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- Mãe! - Me aproximei da cama após o médico se retirar. Ela estava sedada. Mesmo de olhos fechados era possível perceber as olheiras. Acariciei os cabelos dela, compungido pela consternação opressora.

- Filho. - Escutei a voz arrastada de meu pai. Me virei, observando a aparência cansada dele. Os olhos inchados e avermelhados me fizeram sentir culpa.

Era por minha causa que tudo isto sucedera. Nem eu mesmo compreendia a mudança brusca das coisas e como fui inserido nela junto com minha família.

- Eles...eles estão mesmo mortos? - Minha voz saiu por um fio.

Ele assentiu. Eu não precisava escutar nenhuma palavra a mais.
Me isolei no quarto ignorando Hachiko que veio pular em cima de mim. Assim que entrei no cômodo ele entrou também.

Caí ao lado da cama começando a verter lágrimas copiosamente.

- Por quê eles? Por quê?

Hachiko colocou uma das patas no meu braço querendo me consolar. Minha angústia me paralisou por completo enquanto a sensação de morte começou a pairar ao meu redor.

Se eu morresse, ninguém mais se feriria.
Se eu morresse, ninguém precisava sofrer.

Instintivamente olhei o revólver na minha cintura, pensando se eu não existisse as pessoas que amo seriam livres.

Como se lesse esses pensamentos, Hachiko grunhiu atracando os dentes no cabo da arma.

- Não, Hachi.

Ele continuou fazendo isso sem recuar ou dar brechas para eu afastá-lo. Meu pai entrou no quarto imediatamente com o rosto lívido.

- Achei que...

Ele para ao presenciar a cena. Ninguém precisa ser gênio para descobrir o motivo do meu cachorro estar mordendo o cabo do revólver. Engoli em seco evitando encarar o olhar dele. Provavelmente veria decepção ali e isso me faria sentir mais culpa.

- Paulo, você...

- Pai, me desculpe. Estava só pensando.

Afastei Hachiko da arma, me levantando do chão frio.

- Ia fazer isso?

- Eu não sei. - Abafei a voz embargada. - Eu não sei. Tudo é minha culpa. Eu sou culpado por todo sofrimento das pessoas ao meu redor. Eu...

- Ah, filho. - Ele foi rápido em me abraçar tentando transmitir algum conforto. Nunca chorei tanto nem na época em que estive no orfanato. - A culpa não é sua. Nós somos uma família e uma equipe. Vamos superar isso.

- Estou me sentindo no fundo do poço. - Solucei, recordando da avalanche de notícias que recebi de uma vez. - Descobri que meu amigo me traiu. Rúbia e meus irmãos foram sequestrados. Meus avós foram mortos. Mortos!

- Eu sei.

Fiquei tão angustiado que afastei meu pai. Queria ficar sozinho imerso nas desgraças sucedidas. Joguei a arma no chão, correndo para fora do quarto. Minha mente estava nublada. Quase esbarrei no Dramaturgo na curva do corredor.

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