar nos álbuns de música que já escutamos juntos. De certo, eu o conheço desde que ouvimos Parachutes umas duas ou três vezes, ou quem sabe todas as faixas de Abbey Road. Céus, me lembro até dos toques do piano que ouvimos naquele aleatório domingo. Quantas músicas será que faltam para ele acordar, então?

— Você pensa alto demais. — Foi o que ele disse contra meu pescoço quando acordou.

Eu não disse nada, não sabia o que dizer. Não sabia como pedir ajuda pra ele me puxar pra fora daquele poço, não sabia mais nem como falar. Ele sentia que eu não estava bem, eu sabia que ele sentia isso. Mas por algum motivo, hoje ele não me perguntou nada sobre mim. Talvez nossas estrelas se alinharam demais hoje e ele talvez esteja sentindo o mesmo que eu.

Cronofobia • knjWhere stories live. Discover now