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Naquele momento a boca do senhor Sebastian Wessex parecia seca, e ele não sabia como se portar diante da situação difícil, que pensou que nunca teria que reviver e enfrentar.

Claro que ao longo dos anos ela já havia se arrependido por ter sido um covarde e estendido aquele segredo por tanto tempo, mas, existem coisas que ferem ainda mais quando são expostas e na opinião da família, aquela era uma delas.

– minha filha, você tem toda razão em querer saber de tudo, mas, se ninguém contou nada antes foi apenas para protegê-la.– ele conseguiu dizer finalmente, depois de alguns segundos paralizada.

Levantando da poltrona confortável, onde esteve sentado até o momento, ele caminhanhou até o bar, no canto da sala, o senhor Wessex serviu-se de uma dose de whisky puro e tomou um grande gole, antes de voltar para onde estava antes  e sentar de volta na poltrona que gostava, articulando na mente, as palavras que iria usar.

Enquanto isso, Brie aguardava ansiosamente pelas respostas, enquanto os seus irmãos apenas baixavam a cabeça, como se aquilo não fosse uma surpresa para eles também.

– em uma das minhas viagens de negócios, eu conheci uma mexicana chamada Mercedes.– iniciou Sebastian depois de algum tempo daquele silêncio incômodo.– Ela era tão diferente de todas as mulheres que eu já havia conhecido... Seus olhos pareciam chamas, e a sua alegria espontânea, era contagiante. Eu era um homem casado, mas, não resisti aos encantos latinos daquela mulher e nós tivemos um caso.

– então, essa mulher era a minha mãe?– Brie perguntou, lembrando o sotaque latino que despertaram em suas lembranças durante a sessão de hipnose.

– sim, era ela. Acontece que a Kate descobriu tudo, e entre um caso passageiro e a minha família, eu escolhi a família. Foi difícil, mas, a Kate me perdoou depois de tudo, então eu enviei um representante de negócios ao México e não retornei mais lá. Infelizmente, pouco tempo depois a Kate sofreu um grave acidente de carro com os garotos e faleceu na mesma hora. Por muito pouco eu não perdi a minha família inteira naquele dia. Foi nessa mesma época que a Mercedes voltou a entrar em contato comigo e disse que esperava uma filha minha, a garotinha que a Kate não me deu. Ela esperava que diante disso eu voltasse com ela imediatamente. Quando eu disse que não poderia ir ela se irritou e gritou no telefone que eu nunca iria vê-la e que colocaria em você o segundo nome da Kate, pra nunca esquecer dessa promessa. E assim o fez, Kate Brigitte Wessex, era o nome da minha esposa, mãe do Richard e do George.

Ser fruto de um adultério, explicaria a brigitte sobre a forma estranha que ela sempre se sentiu tratada ali, mas ainda não explicava todas as questões que ela queria respondidas.

– mas, então ela não cumpriu a promessa? ela me trouxe pra cá, eu lembrei disso. O que houve?– as lembranças ainda eram desconfortáveis e dolorosas, mas ela sabia que precisava enfrentar e isso estava lhe deixando mais nervosa do que havia imaginado.

– durante muito tempo a minha única preocupação era os meninos no hospital, depois ter que lidar com a volta deles pra casa sem a mãe. Foi o pior momento da minha vida. Alguns meses depois, porém, eu lembrei da sua mãe e tentei reencontrá-la. Ela sempre pedia dinheiro e dizia que traria você pra me ver, mas isso nunca acontecia, e eu covardemente ia permitindo isso sem me impor como deveria, porque eu sempre estava ocupado demais.– enquanto falava, ele parecia realmente envergonhado pela sua omissão.– Isso tudo durou quase cinco anos. Então um dia, sem eu esperar a Mercedes apareceu com você, ela me disse que estava muito doente, que iria morrer em breve e que eu era o único que poderia ficar com você. A Mercedes morreu com AIDS algum tempo depois de deixá-la aqui. Ela não queria mais que você a visse. Ficou magra e pálida, ela não queria que você lembrasse dela daquela forma. Eu tentei ajudar, paguei o seu tratamento como podia, mas a vinte anos atrás isso era uma sentença de morte.

– e porquê eu nunca soube disso?

– quando você chegou aqui, não conhecia ninguém, nem falava o nosso idioma. Chorava de dia e de noite pela sua mãe. O pouco que falava conosco não era compreendido. Até que simplesmente você parou. Parou de chorar, parou de falar. Nós até achamos que isso era uma melhora, que você estava superando, mas, você nunca foi uma criança como as outras. Não permitia que nenhum de nós chegássemos perto de você, gritava ou fazia escândalo quando um dos meninos insistia. Aos poucos fomos nos afastando, pensando que isso seria o melhor pra você no momento. E com o tempo você foi melhorando, aprendendo a se comunicar, foi a escola, chamamos um professor de inglês em casa... Foi quando numa festinha da escola, do dia das mães, eu tentei explicar que a sua não a abandonou, mas você disse que não se lembrava dela. Nem com insistência ou fotos você lembrou. Então não tocamos mais neste assunto. Não queria que você voltasse ao sofrimento de antes. Eu sei que isso não parecia normal e que eu não deveria ter deixado pra lá, mas eu também não sabia mais como lidar com isso. Tudo também veio de surpresa sobre mim. Eu peço perdão a você por isso, e por todas as vezes que eu parecia não me importar com você, mas, nós nos acostumamos a ter que agir assim.

O semblante de Sebastian naquele momento era de derrota, Brigitte não lembrava de ver o pai assim em nenhum outro momento, ele sempre agia com altivez e autoridade. Ao olhar ao seu redor, ela também percebeu o mesmo semblante nos irmãos, e percebeu a dor que todos carregavam alí. Seu cérebro bloqueou o seu trauma, mas os irmãos mais velhos ainda mantinham as lembranças da mãe que partiu cedo e da ausência que sentiram depois disso, da irmã estranha e chorona que chegou na casa deles algum tempo depois. Realmente, já não poderia culpa-los por todo o sofrimento que carregava, nem tampouco a mãe, que a amou enquanto viveu e apenas abriu mão dela quando já não tinha mais esperanças quanto ao seu futuro, numa época em que se descobrir com HIV era realmente como uma sentença de morte.

Apesar  daquela não ser uma história feliz, pelo contrário, agora todos estavam chorosos com as suas próprias lembranças amargas, aquela foi incrivelmente a primeira vez  que brigitte se sentiu amada de verdade. Primeiro pela mãe, que a deixou com sacrifício, depois pelo pai, que mesmo despreparado e ausente até o momento, a recebeu em seus braços, e tentou fazer aquilo que achava ser o melhor e também pelos irmãos que mesmo órfãos de mãe, deixaram o próprio sofrimento de lado e souberam lidar com o sofrimento dela, a deixando livre de questionamentos e nunca tocando no assunto que poderia feri-la novamente, mesmo ainda sendo tão jovens para compreender tudo.

Brie então chorou mais uma vez, mas, sentia dentro de si que o seu choro desta vez era diferente, era libertador.

Dessa vez ela não precisou chorar sozinha, escondida e sem saber explicar o motivo, naquele instante,
Todos se aproximaram e se abraçaram emocionados com o momento e com as fortes lembranças do passado, mas dessa vez, pelo menos para Brie, a imagem do futuro era muito mais reconfortante do que já havia sido.

E ela finalmente sentia como se uma ferida aberta tivesse sendo sarada.

Salva Pelo AmorOnde as histórias ganham vida. Descobre agora