Capítulo 23 - Coração Vadio

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Gisele






Os dias passavam rápidos,e eu havia voltado a minha rotina normal. Eu ainda carregava uma tristeza ,tão  grande dentro do peito que volta e meia me sufocava e eu tinha que chorar. O Davi  entendia  essa minha dor,ele me abraçava forte e me reconfortava da maneira dele,do jeitão  dele. O Henrique teve que voltar a sua rotina normal,foi embora dois dias depois do enterro,mais ele disse que voltaria mais vezes, já  que agora ele não  vai embarcar com tanta frequência. Me despedi dele com muita tristeza,por anos foram só  nós  três,depois  só nós  duas e agora só  existe eu. Me sinto aliviada por está  rodeada de pessoas queridas, meu ruivinho anda tão  preocupado comigo,que essa atenção  da parte dele me faz ama-lo ainda mais.
Enquanto  eu tentava  me concentrar,minhas memórias vagavam pra longe,pro dia em que me sentir perdida como hoje,como ontem e como me sentirei por alguns meses até  me achar de novo.

A Gisele da época  dos seus vinte anos,a menina louca por problema. Se metia em tantos que achava graça de quando não  se via encurralada. A Dona Marina só  faltava me trancar em casa e eu adorava. Era o jeito que eu me sentia amada por ela,a chamando  a atenção, lhe tirando o tempo do trabalho e ganhando muitas broncas por minhas estupidez. Como sinto falta dela,de seus bolos,dos seus carinhos e agrados. Do abraço  apertado e do afago da saudade. Sorrio ao me lembrar dela,e sinto um aperto  no peito por me imaginar vivendo bem sem ela. Eu queria tanto ter dado um neto,antes que ela se fosse. Eu queria ter dito mais "Eu te amo" e demonstrado que dentro do corpo de uma maldita existia um coração amável. 

— Gi...—Logo senti umas lágrimas  rolarem em meu rosto. Eu me emocionava, por lembrar dela. — O que foi? — Se aproximou de mim ,o Davi. Ele abaixou e focou seus olhos aos meus. — Vem...— Puxou-me para um abraço e eu fui. — Eu sei que dói. E dói muito. Não  é  fácil. — Me disse e eu assenti. — Mais vai chegar uma hora que vai parar de doer. — Se afastou um pouco e secou com as próprias mãos  o meu rosto. — Eu estou  aqui,sempre estarei. — Vi que ele também  começava  a se emocionar. Ele sempre foi assim,coração  grande, se envolve com a sua dor ou alegria. Não  liga de demostrar que gosta,não  finge ser quem não  é. E isso ,e lindo de ver.
— Estamos juntos,parceria de amigos pra vida toda,não  é? — Eu sorri,ainda toda chorona.

— Vamos trabalhar,que as contas não  param de chegar! — Lhe disse e ele riu.

— Fiz um anúncio  no jornal,espero ter retorno logo. — Eu me recompôs  e o olhei sem entender do que ele falava. — Se esqueceu? — Ele riu.
— Logo acharemos nossa secretária.
— Sorriu animado. Abri a tela do computador e comecei a analisar uns documentos que estavam no meu e-mail.




Nícolas





Eu tomava um copo de café,sentado no meu escritório olhando a foto da Gi,em dos meus porta-retratos distribuídos  pelas prateleiras da minha sala de trabalho. Ela que decorou a minha sala,espelhou fotos nossa,dos meninos(A Pérola  e o Miguel) ,dos nossos bichos que já partiram pra nunca nos esquecermos dos anjos que passaram por nossas vidas.  Agora falta apenas a foto do Félix,nosso novo mascote. Sorrio com as lembranças  da menina sapeca que conheci. Me meteu em muitos problemas,logo eu que também  não é  flor que se cheire. Um menino revoltado dentro do corpo de um homem feito. Agora ,na idade que estou sobrou apenas um menino conformado e que soube lidar com os obstáculos  que enfrentou pelos caminhos tortuosos da vida.

