Capítulo Um

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Levantei cedo como em todas as manhãs, após o meu celular despertar. Olhei meu travesseiro e notei inúmeros fios dourados nele. Meu cabelo estava caindo. Era uma queda sutil, entretanto era o suficiente para me deixar alarmada. Desde a última vez que pintei meu cabelo, ele se mostrava cada vez mais frágil. A química constante estava acabando com ele e eu não podia fazer nada a respeito. Era uma questão importante para as Autman serem louras e belas. Suspirei frustrada e segui para o banheiro.

Após me pesar na balança e confirmar o mesmo peso do dia anterior, sem sequer uma grama a mais, fui até a pia escovar os dentes. Meu reflexo no espelho era o pior possível. Meus olhos estavam inchados, minha expressão cansada. Tratei logo de lavar o rosto e comecei todo o meu ritual passando a maquiagem. Assim que terminei escovei os meus longos cabelos cautelosamente para evitar, em vão, que caíssem mais. Fiz um rabo de cavalo bem no alto da cabeça e vesti meu top e minha micro saia rosa, com listra lateral branca. No peito tinha estampado dois dragões dourados de frente um para o outro, era o emblema do colégio.

Após estar devidamente arrumada tratei de colocar o meu melhor sorriso no rosto. Era outra característica dos Autman, segundo minha mãe: deveríamos estar sempre impecáveis e sorridentes.

Desci as escadas de vidro com a bolsa no ombro e após atravessar a sala de estar, encontrei meus pais já servidos à mesa.

Meu pai estava como sempre lendo concentrado o jornal enquanto vez ou outra tomava seu café preto, acompanhado de waffles com geléia de morango. Eu amava waffles, porém infelizmente era algo que não fazia parte da minha dieta restrita. No meu lugar habitual já estava servido uma torrada de pão integral e um iogurte light.

— Bom dia, Ina! — Desejei para Corina, nossa empregada desde que me entendo por gente. Ela sorriu afetuosa.

— Bom dia, querida!

Sentei em silêncio à mesa enquanto observava minha mãe fotografar o seu prato com apenas blueberry e frutas vermelhas. Ela adorava postar na internet suas refeições.

— Agora tem que ficar tirando foto de tudo? — Meu pai resmungou e ela não deu ouvidos.

Ele bufou irritado e voltou a atenção para seu jornal. Terminei o meu café e dei a volta na mesa, já me preparando para sair.

— Katie? — Minha mãe chamou e eu me virei para ela. — Quanto?

— Quarenta e oito. — Respondi e ela assentiu com um sorriso fraco.

— Boa garota! — Elogiou como se eu fosse um cãozinho que estivesse agindo bem ao adestramento.

Para minha mãe era inadmissível qualquer grama a mais no visor da balança. Da última vez que engordei duzentos gramas ela me deixou sem jantar por três dias.

— Até mais tarde! — Me despedi dando um beijo no rosto de Corina e ela sorriu docemente.

— Tenha uma boa aula, querida!

Minha casa apesar de bastante luxuosa, as vezes parecia grande demais para meus pais e eu. E estranhamente mesmo quando estávamos todos no mesmo cômodo era quando eu me sentia mais sozinha. Corina sempre foi minha única companheiro.

Assim que abri a porta o vento frio me atingiu em cheio. O início de outono era o período que eu mais odiava, só perdia para o inverno. Abracei meu próprio corpo e segui olhando as folhas alaranjadas que começavam a cobrir o gramado.

— Bom dia, senhorita Autman! — Gaspar me cumprimentou abrindo a porta traseira da BMW para mim.

— Bom dia!

Entrei colocando a bolsa de lado. Ele logo fechou a porta e assumiu o seu lugar. Ligou na minha rádio favorita e enquanto eu ouvia uma música da Billie Eilish ele seguiu dirigindo tranquilamente pela avenida. Pouco depois chegamos na casa de Belinda, em seguida pegamos Glória também em sua casa. As duas eram o mais perto que eu tinha de amigas, entretanto elas definitivamente não eram.

Tanto Belinda quanto Gloria eram líderes de torcida também. Ou seja, como eu era a capitã, ambas passavam muito tempo comigo, sempre me bajulando e fazendo tudo o que eu dizia para fazerem, porém eu tinha certeza absoluta que eu não podia confiar nelas.

Por mais estranho que possa parecer não confiar nos próprios amigos, esse era o preço pago pela popularidade. Estar sempre cercado de muitas pessoas também significava não poder contar verdadeiramente com ninguém.

— Eu não acredito que hoje vamos finalmente conhecer a nova coreografia! Estou tão ansiosa, querida! Aposto que arrasou como sempre! — Belinda falou sorridente.

Ela tinha o mesmo uniforme e penteado que eu, a diferença apenas era ser um pouco mais baixa e ruiva. Já Gloria era naturalmente loura e há poucas semanas desenvolveu a irritante mania de usar os cabelos sempre soltos.

— Eu também estou ansiosa. — Gloria me olhou com seus enormes olhos verdes. — Vamos vencer a competição fácil.

— Não tenha dúvidas disso. Eu quero só ver a cara do colégio Columbia quando perder mais uma vez para nós. — Comentei irônica e ambas riram.

— Eu digo oi, eu digo olá! Eu digo tchau, Columbia! — Belinda cantou alto animada e nós rimos.

Começou a passar a música da Dua Lipa e as meninas começaram a cantarolar. Olhei pela janela do carro os grandes prédios ficando para trás até chegarmos rapidamente no campus do colégio. As vezes eu queria que as coisas fossem mais simples. Que as relações fossem mais simples. Por vezes eu observava os momentos em que dávamos risadas descontraídas ou falávamos sobre banalidades sem a mínima importância para o resto do universo, porém era importante para nós. Era o nosso mundo. E nele eu me sentia confortável.

Gaspar parou o carro e em seguida desceu abrindo a porta. Desci pegando a minha bolsa, sendo seguida por Belinda e Glória, respectivamente.

— Oi, Katie! — Adam Braier me cumprimentou e eu apenas assenti. Não só ele como vários outros pelo caminho me cumprimentavam ou apenas sorriam me olhando, enquanto eu e as meninas seguíamos pelo corredor.

Ao chegar no meu armário peguei meu livro de álgebra enquanto Belinda comentava sobre o último episódio de Riverdale. Eu particularmente parei de ouvir quando avistei Robert Johnson no final do corredor. Ele sorria sedutor, seus olhos azuis brilhavam, os cabelos negros estavam levemente bagunçados, e ele estava com o casaco do time aberto revelando uma camiseta fina por baixo que evidenciava seus músculos. Mordi meu lábio inferior e segui até ele.

— Oi, gata! — Ele falou me dando um selinho em seguida.

Todos os amigos dele me cumprimentaram e logo as meninas seguiram o meu rastro, como minhas sombras.

— Está sabendo da melhor? Vai rolar festinha hoje. — Um dos garotos do time contou e eu franzi a testa.

— Exatamente. Os pais do Ralf vão viajar e a casa será toda nossa. — Robert explicou eufórico.

— Quem é Ralf? — Questionei e o garoto que tinha contado sobre a festa corou, me olhando sem jeito.

— Eu sou o Ralf. Prazer! Vocês estão todas convidadas. — Ele respondeu e eu o olhei pensativa. As meninas me lançaram olhares com evidente expectativa.

— Estaremos lá. — Confirmei e as elas comemoram super animadas.

Desde que se tornaram minhas companhias inseparáveis no colégio, ambas só frequentavam as festas que eu frequentava. Então era basicamente eu quem decidia onde e quando ir.

— Será uma grande noite! — Robert prometeu passando o braço pelos meus ombros. Senti um frio inexplicável na barriga que me fez sorrir como uma boba.

Seguimos pelo corredor, caminhando no centro do grupo. O assunto central era sempre o nosso e a atenção de todos era sempre voltada para nós. Éramos como os reis do colégio. Reis dos quais todos queriam as coroas.

Bad girlWhere stories live. Discover now