Fevereiro, 2017. V.

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    Amanda era o tipo de professora que todo aluno gostaria de ter. Suas aulas iam muito além de um livro e um caderno em cima da mesa. Amanda gostava de ter um contato maior com os alunos, sempre respeitando sua privacidade. Ela precisava ter a atenção de cada um deles completamente voltada a ela, era tudo ou nada. Era uma mulher que beirava os trinta anos, mas, definitivamente, não aparentava.

    A professora gostava sempre de inserir um debate em suas aulas de História. Explicava a matéria e, em seguida, promovia o debate. Esse era um dos motivos para os alunos sempre posicionarem suas carteiras em uma roda antes mesmo que a professora entrasse: os debates eram sempre feitos em roda, para que todos os alunos pudessem olhar um para outro, sem precisarem fazer grande esforço. Além disso, Amanda abominava as fileiras, pois, normalmente, quem estava na primeira carteira era sempre uma pessoa com dificuldade em alguma matéria.

    Amanda já havia passado por aquela situação. Nunca tivera uma relação muito amigável com Matemática e Física e, quando as coisas começaram a complicar para ela, um dos professores logo tratou de colocá-la na primeira carteira, de frente para sua mesa. Claro que Amanda sabia que suas intenções eram as melhores possíveis. Ele não estava fazendo aquilo para humilhá-la, só queria ajudar. E ela sabia disso. Mas, ainda assim, considerava injusto que o aluno fosse colocado naquela posição apenas porque ele pertencia à outra área.

    Por essa razão, Amanda sempre sorria quando entrava na sala e via a arrumação que os alunos já faziam sem ela precisar pedir. Entrava no meio da roda e começava sua explicação, vez ou outra escrevia algumas coisas importantes no quadro. No final, promovia um debate que, se dependesse dos alunos, não acabaria nunca.

    Naquele dia, a professora entrou na sala, prendeu os cabelos ruivos em um coque e anunciou:

    — Hoje eu tenho coisas muito mais importantes do que uma matéria para tratar. Vamos começar e terminar essa aula com um debate. Dessa vez, quero ouvir todos. Sem exceção. — Encarou todos os alunos bem no fundo dos olhos, um por um. Alguns, desconfortados, chegaram até a ajeitar a postura ou mexer no cabelo, apenas para desviar o olhar por um segundo. — Vamos lá! — A voz ficou mais leve e animada. Amanda bateu palmas antes de começar. — Eu li todas as redações. Foi algo que me prendeu muito, eu passei a noite inteira fazendo isso, simplesmente porque não conseguia parar. Eu senti vocês ali como nunca havia sentido antes e eu estou orgulhosa por isso. De verdade. Mas algumas redações me chamaram muita atenção, e eu decidi trazer esse debate para cá. — Os cochichos começaram a ser ouvidos, e Amanda precisou agir rápido, antes que a conversa ficasse alta e não conseguisse mais dar aula. — Guardem suas falas para mais tarde! — Esperou o silêncio e a atenção a ela voltarem, o que não demorou muito. — Ok, obrigada! Gente, hoje eu gostaria de discutir com vocês um tema que não gera polêmica, se pararmos para pensar bem, mas que as pessoas continuam fazendo, mesmo sabendo que é errado. Bullying. Vamos falar a verdade, ninguém aqui acha que bullying é correto, mas a maioria aqui já fez com alguém. E muitas vezes fazemos sem perceber, eu sei, é difícil entender os limites das pessoas, mas eu gostaria que, antes de começarmos o debate, vocês tirassem um tempo para pensarem em todos os comentários que poderiam ter sido evitados, mas que vocês não evitaram; gostaria que pensassem em todas as pessoas que não gostariam de ter magoado, mas magoaram. Não estou tentando torturar ninguém, por favor, não me entendam mal, eu só não quero que sejam hipócritas. Reconheçam o próprio erro antes.

    Depois de pouco mais de dois minutos, a professora sorriu e voltou a falar:

    — Alguém gostaria de começar?

    Para a surpresa de Amanda e de todos os alunos, Lucas foi o primeiro a levantar a mão. Não que ele não pudesse ou não devesse, mas não estavam acostumados a ver alunos novos sentindo-se tão confortáveis ao ponto de quererem começar o debate. Alguns demoravam meses para simplesmente exporem suas opiniões.

Clube dos 7 Erros [HIATUS]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora