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No quinto dia morando ao lado do diabo, acordei com uma sensação estranha, acho que o nome apropriado para tal sentimento era "paz". Não havia música alta, muito menos qualquer outro barulho que a louca da minha vizinha pudesse produzir na casa ao lado (apenas para perturbar o meu tão amado sono).

Ironicamente, estranhei o silêncio. Pode até parecer piada, mas o fato era que eu, Selena Gomez, já estava começando a me acostumar com o alarme matinal que eram as músicas de idioma estranho que Demetria ouvia todas as manhãs, sendo que, uma vez ou outra, ela até cantava junto.

Não vou ser chata a ponto de dizer que não gostava de sua voz, mas achava completamente desnecessário o fato de ela ser tão boa em tudo o que fazia. Certo dia descobri até que Demetria praticava jardinagem.

Onde já se viu uma mulher rica com tanto tempo livre?

Só o diabo mesmo para conseguir uma façanha dessas.

Levantei-me da cama como quem desperta para viajar de manhã bem cedinho. Feliz como um raio de Sol. Era dia de folga, Demetria não havia me acordado com o som alto e, se eu desse sorte, estaria fazendo bastante calor lá fora.

Meu banho matinal foi rápido, obviamente alguém por aqui tinha se preocupar com o planeta. Meu café da manhã ficou pronto minutos depois que me vesti, e tudo o que me restou fazer foi alimentar Vadia e sentar à mesa para comer também.
No instante em que fiz isso, ao olhar pela janela, encontrei a minha tão falada vizinha diaba no gramado que separava nossas casas.

Que conveniente, não?! Ela fazer yoga em plena manhã de sábado, bem a vista de onde eu estava.

Aproveitando a irônica coincidência, fiquei assistindo a seção de exercícios dela enquanto eu, em meio a todo o meu sedentarismo, apenas mastigava alguns ovos. E foi inevitável não tentar me esconder debaixo da mesa no momento em que, ao mudar de posição, Demetria percebeu que eu a encarava fixamente de onde estava.

Foi ridículo, algo que nunca mais pretendo repetir em toda a minha vida!

Bati minha cabeça de uma vez na quina mesa e desabei ali mesmo, pateticamente jogada ao chão, tudo isso sob o olhar debochado de minha gata de estimação, Vadia.

Fiquei grogue com a pancada, sentia algo quente escorrer por minha testa e implorava aos céus que aquilo não fosse sangue.

- Não sabia que consertava mesas, vizinha. - Demetria satirizou da janela. Minha queda fora o atrativo perfeito para garantir sua aproximação. Isso se eu realmente quisesse que ela se aproximasse mim, é claro, o que não era o caso. Mesmo com ela trajando roupas tão... tão bonitas. - Tudo bem aí?

- Tudo ótimo! - exclamei antes mesmo que a morena terminasse de falar. - A mesa está meio mole, precisando de concerto. Vida de quem mora sozinha... Sabe como é, né, vizinha? - indaguei toda destrambelhada, fazendo-a rir ainda mais de minha desgraça.

- Sim, sim... Vejo daqui o quanto você está ótima. - o tom da morena se tornou um pouco mais grave que antes, o que fez encolhe-me contra o chão. - Não se mova. Vou te ajudar, okay?

- NÃO! - neguei diversas vezes com a cabeça, mesmo que dolorida, mas foi em vão. Ela fingiu que não me ouviu e pulou a janela como se pulasse uma mísera rachadura, caminhando até mim como quem vai recolher o lixo da semana.

Nesse caso, mais especificamente falando, o lixo era eu.

E talvez ela estivesse mesmo indo recolher o lixo, só que para jogar no inferno, é obvio!

- Caramba... - Demetria agachou bem a minha frente. Arregalei os olhos diante de tamanha proximidade. Agora, tão perto quanto nunca, pude ver melhor cada tatuagem que cobria as partes visíveis de seu corpo. Principalmente a de leão, que adornava graciosamente uma de suas mãos. - foi um uma pancada e tanto, ein?!

Um sorriso cuidadoso me foi lançado. Cai por terra depois disso, quase furando a camada que separava o meu piso do teto do inferno.

