Capítulo 1

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Nos últimos minutos a suave garoa se transformou em uma tempestade. Eliza Aiken tenta proteger os copos de café contra o corpo enquanto corre para atravessar a rua. Chegou o mais rápido que pode no local indicado, fitas da policia de "não ultrapasse" cercavam a casa na qual ela fora chamada, juntamente com alguns vizinhos que acordaram com a confusão tentando saber o que houve. Eliza empurra educadamente as pessoas com seus guarda-chuvas para conseguir chegar aos policiais que guardam o local.

- Com licença, sou psicóloga forense. – diz ela ao mostrar o crachá de identificação ao policial. – Fui encarregada do caso.

O guarda levanta a fita para lhe dar passagem. Do lado de fora, é possível ver que há muito mais detetives que o normal. A moça solta um bocejo, acordar as três da madrugada com um telefonema urgente de assassinato não mandou totalmente o sono embora. Ao entrar pela porta principal, percebeu que era muito pior do que idealizou, o corpo ainda estavam no local, o cheiro metálico de sangue impregnava o lugar juntamente com a umidade da chuva.

Detetive Mcbell, o encarregado do caso, estava com a expressão mais concentrada que Eliza já viu, era possível imaginar as contas flutuando ao redor de sua cabeça enquanto observava sem piscar o corpo sem vida de uma mulher estirada na sala central. A moça se aproximou do policial e tocou seu ombro, ele sequer sentiu alguém se aproximando.

-Aiken, graças a Deus você chegou. – disse Mcbell, seus olhos suavizaram quando viu a colega, gesticula para subir as escadas para o segundo andar, não mostrou o corpo da vitima ou deu qualquer detalhe, estranho, pensa Eliza. –Dessa vez, pegamos o culpado em flagrante, mas não faz sentido, permanecer na cena do crime muito mais do que o necessário, precisamos que você o acalme para o levarmos para a delegacia.

Isso era muito mais do que incomum. Segundo Mcbell, quando ligou para chamá-la para o caso no meio da madrugada, havia ocorrido um homicídio doloso e o principal suspeito estava insanamente fora de controle. Porém, nesse instante, tinha a ligeira impressão de que o suspeito ficou por livre espontânea vontade. A escada de madeira escura fazia rangidos de protesto a cada degrau, revelando em seu topo um corredor cheio de peritos e policiais, a situação estava pior do que imaginava.

- Devo avisar que ele está incontrolável, se conseguir arrancar algo sobre a motivação, ótimo, mas o que queremos é que ele se acalme primeiramente. –diz, o detetive posiciona-se em frente a uma porta branca, escrito "Isabella" em letras cor-de-rosa e guardada por dois policiais. Merda. Tinham mesmo que colocar o assassino no quarto da filha? E o pior, onde estava a garota? – O suspeito supostamente assassinou a mãe a marteladas depois de espancá-la por horas e a filha de quatro anos não está na casa.

A porta abre-se para revelar um homem de meia idade quase arrancando os próprios braços ao forçar as algemas presas nos braços da cadeira. As pessoas parecem ter desistido de tentar conte-lo e deixaram com que ele force até que o sangue escorra e pingue no chão. Os olhos castanhos do suspeito pairam instantaneamente para Eliza assim que a porta se abre. Animalesco. Um arrepio passa por sua espinha, já viu aquele olhar em algum lugar, era algo impossível de esquecer. Os músculos do suspeito relaxam e ele para de ser contorcer. Um sorriso sarcástico abre-se em sua boca, os dentes perolados oferecem escárnio a quem olha. Estaria sentindo-se vitorioso?

- Parece que a presença feminina o acalmou. – diz Mcbell na tentativa de aliviar a tensão visível de Eliza. – Se conseguir com que fique assim por mais de dez minutos, vamos levá-lo.

O chefe sai batendo a porta deixando-os sozinhos naquele lugar. Todo o corpo de Eliza está alerta e preparado para uma possível fuga. Por que estava com medo do homem que a encarava com ironia? Em mais de dez anos de profissão, nunca sentiu vontade de ficar o mais longe possível de algum suspeito.

- Eu trouxe café, vou deixar aqui para quando você se acalmar. – diz ela colocando em cima da mesa de estudos do quarto e puxando a cadeira do conjunto ara sentar-se de frente para o homem. – Está tentando fugir?

A figura estuda o rosto dela ainda com o sorriso inabalado, parece querer saber ler seus pensamentos. Uma gargalhada estridente preenche o recinto.

- Nunca tive a intenção de fugir. – diz o homem. – Depois que se começa um serviço, é necessário terminar.

Estaria falando da garota? Se sim, havia uma esperança de que ela estivesse viva, precisaria de mais tempo para conseguir fazê-lo falar. Pelo menos, ele havia parado de se contorcer, os pulsos onde as algemas começaram a cortar estavam tomando um tom de púrpura ao seu redor. Qual seria então o motivo da automutilação?

-Meu nome é Eliza Aiken, ainda não sei o seu. – diz ela juntando todas as forças para manter a concentração e a voz neutra. – Poderia me dizer?

- Você não se lembra mesmo? – diz voltando a rir de alguma piada interna que apenas ele entendia. – Significa que não fui bom o bastante.

Eliza vasculha sua mente rapidamente em busca de algo útil. A sensação que já viu aqueles olhos em algum lugar é muito marcante, porém qualquer um já poderia ter visto olhos assim em qualquer psicopata. Talvez ele estivesse sofrendo um surto psicótico, nesse caso estaria delirando e teria que ser atendido por um psiquiatra.

-Não acredito que já nos vimos antes, pode estar me confundindo com outra pessoa. – diz calmamente Aiken, passar a sensação de suavidade era muito importante neste momento. – Me diga seu nome e talvez eu me recorde de algo.

- Demorei algum tempo para reconheci você usando óculos quadrados, deve ter decidido mudar depois que quebrei os redondos. – diz o assassino, Eliza começa a buscar informações no fundo da sua mente, nos lugares mais escuros e profundos.

- Meu nome é Lawrence, não acredito que me esqueceu mesmo depois que tivemos uma filha juntos.

Não olhe para trásWhere stories live. Discover now