Capítulo 2

49 4 3
                                    


Ordem e progresso a serviço do café

– a pauliceia desvairada.

A história do Bairro do Ipiranga, ou Bairro da Independência, funde–se com o próprio evento que tornou o Brasil uma nação supostamente livre.

Em 1822, D. Pedro I viu–se declarando a independência da colônia às margens do riacho Ypiranga – denominação que, na língua tupi, significava "água vermelha" ou "água barrenta". Os analistas políticos da época bem poderiam denominá–lo de "água histórica", se suas margens tivessem sido desbravadas pelo homem branco. No entanto, os índios Guaianazes já habitavam o lugar muito antes de sua chegada. Quando os portugueses começaram a se fixar na região, eles foram compelidos a abandoná–la e a viverem em outras áreas, cada vez mais distantes.

O fato de a província presenciar fato tão decisivo para a nação, não significou prosperidade imediata para as famílias dos nativos ou dos descendentes de portugueses.

Até a metade do século XIX, São Paulo ainda poderia ser considerada uma cidade insípida, com poucos recursos e condições precárias de vida. As epidemias proliferavam, ameaçando torná–la uma cidade fantasma. Além do mais, toda a sua vida social e política concentrava–se no entorno de três ruas que formavam o chamado "triângulo" – a Rua Direita, a Rua do Rosário, e a Rua São Bento. Afora isso, um "mar" de chácaras e algum comércio nas ruas de saída davam uma vaga impressão de que ali existia uma cidade.

Com o surto cafeeiro no "Oeste Paulista", essa situação viria a se modificar. O mercado do café começou a crescer muito rápido, contribuindo para a expansão das ferrovias cujo objetivo maior era justamente escoar a produção. Estrategicamente, todas as linhas convergiam para o porto de Santos. E para chegar lá, a topografia colocava São Paulo entre o oeste e o litoral, transformando–a num entreposto comercial por excelência – a parada obrigatória para os que vinham ou partiam...

Com a chegada maciça dos imigrantes, na segunda metade do século XIX, a urbanização receberia melhorias de influência europeia. E no finalzinho daquele século, São Paulo poderia ser considerada uma cidade com alguma estrutura.

A maioria dos imigrantes desembarcava no porto de Santos, vindos de todas as partes do mundo. Depois, subiam para a capital nos trens da São Paulo Railway Co. e ficavam hospedados na Hospedaria dos Imigrantes do Brás, até conseguirem uma colocação. Isso, quando já não tinham endereço certo...

Na Agência Oficial de Colonização e Trabalho, anexa à hospedaria, estabeleciam–se os contratos com as fazendas produtoras de café, onde as famílias deveriam trabalhar por um tempo estipulado (geralmente, cinco anos).

Essa rotina persistiu mesmo durante a primeira crise cafeeira. Naturalmente, a chegada de imigrantes diminuiu. E alguns países até deixaram de enviá–los. Mas os fazendeiros já estavam bem situados... Há algum tempo vinham diversificando seus negócios e mudando o foco de suas operações para a capital. Se os primeiros bancos surgiram para dar conta das transações comerciais em torno do café, agora, suas funções se ampliavam em virtude desses novos negócios. Para além de entreposto comercial, São Paulo velozmente se convertia num importante centro econômico.

Os barões do café, contudo, não descuidaram do que realmente importava... As grandes fazendas se consolidaram como cidadelas influentes nas comunidades que "orbitavam" ao seu redor.

Quando o preço do café voltou a ficar favorável, a cultura cafeeira retomou sua louca expansão, puxando direta e indiretamente o crescimento da indústria. Diretamente, porque as primeiras fábricas visavam fornecer a matéria produzida necessária para que o café chegasse ao mercado dentro dos conformes. Indiretamente, porque também visavam atender à cadeia de demandas originadas pelos agrupamentos humanos que lidavam com a sua colheita, preparo e transporte.

O Papiro (1988) AMAZON COMPLETO Where stories live. Discover now