CINCO

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O clima gélido de Tóquio fez Akemi vestir-se com um moletom soltinho, uma calça jeans skinny preta e botinhas de cano baixo. Resolveu fazer um rabo de cavalo, destacando bastante as pontas roxas do cabelo - ela havia pintado com uma tinta um pouco mais forte naquela semana. Alguns itens essenciais não poderiam ser esquecidos: o fone de ouvido pairava em volta de seu pescoço e o celular já estava na bolsa de mão. Após despedir-se dos pais, caminhou calmamente até um dos guichês da companhia aérea, fez o check-in, despachou a mala e foi procurar o portão de embarque. Aeroportos eram uma paixão secreta de Akemi. Observar as diferentes emoções das pessoas, ver cada abraço de reencontro, cada beijo de despedida, cada lágrima de felicidade ou de saudade... Era mágico. Ela era apaixonada por histórias que nem conhecia.

Enquanto saboreava alguns biscoitos, percebeu que o embarque teria início. Deixou a carteira de identidade junto ao comprovante da passagem e direcionou-se para a fila. Apenas cinco pessoas estavam na sua frente, então provavelmente seria um voo tranquilo e quase vazio. Dezembro era um mês que turistas visitavam, sim, a Coréia, mas nada comparado ao verão. Akemi não gostava de calor e muito menos de multidões, por isso sempre evitava ir a baladas e festas da escola. Preferia mil vezes viajar e conhecer um lugar novo, uma nova cultura, novas pessoas. No momento em que entrou no avião, a garota acomodou-se em seu assento, colocou o fone de ouvido e deixou The Smiths tomar conta de seus pensamentos durante todo o voo.

— Meu Jesus Cristo, que calor! — esbravejou a mulher que saiu do avião ao lado de Akemi. E, de fato, a garota não poderia deixar de concordar.

— Bota calor nisso! — respondeu, dobrando as mangas do cardigã acima dos cotovelos.

Após esperar dez minutos para pegar a mala na esteira, Akemi foi direto para a entrada do aeroporto. Havia combinado de encontrar a motorista do resort na saída número quatro. Demorou alguns segundos para identificar onde exatamente era a saída daquele lugar enorme, mas, assim que achou, também avistou uma senhora segurando um papel escrito "Ajemi". Ela sorriu e caminhou em direção á mulher.

— Oi, tudo bom? Você está esperando alguém para ir até Busan?

— Bom dia, moça. Estou sim. Você é a Ajemi? — perguntou a senhora, já sorrindo de orelha a orelha.

— Eu sou a Akemi! — corrigiu, sorrindo junto com a mulher. — Acho que entenderam meu nome errado.

— Nossa! Mil desculpas, querida, nós não... — quando a mulher começou a se explicar, Akemi interrompeu.

— Não seja por isso. Culpo a operadora do celular mesmo, o sinal estava horrível! — a garota gargalhou e ganhou um sorriso tímido da mulher. — Qual é o seu nome?

— AeCha. É um prazer, viu? — disse, ainda encabulada.

— O prazer é todo meu, dona AeCha. Vamos indo? — perguntou, já levando a mala ao bagageiro.

— Vamos, sim. Temos um pouco de estrada pela frente! — exclamou dona AeCha, arrumando o banco de motorista e ajustando a postura. — Você vai no passageiro ou prefere sentar-se atrás? — questionou, encarando Akemi com um sorriso.

— Vou no passageiro — afirmou.

Durante as três horas e meia de viagem, Akemi conheceu boa parte da história de dona AeCha. A garota já sabia que ela tinha três filhos e um neto, havia perdido o marido para um câncer no estômago e aprendeu a reconstruir a vida sem seu amado, como ela mesma disse. Contou que era da capital e trabalhava em Busan de quinta a domingo. Ficou falando de sua época de faculdade por um tempo, que era formada em Direito, mas nunca exerceu. Não soube lidar com a sujeira que escorria nos tribunais e decidiu abdicar do sonho de ser defensora pública e poder ajudar quem não podia pagar para ter justiça. Esse foi um dos muitos sonhos que dona AeCha abdicou durante a vida, mas, segundo ela, cada obstáculo a fez ser quem era hoje.

