Capítulo Dois

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Acordei atrasada. Muito atrasada. Por algum motivo, o alarme do celular não tocou, e eu não gastei um segundo para descobrir a razão. Pulei para fora da cama, chutando as cobertas quentinhas e sedutoras, encontrei um vestido roxo na caixa "para doação" e me vesti. Agarrei minhas sapatilhas favoritas e uma escova com uma mão e a mochila com a outra.

- Bom dia, Miss Sunshine. Pensei que já estava na escola. – tia Becky falou quando entrei na cozinha correndo. Ela me olhava por cima de uma xícara fumegante.

Com trinta e dois anos, cabelos curtos e em um bagunçado sexy, olhos amendoados e usando calças folgadas estampadas e regata que deixava a barriga parcialmente exposta, ela parecia uma modelo se preparando para um comercial despojado. Meu estado merecia um "Miss Sunshine" em tom irônico.

- Bom dia, Becky. – falei, enchendo minha garrafinha térmica com café. - Rola uma carona? - perguntei esperançosa.

- Uma sílaba: Max.

Concordei com um aceno e notei Calum em uma das cadeiras, mastigando cereal preguiçosamente com os olhos inchados.

- Noitada boa, Cal? – perguntei para meu irmão mais velho.

- Uma das melhores. – respondeu, com algo próximo a um sorriso.

- Pode me levar para a escola?

- Tenho uma entrevista de emprego e preciso de tempo para me livrar dessa cara.

- Você precisaria do dia todo. – resmunguei, mordendo uma torrada e queimando a língua.

Ele me ignorou totalmente. Calcei as sapatilhas e corri porta à fora.

O ar molhado e as folhas grudando em meus pés a cada passo me informaram que havia chovido durante a noite. Continuei correndo até o ponto de ônibus, chegando lá ofegante como uma boa sedentária magricela. O relógio triste e pesado, mas digital, no fim da calçada mostrava que eu tinha quinze minutos para chegar à escola, sem chance de conseguir aquilo indo a pé. Em momentos de desespero como aquele eu desejava ter um carro.

Ouvi um barulho ensurdecedor, um motor que parecia ter asma e, antes de olhar, soube o que se aproximava. Naquele ponto, duas linhas distintas me levariam ao colégio, uma com bancos confortáveis e aromatizadores e outra com blocos de metal sobre rodas e estofados vítimas de assassinos de assentos. A lata velha que parou era o pior veículo de todos, eu o chamava de tumba. Não tinha tempo para exigir algo melhor, então entrei e escolhi um lugar logo na frente para ter uma saída mais rápida. Usei a escova para dar um ar mais social ao meu cabelo mas, com toda a tremedeira do tumba, acabei com um aspecto pior. Dei dois goles no café e fiz uma careta, não era minha bebida favorita, mas serviria para disfarçar a falta de pasta de dente.
Enquanto o ônibus se arrastava pelas ruas, sonhei com um gigante cappuccino de chocolate. Em algum momento, passei a sonhar apenas com o chocolate.

A John Quincy Prep estava com os corredores vazios, para meu desespero. Ignorei a existência dos armários e dos livros dentro deles e corri para a aula de biologia. O sr. Baker estava no meio de um falatório quando deslizei para meu lugar na frente da turma. O professor apenas ergueu uma sobrancelha para mim e seguiu falando. Talvez, ser a primeira da turma tenha os seus privilégios, pensei.

- Vocês realmente precisam fazer isso? De verdade? - Nicholas Miller perguntou, dois lugares atrás de mim.

- Fazer o quê? - quis saber o professor, erguendo outra fez uma sobrancelha grisalha. Will afirmava que ele era gay, eu apostava que toda aquela expressividade facial vinha de algum curso de teatro.

- Usar termos como copular. - respondeu o garoto.

- Estamos falando sobre reprodução, sr. Miller.

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