05 | u said

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             A MINHA CABEÇA ESTAVA TRAVADA em uma batalha interna, tantas vozes, tantos palpites

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             A MINHA CABEÇA ESTAVA TRAVADA em uma batalha interna, tantas vozes, tantos palpites. Desprendi o freio de mão, assim que adentrei em meu carro, descendo o veículo e colocando-o no ponto cego: não poderia partir, mas deixaria Jack achando isso assim que espionasse pela janela e não encontrasse o Benz estacionado no outro lado da rua. 

Não tinha condições de dirigir no estresse que estava, acabaria causando um acidente; respirei fundo e antes de apelar para as drogas, testei inúmeras alternativas para que meu coração se acalmasse, tentativas em vão. Retirei o pacote de erva dichavada do porta-luvas, distribuindo-a na folha de tabaco, lambendo, enrolando e moldando o blunt. Estava enorme, parrudo e resolveria o esgotamento físico e emocional temporariamente. Acendi, rolando a pedra do isqueiro e colocando a ponta do charuto de maconha contra o fogo, por igual.

A primeira tragada foi libertadora, tão boa quanto ingerir uma cartela inteira de pílulas alprazolam. Depois da primeira, pareceu tentador terminar com aquele baseado o mais rápido possível, para fazer outro e ficar naquele ciclo até que adormecesse. A fumaça passava pela minha garganta e rumava até os pulmões, o efeito chegava em meu cérebro tranquilizando meus nervos, causando-me felicidade. Uma felicidade provisória, mas deveras acessível. 

Repousei a cabeça no encosto do banco, olhando para o teto e rindo sem motivo. Foi quando a porta do passageiro se abriu de modo brusco, me fazendo perceber depois de um tempo, que Ayla estava bem do meu lado. 

— Me leve para sua casa. — Ordenou distante, sem fazer contato visual. Tratei de apagar o cigarro enroladinho, escondendo as drogas e abanando o ar do ambiente para que a fumaça espessa saísse pelo vidro fumê entre-aberto. 

— Não moro aqui. — Disse devagar, observando sua face turbulenta. Conectei a chave no contato do veículo, ligando o motor assim que a ouvi dizer: ''Me leve para qualquer lugar''.

Enquanto dirigia extremamente lento pelas ruas, optando por caminhos mais longos, pensava onde poderia leva-la. Caí nas memórias mais uma vez:

— Quando ficarmos ricos, podemos ir naqueles hotéis caros. — Fantasiou mais um dos nossos incontáveis planos, enquanto se equilibrava na guia da calçada e observava o céu marcado por altos prédios. Encostei em suas costas com tom brincalhão, fazendo-a cair. — Estraga prazeres. — Mostrou o dedo do meio, tentando resistir a gargalhada que vinha a todo vapor. 

— Vou te levar lá. — Nos sentamos na calçada, debruçados no hidrante. Já estava começando a adoecer com a sensação de não conseguir, mas não deixaria isso evidente para Ayla; sabia bem as estradas solitárias que teria que enfrentar para valer a pena. — Bebendo vinho branco, acumulando as refeições do serviço de quarto e transando com a garota mais perfeita desse universo. Serei um rockstar.

Ela riu com todos os dentes, como se lhe contasse a piada mais incrível do planeta. Não importava a dificuldade, ela sempre acabava rindo ao meu lado, e de um modo curioso, acabava despertando uma sessão de risadas em mim, como se estivesse em um stand-up. 

Queria que ela se lembrasse dessas pequenas coisas, da mesma forma que me lembrava.

Parei de estar imerso em recordações intensas, assim que debrucei meus braços sobre a bancada do Renaissance Long Beach Hotel, bocejando em tédio enquanto o recepcionista arranjava um quarto de luxo para que passássemos a noite. Até então, Ayla não tinha aberto a boca para se pronunciar. 

Depois de sairmos do elevador, ocupamos o último quarto do último andar; ele era espaçoso, móveis chiques eram distribuídos pelo cômodo, com uma varanda de frente a praia. 

De canto de olho, a vi repousar na cama, suspirando pesado. Ela estava mais confusa que eu, e tal momento seria ideal para lhe contar; abri o frigobar, tomando uma iniciativa. Apanhei duas taças, despejando o conteúdo alcoólico do White Wine Château d'Yquem nas mesmas e sentando-me na beirada do colchão de casal. 

— Quero saber da verdade e somente ela. — Bebeu um pouco, arrumando-se nos edredons brancos. 

— A verdade é que, eu te amo. Eu te amo mais do que a mim mesmo. — Admiti, olhando-a nos olhos. Me prendi neles, não deixando que os meus escapassem envergonhados; faria certo dessa vez. Respirei com força, prosseguindo: — Não queria ter um coração para te amar e não queria ter feito as merdas que fiz. 

Busquei pela minha carteira, destacando a foto que mantinha junto com meu documento de identidade. A entreguei:

— Têm coisas que gostaria que você se esquecesse, mas elas fazem parte de quem somos... éramos. — Mordi os lábios, dando mais um gole. Estava na hora de assumir os erros: — Me distanciar de você leva tempo e dói, e nem quero isso. Sei que nos separamos no passado e a culpa foi minha, pois mal ficava em casa e toda semana amaldiçoada ficava chapado pensando no quão errado estava sendo. Não me orgulho disso, mas continuo usando as mesmas drogas, tentando enganar as saudades e dores que sinto.

Um peso parecia ser arrancado de minhas costas, mas este peso era substituído por um vazio tão desconhecido. 

— Tivemos os melhores anos de nossas vidas, quando nos conhecemos. — Toquei sua face pasma, acariciando suas bochechas. — Não consigo me esquecer, de nada. Dia após dia, revivendo o nosso primeiro beijo naquela casa da árvore e no quão importante ele foi para mim, depois os momentos de diversão que tínhamos na aula de educação física e o que costumávamos fazer quando o vestuário se esvaziava. Tudo, Ayla. O melhor e o pior de nós, sempre comigo. Eu voltei, mas vou entender se quiser que eu parta.

 Ayla paralisou com uma expressividade vaga diante cada frase, como se tentasse absorver uma realidade que nem sabia da existência. Ela era e sempre seria aquele amor que só acontece uma vez na vida.

— Diga se me odeia, quero saber disso. — Sussurrei, em um pedido de rasgar o peito. 

Ela não pensou muito, pois parecia saber todas as respostas de minhas perguntas. Devagar, a vi inclinando-se, de modo que nossos rostos se encontrassem com tranquilidade, e que os lábios se tocassem em um beijo leve. O gosto do gloss de cereja dela ia se misturando com os dois hálitos refrescantes, transformando-o em apenas um sabor: um delicioso chá do Texas. Doce e quente.

— Gustav... 

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