Capítulo 10

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Vinham da floresta, voltando para a campina. Quando estavam chegando,Cinzento parou de repente, o focinho erguido no ar.De novo. Ele esticou a cabeça para avaliar com atenção. Mais forte.Pax, já hesitante, ficou tenso.Cinzento correu até o trecho em que acabavam as árvores.Um solitário está me desafiando. Ele quer este território, mas está se exibindopara a jovem raposa fêmea. Ela vai escolher um companheiro até o fim doinverno.Pax foi atrás e observou a cena. Quatro raposas pontilhavam a campina.Arrepiada e Miúdo estavam juntos, as orelhas de pontas pretas viradas para afrente, em sinal de alerta, na direção das outras duas raposas, que se encaravamsobre uma rocha, pouco mais à frente. Uma delas era fêmea, mais escura doque Arrepiada e com a barriga inchada de filhotes. A outra raposa era um machogrande, com pelugem áspera e castanha, os pelos do pescoço eriçados e a orelhaesquerda com um corte.Cinzento anunciou sua presença com uma espécie de latido. O intruso desceuda rocha, o sangue jorrando da orelha, e disparou pela campina.Cinzento desceu pela encosta da colina, seguido por Pax. Quando passou porArrepiada e Miúdo, sua simples presença pareceu acalmá-los, como se ele fosseuma mão invisível acariciando as costas de ambos. Assim que ele passou, Miúdodeu pulinhos de empolgação ao ver Pax, mas Arrepiada fez cara feia e sibilou demaneira bastante agressiva.Pax correu atrás de Cinzento, que subiu na rocha, colocando-se ao lado de suacompanheira. Pax foi até a base e se sentou, respeitoso. A companheira deCinzento o cumprimentou com afeição e contou as novidades:O vento desta manhã trouxe cheiro de fogo. Temos que ir logo. Ela olhou paraPax. O forasteiro cheira a humanos.Arrepiada e Miúdo se aproximaram, as orelhas erguidas para ouvir a respostade Cinzento.Ele está voltando para os humanos com quem morava. Vou com ele, encontrarum bom lugar para nos instalarmos. Partimos hoje à noite, depois quedescansarmos.Atrás de Pax, Arrepiada rosnou de novo. Ele teve vontade de sair correndo.Seu menino... ele só queria encontrar seu menino. Mas o instinto lhe dizia queprecisava, primeiro, de descanso e comida. Pax fez um sinal, mostrando queconcordava. Cinzento e sua companheira foram andando em silêncio pelacampina verde.Miúdo correu até lá e se jogou em cima de Pax. Deixou cair o soldadinho debrinquedo que carregava na boca, convidando Pax a brincar. Arrepiada pulouentre os dois e jogou o brinquedo longe.Humanos. Não esqueça o perigo.Miúdo pegou o brinquedo de volta e o exibiu entre os dentes, em claro desafio.Pax sentiu que Miúdo tinha arranjado problemas para si e que o culpado eraele mesmo, Pax. Já muitas vezes se sentira assim com seu menino e o pai dele, euma das estratégias que usava nessas ocasiões era se afastar, pois assim protegiaseu menino da raiva do homem. Ele recuou. Mas Arrepiada não se deu porsatisfeita.Fique longe do Fedor Humano, alertou ela ao irmão. Não esqueça o perigo.Pax avançou um passo.Meus humanos não são perigosos.Miúdo pareceu alarmado ao ouvir isso, como se Pax tivesse lançado umdesafio. Subiu correndo a colina até a entrada da toca, mas Arrepiada foi maisrápida: bloqueou o irmão e, quando ele tentou correr para o outro lado, o seguroucom o peso da pata até ele desistir, derrotado.Todos os humanos são perigosos...O pelo de Pax se arrepiou com o tremor que o percorreu quando ouviu a cenaque a raposa fêmea invocou: vento frio, uivante e com uma pesada ameaça deneve. Pax reconheceu o vento — ele sabia que a história que ela contariaterminaria com sangue na neve e dentes de aço.Arrepiada arreganhou as presas para Pax e começou.

PAXWhere stories live. Discover now