Capítulo 3

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Vidas se cruzam

no Lugar de Memória Nacional...

O Museu Paulista foi concebido originalmente como monumento à Independência; marco do progresso brasileiro e centro norteador das festividades de sete de setembro. A construção teve início em 1885, chegando ao término cinco anos mais tarde.

Foi considerado um projeto arquitetônico arrojado para sua época – embora o layout tenha incorporado aspectos do estilo renascentista. A execução ficou a cargo de um renomado engenheiro italiano. No entanto, credita–se boa parte do charme do prédio aos amplos jardins – desenvolvidos por um dedicado paisagista belga, por volta de 1909.

A instituição, também conhecida como Museu de História Natural, contava com uma equipe variada de funcionários. Mais do que variada – Miguel classificaria como sui generis.

Há quatro anos, a viúva Catalina Silveira atuava como bibliotecária responsável pelo acervo de livros e documentos – e agora era auxiliada por uma jovem assistente, a Srta. Irene Lucas. A enérgica viúva nunca teve uma assistente, e considerou a ação do diretor, ao lhe conceder uma, grande avanço no status que ocupava dentro da instituição. Por esse motivo, alterou por conta própria o título de seu cargo para "bibliotecária–chefe".

Apesar de disponível aos visitantes, a biblioteca atendia mais especificamente aos pesquisadores e especialistas, que precisavam classificar as peças do mostruário museológico. O que não foi difícil nos primeiros tempos, já que elas se resumiam ao acervo do Coronel Joaquim Sertório.

O constante trabalho de captação de obras por parte da direção, ao longo dos anos, levou o Ipiranga a diversificar seu mostruário, formando novas coleções classificadas por grupos temáticos. Consequentemente, isso gerou novas demandas, como a necessidade de preservação e manutenção das peças adquiridas. Essa parte ficava a cargo dos irmãos Benito e Donatello Galliani, restauradores que vieram de Nápoles, acalentando o sonho de uma vida melhor.

Na Itália, as equipes de restauração formavam grupos seletos e fechados, com grande resistência em aceitar jovens profissionais – como eles – recém–saídos dos ofícios preparatórios, ou dos ateliês especializados em restauração. Assim sendo, os Galliani acreditavam que seriam aceitos com mais facilidade em países carentes desse tipo de serviço.

Acertaram em cheio. Logo no primeiro mês em São Paulo, foram contratados pelo Conselho Municipal para atuar no Ipiranga.

Benito restaurava livros e pequenos objetos de madeira e porcelana, ao passo que Donatello cuidava de pinturas e molduras danificadas. Ambos trabalhavam numa espécie de ateliê, instalado no subsolo do museu. O serviço nunca acabava, uma vez que era preciso providenciar a manutenção das obras do acervo, bem como das últimas aquisições dos mostruários. E não era só do acervo que eles tomavam conta, aceitavam pedidos para coleções particulares também. O valor pago por esse tipo de serviço auxiliava no caixa do museu, especialmente no que se refere à compra de materiais empregados nas próprias restaurações.

Alguns outros institutos também recorriam aos serviços profissionais dos irmãos italianos. Nesse sentido, o Professor e Historiador Alberto Godói de Oliveira costumava se gabar de que o Ipiranga era o museu mais bem preparado da América do Sul.

Ele cuidava da articulação pedagógica e administrativa com as demais instituições vinculadas às artes e ao ensino. Uma série de trâmites burocráticos dependia de seu parecer: reconhecimento de descobertas arqueológicas em território nacional; autorização para pesquisas de campo; manuseio e transporte de relíquias que transitavam em território nacional; e visitas programadas das escolas.

O Papiro (1988) AMAZON COMPLETO Where stories live. Discover now