O tempo passou voando, e Akemi agradeceu mentalmente por ter conhecido uma pessoa tão bacana e carismática. Além de a simpática senhora ter contado boa parte de sua vida, também fez questão de aconselhar Akemi a tomar cuidado com certas regiões, afirmando que o resort que a garota havia reservado era de uma rede famosa e conhecida pela ótima qualidade de seus serviços. A família Jeon era muito conhecida pelo expecional atendimento durante tantos anos de hotelaria. Quando AeCha falou da noite na cidade, destacou um curioso pub que funcionava como uma espécie de encontro às cegas; disse que havia conhecido o seu primeiro amor lá. Akemi não controlou a gargalhada: queria deixar bem claro o quanto estava se divertindo na companhia da senhorinha.

— Chegamos, querida! — avisou AeCha, apontando para o resort e manobrando o carro para estacionar.

— Uau! Que lindo! — Akemi ficou boquiaberta com o lugar. Ao descer do carro, conseguiu ouvir perfeitamente o barulho do mar.

— Eu avisei que aqui era ótimo, não foi?! — disse, enquanto entregava a mala à garota. — Minha querida, foi um prazer fazer essa viagem com você. É sempre bom conversar com alguém tão agradável e de alma tão jovem!

— Poxa, dona AeCha, eu nem sei como agradecer! — Akemi estava lisonjeada. — De verdade, queria ter trazido mais dinheiro para poder te contratar como guia turística. Você merece muito! Obrigada, muito obrigada.

— Estou sempre à disposição. Se precisar de uma carona na cidade maravilhosa, estarei aqui! — afirmou sorrindo.

— Boa tarde, dona AeCha! — exclamou, já sentindo falta das infinitas histórias da coreana.

— Boa tarde, minha linda. E aproveite muito a viagem! — respondeu, entrando no carro — Nos vemos por aí! — dona AeCha deu uma leve buzinada e dirigiu-se ao estacionamento do resort.

Akemi estava sorrindo sem nem ao menos perceber. Aquela aventura tinha apenas começado e ela já estava genuinamente feliz. Quão incrível é o sentimento de conhecer uma pessoa, cheia de histórias e de simpatia rara como aquela senhora? Queria poder conversar com dona AeCha todos os dias.

— Boa tarde, posso ajudar a senhorita? — uma voz masculina interrompeu seus desvaneios. Era um homem vestindo roupa social, de gel no cabelo. O crachá o indentificava: BongCha.

— Boa tarde! Na verdade, só trouxe uma mala maior e uma de mão. Pode deixar que levo sozinha. Poderia me dizer onde faço o check-in?

— Claro, senhorita. Me acompanhe, por favor — BongCha caminhou até o balcão de entrada do resort, revelando um saguão cercado por paredes de vidro; a vista era algo parecido com o que Akemi imaginava ser o paraíso.

— Olá! — Disse um garoto de cabelo negro acompanhado de um ruivo, sorrindo e fazendo uma reverência para Akemi.

— Ah, olá! — A garota retribuiu os gestos.

— BongCha! — O de cabelo preto chamou o funcionário, que rapidamente virou-se para escutar o rapaz — de onde vem esse barulho? — No exato momento em que perguntou isso, uma batida de música eletrônica e gargalhadas masculinas abafadas foram ouvidas por todos. Parecia vir de algum lugar por perto.

— Me perdoe pelo barulho, senhor Jeon — falou BongCha. — Tem uns oito garotos hospedados no outro prédio do resort. Estamos fazendo todo o possível para fazê-los parar.

— Não precisa se preocupar, só perguntei por curiosidade. Tenho certeza que mais tarde eles param — o garoto de cabelo negro - que agora Akemi sabia ser chamado de 'senhor Jeon' - lançou um sorriso confortante para BongCha, e logo saiu dali, segurando a mão do ruivo que estava visivelmente confuso.

Depois de responder algumas perguntas básicas do check-in, ela pegou a chave do quarto e foi direto para o elevador. Teceiro andar! O número três era o seu número da sorte e a garota sorriu sem querer. Ao chegar na porta e destravá-la com o cartão, sorriu mais ainda. Era impossível não se maravilhar com uma vista daquelas.

Continua...

(Re)começos | BYUN BAEKHYUNWhere stories live. Discover now