― É melhor você ir agora, tentar descansar um pouco, comer algo, esteve aqui a tarde toda, não está com fome, cansada?

A verdade é que pela primeira vez na vida não sinto nenhuma fome, duvido que consiga fazer qualquer coisa descer pela minha garganta no momento, é como se uma tala a atravancasse.

― Eu vou, mas só depois que a senhora me deixar entrar para vê-lo ― jogo a minha última carta.

A Sra. Talbot suspira pesadamente, checa os arredores, e em seguida deixa os ombros caírem.

― Só por um minuto... e tem que me prometer que vai ficar quietinha.

Salto do sofá no mesmo instante, limpando os olhos e esfregando o nariz irritado com o dorso da mão.

Antes que a Sra. Talbot tenha a oportunidade de mudar de ideia, eu abro a porta e caminho a passos de guepardo até a cama, onde o Oli está estirado.

― Devagar ― a enfermeira sibila.

― Desculpe.

Uma sensação estranha aperta meu peito e se alastra pelas veias ao vê-lo assim, inerte, seus incríveis olhos cinzas fechados, o corpo rígido, é quase como se estive morto. E, por mais que tente, não consigo espantar o pensamento de que, assim como eu, um dia ele também não estará mais aqui. Isso me apavora, a precariedade da vida, pensar que nada no mundo, nem mesmo o amor, pode mudar o que somos desde o ínicio: sopros. E tudo que nos resta é preencher o lapso entre o primeiro choro e a última respiração da melhor forma possível.

Sem conseguir conter o fluxo de lágrimas, me sento na beirinha do colchão e ponho a minha mão sobre a sua, observando o braço enfaixado, faço um carinho nos dedos de nós branquicentos, tão maiores que os meus, e nada poderia abalar a certeza de que quero segurá-los para sempre.

― Você é um sopro que eu queria que se tornasse tempestade e durasse e durasse por toda a eternidade ― cantarolo, as palavras brotando de algum lugar da minha alma. ― Vou rezar por você, vai ficar tudo bem, eu sei. O padre Cadence diz que nenhuma prece volta vazia, e eu acredito nisso. Você vai ficar bom, eu sinto bem aqui. ― Aponto o próprio peito, que chacoalha fraquinho na caixa torácica. ― Logo, logo vai estar resmungando por aí e testando a paciência de todo mundo, menos a minha, posso te ouvir resmungar para sempre, sem nunca me cansar, juro que posso, você fica engraçado quando fica bravo.

A cabeça dele pende um pouquinho para o lado, os cabelos loiros esparramados sobre o travesseiro, e me pergunto se consegue me ouvir. Acho que não, a Sra. Talbot deve tê-lo entupido de analgésicos e remédios para dormir.

Ela fez isso comigo uma vez, quando despenquei de um pessegueiro no terceiro ano, eu tomei tantos remédios que esqueci até o meu nome, e quando o papai apareceu para me ver eu o chamei de Sr. Coelho Branco; todo mundo riu, mas eu não vi a menor graça.

Sinto a mão da enfermeira pousar no meu ombro e ergo a cabeça para ver seu rosto consternado.

― Seu minuto acabou.

― Mas já?

― O tempo voa, querida.

― E a vida não para ― completo ― para ninguém.

― Menina esperta ― Ela sorri, tirando a mão do meu ombro e afundando no bolso. ― Agora vá.

Posso ouvir o ruído da respiração do Oli se alongando, e não desvio meu olhar do seu rosto nem mesmo quando a enfermeira tropeça em uma mesinha, derrubando uma bandeja de medicamentos e causando um estalido, e eu levo um susto.

― Precisa de ajuda ― pergunto ao ver a Sra. Talbot se agachar para recolher os comprimidos, frascos de remédios e ampolas estilhaçadas.

― De forma alguma ― diz calmamente ― Eu cuido disso.

Viola e Rigel - Opostos 1Where stories live. Discover now