- Foi? - questionei confusa.

O hálito de Demetria tinha cheiro de chá de hortelã com romã ou a batida estava me fazendo delirar a ponto de me fazer achar que conseguia distinguir alguma coisa?

- Uh. - apertei os olhos com força, a dor era imensa. Latejava tudo. Digo, quase tudo. - Me desculpe, por...

- Por ser uma pervertida que espia a vizinha gostosa?

- P-Pervetida? - ergui os olhos de modo alarmado, ignorando por completo o quão inflado era o ego dela.

P-E-R-V-E-R-T-I-D-A.

Eu não podia acreditar no que acabara de ouvir. Demetria havia me chamado de pervertida e o pior de tudo era que eu nem ao menos tinha como negar que, sim, a observava de minha janela. Todavia, o olhar que direcionei à ela não se equiparava nem um pouco ao que se passava em sua cabeça.

- Não, por favor, não me chame assim. - esforcei-me para ficar de pé, quase indo ao chão novamente. - Se te olhei, peço desculpas. Mas em nenhum momento levei para esse lado sujo.

- Sujo por que? - o sorriso da mulher a minha frente se alargou ainda mais. Que desgraça de sorriso bonito! - Essa pancada não te fez bem. Senta aí. - Demetria apontou para a cadeira e logo o fiz.

Eu não estava com muita moral para continuar reclamando, mas isso não significava dizer que eu não o faria.

- Estou sentando, mas saiba que não foi porque você mandou. - resmunguei, embora fosse mentira. E mesmo sabendo que essa seria uma atitude passível de julgamento, meu espírito de criança birrenta não permitiu que eu mantesse a boca fechada.

Obtive um resmungo nasal como resposta. Depois disso, um longo silêncio se fez e me fiz de estátua para receber os cuidados da menor. Para um ser tão maligno, ela até que conseguia ser delicada quando queria.

Meu machucado não demorou a ser devidamente limpo e coberto, assim como o meu medo de estar tão próxima do tinhoso não também demorou a volta, mas mesmo assim sustentei o meu melhor semblante de quem tinha total controle da situação.

Embora nunca tivesse tido controle nenhum de qualquer coisa na minha vida.

- Pronto. - ela murmurou, olhando para a minha testa como um artista olharia para uma obra finalizada. - Agora você é uma pervertida remendada.

Franzi meu cenho em descrença. - Ah, me poupe desse apelido ridículo! Saia da minha casa agora! - Apontei para a janela, na intenção de ofender mesmo, tão envergonhada que mal consegui olhar na cara de minha vizinha. Mas logo algo me fez murchar por inteiro, Demetria ria sem pudor algum de minha atitude.

- Se for levar para o coração tudo o que eu fizer e disser, vai acabar tendo um infarto, vizinha. Relaxa um pouco aí. Sei que não gosta de mim, mas quero que saiba que eu também não gosto estar aqui. - sua fala repercutiu divertida, com uma pontinha de verdade. E assim como chegou, Demetria se foi. Pulando a janela como uma atriz faria na cena de um filme. Um filme de comédia, é claro! Pois, assim que pisou do outro lado, ela caiu com tudo no chão.

- Acho que vai precisar trocar a yoga por algumas aulas de parkour. - alfinetei, assistindo-a olhar-me com os olhos cerrados ao levantar. Seu riso continuava irritantemente presente, o que acabou me fazendo rir também. - É isso aí... Aqui se faz, aqui se paga, vizinha. - Falei por fim, achando engraçado o fato de ela se divertir com tudo o que eu dizia.

- Sendo assim, te encontro no inferno, sua pervertida! - um de seus olhos piscou em minha direção.

Passei a ter a face coberta por uma intensa coloração vermelha. Daí então, foi impossível não retrucar com a frase mais óbvia que eu poderia pensar na hora: - Sai de ré, Satanás!

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⏰ Cập nhật Lần cuối: Mar 27, 2021 ⏰

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❝O diabo mora ao lado ➳ Semi❞Nơi câu chuyện tồn tại. Hãy khám phá bây giờ