Uma coisa eu aprendi com a Gi,a vendo virar a mulher que é, cada evolução  e erro. Ela virou quem deveria ser agora,a menina sapeca no corpo da maldita que já  foi um dia.
A vida nos ensina muita coisa,e passamos por várias etapas ao longo dela.  Crescemos,tanto de tamanho quanto de conhecimentos.
Amadurecemos  e entendemos que somos o que somos e não  o que os outros projetam de nós, sofremos,ou por uma perda de um ente-querido ou porque resolvermos ter seguido por um caminho que nos feriu a alma ,mais deixou nosso corpo intacto. Sorrimos por ter alcançado o que tantos queremos ,que o sabor da Vitória nos emociona e faz querer que o coração sai para fora do peito.
C

horamos, porque a vida não  é  fácil, todos os dias temos que matar um leão e desviar das ofensas proferidas a nós. Somos bons,temos uma alma grande,só  não  sabemos que isso faz os outros nos querer nos machucar pelo simples fato de sermos quem somos. Matar os leões de fora,pensando melhor,chega a ser até  mais fácil.  O problema começa  quando temos que matar os leões de dentro da alma. Criamos esse leões desde o começo, mais não  sabemos lidar com eles depois que começam  a ter suas vidas próprias. Uma hora pressos,outras horas doidos pra sair da cela de dentro do peito. Somos quem somos e ainda não  somos quem queríamos que fosse. Eu sou aquilo que vejo e não  aquilo que você  vê, quando me vê. Eu sou uma alma agitada ,inquieta,maluca por coisas novas,louca pelo desconhecido. Eu sou aquele menino de antes,mais maduro,mais seguro e menos sonhador. Me apago cada dia que me esqueço de sonhar,e eu não  quero que a Gi também  se sinta assim.

— Nícolas ...— O olhei,e me toquei de que eu ainda segurava o copo em mãos olhando pro nada,pensando em tudo. — Amigão,tá  tudo bem?
— indagou-me ,enquanto fechava a porta.

— Tá  tudo na mesma. A Gi chorando pelos cantos,achando que eu não  vejo. Eu pensando em como traze-la de volta a vida. — Ele sentou-se a minha frente. — Eu tô  tentando,mais acho que não  tá  dando certo.

— Calma. — Pediu-me. Voltei a apoiar o copo quase intocável na mesa,eu não  gostava tanto assim de café. O Artur buscou o copo na mesa e tomou um gole. — Você  tá  precisando de férias. — Me disse!

— Férias! — Murmurei. — Você  não  vive sem mim. — O disse de forma divertida e ele entendeu.

— Uma semana pelo menos,acho que consigo me manter vivo. — Me disse e eu sorri.

— Que ir conosco? — O perguntei e ele negou. — Tem certeza? — Ele assentiu.

— Vai atrás  da Lua de mel que você  não  teve,amigão. — Eu ri. — Vou indo,tenho muito trabalho a fazer.
— Levantou-se, deixou o copo de café na mesa e caminhou-se até  a porta.

— Artur? — O chamei e ele se virou para olhar-me. Coloquei-me de pé, e me aproximei dele. — Já  te agradeci por ser um melhor amigo que um homem pode ter? — Ele sorriu orgulhoso.

— Hoje não! — Murmurou e eu o abracei forte e o beijei no rosto de forma carinhosa. Pra ele aquilo tinha um significado especial. Na cultura dele,isso é  normal entre amigos. Ele sempre me beija no rosto e me abraça  sem amarras de machismo,ou pensamentos idiotas. Ele não  liga,ele é  ele. Mais eu fazer isso,de beija-lo no rosto só  o mostra o quanto eu o considero.

— Vamos...— Me disse,assim que nos desprendemos do nosso abraço  sincero.—  Temos muito trabalho pra adiantar. — Me disse e eu assenti.
— Quero ver você  longe amanhã!
— Eu ri. — E sem ligação. — Ordenou e eu assenti. — Quero a sua felicidade meu amigo, sua e daquela loira maluca que você  chama de esposa.
— Eu ri. — Cuide dela,porque se der mole,tô  na fila do próximo  a tomar.— Eu gargalhei.

— Tô  sabendo disso. — Lhe disse.
— Pode deixar que eu sempre ocuparei aquele coração vadio.


Meu pedacinho tão esperado✔Where stories live. Discover now